Anos atrás, preocupado
em mostrar a face positiva do Ministério Público Federal, diluindo a imagem
arrogante que a opinião pública tinha da corporação, preparei um programa sobre
o tema na TV Brasil. Convidei Cláudio Fontelles, ex-Procurador Geral da
República, procurador de belíssima história no MPF. E também Alexandre Camanho,
presidente da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR).
A ANPR tem duas funções
básicas. Uma delas é a de preparar uma festa de final de ano para a categoria e
cuidar de questões sociais - de clubes a seguros - dos associados. A segunda, a
de preparar a lista tríplice dos candidatos à PGR - uma incongruência fantástica.
Camanho não aceitou o
convite, mas topou gravar um depoimento para a abertura de um dos blocos. No
depoimento disse apenas que o Brasil é um oceano de corrupção no qual a única
ilha de honestidade era o Ministério Público Federal.
Hoje,
o Globo traz reportagem de Aguirre Talento e Bela Megale sobre as
estranhas ligações de Camanho com Rodrigo Rocha Loures, o deputado federal
flagrado com R$ 500 mil da JBS destinados a Michel Temer.
Quebrando o sigilo de
Loures, a Polícia Federal se deparou com uma série de mensagens eletrônicas
trocadas entre Loures e nosso campeão da honestidade, Camanho. Nelas, o
procurador sugere nomes para o Ministério de Temer e sugere repassar
informações para Temer através de Loures. Segundo a reportagem, em uma das
mensagens, a ilha de honestidade avisa que tinha “assunto importante e urgente”
para tratar, mas sugerindo que fosse fora do palácio, por ser “muito expositivo”.
Àquela altura, Camanho
tinha deixado a ANPR e mais tarde se tornaria o braço direito da PGR Raquel
Dodge. Procurado pela reportagem, admitiu as conversas mas explicou serem
frutos de amizade mantida com Loures.
Segundo o relatório da
PF, dois diálogos chamaram a atenção dos investigadores. Um deles, de 25 de
maio de 2016, logo após Temer assumir a presidência, Camanho pede para falar
com o presidente no final do dia. Disse que estaria indo conversar com o
‘Zequinha’. E informa ter muitas coisas que precisa levar ao conhecimento do
presidente via vc’. Naquele mesmo dia foi noticiada a homologação da delação
premiada de Sérgio Machado, implicando os principais nomes do PMDB na época,
incluindo José Sarney que tem um filho de nome Zequinha.
Como muitos burocratas
de Brasilia, Camanho se valia da relação com Loures para angariar prestígio com
personalidades. Diz o relatório:
"Da conversa de
ontem pensei: pq não chamar Francisco Rezek para a Justiça? (...) Se o
presidente quiser, posso fazer uma sondagem preliminar, para que ele não corra
riscos”. Rocha Loures responde: “Ótima sugestão! Falarei com ele e te
aviso após almoço. Favor aguardar”.
Em outra mensagem diz
de sua alegria, se Zequinha Sarney fosse nomeado para o Ministério do Meio
Ambiente.
Mal assumiu a
presidência, aliás, Michel Temer recebeu em audiência José Robalinho, sucessor
de Camanho na ANPR e, como ele, habitante da única ilha de honestidade em um
oceano de corrupção chamado Brasil. A honraria se deveu ao fato do MPF ter sido
ator central no impeachment de Dilma Rousseff.
Aliás, na véspera do
impeachment, Camanho
tentou organizar um encontro entre Temer e a equipe da Lava Jato, Na época,
antes de ser convidado por Raquel Dodge para sua equipe, já era visto como
homem de confiança do MDB.
GGN