No final de semana passado, o ministro Edson Fachin retirou
da pauta da segunda turma do Supremo Tribunal Federal o julgamento de um
recurso de Lula que poderia, entre outras opções, culminar na transferência do
petista para a prisão domiciliar. Fachin agiu para barrar uma eventual vitória
de Lula no STF, em tabelinha com o Tribunal Regional Federal da 4ª
Região.
A vice-presidência do TRF-4, a quem cabe analisar a
admissibilidade da apelação de Lula em tribunais superiores, rejeitou a larga
maioria dos argumentos inseridos pela defesa do ex-presidente no recurso
extraordinário ao Supremo. Isso foi feito faltando faltando 4 dias para a
análise na segunda turma.
Uma hora após a decisão no TRF-4, Fachin alegou que a
situação processual de Lula foi alterada e enterrou a análise da medida
cautelar que seria feita pela segunda turma na terça (26). Essa medida pedia,
em suma, que a pena de Lula fosse suspensa até o fim do julgamento dos recursos
ao caso triplex nas instâncias superiores ao TRF-4.
Na prática, o ex-presidente poderia ser solto e ficaria apto
a concorrer à Presidência. Com a decisão de Fachin, as chances de isso ocorrer
em um futuro próximo foram praticamente anuladas.
Abaixo os detalhes da decisão da vice-presidente do TRF-4,
Maria de Fátima Freitas Labarrère.
Ela rebateu 8 argumentos da defesa da seguinte forma:
1) MORO NÃO É O JUIZ NATURAL DO CASO TRIPLEX
A defesa de Lula alegou que o juiz natural da causa deveria
ser de São Paulo, onde os fatos relatados teriam supostamente ocorrido.
A vice-presidente do TRF-4 decidiu que "não merece
trânsito a pretensão recursal no que concerce à alegação de violação ao
princípio do Juiz natural, uma vez que tal exame depende da prévia análise das
normas infraconstitucionais". Ela citou decisão do STF que define: "O
Supremo Tribunal Federal já assentou, sob a sistemática da repercussão geral,
que suposta ofensa aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa, do
contraditório e dos limites da coisa julgada, quando a violação é debatida sob
a ótica infraconstitucional, não apresenta repercussão geral, o que torna
inadmissível o recurso extraordinário."
2) TRIPLEX NÃO DEVERIA SER PROCESSO DA LAVA JATO
3) PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA DE LULA FOI VIOLADA
4) MORO É UM JUIZ PARCIAL
A defesa de Lula alegou que uma decisão assinada pelo próprio
juiz de Curitiba expõe a falta de elo entre o caso triplex e 3 contratos da
Petrobras citados na denúncia. Para condenar o ex-presidente, Moro usou não a
denúncia original do Ministério Público, mas uma delação premiada segundo a
qual a OAS tinha um caixa fictício de R$ 16 milhões em propinas a favor do PT.
A reforma do triplex - que foi paga com dinheiro da OAS Empreendimentos, que
tampouco tem relação comercial com a Petrobras - supostamente viria a ser abatida
desse caixa no futuro.
A vice-presidente do TRF-4 definiu que a "alegação de
excesso de acusação e imparcialidade do juiz igualmente não é de ser admitido o
recurso" pois "no que tange à suspeição do juiz, tem-se
que a ofensa aos dispositivos constitucionais invocados, ainda que fosse
reconhecida, afetaria os preceitos constitucionais somente de modo indireto ou
reflexo, cuja reparação é inviável em recurso extraordinário."
Além disso, "o acolhimento da teses levantadas pela
defesa demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é vedado
no âmbito do recurso extraordinário." A Súmula 279 do STF, na verdade,
diz: "Para simples reexame de prova não cabe recurso
extraordinário."
5) PROCURADORES NÃO FORAM SÉRIOS E IMPESSOAIS E USARAM CONVICÇÕES
NO LUGAR DE PROVAS
A defesa alegou que os procuradores atuaram no caso triplex
como inimigos públicos de Lula “não em razão de fatos típicos efetivamente
imputados, mas por causa da convicção desses agentes
institucionais."
A vice-presidente apontou que não entendeu a
"retórica" dos advogados contra os procuradores e citou passagem do
Supremo onde consta ser "inadmissível o recurso extraordinário, quando a
deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."
6) AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO FORAM VIOLADOS
Os advogados de Lula citaram vários atos praticados por Moro
durante o julgamento para impedir produção de provas ao passo em que era mais
permissivo com o Ministério Público.
Labarrère, mais uma vez, disse que a reclamação demanda
reexame de provas, o que não deve ser feito em recurso extraordinário. "A
sistemática dos recursos excepcionais impõe que o exame levado a efeito pelos
Tribunais Superiores fique adstrito às questões de direito, uma vez que os temas
de índole fático-probatória exaurem-se com o julgamento nas vias ordinárias.
Isto importa em dizer que o exame da matéria fática e das provas é efetivado
com profundidade e se esgota no segundo grau de jurisdição."
7) TRF-4 IGNOROU PROVAS APRESENTADAS APÓS SENTENÇA DE
MORO
8) LULA FOI CONDENADO SEM TIPIFICAÇÃO DE CRIMES E COM USO DE
DELAÇÕES, SENDO QUE A DOSIMETRIA DA PENA É QUESTIONÁVEL
Nestes dois tópicos, advogados manifestaram que a condenação
de Lula "pela prática de corrupção passiva e lavagem de dinheiro sem a
presença das elementares do tipo e com base na palavra de dois corréus
configura manifesta contrariedade" à Constituição. Também viola a ampla
defesa a atitude do TRF-4, que alegou fim de prazo para analisar provas novas e
além de confirmar a sentença de Moro, majoraram a pena apenas para evitar a
prescrição.
Nestes casos, a vice-presidente do TRF-4, mais uma vez,
reciclou a desculpa de que não é possível debater mais essa reclamação sem
entrar no mérito das provas, o que não cabe em recurso extraordinário.
Dessa maneira, ela rejeitou na íntegra a admissibilidade do
recurso de Lula ao STF.
RECURSO ESPECIAL
Quanto ao recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça,
ela só acolheu uma reclamação: sobre Moro ter condenado Lula a reparar os R$ 16
milhões fictícios que a OAS disponibilizou ao PT, em vez de usar o valor do
triplex na ação, de R$ 3,7 milhões (construção e reforma em valores
atualizados).
Segundo informações do TRF-4, Lula tem direito de recorrer da
decisão interpondo "agravo no TRF4 (artigo 1042 do CPC), um para cada um
dos recursos negados [extraordinário e especial]. O Ministério Público Federal
deve ser intimado para apresentar contrarrazões. Os autos são submetidos à
vice-presidência e, não havendo a reconsideração, os recursos são enviados aos
tribunais superiores."
Ainda segundo o TRF-4, os recursos excepcionais –
extraordinário e especial – são submetidos a um duplo juízo de admissibilidade.
O tribunal de origem faz uma espécie de filtro, analisando o preenchimento dos
requisitos de admissibilidade. Nas Cortes Superiores é realizado novo exame de
admissibilidade.
GGN