domingo, 30 de junho de 2019

XADREZ DA GRANDE ARMAÇÃO DA DELAÇÃO DA OAS, POR LUIS NASSIF

Apagão jornalístico da época, impediu Folha e The Intercept de contextualizar os diálogos capturados sobre a delação de Leo Pinheiro.

A Folha colocou repórteres experientes para se juntar à jovem equipe do The Intercept na cobertura do dossiê sobre a Lava Jato. A dificuldade que enfrentam é a ausência de acompanhamento anterior sobre tema, tanto por parte da Folha como do The Intercept, o que impede de contextualizar devidamente os diálogos (aqui).
Essa é uma das grandes dificuldades do dossiê. Cada capítulo expõe, ainda que de forma indireta, o grande apagão da mídia no período.
Tome-se o episódio de hoje, publicado pela Folha, sobre a delação de Léo Pinheiro, da OAS (aqui) As implicações são bem maiores do que foi sugerido pela reportagem. Foi a primeira evidência efetiva de que o Procurador Geral da República Rodrigo Janot havia entrado de cabeça nas armações da Lava Jato.
Expliquei o jogo no artigo “Xadrez de Toffoli e o fruto da árvore envenenada” (aqui), de 22 de agosto de 2016, em plena efervescência do episódio.
Simplificadamente, ocorreu o seguinte:
  1. Havia evidências de que Léo Pinheiro, presidente da OAS, entregaria tucanos, especificamente o governador José Serra, em sua delação.
  2. De repente, há o vazamento de um falso escândalo para a revista Veja.
  3. Com base nesse factoide, o Procurador Geral da República Rodrigo Janot ordena a interrupção das negociações com Pinheiro.

Vamos entender esse jogo em detalhes.
Peça 1 – Leo Pinheiro e o buraco do Metrô
Antes da delação de Leo Pinheiro, circularam informações, entre advogados de São Paulo, que ele seria decisivo nas denúncias contra políticos do PSDB, especialmente José Serra.
Em duas operações que, de alguma forma, envolviam Serra, a Justiça acatou a tese do “fruto da árvore envenenado” para anular o inquérito. Foi assim na Satiagraha e na Castelo de Areia – na qual há acusações graves contra o Ministro do Superior Tribunal de Justiça que anulou o inquérito. Ou seja, pegava-se qualquer irregularidade (no caso da Castelo de Areia não havia) e se recorria ao conceito do fruto envenenado para anular toda a operação.
A Castelo de Areia, por sua vez, permitiria comprovar uma das grandes suspeitas de crime do então governador José Serra, no episódio do buraco do Metrô, que deixou 7 mortos.
O trabalho era executado por um consórcio formado pela Norberto Odebrecht, CBPO, Construtora Camargo Correia, OAS Construção, Andrade Gutierrez e Queiroz Galvão.
Quando houve o acidente, as empreiteiras foram colocadas no corner por duas ações simultâneas. A primeira, as declarações do Secretários dos Transportes José Luiz Portella, de que eles sabiam do problema (aqui), portanto, haveria dolo. E o Ministério Público Estadual pretendia indiciar os próprios presidentes das empreiteiras.
Houve uma dura negociação, com participação direta de Serra, ao cabo da qual o MPE teria concordado em indiciar engenheiros indicados pelas próprias empreiteiras. Na época, havia suspeita de pagamento de R$ 15 milhões. A Castelo de Areias identificou pagamentos de R$ 5 milhões, da parte da Camargo Correia, que poderiam estar ligados ao acerto. Mas o caso acabou anulado.
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Aliás, uma das figuras-chave para a anulação da Castelo de Areias foi o intimorato Ministro Luis Roberto Barroso (aqui).
Tudo indicava que, sem ter como atender a Lava Jato, no caso do tríplex, Pinheiro ofereceria as provas contra o PSDB no episódio do Metrô.
Há uma conversa de Deltan Dallagnol comprovando essa suspeita.
Peça 2 – a jogada do falso vazamento
Aí veio a grande jogada, que consistiu em um vazamento de um episódio anódino para a Veja, envolvendo o Ministro Dias Tofolli, do Supremo Tribunal Federal (STF). Era uma denúncia falsa, conforme descrevi na época:
Fato 1 – já era conhecido o impacto das delações de Léo Pinheiro sobre Serra e Aécio (http://migre.me/uJKsj). Tendo acesso à delação mais aguardada do momento, a revista abre mão de denúncias explosivas contra Serra e Aécio por uma anódina, contra Toffoli.
Fato 2 – a matéria de Veja se autodestrói em 30 segundos. Além de não revelar nenhum fato criminoso de Toffoli, a própria revista o absolve ao admitir que os fatos narrados nada significam. Na mesma edição há uma crítica inédita ao chanceler José Serra, pelo episódio da tentativa de compra do voto do Uruguai. É conhecida a aliança histórica de Veja com Serra. A reportagem em questão poderia ser um sinal de independência adquirida. Ou poderia ser despiste.
Era em tudo similar ao famoso grampo de Demóstenes Torres, que serviu para afastar o delegado Paulo Lacerda da ABIN (Agência Brasileira de Inteligência). Era um grampo a favor, no qual o
Ministro Gilmar Mendes e o senador Demóstenes Torres trocavam elogios entre si. Havia em tudo o mesmo estilo, uma versão tupiniquim do mesmo padrão do incêndio do Reichstag, recurso utilizado desde tempo imemoriais.
No mesmo domingo, Janot acusa os advogados da OAS de terem vazado o episódio e ordena a anulação das negociações com ele. Não tinha pé nem cabeça. Como observei na ocasião.
  • A alegação dos procuradores, de que o vazamento teria partido dos advogados de Léo Pinheiro, visando forçar a aceitação da delação não têm o menor sentido. Para a delação ser aceita, os advogados adotariam uma medida que, na prática, anula a delação? Contem outra.

Não havia nenhum indício de autoria do vazamento. Mais ainda: em nenhum momento a delação mencionava o episódio narrado por Veja, como se comprova, agora, nos próprios diálogos dos procuradores. Mas havia uma estratégia nítida por trás.
  • “Sem comprometer Toffoli, o vazamento estimula o sentimento de corpo do Supremo, pela injustiça cometida contra um dos seus.
  • Aomesmo tempo, infunde temor nos Ministros, já que qualquer um poderia ser alvo de baixaria similar”.
  • Era evidente a armação. Só não se conheciam os autores intelectuais.
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  • De qualquer modo, trata-se de um ponto de não retorno, que ou consagra a PGR e o Ministério Público Federal, ou o desmoraliza definitivamente.

Afinal, quem toca a Lava Jato é uma força tarefa que, nas eleições presidenciais, fez campanha entusiasmada em favor do candidato Aécio Neves. Bastaria um delegado ligado a Serra e Aécio vazar uma informação anódina contra um Ministro do STF para anular uma delação decisiva. Desde que o PGR aceitasse o jogo, obviamente.
Era esse o contexto central, onde deveriam entrar os diálogos revelados pela Folha e pelo The Intercept.
Peça 3 – o fator Janot
Janot sempre foi uma figura menor no MPF, que se destacava apenas na política interna menor, tratando dos micro temas da corporação. Enquanto o PT era poder, aproximou-se de lideranças do partido, como José Genoíno, em um esquema bajulatório que incluía jantares em sua casa, regados a vinhos caros, nos quais atuava como cozinheiro e garçom. Seu principal padrinho para a PGR, e melhor amigo, procurador Eugênio Aragão, narrou em detalhes a atuação bajulatória de Janot, depois que ele mudou de lado.
No artigo em que analisamos o episódio, levantamos as suspeitas sobre a armação.
  • Afinal, quem toca a Lava Jato é uma força tarefa que, nas eleições presidenciais, fez campanha entusiasmada em favor do candidato Aécio Neves. Bastaria um delegado ligado a Serra e Aécio vazar uma informação anódina contra um Ministro do STF para anular uma delação decisiva. Desde que o PGR aceitasse o jogo, obviamente.
  • Será curioso apreciar a pregação dos apóstolos das dez medidas, se se consumar a anulação da delação.

E colocava foco em Janot:
  • A incógnita é o PGR Rodrigo Janot. Até agora fez vistas largas para todos os vazamentos da operação mais vazada da história. E agora?
  • Se ele insiste na anulação da delação, a Hipótese 1 é que está aliado a Gilmar na obstrução das investigações contra Aécio e Serra. A Hipótese 2 é que está intimidado, depois do tiro de festim no pedido das prisões de Renan, Sarney e Jucá. A Hipótese 3 é que estaria seguindo a lei. Mas esta hipótese é anulada pelo fato de até agora não ter sido tomada nenhuma providência contra o oceano de vazamentos da Lava Jato.

Os diálogos revelados pela Folha servem para comprovar que a armação, nesse caso, não partiu da força tarefa.
Peça 4 – o apagão do jornalismo
Na época, toda a imprensa se calou ante uma manobra escandalosa. Aliás, seria um bom tema para ser abordado no evento da ABRAJI (Associação Brasileira de Jornalismo Investigativo). A própria Veja, que, agora, se esmera em retomar os caminhos do jornalismo, poderia esclarecer melhor o episódio.
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A reportagem de hoje, na Folha, esclarece muito mais pelo que não revela.
A Lava Jato estava empenhada, sim, em anular a delação de Pinheiro, por não trazer elementos que incriminassem Lula.
Isso já era nítido na época:
  • Na semana passada o procurador Carlos Fernando dos Santos lima já mostrava desconforto com a delação da OAS, ao afirmar que a Lava Jato só aceitaria uma delação a mais de empreiteiras. Não fazia sentido. A delação depende do conteúdo a ser oferecido. O próprio juiz Sérgio Moro ordenou a suspensão do processo, sabe-se lá por que. E nem havia ainda o álibi do vazamento irrelevante.

  1. A Lava Jato sabia que a delação de Pinheiro incriminaria os tucanos, como revelou a fala de Dallagnol.
  2. Mesmo assim, foram apanhados de surpresa pelo vazamento, indicando que a estratégia partiu de Brasília, mas especificamente de Rodrigo Janot.

A extraordinária incompetência política do PT, e de Dilma Rousseff, orientada pelo arguto Ministro da Justiça José Eduardo Cardoso, levou à recondução de Janot ao cargo de PGR, preterindo Ella Wiecko. Seguramente ali selou o destino do seu governo. Janot foi elemento central para o impeachment.
Os episódios narrados ocorreram em pleno apagão jornalístico. E é essencial para desnudar de vez as armações e comprovar que não se limitavam aos provincianos de Curitiba, mas ao próprio centro de poder.
De qualquer modo, Folha e The Intercept poderão retomar o tema em futuras reportagens.
Do GGN

sexta-feira, 28 de junho de 2019

DIPLOMACIA, ECOLOGIA, ECONOMIA. A CABEÇA PRIVILEGIADA DE PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.


O Tijolaço nunca escondeu sua admiração pelo economista Paulo Nogueira Batista Jr., sobre quem lamenta não ter recebido o Ministério da Fazenda no governo Dilma. Comenta Fernando Brito. Segue dizendo.
Hoje, tem o privilégio de reproduzir a entrevista dada a Eleonora de Lucena e Rodolfo de Lucena.
Você vai ver um sujeito que conjuga equilíbrio e paixão, tudo em nome de uma visão de Brasil  coerente com um país como o nosso, com o tamanho e importância que tem.
Que conjuga coerência com pragmatismo.
Que fala em economia com a simplicidade de quem quer ser entendido e não admirado.
Que é moderno sem perder as referências históricas.
Não falar na linguagem simples é, em geral é um maneira de trair a população, porque é falando o que não se pode entender que se faz o que não se poderia aceitar.
Se não tem tempo para uma conversa encantadora, deixe para assistir depois.
Por ser assim, não faço o resumo, que você pode ler aqui.
Mas recomendo que não leia, assista, é uma conversa que eu adoraria ter.
Confira a entrevista:
Do Tijolaço

quinta-feira, 27 de junho de 2019

SÉRGIO MORO JÁ DECIDIU QUE O SARGENTO AGIU SOZINHO NO CASO DA COCA, POR LUIS NASSIF

Enquanto isto, permanecem intocados Flávio Bolsonaro, o lugar-tenente Queiroz, as investigações sobre a autoria da morte de Marielle.

O vice-presidente, general Hamilton Mourão, declarou o óbvio: o tal sargento da aeronáutica não agiu sozinho. Têm-se, aí, um caso grave, um problema que já afetou Forças Armadas de diversos países, mais ainda aquelas que foram colocadas na linha de frente da luta contra a droga.
As fotos na Internet, sobre carregamentos de 40 kg de cocaína, comprovam a impossibilidade do sargento ter atuado sozinho.
Na viagem, ele certamente tinha uma mala para seus pertences pessoais, mais o adicional de 39 kg, que exigiria uma mala gigante. Essa mala chegou no hangar da FAB, foi transportada até o avião. Sendo o avião da comitiva presidencial, supõe-se que seja submetido a fiscalização adicional pelas próprias normas de segurança do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), incumbido de zelar pela segurança do presidente.
Depois, na chegara ao destino final, o sargento carregava a mala, imensa. Mesmo se passasse pela alfândega, é evidente que não passaria despercebida de seus colegas de voo. Além disso, há indícios de que era reincidente na prática. Ou seja, havia um esquema azeitado de entrega dos pacotes no hangar da FAB e de entrega no destino final.
Em países sérios, haveria uma imediata mobilização das autoridades, do Ministro da Justiça, da Polícia Federal e do próprio comando da Aeronáutica, para investigar o caso. E a principal suspeita seria de uma organização criminosa atuando no âmbito da Aeronáutica.
A repercussão internacional mostra a gravidade do episódio:
  • ‘Financial Times’: “cocaína na Espanha coloca Bolsonaro sob pressão”.
  • ‘New York Times’  “Pó branco, rostos vermelhos: carga de cocaína a bordo de avião presidencial do Brasil”.
  • ‘Le Monde’, de Paris, : Bolsonaro foi sacudido pelo “Aero Coca”, depois de 39 quilos de cocaína terem sido descobertos

A própria Aeronáutica, que é uma corporação idônea, certamente está empenhada nessa apuração.
O que faz o Ministro da Justiça, Sérgio Moro? Sua primeira atitude é afirmar que foi um caso isolado, antes mesmo de qualquer análise.
Não se duvide da honra da FAB. Mas o pré-julgamento de Moro, transformando um indício preocupante, de organização criminosa atuando na FAB, em “ínfima exceção” visa exclusivamente fortalecer o apoio militar a ele, no momento em que é exposta sua parcialidade na Lava Jato. E no momento em que vai aos Estados Unidos, com a desculpa de se inteirar de técnicas na luta contra o tráfico. E o responsável pela segurança do vôo, General Alberto Heleno, diretor do GSI, explica que não tem o dom da adivinhação, incluindo um componente novo nas normas de segurança: a adivinhação.
Pior! Servindo a um governo sobre o qual pairam suspeitas sérias de envolvimento com o crime organizado, as milícias, contra as quais Moro, até agora, não definiu uma estratégia de combate.
No mesmo momento, o 3º filho, Carlos Bolsonaro, tuitava mensagem de apoio ao PL 1379/19 que, como explica com seu estilo tormentoso, “anistia multas transportes coletivos que circulam nas faixas de ônibus”.
Ora, transportes coletivos é um dos setores preferenciais de atuação das milícias no Rio de Janeiro. É mais um avanço da economia do crime sobre a economia formal.
Simultaneamente, o inacreditável Ministro da Educação Abraham Weintraub faz a defesa mais esdrúxula do governo, reeditando a máxima “sou, mas quem não é?”
Enquanto isto, permanecem intocados Flávio Bolsonaro, o lugar-tenente Queiroz, as investigações sobre a autoria da morte de Marielle.
GGN

ENERGIA RENOVÁVEL, ALEMANHA E BRASIL TÊM MUITO A ENSINAR A BOLSONARO, POR LUIS NASSIF


A refundação do Brasil, segundo Luis Roberto Barroso, deu nisso. Nos fóruns internacionais, para debater com estadistas do porte de Angela Merkel, o Brasil é representado pelo baixíssimo clero Jair Bolsonaro.
Pior do que o caso do tráfico de cocaína em avião da FAB, foi Jair Bolsonaro, pretender ensinar a Alemanha sobre energia renovável.
A refundação do Brasil, segundo Luis Roberto Barroso, deu nisso. Nos fóruns internacionais, para debater com estadistas do porte de Angela Merkel, o Brasil é representado pelo baixíssimo clero Jair Bolsonaro.
Provocado sobre a declaração de Merkel, sobre a desatenção do seu governo com o meio ambiente, Bolsonaro afirmou que “o Brasil é que tem que dar exemplos para a Alemanha sobre o meio ambiente (…) Eles têm muito a aprender conosco”.
Ora, a tradição brasileira de energia renovável é um trabalho de gerações, que passou pela instalação do parque hidrelétrico, pelas leis de proteção ao meio ambiente, pelo modelo elétrico pós 2008, com a ampliação dos leilões de energia renovável.
Seria o caso de o governo Bolsonaro aprender com o Brasil. Mas o que tem sido feito é o desmonte de todo esse sistema, das leis de proteção ambiental, da regulação dos ecossistemas, das ameaças às reservas florestais e à própria Amazônia.
O que se tem, portanto, é um país sustentável sendo destruido versus um país das primeiras revoluções industriais construindo seu sistema de energia renovável.
O caso alemão é um exemplo para qualquer país do mundo comandados por governantes minimamente racionais.
Sugere-se a esses gênios do Twitter a leitura do trabalho “Análise da Política Energética na Alemanha do século 19 ao 21”, de Léo Metello Castro, sob orientação do professor Nivalde José de Castro.
Diz ele:
A Alemanha se destaca por ser uma das principais potências mundiais, contando com um elevado consumo energético. Com isso, o processo inovador que vem ocorrendo no país ganha ainda mais destaque, sendo um processo complexo, mas que vem sendo conduzido com um aparente êxito.
(…) Outro ponto que motivou essa postura foi a questão ambiental. O consumo de combustíveis fósseis é um dos principais emissores de dióxido de carbono, uma das principais causas para o Efeito Estufa. Esse combate já é realizado com seriedade pelo governo desde a década de 90.
(…) O Energiewende se trata de uma política integrada que abrange todos os mais diversos setores da economia. É impulsionado por quatro objetivos principais: combater as mudanças climáticas (através da redução das emissões de CO₂), eliminar a energia nuclear, melhorar a segurança energética (através da redução das importações de combustíveis fósseis) e garantir competitividade e crescimento (através de políticas industriais visando desenvolvimento tecnológico, industrial e de emprego) (Agora, 2015).
E as medidas recentes:
2014: O governo diminui as tarifas utilizadas no modelo feed-in, introduz sistemas de leilão para capacidade fotovoltaica e apresenta um plano para atingir as metas traçadas para 2020.
2015: O plano está progredindo na velocidade desejada, um relatório aponta que a meta de reduções da emissão de gases até 2020 está em “sério perigo”. 28
2016: O governo federal assina um “Plano de Ação Climática”, um quadro básico para descarbonizando a economia até 2050 através de metas graduais. Inclui corredores alvo de redução nas emissões de gases de efeito estufa em setores econômicos individuais. · 2017: Substituição do modelo de tarifas feed-in para um sistema de leilões para todas as energias renováveis.
Aqui, a íntegra do trabalho, que certamente jamais será lido pelo governo Bolsonaro, por ultrapassar o número de toques do Twitter.
Do GGN

quarta-feira, 26 de junho de 2019

XADREZ DOS 4 MS: MORO, MÍDIA, MILÍCIAS E MINISTROS DO STF, POR LUIS NASSIF

De algoz inclemente, Moro caminha para ser o bode expiatório do sistema. Será usado pela mídia para purgar seus pecados, de apoio à desestruturação do país.
Nosso Xadrez ganhou uma complexidade à altura do caos que se instalou no país.
Há quatro personagens diretamente envolvidos com a Lava Jato e, seguramente, fazendo parte do dossiê Intercept: a Lava Jato, o Supremo Tribunal Federal (STF), Mídia e Milícias (entendido aí, o grupo diretamente ligado à eleição de Bolsonaro).
Todos eles tiveram papel central na era da ignomínia da democracia brasileira, uma mancha na história de cada um, com exceção obviamente das milícias, as vitoriosas.
Em outros tempos, a revisão histórica se daria após o fim do período de exceção, com justiça de transição, obras desnudando os personagens. E, em geral, cobrindo de vergonha apenas os descendentes dos principais personagens.
No entanto, na era da Internet e das redes sociais, o tempo político acelera-se enormemente. A trágica resultante do jogo – a ascensão de Jair Bolsonaro, ameaçando jogar o país na era das trevas – acelerou enormemente o revisionismo. Jornalistas, celebridades, alguns veículos que foram peça central na desmoralização da democracia, trabalham, hoje em dia, em um aggiornamento a jato, menos de dois anos após delatarem adversários, estimularem o ódio, defenderem as ações de exceção da Lava Jato.
Especialmente porque emergiu dessa zona um Brasil do baixo clero, com a opinião se fazendo ao largo da mídia, das análises técnicas e da Bastilha dos poderes constitucionais. Abriram a jaula, liberaram os bárbaros. A recuperação da influência dependerá, portanto, da retomada da legitimidade perdida.
Por outro lado, a recuperação dos princípios democráticos poderia trazer Lula de volta à arena política. Como se equilibrar nesse dilema, entre a cruz e a caldeirinha? Especialmente porque o dossiê do Intercept, se divulgado na integra, revelará:
Pecados específicos da operação.
Acertos com jornalistas e veículos.
Conversas mencionando acertos nas instâncias superiores, podendo chegar até o STF.
É nessa arena que se dará os próximos embates entre os quatro Ms.
Vamos conferir como deverão se comportar, a partir da estratégia elaborada por Glenn Greenwald, da Intercept.
Protagonista 1 – Glenn Greenwald e o Intercept
Glenn se tornou um jornalista premiado internacionalmente não apenas por ser receptador de dossiês explosivos, mas, principalmente, por sua capacidade de viabilizar sua divulgação. No caso Snowden, houve a parceria com The Guardian e outros grandes veículos internacionais, conseguindo contornar até a enorme influência da CIA e do governo norte-americano.
Agora, monta uma tacada de mestre, com a parceria com a Folha de S. Paulo. Com a aliança, blinda-se contra eventuais tentativas de Sérgio Moro, de criminalizar a cobertura, ganha um alto-falante potente, junto a uma bolha extra-Internet.
Definiu claramente o alvo – Sérgio Moro e a Lava Jato -, enfrentou valentemente os grandões, inclusive a Globo, quando tentou criminalizar sua conduta, e os bolsominions que o ameaçaram
Há informações de que apenas 2% do dossiê Snowden foi divulgado, devido a alianças políticas de Greenwald. Não se condene. Fez o que era possível para viabilizar a divulgação de parte dos documentos, que se tornou um clássico do jornalismo contemporâneo. Mas pode explicar eventuais desdobramentos na divulgação do dossiê Intercept, como se analisará a seguir.
Protagonista 2 – mídia
A eleição de Bolsonaro consagrou definitivamente o novo ator das comunicações, as redes sociais, os “influenciadores”, com sua comunicação horizontal, os fake news e o trabalho absolutamente profissional de apoio a Bolsonaro. A única maneira da mídia mainstream recuperar o espaço é retomando os valores imemoriais do jornalismo.
Mas como apagar tantos anos de infâmia, o uso abusivo de fakenews até perder o controle sobre o produto?
Este ano, tem havido um esforço ingente para recuperação da legitimidade. Jornalistas que se lambuzaram até o pescoço atendendo à sede de ódio do período anterior, a legitimação das ilegalidades, a delação dos inimigos, de repente se tornam campeões do lado certo, na grande batalha civilização x selvageria. Sejam bem vindos.
Ao mesmo tempo, na classe média mais moderna, dos jovens de boa cabeça, há um movimento irresistível de adesão às críticas contra Moro, Dallagnoll e operação. Ora, se investir contra o poder constituído engrossou a campanha do impeachment, hoje em dia o poder constituído atende pelo nome de Sérgio Moro, e Lava Jato.
É um movimento que conquistou programas de humor, na própria Globo, corações e mentes da parte mais saudável dos jovens jornalistas – ainda que contidos pelas amarras da redação. E, especialmente, a classe média mais informada, blindada contra os fakenews das redes sociais.
Está em formação a tentativa de criar um pensamento progressista, tipo classe média intelectualizada, em substituição à esquerda tradicional.
Por outro lado, a divulgação de diálogos de procuradores com jornalistas poderá explicitar o óbvio, o fato de a mídia ter endossado todos os arbítrios da Lava Jato.
Nesse sentido, é interessante analisar o comportamento da Globo.
Começou pretendendo criar um Russiagate, para desmoralizar as denúncias. Recebeu reações à altura de Greenwald, valendo-se das redes sociais. Depois, se acalmou, a ponto de produzir uma matéria longa e isenta sobre o tema no último Fantástico, depois de anunciado a parceria Intercept-Folha.
O que a fez mudar de opinião? A constatação de que, indo contra o dossiê, comprometeria ainda mais sua imagem? A garantia de que apenas parte do dossiê seria revelado?
Lembrem-se das contas do HSBC. Quando o jornalista Fernando Rodrigues se viu com os dados na mão, incluindo contas de donos de empresas jornalísticas, amarelou e pediu ajuda à Globo. O jornal alocou bons repórteres, que levantaram alguns casos, para dar alguma satisfação ao distinto público, mas esconderam o restante do material. Até hoje é mantido nas sombras.
Greenwald informou estar fechando aliança com outros veículos. Ainda é cedo para avaliar a profundidade da cobertura do dossiê. Qualquer que seja o nível de concessão, já prestou um serviço inestimável à democracia brasileira.
Protagonista 3 – os milicianos
Jair Bolsonaro está se esbaldando com a agonia de Sérgio Moro. É só comparar sua desenvoltura, depois que se iniciou a descida de Moro aos infernos, com a postura anterior. O aclamado herói nacional, agora, come na sua mão, endossa todos seus esbirros e, a cada dia que passa, reduz seu próprio potencial eleitoral – embora ainda seja bastante popular.
Por outro lado, as tentativas da mídia de limpar as marcas do passado recente, o aumento da grita pela libertação de Lula, fortalecem Bolsonaro junto às suas milícias.
A cada dia que passa, seu governo mais se isola, mais nítidos ficam os sinais de descontrole sobre a economia e o isolamento do país no cenário global. Salva-se apenas pelo antilulismo.
Mas isso é tema para outro xadrez.
Protagonista 4 – os Ministros do Supremo
Hoje confirmou-se a regra suprema, que explicitei em artigo recente (aqui). Todo movimento do Supremo é ensaiado. A banda legalista vota, mas sempre com a garantia de que será minoritária na votação.
Mesmo assim, hoje em dia, o pouco que o dossiê Intercept revelou até agora escancara os desmandos da operação. Seguramente há material muito mais explosivo a caminho, explicitando de forma indelével o caráter político da operação.
Por outro lado, a maioria do Supremo continua firmemente alinhada à tese do sistema, de uma reconstituição da democracia, mas sem Lula. Qual o óbolo a ser pago? Provavelmente o pescoço de Sérgio Moro, depois de garantido que sua condenação não viabilizará politicamente Lula.
Protagonista 5 – Moro
Encerrou sua carreira de Ministro. No cargo, sua reputação será destruída dia a dia por três fenômenos:
O vazamento continuado do dossiê Intercept.
A blindagem ao no. 1 Flávio Bolsonaro e do lugar-tenente Queiroz. Ligado a isso, a impossibilidade de resolver o episódio da morte de Marielle.
Sua total incapacidade de articular qualquer política pública consistente.

Ficando no cargo, gastará toda sua reserva de imagem e se arriscará a ser abandonado por seus seguidores, do MBL às alianças empresariais. Principalmente porque estará permanentemente subordinado a Jair Bolsonaro.
No momento, ainda goza de popularidade, ainda que descendente. Sua visita aos principais departamentos de segurança dos Estados Unidos mostram o desespero e a necessidade de apoio dos padrinhos.
Conclusão
O sistema – entendido como o conjunto de forças que influi nas decisões de poder – já rifou Sérgio Moro.
Confira-se o inexpressivo senador David Alcolumbre, alçado à presidência do Senado por uma articulação de anti-PMDB e partidos bolsonarianos, afirmando que, fosse político, Moro estaria sem cargo e preso. Usou Moro de escada para levantar sua reputação. Na Câmara, a cada dia que passa Rodrigo Maia atua mais e mais como freio às pirações de Bolsonaro. A própria Câmara, valendo-se das revelações do Intercept, ressuscitou a lei anti-abuso das autoridades, uma lei que, ao pé da letra, poderá comprometer até a parte saudável da atuação do Ministério Público Federal.
Ou seja, as duas casas legislativas recuperam seu protagonismo. Enquanto isto, as Forças Armadas dão um sinal forte de impedir a contaminação de sua imagem por Bolsonaro, recusando a promoção de um dos militares da ativa que foi servir o governo.
De algoz inclemente, Moro caminha para ser o bode expiatório do sistema. Será usado pela mídia para purgar seus pecados, de apoio à desestruturação do país. Pelo Congresso, como forma de recuperar seu protagonismo. Pelo Supremo, para mostrar-se defensor das leis e do direito, desde criancinha. Será mantido em formol por Bolsonaro, para mostrar-se solidário com os soldados caídos no campo de batalha.
Daí, começará uma segunda revisão desses tempos bicudos, demonstrando que Moro, Dallagnol, Janot e companheiros eram apenas instrumentos, pessoas sem dimensão intelectual e social, provincianos deslumbrados, brinquedos de um poder maior, daqueles que se usa e se joga fora.
Do GGN

segunda-feira, 24 de junho de 2019

COMO UM BANDIDO MEQUETREFE NO RATINHO, MORO NEGOU TUDO, POR ARMANDO COELHO NETO

A farsa processual está mais do que nunca revelada e só mesmo um STF conivente ou sob chantagem pode mantê-la. O Supremo pode e deve resgatar sua imagem.
Foto Gabriel Cardoso/SBT
Nos presídios do Brasil é muito comum que criminosos usem telefones baratos (de poucos ‘baites’), mudem de número ou de aparelho com frequência. As mulas flagradas com droga, no Aeroporto de Guarulhos/SP, costumam negar saber que estão traficando. É comum criminosos negarem seus crimes, mesmo diante de evidências. Aconteceu com os irmãos Cravinhos (caso Richthofen), com os Nardones e com Fernandinho Beira-Mar. Todos negaram seus crimes. É comum raposas negarem que comeram as galinhas, mesmo com a boca cheia de penas. Afinal, vale a máxima do Latim: “Nemo tenetur se detegere”(o direito de não produzir prova contra si mesmo).
O marreco de Maringá nunca me enganou. Realizou a prisão ilegal de quase 300 pessoas, vazou informações sigilosas para a imprensa, permitiu que audiência fosse transmitida por celular para blogueiro simpatizante, exerceu ato de ofício em férias. Mandou prender “suspeitos” dentro de hospital, condenou pessoas fora da lei e sem prova – não raro os contrários ao seu ideário político. Leia-se, desafetos políticos. Com sensacionalismo, aconteceu e brilhou encantando pessoas sob a bandeira de combate à corrupção. Na leva, até corruptos ficaram contra a corrupção (Aécio, Cunha, família Bozo).  Mas, com a farsa político-policialesca, acabou conseguindo selo de probidade, e ai de quem criticasse seus atos.
Desse modo, o marreco virou um “Grande Homem”, de quem se espera o óbvio: grandeza. Na década de 1990, na Suécia, a então vice-primeira ministra, Mona Sahlin, renunciou quando descobriram que ela comprou uma barra de chocolates Toblerone com cartão corporativo. Sem meandros ideológicos, grandes nomes quando flagrados até se matam – seja por vergonha, vaidade, como resposta a uma grande injustiça, medo da Justiça. Há quem queira preservar qualquer coisa num último gesto… Foi assim com Hitler (Alemanha), Getúlio Vargas (Brasil), Pierre Bérégovoy (França) e mais recentemente com Alan Garcia (Peru).
Que a Farsa Jato era farsa sempre se soube, e não é hora de inventariar as provas anteriores. Os holofotes da grande mídia projetavam na parede a figura de um pássaro gigante. Veio um certo Glenn, jogou a luz por cima e revelou o tamanho real do marreco. Eis que ele surge nanico e mentindo para o Brasil, dando nós em senadores mal preparados, que com discursos longos, confusos abrem espaço para evasivas do marreco. O ex-juiz prevaricou, sim, agiu por interesses pessoais/políticos, tramou contra a defesa e condenou sem provas o ex-presidente Lula.
Cadê os grandes homens da Farsa Jato? O que se esperaria? Ah, estão pondo em dúvida nosso trabalho? Aqui estão nossos celulares, nossas contas, nosso trabalho, investiguem e apontem onde erramos. Da associação de procuradores da República e da representação dos juízes se esperaria o óbvio: primeiro, apoio aos seus pares. Segundo, pedir que se investigue. Fizeram só a primeira parte, ignorando o conteúdo criminoso das revelações. Reafirmando em síntese a infâmia: é normal o conluio de acusadores com juízes.
Bom lembrar que a TV Globo não é exemplo de ética jornalística. Filmagens e gravações clandestinas, as edições criminosas contra o ex-presidente Lula falam por si. Mas, ao constatar falha na postura de um de seus repórteres, no Caso Neymar, o afastou e emitiu nota: “Há evidências de que as atitudes dele neste caso contrariaram a expectativa da empresa sobre a conduta de seus jornalistas”. Na Operação Satigraha, a Globo teve atitude semelhante, dando sinais de querer preservar sua imagem, mesmo suja.
Toda podridão está lançada. Em novos áudios revelados, o marreco chama de tontos os tontos do MBL. Nega gravações, mas pede desculpas pelo que supostamente “não disse”. O afastamento de uma procuradora “fraquinha”, a proteção a FHC, o “In Fux we trust”, o controle de mídia são sinais inequívocos de ação manipulada. O que falta? Mais revelações?
Durante a audiência no Senado, o marreco revelou traços psicopatas que só a Psiquiatria Forense explica.
Enquanto isso, os oficiantes da Farsa Jato se encolhem e, com embustes, fabricam álibis e teorias conspiratórias. Um dos jornalistas mais premiados do mundo é preconceituosamente desqualificado, como se estando a serviço de uma ORCRIM.
A farsa processual está mais do que nunca revelada e só mesmo um STF conivente ou sob chantagem pode mantê-la. O Supremo pode e deve resgatar sua imagem. A confissão do marreco quanto aos seus próprios crimes não está nem nos autos nem nas gravações do Telegram, mas sim na defesa pública que ele faz das provas obtidas por meios ilegais. O marreco é réu confesso. Num “pronto falei”, é de se concluir que ele e demais envolvidos na fraude processual agem, não com grandeza, mas com a pequenez moral de muitos bandidos mequetrefes em programas sensacionalistas como Ratinho. Negam tudo.
Armando Rodrigues Coelho Neto – jornalista e advogado, delegado aposentado da Polícia Federal e ex-integrante da Interpol em São Paulo.
Do GGN

sábado, 22 de junho de 2019

É HORA DE DISCUTIR E LEI DE ABUSOS DE AUTORIDADES, POR LUIS NASSIF

É hora de se discutir seriamente a Lei de Abusos de Autoridades. Não pode prosseguir a escalada de ações abusivas, sob risco de se comprometer definitivamente a claudicante democracia brasileira.
Os setores responsáveis do Judiciário e do Ministério Público precisam se convencer que só uma lei superior separará o joio do trigo. A não ser que se espere que permaneça apenas o joio.
Alguns episódios desmoralizantes recentes, de abusos que passaram impunes.
Tudo isso começou com a flexibilização da Constituição, a tal “mutação constitucional” liderada pelo então jurista Luis Roberto Barroso, tendo como álibi alguns avanços na ampliação dos direitos humanos.
Era apenas álibi para derrogar a Constituição abrindo caminho para o arbítrio e para o direito penal do inimigo. Sabia-se que, aberto o guarda-chuva da luta contra a corrupção, aceitando-se todos os abusos, o espírito do direito penal do inimigo se espraiaria sobre todo o corpo do judiciário e do Ministério Público, em uma repetição da maldição de Pedro Alexis, alertando para os abusos que seriam cometidos na porta da cadeia, pelos ecos do AI-5.
Barroso rasgou de vez a fantasia quando se tornou, ao lado de Luiz Edson Fachin, o principal avalista das arbitrariedades.
E agora? Vai se permitir o aumento da escalada do arbítrio, ou haverá uma maioria no Supremo contra os abusos?
O cientista político polonês Adam Przeworski está lançando o novo estudo sobre o fim das democracias, mostrando que elas não são liquidadas com um golpe, mas com a inoculação diária de pequenas doses de veneno, flexibilizando os princípios constitucionais.
Abaixo, uma pequena relação do efeito “mutação constitucional”.
O caso Cancellier
O reitor Luiz Carlos Cancellier de Olivo foi preso, humilhado, proibido de entrar no campus da Universidade Federal de Santa Catarina. Foi acusado de desvio de recursos, falsificação de inscrição de bolsistas. Está semana o inquérito chegou ao fim. Inocentou-o.
Nada ocorreu com as duas principais responsáveis, Juíza Janaína Machado e Delegada Erika Melena. Erika foi promovida para comandar a Polícia Federal em um estado do Nordeste. Depois, convocada para a equipe de Sérgio Moro no Ministério da Justiça.
Este é o mundo criado pelo Ministro Luis Roberto Barroso, do Supremo Tribunal Federal.
O militar infiltrado
Um militar infiltrou-se em um grupo de namoro e armou uma arapuca para jovens estudantes, a caminho de uma passeata. Manipulou-se o inquérito, consideraram-se armas fatais meras garrafas de líquidos destinados a prevenir efeitos de gases e uma marreta de madeira, possivelmente plantada pelos policiais. Nada ocorreu com o militar. Os estudantes foram indiciadas como integrantes de uma organização criminosa, estragando sua vida.
Essa barbaridade é filha direta do lema de que qualquer manifestação contra o pensamento hegemônico é equiparado a corrupção e deve ser tratado com mão de ferro, de acordo com o direito penal do inimigo.
Mais um legado do Ministro Luis Roberto Barroso.
A invasão das universidades
O Tribunal Superior Eleitoral arma uma ofensiva contra as universidades, visando beneficiar a candidatura de Jair Bolsonaro. Em ação articulada, inúmeras universidades são ocupadas pela Polícia Militar, com autorização dos juízes eleitorais.
Mais uma herança de Luis Roberto Barroso. 
A condução coercitiva de funcionários do BNDES
O procurador Anselmo Lopes e o juiz Ricardo Leite comandam uma operação atrabiliária de condução coercitiva com estardalhaço contra 40 funcionários do BNDES, incluindo mulheres grávidas, iniciando um apagão em todas as decisões do banco, com a perda total de referencial por parte dos funcionários. Nada aconteceu com eles.
A humilhação pública do réu Sérgio Cabral Filho
Duas cenas chocantes, ambas envolvendo o réu condenado Sérgio Cabral Filho, mostrando a selvageria implantada no país.
A primeira, a cena de Cabral sendo conduzido publicamente, algemado nas mãos e nas pernas pelo delegado Igor de Paula, da Polícia Federal. A segunda, do promotor André Guilherme Freitas, invadindo o presídio e humilhando sadicamente o réu.
Do GGN

O JAZIGO VIVO DO BRASIL, POR FERNANDO BRITO

Não surpreendem a ninguém os números publicados pela Folha, com base em levantamento da prefeitura paulistana, que reveram ter quase dobrado a população de rua no centro de São Paulo.
Mais de 100 mil, ou muito mais, porque os próprios recenseadores admitem que não há como chegar a cada vão de viaduto.
“O número de indivíduos abordados não representa a quantidade de pessoas que vive de fato nas ruas. (…) há, por exemplo, moradores da periferia que passam dias e noites vivendo nas calçadas da região central em busca de doações, mas em parte do mês retornam a suas casas, pessoas que estão de passagem pela cidade, entre outras situações”.
Não é diferente no Rio e nem deve ser na maioria das grandes cidades brasileiras.
Qualquer um que passe pelas calçadas da Zona Sul carioca percebe que explodiu o número de pessoas deitadas sobre caixas de papelão e cobertas com trapos.
Mães com crianças, implorando aos passantes que lhes comprem um pacote de balas, homens pedindo que se lhes ajude a comprar uma refeição.
Não é novidade, não mesmo, mas era uma imensa e feia ferida deste país que vinha cicatrizando lentamente, como sempre é com as grandes chagas.
De alguma forma, timidamente, a sociedade, através do Estado – e, mesmo eu não sendo seu fã, admito, das ONGs – dava-lhes o remédio do trabalho e da consciência de que, sim, imundos, maltrapilhos, miseráveis, e, ainda que, como escreveu Drummond, estejam “vagabundos que o mundo repeliu, mas zombam e vivem”,  continuam sendo seres humanos.
Desde o inverno da selvageria, já não são. São, oficialmente, va-ga-bun-dos, suspeitos da droga e do furto, quando não apenas incômodos a nos pedir um cigarro ou uma moeda.
Para prová-lo, dizem que só querem dinheiro, comida, sexo e bebida. Tudo o que nós, os “normais”, afinal, queremos, é o seu pecado.
Inclinam-se em ângulos as soleiras, para impedir que se sentem junto as vitrines do comércio, espetam-se com pedras ou tapam-se com blocos as pontes, para que não se deitem. Nem isso, o descanso precário e duro do cimento, podem ter.
Inútil, eles estão por aí, e por aí mais numerosos estarão a cada dia em que continuarem a dizer que este país precisa empobrecer para crescer, precisa viver pior para poder, num imaginário dia distante, viver melhor, precisa ser selvagem para ser seguro.
Assim como não os matarão, não matarão o sentimento que nos civiliza, o da solidariedade e o de sermos capazes de sofrer com o sofrimento alheio, como sofreu o adolescente que tirou o agasalho que usava num junho como este, há mais de 40 anos, para dar a um homem velho que tiritava de frio tendo apenas um muro frio proteger-lhe as costas. Perdeu a única vaidade de roupa que já teve, mas ganhou o que lhe aqueceria o peito por toda a vida.
Olhem a foto da Folha, que reproduzo.  São como corpos jazidos de uma guerra, de uma chacina.
Para muitos, com o defeito de estarem vivos, pois mortos atrapalhariam menos o  sossego público.
Mas não estão.
Um dia, deixaremos de ser maus e brutos, e meu país dará, de novo, a mão para que seus filhos se levantem.
Do Tijolaço

sexta-feira, 21 de junho de 2019

NOVA OPORTUNIDADE PARA O SUPREMO SE MOSTRAR GUARDIÃO DA LEI, POR LUIS NASSIF

A manutenção de Lula na prisão é um atestado de que o país perdeu mesmo o rumo e o respeito a valores fundamentais da ordem jurídica. É preciso que o Supremo adote uma postura no sentido da retomada da legalidade.
Foto: Ricardo Stuckert
Outro recado para o Supremo Tribunal Federal (STF), a partir de conversas com meu guru jurídico.
Dia 25 de junho de 2019 poderá ser o dia em que o STF poderá retomar a rota da democracia brasileira.
Como já foi dito aqui, em “Urgente: um HC de ofício para Lula”, mesmo antes das revelações do Intercept, há motivos de sobra para se anular os processos criminais contra Lula.
Além de questões relativas a competência, ao verdadeiro atentado à democracia que foi a utilização de manobras processuais para influenciar em eleições – a suspeição de Moro e dos procuradores era escancarada.
Mas a Justiça é “cega”. Lula foi preso e assim permaneceu.
Apareceram então as comprovações pelo Intercept da absoluta promiscuidade entre o juiz Sérgio Moro e procuradores.  A Justiça continuou “cega” e Lula, preso.
Mas nesta terça-feira, finalmente vai a julgamento um dos inúmeros recursos e pleitos  apresentados pela incansável defesa de Lula: uma exceção de suspeição proposta há tempos e que foi processada sem liminar.
Com o caso em pauta, basta à Segunda Turma do STF acolher o pedido com base nas alegações e provas dos próprios autos. Não se exige dos senhores ministros  nenhum ato inusitado de coragem, como seria a concessão de um “habeas corpus” de ofício. Basta acolher a alegação feita pela parte há meses.
Há rumores de que o processo pode ser retirado da pauta; que pode haver um pedido de vista; ou que ocorra qualquer outro fato que impeça o julgamento.  Porém, em qualquer hipótese, mesmo retirando o processo de pauta, pode ser deferida uma liminar concedendo  o imprescindível mandado de soltura.
O mundo está olhando para o Brasil. Ele olha e constata facilmente que foram as Vossas Excelências do sistema de Justiça que nos enfiaram nesse buraco, atendendo sabe-se lá a que tipo de sentimento pessoal (obediência ao mercado e à mídia, decepção ou ‘nojinho’ do PT, e assim por diante).
Não há mais tempo. As medidas que adotadas pelo atual governo vão gerar um prejuízo social e cultural que o país vai levar décadas para reparar. E não dá mais para ignorar a sanha persecutória contra Lula. A manutenção de Lula na prisão é um atestado de que o país perdeu mesmo o rumo e o respeito a valores fundamentais da ordem jurídica.
É preciso que o Supremo adote uma postura no sentido da retomada da legalidade. Assim como em um bordado que começa a dar errado é preciso fazer o caminho de volta para corrigir os primeiros pontos onde a confusão começou, a retomada de nosso processo inconcluso de consolidação da democracia passa obrigatoriamente pela libertação de Lula. E a oportunidade para fazê-lo é nesta terça-feira, 25 de junho.
Cumprido esse passo, também é mais que urgente que o Supremo  decida  o mérito da ação  proposta por José Eduardo Cardoso, pedindo a anulação do processo do Impeachment de Dilma Roussef.
É óbvio que a ação foi proposta pelo inacreditável escudeiro de Dilma quando não havia mais tempo de se fazer nada. Mas ela é o âmbito no qual pode ser declarada a nulidade daquele Impeachment  ainda que apenas para fins éticos e morais.
Esses dois fatores – Impeachment exclusivamente político e prisão ilegal do candidato favorito – gerariam, sem dúvida, a nulidade da eleição de Bolsonaro. Mas essa não tem volta. A omissão da Justiça eleitoral, que deixou transcorrer a bizarra candidatura impregnada de razões suficientes para a inabilitação, não permite que sejam desconsiderados os milhões de votos que – lamentavelmente – foram nele depositados.
Mas Bolsonaro tem sido pródigo em oferecer razões jurídicas suficientes para que seja impedido de prosseguir ocupando a presidência da República – ainda nos seus dois primeiros anos de mandato. Nesta hipótese, novas eleições seriam convocadas e isto representaria que o bordado com que a nossa frágil democracia vem sendo  construída poderia prosseguir novamente.
Que o STF tire a venda dos olhos… que ele enxergue a gravidade do momento. Senão por coragem e compromisso com a Constituição, que ele tenha a humanidade de dar início à correção de rumos colocando Lula em liberdade!
Assine e faça parte desta caminhada para que ele se torne um veículo cada vez mais respeitado e forte.
Do GGN