Joesley,
na Época, chama Temer de chefe da organização criminosa do PMDB
É
explosiva a entrevista de Joesley Batista à Época.
Vou
reproduzi-la, mas destaco, antes, alguns trechos:
[Michel
Temer]Não é um cara cerimonioso com dinheiro.
Ele
dizia: ‘Joesley, essa parte financeira toca com o Eduardo e se acerta com o
Eduardo [Cunha]’.
O
mais relevante foi quando Eduardo tomou a Câmara. Aí virou CPI para cá, achaque
para lá. Tinha de tudo. Eduardo sempre deixava claro que o fortalecimento dele
era o fortalecimento do grupo da Câmara e do próprio Michel.
O
Temer é o chefe da Orcrim [organização criminosa] da Câmara. Temer,
Eduardo, Geddel, Henrique, Padilha e Moreira. É o grupo deles. Quem não está
preso está hoje no Planalto. Essa turma é muita perigosa. Não pode brigar com
eles. Nunca tive coragem de brigar com eles. Por outro lado, se você baixar a
guarda, eles não têm limites.
A
entrevista de Joesley fixa um ponto principal: Temer era o chefe e Eduardo
Cunha seu agente.
ÉPOCA
– Quando o senhor conheceu Temer?
Joesley
Batista – Conheci Temer através do ministro Wagner Rossi, em 2009, 2010. Logo
no segundo encontro ele já me deu o celular dele. Daí em diante passamos a
falar. Eu mandava mensagem para ele, ele mandava para mim. De 2010 em diante.
Sempre tive relação direta. Fui várias vezes no escritório da praça Pan-americana,
fui várias vezes no escritório no Itaim, fui várias vezes na casa dele em São
Paulo, fui alguma vezes no no Jaburu, ele já esteve aqui em casa, ele foi no
meu casamento. Foi inaugurar a fábrica da Eldorado.
ÉPOCA
– Qual, afinal, a natureza da relação do senhor com o presidente Temer?
Joesley – Nunca foi uma relação pessoal, de amizade. Sempre foi uma relação
institucional, de um empresário que precisava resolver problemas e via nele a
condição de resolver problemas. Acho que ele me via como um empresário que
poderia financiar as campanhas dele – e fazer esquemas que renderiam propina.
Toda vida tive total acesso a ele. Ele por vezes me ligava para conversar, me
chamava, eu ia lá.
ÉPOCA
– Conversar sobre política?
Joesley
– Ele sempre tinha um assunto específico. Nunca me chamou lá para bater papo.
Sempre que ele me chamava eu sabia que ele ia me pedir alguma coisa ou ele
queria alguma informação.
ÉPOCA
– Segundo a colaboração, Temer pediu dinheiro ao senhor já em 2010. É isso?
Joesley
– Isso. Logo no início. Conheci Temer e esse negócio de dinheiro para campanha,
aconteceu logo no iniciozinho. O Temer não tem muita cerimônia para tratar
desse assunto. Não é um cara cerimonioso com dinheiro.
ÉPOCA
– Ele sempre pediu sem algo em troca?
Joesley
– Sempre estava ligado a alguma coisa, ou a algum favor. Raras vezes não. Uma
delas foi quando ele pediu os R$ 300 mil para fazer campanha na internet antes
do impeachment, preocupado com a imagem dele. Fazia pequenos pedidos. Quando o
Wagner saiu, Temer pediu um dinheiro para ele se manter. Também pediu para um
tal de Ortolon, que está lá na nossa colaboração. Um sujeito que é ligado a
ele. Pediu para nós fazermos um mensalinho. Fizemos. Ele volta e meia fazia
pedidos assim. Uma vez ele me chamou para apresentar o Yunes. Disse que o Yunes
era amigo dele e para ver se dava para ajudar o Yunes.
ÉPOCA
– E ajudou?
Joesley
– Não chegamos a contratar. Teve uma vez também que ele me pediu para ver se eu
pagava o aluguel do escritório dele na praça (Panamericana, em São Paulo). Eu
desconversei, fiz de conta que não entendi, não ouvi. Ele nunca mais me cobrou.
ÉPOCA
– Ele explicava a razão desses pedidos? Por que o senhor deveria pagar?
Joesley – O Temer tem esse jeito calmo, esse jeito dócil de tratar e coisa. Não
falava.
ÉPOCA
– Ele não deu nenhuma razão?
Joesley
– Não, não ele. Tem políticos que acreditam que, pelo simples fato do cargo que
ele está ocupando, já o habilita a você ficar devendo favores a ele. Já o
habilita a pedir algo a você de maneira que seja quase uma obrigação você
fazer. Temer é assim.
ÉPOCA
– O empréstimo do jatinho da JBS ao presidente também ocorreu dessa maneira?
Joesley
– Não lembro direito. Mas é dentro desse contexto: “Eu preciso viajar, você tem
um avião, me empresta aí”. Acha que o cargo já o habilita. Sempre pedindo
dinheiro. Pediu para o Chalita em 2012, pediu para o grupo dele em 2014.
ÉPOCA
– Houve uma briga por dinheiro dentro do PMDB na campanha de 2014, segundo o
lobista Ricardo Saud, que está na colaboração da JBS.
Joesley
– Ricardinho falava direto com Temer, além de mim. O PT mandou dar um dinheiro
para os senadores do PMDB. Acho que R$ 35 milhões. O Temer e o Eduardo
descobriram e deu uma briga danada. Pediram R$ 15 milhões, o Temer reclamou
conosco. Demos o dinheiro. Foi aí que Temer voltou à Presidência do PMDB, da qual
ele havia se ausentado. O Eduardo também participou ativamente disso.
ÉPOCA
– Como era a relação entre Temer e Eduardo Cunha?
Joesley
– A pessoa a qual o Eduardo se referia como seu superior hierárquico sempre foi
o Temer. Sempre falando em nome do Temer. Tudo que o Eduardo conseguia resolver
sozinho, ele resolvia. Quando ficava difícil, levava para o Temer. Essa era a
hierarquia. Funcionava assim: primeiro vinha o Lúcio. O que ele não consegui
resolver ele pedia para o Eduardo. Se o Eduardo não conseguia resolver,
envolvia o Michel.
ÉPOCA
– Segundo as provas da delação da JBS e de outras investigações, o senhor
pagava constantemente tanto Eduardo Cunha quanto Lúcio Funaro, seja por acertos
na Câmara, seja por acertos na Caixa, entre outros. Quem ficava com o dinheiro?
Joesley
– Em grande parte do período que convivemos meu acerto era direto com o Lúcio.
Eu não sei como era o acerto do Lúcio do Eduardo tampouco do Eduardo com o
Michel. Eu não sei como era a distribuição entre eles. Eu evitava falar de dinheiro
de um com o outro. Não sabia como era o acerto entre eles. Depois, comecei a
tratar uns negócios direto com o Eduardo. Em 2015, 2016, quando ele assumiu a
Presidência da Câmara. Não sei também o quanto desses acertos iam para o
Michel. E com o Michel mesmo eu também tratei várias doações. Quando eu ia
falar de esquema mais estrutural com Michel, ele sempre pedia para falar com o
Eduardo. ‘Presidente, o negócio do Ministério da Agricultura, o negócio dos
acertos…’. Ele dizia: ‘Joesley, essa parte financeira toca com o Eduardo e se
acerta com o Eduardo’. Ele se envolvia somente nos pequenos favores pessoais ou
em disputas internas, como a de 2014.
ÉPOCA
– O senhor realmente precisava tanto assim desse grupo de Eduardo Cunha, Lúcio
Funaro e Temer?
Joesley
– Eles foram crescendo no FI-FGTS, na Caixa, na Agricultura – todos órgãos onde
tínhamos interesses. Eu morria de medo de eles encamparem o Ministério da
Agricultura. Eu sabia que o achaque ia ser grande. Eles tentaram. Graças a Deus
mudou o governo e eles saíram. O mais relevante foi quando Eduardo tomou a
Câmara. Aí virou CPI para cá, achaque para lá. Tinha de tudo. Eduardo sempre
deixava claro que o fortalecimento dele era o fortalecimento do grupo da Câmara
e do próprio Michel. Aquele grupo tem o estilo de entrar na sua vida sem ser
convidado.
ÉPOCA
– Pode dar um exemplo?
Joesley
– O Eduardo, quando já era presidente da Câmara, um dia me disse assim:
‘Joesley, tão querendo abrir uma CPI contra a JBS para investigar BNDES. É o
seguinte: você me dá cinco milhões que eu acabo com a CPI.’ Falei: Eduardo,
pode abrir, não tem problema. Como não tem problema? Investigar o BNDES, vocês.
Falei: Não, não tem problema. Você tá louco? Depois de tanto insistir, ele
virou bem sério: é sério que não tem problema? Eu: é sério. Ele: não vai te
prejudicar em nada? Não, Eduardo. Ele imediatamente falou assim: seu
concorrente me paga cinco milhões para abrir essa CPI. Se não vai te
prejudicar, se não tem problema… Eu acho que eles me dão os 5 milhões. Uai,
Eduardo, vai sua consciência. Faz o que você achar melhor’.Esse é o Eduardo.
Não paguei e não abriu. Não sei se ele foi atrás. Esse é o exemplo mais bem
acabado da lógica dessa Orcrim.
ÉPOCA
– Algum outro?
Joesley
– Lúcio fazia a mesma coisa. Virava para mim e dizia: tem um requerimento numa
CPI para te convocar. Me dá um milhão que eu barro. Mas a gente ia ver e
descobria que era algum deputado a mando dele que estava fazendo. É uma coisa
de louco.
ÉPOCA
– O senhor não pagou?
Joesley
– Nesse tipo de coisa, não. Tinha alguns limites. Tinha que tomar cuidado. Essa
é a maior e mais perigosa organização criminosa desse país. Liderada pelo
presidente.
ÉPOCA
– O chefe é o presidente Temer?
Joesley
– O Temer é o chefe da Orcrim da Câmara. Temer, Eduardo, Geddel, Henrique,
Padilha e Moreira. É o grupo deles. Quem não está preso está hoje no Planalto.
Essa turma é muita perigosa. Não pode brigar com eles. Nunca tive coragem de
brigar com eles. Por outro lado, se você baixar a guarda, eles não têm limites.
Então meu convívio com eles foi sempre mantendo à meia distância: nem deixando
eles aproximarem demais nem deixando eles longe demais. Para não armar alguma
coisa contra mim. A realidade é que esse grupo é o de mais difícil convívio que
já tive na minha vida. Daquele sujeito que nunca tive coragem de romper, mas
também morria de medo de me abraçar com ele.
ÉPOCA
– No decorrer de 2016, o senhor, segundo admite e as provas corroboram, estava
pagando pelo silêncio de Eduardo Cunha e Lúcio Funaro, ambos já presos na Lava
Jato, com quem o senhor tivera acertos na Caixa e na Câmara. O custo de manter
esse silêncio ficou alto demais? Muito arriscado?
Joesley
– Virei refém de dois presidiários. Combinei quando já estava claro que eles
seriam presos, no ano passado. O Eduardo me pediu 5 milhões. Disse que eu devia
a ele. Não devia, mas como ia brigar com ele? Dez dias depois ele foi preso. Eu
tinha perguntado para ele: “Se você for preso, quem é a pessoa que posso
considerar seu mensageiro?”. Ele disse: ‘O Altair procura vocês. Qualquer outra
pessoa não atenda’. Passou um mês, veio o Altair. Meu deus, como vou dar esse
dinheiro para o cara que está preso? Aí o Altair disse que a família do Eduardo
precisava e que ele estaria solto logo, logo. E que o dinheiro duraria até
março deste ano. Fui pagando, em dinheiro vivo, ao longo de 2016. E eu sabia
que, quando ele não saísse da cadeia, ia mandar recados.
ÉPOCA
– E o Lúcio Funaro?
Joesley
– Foi parecido. Perguntei para ele quem seria o mensageiro se ele fosse preso.
Ele disse que seria um irmão dele, o Dante. Depois virou a irmã. Fomos pagando
mesada. O Eduardo sempre dizia: “Joesley, estamos juntos, estamos juntos. Não
te delato nunca. Eu confio em você. Sei que nunca vai me deixar na mão, vai
cuidar da minha família’. Lúcio era a mesma coisa: “‘Confio em você, eu posso
ir preso porque eu sei que você não vai deixar minha família mal. Não te
delato’”.
ÉPOCA
– E eles cumpriram o acerto, não?
Joesley
– Sim. Sempre me mandando recados: “Você está cumprindo tudo direitinho. Não
vão te delatar. Podem delatar todo mundo menos você’”. Mas não era sustentável.
Não tinha fim. E toda hora o mensageiro do presidente me procurando para
garantir que eu estava mantendo esse sistema.
ÉPOCA
– Quem era o mensageiro?
Joesley
– Geddel. De 15 em 15 dias era uma agonia terrível. Sempre querendo saber se
estava tudo certo, se ia ter delação, se eu estava cuidando dos dois. O
presidente estava preocupado. Quem estava incumbido de manter Eduardo e Lúcio
calmos era eu.
ÉPOCA
– O ministro Geddel falava em nome do presidente Temer?
Joesley
– Sem dúvida. Depois que o Eduardo foi preso, mantive a interlocução desses
assuntos via Geddel. O presidente sabia de tudo. Eu informava o presidente por
meio do Geddel. E ele sabia que eu estava pagando o Lúcio e o Eduardo. Quando o
Geddel caiu, deixei de ter interlocução com o Planalto por um tempo. Até por
precaução.
Tijolaço