sexta-feira, 30 de abril de 2021

1° DE MAIO CONTRA O GENOCÍDIO, A FOME, O DESEMPREGO E A DESTRUIÇÃO NACIONAL

19 milhões de irmãs e irmãos passam fome, enquanto Paulo Guedes achincalha trabalhadores e Bolsonaro compra o "centrão".

O desemprego atinge mais de 14 milhões de pessoas, em sua maioria mulheres e negros – Reprodução.

Por R$ 600 de auxílio para toda pessoa sem renda, vacina e distanciamento social para barrar o morticínio. Mais de 400 mil pessoas mortas. O desemprego atinge mais de 14 milhões de pessoas, em sua maioria mulheres e negros.

Mais de 28% da força de trabalho encontra-se subutilizada e mesmo entre as pessoas com ocupação remunerada, 39,5% estão na informalidade.

Parcelas significativas sobrevivem como podem, a exemplo do que acontece no nosso querido Nordeste onde 31% trabalham por conta própria, sem as garantias constitucionais mínimas. 

A fome voltou a humilhar e aterrorizar nossa gente. 19 milhões de irmãs e irmãos passam fome, enquanto Paulo Guedes achincalha trabalhadores e Bolsonaro compra os partidos do "centrão". 

Segundo levantamento do Grupo de Pesquisa Alimento para Justiça mais de 125 milhões de pessoas sofreram com a insegurança alimentar durante a pandemia.

O desespero toma conta das famílias, violentadas pelo aumento insuportável da carestia, principalmente dos preços dos alimentos. 44% das pessoas deixaram de comer carne. O preço proibitivo do botijão de gás força milhões aos riscos de queimaduras com uso de fogo a lenha.

O resultado da carestia é fome, desnutrição, endividamento, humilhação. 

O auxílio emergencial de R$ 600 aprovado pela oposição em março de 2020 permitiu por alguns meses do ano passado que famílias e pequenos negócios se sustentassem na crise agravada pela pandemia.

Mas o austericidio do governo fiel ao dogmatismo da Faria Lima pelo teto de gastos cortou o auxílio, jogando milhões de pessoas e milhares de pequenas empresas à própria sorte. 

:: No Rio, ação de solidariedade vende gás a preço justo para moradores de ocupações ::

A retomada de um auxílio miserável de R$ 250 está longe de ser suficiente para aliviar essa ferida aberta da fome, da insegurança alimentar, do desemprego e da quebradeira das empresas. 

Bolsonaro e seus apoiadores do "centrão" e do capital financeiro atuam juntos no desfazimento do tecido social brasileiro.

O desmonte do Estado e os sucessivos cortes de gastos públicos fazem a festa de um punhado de rentistas e de novos bilionários, enquanto a maioria da população desce a escada do empobrecimento e da miséria, na escalada das desigualdades sociais. 

A sabotagem de Bolsonaro às orientações da ciência diante da pandemia e sua política de destruição nacional para atender aos interesses do capital financeiro produzem caos, angústia e pânico. 

:: Filhos de porteiros que estudaram graças a Fies e Prouni rebatem Guedes: "Absurdo" ::

Diante dessa tragédia humanitária é fundamental apontar um caminho que restabeleça a esperança do nosso povo, dessa brava gente que vive do seu próprio trabalho e que muitas vezes foi enganada pelas manobras, campanhas e golpes dos agentes da Faria Lima e de Wall Street.

As lutas unitárias neste 1° de Maio precisam apontar nesse sentido. A urgência é pelo auxílio emergencial de R$ 600 até o fim da pandemia, pela vacina para toda a população, pelo emprego e socorro aos pequenos negócios e por políticas públicas que garantam distanciamento social e impeçam aglomerações.

Essas medidas emergenciais unem as principais centrais sindicais neste dia internacional da classe trabalhadora.

As lutas para derrotar a extrema direita, o neoliberalismo e a continuidade da destruição nacional levada a cabo pelo governo Bolsonaro unem, também, partidos, centrais, movimentos e organizações das Frentes Povo Sem Medo e Brasil Popular. Fora Bolsonaro. 

Que esse 1° de Maio nos sirva para refletir sobre a necessidade de um projeto unitário de reconstrução nacional que passa por descriminalizar os gastos e investimentos públicos, revogando o teto de gastos; fortalecer a atuação do Estado na economia a fim de promover pleno emprego,  combater desigualdades e planejar a reindustrializacão do Brasil modelada pelas carências do nosso país e da nossa gente e que rejeite a devastação ambiental e a agressão aos povos indígenas; restituir os direitos sociais, trabalhistas, previdenciários e sindicais golpeados depois do impeachment de 2016; promover a progressividade tributária com impostos sobre fortunas, altas rendas e patrimônios; promover uma agressiva política de investimentos em ciência, pesquisa e inovação tecnológica a serviço do bem estar da humanidade; fim das privatizações, fortalecimento das empresas públicas e forte atuação dos bancos públicos na garantia de crédito para pequenos produtores; reverter o desmonte da Petrobras e todos os retrocessos operados pela Lava Jato em conluio com o Departamento de Estado norte-americano. 

Esses e outros elementos de um projeto unitário precisam ser debatidos pela classe trabalhadora e suas organizações. Enquanto desenvolvemos nossas lutas em 2021 pelas urgências e necessidades mais sentidas pelo nosso povo, devemos buscar construir os laços e caminhos para derrotar a extrema direita e o neoliberalismo, nas redes, nas ruas e nas urnas.

Com a consciência dos corpos femininos, negros, indígenas, LGBTQI+ que compõem nossa diversidade com singularidades. Mas, sobretudo, com a consciência de classe daqueles e daquelas que nada mais dispõem a não ser a sua força de trabalho.

Pela vida, democracia, soberania e igualdade. Viva a classe trabalhadora. Viva a autodeterminação dos povos. Viva o 1° de Maio!

Brasil de Fato.

O FILHO DO PORTEIRO E PAULO GUEDES O SERVIÇAL DA ELITE, POR FERNANDO BRITO

Mais um “vazamento” do pensamento sincero do sr. Paulo Guedes mostra nas mãos de que tipo de gente estamos.

Mais um trecho de seu ‘momento botequim” do ministro na reunião quer teve com representantes dos planos de saúde. desta vez dizendo que “o filho do porteiro” teve direito ao Fies – fundo de financiamento ao ensino universitário – mesmo ‘tirando zero no vestibular”, que foi transmitida sem o seu conhecimento e da qual ele se defende como sendo “um momento infeliz”.

Não foi. Guedes é isso, um escravocrata, um remanescente do Brasil censitário, onde o direito das pessoas vem do berço ou da esperteza.

Do Brasil das castas, aquele que desprezam os trabalhadores e que creem que seus filhos são inferiores e que só podem progredir por truques e falcatruas.

Talvez creiam nisso por identificá-lo em suas próprias trajetórias.

Não ocorreu a Guedes atacar o ensino universitário privado por baixa qualidade, por sua ênfase – já na fase pré pandêmica – à virtualização do ensino, pela falta de espaço à discussão acadêmica e a produção de conhecimento, e por sua absoluta adequação à reprodução dos sistemas empresariais de treinamento de mão de obra, traduzidos na expressão “empregabilidade” com que “qualificavam” a formação superior, ainda que este “superior” contenha um imenso grau de ironia.

É preferível falar que isso acontecia apenas porque era para “o filho do porteiro”, aquele guri pobre que, enquanto é pequeno ainda recebe alguns doces, mas quando crece vira suspeito em potencial de tudo o que de mal ocorre no prédio.

O filho do porteiro segue sendo persona non grata no Brasil dos Guedes: é o que não se quer ver nos shoppings, no aeroporto, nas praias, na Universidade.

O Fies, em 2014, financiou a educação de 732 mil jovens. Em 2020, foram apenas 100 mil. Entre os 632 mil excluídos, quantos foram os filhos de porteiro?

E de tantas outras profissões do povão e de tantas famílias de classe média que não tinham como arcar com os preços do ensino superior.

A universidade pública também é maldita por ele que, devendo sua formação a uma delas, reproduz o discurso de Abraham Weintraub – hoje pendurado num cargo público milionário – de que ela é um antro de sexo e drogas: ” “Paulo Freire. Ensinando sexo para criança de 5 anos. Todo mundo… maconha, bebida, droga. Dentro da universidade.”

Paulo Guedes é um decrépito que torna decrépito um país. Habita, com todos os seus diplomas de Chicago, povoar a calçada de botequim que virou o governo brasileiro.

E cairá, de podre, como podre é.

Tijolaço.

400 MIL CULPAS PARA EXPIAR, POR FERNANDO BRITO

Não é notícia, porque era óbvio.

Nem por isso, é menos apavorante que tenhamos chegado a 400 mil mortes, um quarto delas acontecida nos últimos 36 dias.

O número de vidas perdidas no Brasil já é igual ao que países beligerantes na 2ª Guerra Mundial, como a Itália e o Reino Unido, somados os civis e militares.

Infelizmente, fomos levados a um ponto onde não choca mais a sociedade quantidade de mortos que merece esta comparação destas.

Temos um país menos humano, menos solidário, mais “e daí?” para nossos irmãos e irmãs que se foram sem direito sequer a sentir sua mão apertada pela última vez.

Quem achar pieguice, pense no que seria com seu parente, com seu amigo, com ele próprio.

Mas não basta a dor, porque este crime não terminou, está em curso e num curso vertiginoso de perto de 2,5 mil vidas por dia.

E é preciso, se não é por humanidade, ao menos por medo das consequências que terá o negacionismo que rege o País, parar os que estão levando o país a pagar um sobrepreço inaceitável em mortes.

São muitos, mas todos agem sob a inspiração de um: Jair Messias Bolsonaro.

É por ele que generais covardes se vacinam às escondidas, que médicos obtusos despejam cloroquina e ivermectina nos seus pacientes, que gente insensível propaga o “vem pra rua”, que ladrões abomináveis desviaram dinheiro público destinado a assistir a população.

A CPI da Covid não pode ser tratada – e parece que não vai – como um inventário frio de erros e acertos. Não é um “equívoco” deixar uma pessoa morrer e não pode ser deixar-se que morram centenas de milhares.

Não precisa ser um Nuremberg; precisa ser mais, porque a abominação que examina não está derrotada, como o nazismo estava ali, com seus milhões de mortos às costas.

O monstro de hoje está vivíssimo. E perigosíssimo.

Tijolaço.

quinta-feira, 29 de abril de 2021

O QUE VALE PARA DANIEL SILVEIRA VALE PARA O GENERAL DO CLUBE MILITAR? POR FERNANDO BRITO

Não é porque um dia envergou a farda do Exército Brasileiro que um sujeito adquire imunidade para falar asneiras e brandir o rebenque no rosto dos cidadãos deste país.

O que o senhor Eduardo José Barbosa, presidente do Clube Militar, diz em artigo que publica na página da entidade é uma vergonha, sobretudo, para as Forças Armadas, porque as iguala a uma seita fundamentalista das mais irracionais, inadmissível em instituições públicas, que devem representar todos os brasileiros e não alguns que professam um credo que os divide em anjos e demônios.

O senhor Barbosa se pretende um pregador político-religioso e vai além, partindo para uma imitação inaceitável do que fez o deputado Daniel Silveira, o brutamontes que acaba de ser transformado em réu por agressão aos poderes da República.

Exagero?

O texto – onde Barbosa usurpa o direito de opinião de seus colegas, ao chamá-lo de “Pensamento do Clube Militar “, sem que, ao que se saiba, não tenha sido coletivamente aprovado – começa com declarações que parecem extraídas das prédicas de Edir Macedo ou Silas Malafaia: “O Brasil é “a Pátria do evangelho! Natural, portanto, que o poder das trevas queira destruir nossa Nação” e que ” bastou a eleição de um Presidente que acredita em Deus para que todo o inferno se levantasse contra ele.”

De onde tirou o Sr. Barbosa o direito de chamar de integrantes do “inferno” os que se opõem a Jair Bolsonaro?

Em seguida, compara a “Marcolas e Fernandinhos beira mar (sic)” os senadores que comandam a CPI da Covid – que, para ele, se destina a “culpar o Presidente por aquilo que não o deixaram fazer. Ou por não usar as máscaras utilizadas por alguns para se esconder da população”. Detalhe, identifica-os sem dar seus nomes, covardemente, para não tomar o merecido processo no lombo.

Chama a população de covarde por aceitar “o cerceamento de suas liberdades pétreas passivamente” e a imprensa, por noticiar “fake news”, donde que pode intuir que verdades vêm é dos gabinetes do ódio e das falanges que as propagam.

Diz ainda que acovardam-se os senadores, “por conveniência de terem seus processos engavetados, são nossos Senadores que não iniciam processos contra aqueles Ministros que cometem crimes de responsabilidade, como escrito na Constituição oficial vigente (sic)“, referindo-se ao impeachment dos ministros do STF pedido por bolsonaristas e sugerido pelo próprio Presidente.

E, ao fim, incita a um golpe invocando o artigo 142 da Constituição Federal que, é claro, não tem nenhuma previsão de intervenção militar no Legislativo e no Judiciário: “se neste cenário atual, o Poder Executivo, único dos três poderes que está sendo obrigado a seguir a constituição a risca, que utilize o Art. 142 da Constituição Federal (vigente) para restabelecer a Lei e a Ordem.”

Fazendo o tipo “valentão covarde”, tão em voga nestes tempos, diz que de deve parar de usar algemas “nos trabalhadores que querem ganhar o sustento dos seus lares” (o que só a sua cegueira vê, e se as passe a utilizar “nos verdadeiros criminosos que estão a serviço do Poder das Trevas.”

Quem são, general? Fale os nomes, para que eles possam interpelá-lo na Justiça, ou seu destemor não vai a isso? Daniel Silveira, ao menos, teve a coragem de fazê-lo.

Aguarda-se a ação da Procuradoria Geral da República: vão dar ao general reformado o mesmo tratamento que teve o “brucutu”? Ou a noção de República do sr. Barbosa não é a de que os cidadãos são iguais perante a lei e o seu pijama lhe dá direitos quase divinos sobre os outros, inclusive o de ofender e xingar e ameaçar as instituições?

Tijolaço.

OS CONFLITOS ENTRE A ESQUERDA E A NOVA DIREITA PROGRESSISTA, POR LUIS NASSIF

Ontem à noite, o discurso do presidente Joe Biden foi a pá de cal no modelo de desmonte do estado norte-americano, iniciado na era Reagan.

Ontem à noite, o discurso do presidente Joe Biden foi a pá de cal no modelo de desmonte do estado norte-americano, iniciado na era Reagan.

Fio uma inversão completa nos objetivos da política econômica, algo que nem Barack Obama – mais à esquerda – conseguiu. Não mais foco em Wall Street, mas na classe média, que construiu os Estados Unidos. Defesa dos pobres, das crianças, do aumento do salário mínimo, da economia verde, da solidariedade nacional, da proteção às famílias, da universalização da educação. Ao mesmo tempo, o chamamento para a compra de produtos americanos e para a mobilização do país para a disputa tecnológica e econômica com a China.

É um capítulo a mais, e o mais significativo, da mudança radical do ultraliberalismo que dominou o mundo nos últimos 40 anos.

Enquanto Biden alertava para o custo da saúde nos EUA, Paulo Guedes propunha a privatização do SUS em encontro fechado.

Os reflexos sobre o Brasil se darão em cima de dois grupos, ambos disputando as chamadas pautas progressistas: a esquerda progressista, que tem como base o PT; e a nova direita progressista, um grupo de pessoas de boa vontade, que tenta empoderar o centro-direita com teses politicamente corretas, tentando reescrever um liberalismo menos selvagem, mas mantendo a hegemonia do mercado. 

Em muitos pontos, há concordância, especialmente nas proposições de boa vontade. O conflito surge nos temas em que se exteriorizam disputas de poder e pelo orçamento.

OS PONTOS DE CONFLITO

Sindicatos

Setores modernos no país ainda não entenderam o papel essencial dos sindicatos no fortalecimento dos setores em que atuam. A rigor, apenas o pai do neoliberalismo brasileiro – Fernando Collor – deu-se conta da relevância dos grandes pactos setoriais, entre empresas, sindicatos, fornecedores, nas câmaras setoriais que criou.

Muitos setores embarcam em um paradoxo suicida: aceitam mudanças que podem trazer benefícios individuais a cada empresa, sem se dar conta das perdas para o setor em geral, pela superficialidade das análises.

Nos Estados Unidos houve o enfraquecimento gradativo dos sindicatos. Quando teve início a transferência da produção para a China, os industriais americanos não tinham aliados para impedir a sangria. Daí a ênfase do novo presidente Joe Biden, no re-fortalecimento do movimento sindical como parte de um esforço geral de recuperação do mercado e da produção interna americana.

Por aqui, ocorreu o mesmo fenômeno. Até alguns anos atrás, era possível acompanhar pactos entre a Abimaq (Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos) com centrais sindicais, especialmente na crise de 2008. Com a ascensão do governo Temer teve início o desmonte da estrutura sindical. E as indústrias perderam seus grandes aliados.

Da parte das esquerdas, há dificuldade dos sindicatos em entender a nova ordem e definir alianças horizontais fora da bolha, ou em mudar o modelo de atuação para abrigar os setores informais da economia. Ou mesmo em mudar as regras de disputa para abrir espaço para uma co-gestão com outras forças, inclusive de oposição.

EDUCAÇÃO PARTICIPATIVA

No final do segundo governo Lula, as Conferências Nacionais produziram alguns ensaios de pactos que poderiam ter mudado a história do país. Um deles foi o pacto pela educação, no qual ONGs empresariais, movimentos sociais, sindicatos de professores, associações de secretarias de educação começaram a formar um consenso que poderia consolidar um futuro partido da educação – como existe o partido da saúde, suprapartidário.

Aceitava-se que os professores tinham que ter melhores salários, melhores condições de ensino e, a partir daí, serem avaliados e cobrados. Depois, se diluiu e a centro-direita educacional tucana se curvou ao estilo yuppie autoritário de Maria Helena Guimarães, e sua suposta racionalidade gerencial. É impossível qualquer política de qualidade – em empresas, ou em setores sociais – sem a participação dos que entregam o produto final.

O apoio da nova direita progressista ao enquadramento da educação em atividade essencial – diluindo a influência dos sindicatos e até o exercício da greve – é o indício mais evidente dessa miopia típica do gerencialismo burocrático. Nenhuma empresa, pública ou privada, consegue implementar programas de qualidade sem conquistar coração e mentes dos trabalhadores da ponta.

Da parte das esquerdas, ainda há uma enorme resistência aos sistemas de avaliação.

GERENCIALISMO BUROCRÁTICO

Um exemplo simples, colhido também na área de educação. As escolas rurais garantem o ensino a populações vulneráveis, do campo. Mas também reduzem as notas do estado no IDEB (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica). Fechando as escolas rurais, o Estado piora seus indicadores sociais, deixa de cumprir seus compromissos em relação aos Índice de Desenvolvimento Humano, mas melhora o IDEB. E, com a melhoria do IDEB, melhora os indicadores de eficácia financeira e o governo sai consagrado.

ORÇAMENTO

Outro ponto hipócrita são os discursos solidários a favor do combate à miséria, à desigualdade, a favor das políticas distributivas, desde que não se inclua o pobre no orçamento. Cria-se um vício insanável, de colocar como meta das políticas públicas – especialmente educação e saúde – a redução dos gastos, de fazer o mesmo com menos – e não de fazer mais com mais.

Não é possível discutir recursos para a área social sem analisar os impactos das políticas monetária e fiscal e da Lei do Teto. É discutir consequência sem causa. Não adianta o bom mocismo de criticar as disparidades de renda sem se debruçar sobre o modelo tributário e sobre a distribuição dos tributos, recaindo sobre o consumo (e, por causa disso, sobre classes de menor renda) e isentando os altos ganhos.

CONSUMIDORES X ACIONISTAS

Estatais estratégicas

Uma das maiores distorções atuais é a não compreensão do papel das empresas estatais, especialmente em setores estratégicos. Por tal, entendam-se setores que impactam a economia como um todo, ou que produzam insumos estratégicos essenciais.

Por exemplo, Correios, energia, bancos de desenvolvimento, saneamento público, Sistema Único de Saúde.

Os progressistas de mercado não conseguem medir retorno social ou econômico. A única métrica é a lucratividade, porque se reflete na distribuição de dividendos. E muita distribuição de dividendos significa menos investimento.

Com a pandemia, essa lógica perversa será revertida.

Mas ainda há um longo caminho a percorrer até que a racionalidade se imponha sobre os enquadramentos políticos.

GGN.

quarta-feira, 28 de abril de 2021

FALTA DO CENSO TEM RAZÃO ELEITORAL QUE LIMINAR NÃO RESOLVERÁ, POR FERNANDO BRITO

O destino do censo demográfico brasileiro, independente da decisão do ministro Marco Aurélio Mello tem lógica, é ficar – e olhe lá – para 2022.

É provável que a decisão – liminar de tutela antecipada – caia e, ainda que isso não aconteça, que se crie um impasse: sem previsão orçamentária, como o IBGE fará as despesas necessárias para sua realização?

O país, é claro, precisa do Censo, mas para tem censo, com o perdão do trocadilho, para que ele aconteça precisa-se de um governo com um mínimo de senso, o que não é, definitivamente, o que temos hoje.

Na elaboração e na aprovação do Orçamento, em lugar de espírito público, houve uma corrida desesperada por montar uma base de apoio fisiológica e, para isso, foi-se leniente ou cúmplice de um alucinado assalto aos cofres públicos, para financiar obras e programas que atendessem aos interesses paroquiais dos parlamentares.

Não foram os recursos do Censo os cortados, foram todos os destinados a políticas públicas, em todas as áreas, exceto, talvez, a militar.

E essa por motivações idênticas às que determinaram os arreglos com os parlamentares.

E veremos adiante porque o Censo foi um dos primeiros a sofrer a degola orçamentária.

O dano está feito e o próprio Sindicato dos Servidores do IBGE diz que não há mais como realizar a pesquisa este ano: “O IBGE não pode tirar o Censo da cartola sem garantia de recursos e cumprimento do cronograma necessário para a pesquisa”.

Não se governa nem com decretos, nem com liminares. Governa-se com políticas públicas – que os serviços oficiais de estatística, como o do Censo, devem alimentar de informações e diretrizes.

Um governo sem políticas públicas, como este, não precisa delas e, por isso, desde sua posse, vem tratando o IBGE a migalhas de pão e goles d’água, porque não quer números que reflitam a realidade, mas que louvem a administração.

É só você ver a “reengenharia” que fizeram no Caged (cadastro de empregados e desempregados) para registrar um crescimento no número de trabalhadores que ninguém mais vê, muito menos as pesquisas do IBGE.

Infelizmente, o que vai acontecer – com ou sem liminar do STF – é não haver o censo demográfico de 2021.

O governo Bolsonaro não quer que se veja a realidade brasileira, degradada e empobrecida, porque ela é o mais violento libelo contra a desgraça que representou para o país. Não antes de 2022, quanto tentará prosseguir em sua desgraçada trajetória.

O corte de verbas é conveniente ao governo brasileiro e a escuridão estatística é vital a Jair Bolsonaro.

Tijolaço.

terça-feira, 27 de abril de 2021

VEM AÍ PARA QUEM QUISER VER O “MINISTÉRIO DAS EMENDAS DO CENTRÃO”, POR FERNANDO BRITO

A troca do cargo de Secretário do Tesouro, do qual sai Waldery Rodrigues – notório arrochador de despesas públicas – e entra Bruno Funchal, que já mostrou ser flexível ao ponto de dizer não espera que Jair Bolsonaro faça “populismo” com recursos públicos com a aproximação das eleições, é só o primeiro capítulo da lenta degola de Paulo Guedes já vem sendo submetido e que vai começar a se tornar pública.

Ontem, em seu programa no Youtube, o jornalista Luís Costa Pinto antecipou este e, ainda, o próximo passo: a provável indicação do seu inimigo figadal, Rogério Marinho, a quem chama de “ministro fura-teto, para chefiar a recriação do Ministério do Planejamento, que vai assumir a natureza de “Ministério das Emendas Parlamentares”, pois vai se dedicar essencialmente em garantir a liberação e execução das emendas parlamentares.

Quem vai assumir a “quase metade” da Economia é chamado de “chefe de gangue” por Guedes e, portanto, pode-se adivinhar como será o convívio de ambos.

Como as despesas discricionárias -as não-obrigatórias – estão praticamente reduzidas a zero, o conflito entre Fazenda (porque também o Ministério da Economia, ao menos na prática, vai se reduzir à mera função arrecadatória, ainda mais que com a recém-concedida autonomia do Banco Central) e o “MEP” de Marinho vai ser um traço permanente e contínuo da administração dos recursos públicos.

Por mais que o “mercado” seja indulgente com o governo Bolsonaro, tolerando dele o que jamais aceitaria de um governo minimamente comprometido com o povo brasileiro, um arranjo destes não pode funcionar e dar segurança e coerência à administração econômica do país.

Isso, claro, se Paulo Guedes resistir à sua própria estupidez.

Tjolaço.

AS DENÚNCIAS CONTRA BOLSONARO E A XEPA DA PRIVATIZAÇÃO, POR LUIS NASSIF

Jair Bolsonaro, durante cerimônia comemorativa do Dia do Exército, com a Imposição da Ordem do Mérito Militar e da Medalha do Exército Brasileiro - Fotos Públicas.

Nos últimos dias ocorreram fenômenos curiosos na mídia.

De um lado, viúvas da Lava Jato bradando aos quatro ventos que o combate à corrupção no Brasil foi prejudicado com a suspeição de Sérgio Moro pelo Supremo Tribunal Federal (STF). 

O bravo Ministro Luís Roberto Barroso, um Dorian Gray contemporâneo – tentando emular o líder estudantil que foi, para se tornar permanentemente jovem -, sustentou que, depois da Lava Jato, não se pratica a corrupção no país com a mesma desenvoltura de antes.

Diz isso e um delegado da Polícia Federal vai ao Congresso e acusa o Ministro do Meio Ambiente de ter interferido na maior apreensão de madeira ilegal da Amazonia. Ricardo Salles foi até o local e avalizou a madeira tombada, como sendo legal. Segundo o delegado, ainda não tinha aparecido sequer o proprietário de 70% da madeira apreendida. E a maior madeireira da região acumula mais de 20 multas do IBAMA. Efetivamente um crime de responsabilidade à luz do dia, sob silêncio do nosso Dorian Gray.

Em paralelo, o site The Intercept, com base em informações do Ministério Púbico Estadual do Rio de Janeiro, levanta indícios veementes de ligação da quadrilha de Adriano Nóbrega – o chefe do Escritório do Crime, morto na Bahia – com o “homem da casa de vidro” que tudo indica ser o Palácio do Planalto. Ou seja, indícios veementes das ligações atuais do presidente da República com o Escritório da Morte. Silêncio sepulcral da parte dos varões de Plutarco, silêncio da mídia, mostrando que o Brasil de Noel Rosa continua presente: por aqui tudo se compra e tudo se vende. 

O que faremos com o escândalo? Vamos usá-lo para acelerar os negócios da privatização, é claro. Se se aciona a bomba, ela mata e governo morto interrompe os negócios. Então é mais efetivo manter a bomba à mão, com o governo sabendo que poderá ser acionada a qualquer momento. E deixá-lo continua exterminando CPFs.

Essa é a quadra atual em que se encontra o país. Some-se a politização extremada da Justiça Federal, com um juiz, polêmico ex-presidente da AJUFER (Associação dos Juízes Federais da 1a Região) expondo sua corporação ao ridículo, concedendo uma liminar-cloroquina, para impedir a eleição do senador Renan Calheiros como relator da CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito). Sendo que sequer há eleição para relator, que é escolha pessoal do presidente eleito para a CPI.

Esse é o caos político-jurídico em que o país se meteu, depois que a Lava Jato foi utilizada como gazua para implodir o sistema político brasileiro.

O que se tem, agora, é uma xepa, com mercado, mídia, grupos financeiros saindo atrás dos últimos negócios, antes que o sistema institucional brasileiro se recomponha. E tome brasileiro morrendo de Covid ou morrendo de fome.

Enquanto isto, o espertíssimo Ministro Luiz Edson Fachin, para salvar o ex-juiz Sérgio Moro, abre a garrafa e deixa escapar Lula. Não foi para reparar injustiças, para recompor o sistema político, mas apenas para salvar seu verdugo. E o país de Macunaíma tenta escrever o certo por linhas tortas, começando a reconstruir uma alternativa ao bolsonarismo.

É nesse quadro que se deve analisar os últimos dados sobre 2022, o crescimento de Lula não apenas nas redes sociais, mas junto ao sistema. Segundo informações vazadas para a imprensa, Lula já está em reuniões com empresários, embaixadores estrangeiros.

Imediatamente, o exército de robôs turbinados pela mídia, chamados de “presenciáveis 2G”, se desfez nas brumas do tempo. E o espirito de Macunaíma descobre a solução mágica. Se o país está polarizado, entre Lula e Bolsonaro, venda-se a ideia de que Bolsonaro não irá para o 2o turno. Não indo, restará Lula. Substitui-se o antibolsonarismo e se repõe o antilulismo. E, aí, os bravos Fachin e Barroso pensam em uma estratégia mais eficiente para reativar a proibição de Lula concorrer.

É nesse quadro típico de republiqueta latino-americana que se move a economia.

Nos próximos meses, o país terá que escolher entre recompor o sistema político-partidário ou continuar a xepa. Mas toda xepa tem vida curta.

GGN.

segunda-feira, 26 de abril de 2021

LAVA JATO PASSADA A LIMPO NO ESCANDALOSO ACOBERTAMENTO DA TRAFIGURA, POR LUIS NASSIF

Se Supremo Tribunal Federal, Superior Tribunal de Justiça, Procuradoria Geral da República quiserem, de fato, investigar os mal feitos da Lava Jato Curitiba, debrucem-se sobre o escandaloso acobertamento da Trafigura.

Ontem, a Bloomberg noticiou mais um cerco sobre Isabel Santos, filha do ex-presidente de Angola que, durante a gestão de seu pai, acumulou uma fortuna bilionária.

A principal beneficiária das tramoias de Isabel Santos foi a Trafigura, comercializadora de petróleo, uma das 50 maiores empresas do ranking da Standard & Pors. Compreensivelmente, o nome da empresa não é mencionado na reportagem.

A Trafigura é um dos exemplos mais nefastos da financeirização da economia mundial. Fundada por operadores financeiros, começou a atuar na comercialização de petróleo, dentro do processo que tornou o mercado de petróleo um ativo financeiro, sujeito a enorme volatilidade.

Mais que isso, virou uma máquina de corrupção e de atentados ao meio ambiente. Foi o principal ator da corrupção de Angola, conseguindo o controle da prospecção, importação de petróleo e de obras de infraestrutura. Seus concorrentes maiores eram a Petrobras, na área de petróleo, e Odebrecht, na área de engenharia. Os ataques ao meio ambiente custaram a prisão do seu sócio e fundador

A Lava Jato bateu no coração da Trafigura quando deteve Mariano Marcondes Ferraz. Lobista carioca, Mariano foi o principal organizador da mega corrupção em Angola. Como recompensa, ascendeu ao cargo de membro do board mundial da Trafigura.

Marcondes Ferraz foi denunciado por Paulo Roberto Costa e outros executivos da Petrobras como o intermediário da Trafigura junto à Petrobras. Foi preso nessa condição. De advogados que acompanhavam a Lava Jato ouvi o diagnóstico definitivo: agora, a Lava Jato bateu no centro de corrupção da Petrobras. De fato, o dinheiro envolvido na comercialização de petróleo era imensamente superior aos valores da construção civil. E tinha-se na linha de frente algumas das empresas mais suspeitas do planeta, além da Trafigura, a Glencore.

Repare bem: a Petrobras não é uma empresa corrupta, é vítima de corrupção. Ou seja, a corrupção ocorrida era contra a Petrobras. Já a Trafigura tem a corrupção na veia, como comprovaram os escândalos de Angola.

Na ocasião da prisão de Marcondes Ferraz, as principais publicações econômicas mundiais ressaltaram o fato de pertencer ao board da Trafigura. Principal operador de Mariano na Petrobras, em seu depoimento Paulo Roberto Costa ligou-o de forma explícita à Trafigura. Mesmo assim, Mariano Ferraz foi libertado poucos dias depois e o seu inquérito mudou de objeto: em vez de representante da Trafigura, passou a ser processado por um bico que fez para uma empresa italiana, a Decal, no porto de Suape. Nesse caso, tinha uma taxa de sucesso de 5% da operação.

Ao contrário da Petrobras, a Trafigura foi totalmente blindada, não apenas no inquérito mas na divulgação de dados. Marcondes Ferraz foi liberado pouco tempo depois, mediante depósito de fiança – benefício que não foi estendido à maioria dos presos pela Lava Jato.

No seu depoimento, Mariano fala dos contatos com Paulo Roberto e do fato de ele estar muito mais ligado aos negócios da comercialização – justamente a área de atuação a Trafigura. No seu interrogatório, em nenhum momento aparece o nome da Trafigura – apesar do próprio Paulo Roberto ter mencionado em seu primeiro depoimento. Mariano admite que não houve nenhuma melhora nos pagamentos à Decal, mostrando que as tratativas não foram eficientes. Durante cinco anos, a Petrobras continuou pagando a mesma tarifa à Decal. Mesmo assim, a Lava Jato aceitou sua versão, de que as propinas referiam-se aos negócios da Decal.

No depoimento, Marcondes Ferraz faz questão de enfatizar que todas as contas identificadas na Suiça eram dele. Sustentou que nem a Decal tinha informações sobre as propinas. Todos os pagamentos saiam das contas pessoais dele.

Na ocasião, mostramos todos os dados das ligações da Marcondes Ferraz com a Trafigura. Houve silêncio absoluto da mídia e da Lava Jato. As reportagens chamaram a atenção de jornalistas estrangeiros, ligados a ONGs ambientais. As denúncias de sua atuação em Angola foram levantadas a partir de trabalhos de blogueiros nacionais.

No depoimento de Marcondes Ferraz, as perguntas do procurador são ridículas. Em que ano saiu do Brasil? As contas na Suíça têm sua identificação? Na sequencia, o procurador pede que Mariano diga qual o ganho que a Petrobras teve com o contrato da Petrobras.. Levanta a bola para Mariano fazer uma belíssima propaganda do terminal da Decal. Nenhuma preocupação em levantar, junto aos procuradores da Suíça, os pagamentos da Trafigura a Mariano. 

A brava equipe de repórteres investigativos, repassadores de releases da Lava Jato, em nenhum momento questionou o inquérito.

Nos meses seguintes, a Petrobras começou a vender ativos na América Latina. A principal candidata às compras foi justamente a Trafigura.

Agora que acabou a blindagem da Lava Jato, é preciso que se vá fundo sobre os motivos de se poupar a Trafigura.

Outras reportagens do Jornal GGN sobre o tema:

Xadrez da Lava Jato e da Corrupção em Angola – Capítulo 1

Xadrez da Lava Jato e a corrupção em Angola – Capítulo 2

Ha corrupção nos EUA? Sim, tem muita e é legal, por André Araújo

Xadrez da Petrobras e a maior corrupção do planeta

Moro condena Mariano Marcondes e livra a Trafigura

GGN.

‘OSCAR’ DE MELHOR ROTEIRO PARA A CPI DA COVID-19 VAI PARA O PLANALTO, POR FERNANDO BRITO

Ótimo trabalho do repórter Rubem Valente, no UOL – logo confirmado e reproduzido pelos demais veículos de imprensa – revelou a planilha de 23 acusações das quais o governo Bolsonaro tentará se defender na CPI da Covid.

Com o favor do governo em elaborá-lo, faz-se assim o longo roteiro do documentário de horrores que foram as ações, omissões e os requintes de maldade do atual presidente, com 23 situações que compõem o fio principal: como um homem manipulou uma catástrofe sanitária para obter dela o combustível de seu projeto autoritário de poder, obtido pela fermentação do ódio, com a levedura da estupidez e do calor de uma sempre ameaçada intervenção militar.

Pois é esse roteiro que já está se desenvolvendo e toma corpo a partir de amanhã, com a instalação da CPI, tendo como ponto central seu item 11 – “O governo politizou a pandemia” – em torno do qual se desenvolvem as várias tramas que a isso conduzem.

Esta é a questão central: por que se praticou o negacionismo, o charlatanismo, a incitação ao uso das Forças Armadas, a militarização do Ministério da Saúde, a procrastinação na compra das vacinas e tudo o mais?

A resposta, já evidente, é essa: a de tirar proveito político do desespero da população diante de uma catástrofe, usando-a para exacerbar os conflitos políticos.

É evidente que o Brasil teria perdas, como todos os países do mundo tiveram, com a pandemia. O fato é que aqui ela foi potencializada pelos objetivos político do Sr. Jair Bolsonaro.

A pandemia contou aqui com a ajuda de uma “pedalada mortal”.

Tijolaço.

domingo, 25 de abril de 2021

A CLASSE MÉDIA “JÓIA DA COROA DOS GOVENOS DO PT” QUE FOI AO INFERNO EM BUSCA DE LUZ, POR FERNANDO BRITO

Extensa reportagem de Fernando Canzian, com muitos dados estatísticos, na Folha de hoje, mostra o inferno em que foi lançada – ou lançou-se – a pequena classe média, brasileira, que os governos do PT julgavam a “jóia da coroa” de seu governo desenvolvimentista.

O número de famílias na “Classe C”, com renda familiar mensal até 8.300 (note que isso era quase oito mínimos, em 2020), desabou 32%, mesmo tendo o “reforço” das famílias de Classe A/B que migraram para o patamar abaixo.

Daí que cresceram em 33,3 milhões de famílias as que estão nas classes “D” e “E”, com ingressos mensais de até R$ 1,92 mil e até, R$ 1,2 mil.

Sim, foi neste grupo, cuja ascensão deu-se sob Lula, que Bolsonaro inflou seu discurso de ódio e abocanhou a presidência.

A jovem classe média ascendente, como Esses Moços de Lupicínio Rodrigues, deixaram o Céu por escuro e foram ao inferno em busca da luz moralista que Moro levantava de Curitiba.

E vai piorar:

Enquanto classes mais favorecidas começam a estabilizar a renda ou a obter ganhos, as classes D e E —cada vez mais numerosas— devem amargar nova queda de quase 15% em seus rendimentos neste ano.

Mais, é um problema que se retroalimenta:

Mais pobre, a gigantesca população de baixa renda consumirá menos, exigindo menos investimentos e contratações de novos empregados pelo setor produtivo.

No entanto, todo o discurso que vemos dos “grandes economistas” se volta para o corte, o arrocho, a contração dos gastos públicos, uma espécie de dieta “low carb” para quem está anoréxico.

Só aqui, claro, porque a política de subsídios – trilhões de dólares – de Joe Biden é saudada como chave para a recuperação econômica dos EUA.

Repare como todos aqueles que atribuem ao quadro internacional de valorização das commodities o sucesso econômico do Brasil nos anos Lula não abrem a oca para falar que se vive, naqueles mercados, uma situação ainda melhor sem que isso alivie nossa desgraça econômica.

Não é a atração do capital financeiro internacional que trará a recuperação da economia brasileira, mas o inverso: é voltarmos a ser um país de 220 milhões de pessoas – e não um mercado de consumo de 70 ou 80 milhões de pessoas apenas – que nos tornará atrativos e não um inferno do qual, como estamos assistindo a toda hora, um país que perde investimentos produtivos, que expulsa fábricas como se viu ocorrer, ainda esta semana com a cimenteira francesa LafargeHolcim, que foi se juntar à fila de embarque onde já estavam a Sony , a Ford , a LG e a Mercedes-Benz.

Tijolaço.

O QUE A MÍDIA ESCONDE QUANDO FALA “O AGRO É POP”. POR TELMA DOMINGUES

Aumenta quantidade de agrotóxicos liberados pela Anvisa; Mogi tem programa para conscientizar agricultores — Foto: Reprodução/TV Diário.

Em 2020 e agora em 2021, anos em que vivemos a pandemia, e com ela a pior crise econômica e humanitária a nível planetário, nós no Brasil presenciamos sucessivas safras recordes de grãos. O feito é noticiado, ou, mais do que isso, alardeado, comemorado, exibido como um troféu. E os números, impressionantes, estão ainda em crescimento: “A safra nacional de grãos deve atingir mais um recorde, o terceiro consecutivo, neste ano, com 260,5 milhões de toneladas, um crescimento de 2,5% em relação a 2020”. Importante seria alardear, junto a esses números, outros: qual o montante da fortuna arrecadada com as exportações de grãos, dado o câmbio atual? quantos brasileiros se beneficiam dessa fortuna?

Mas parece não haver nessa falta nenhum incômodo, basta aos brasileiros ter notícia dessa “nossa riqueza”.

A propaganda do agronegócio, de uma campanha já antiga, de 2017, circulou fortemente na Rede Globo no ano passado e início deste: “Agro é Pop, Agro é Tech, Agro é tudo”. Sim, é uma propaganda, mas é de responsabilidade de uma determinada empresa jornalística, que, em sua difusão por todo o imenso território, denota de maneira flagrante esse traço subdesenvolvido e antidemocrático de nossa Comunicação. A campanha intitula-se “Agro: a Indústria-Riqueza do Brasil”, numa significação que afirma sem rodeios a agricultura como uma indústria, aliás a mais rica – e isso é mesmo certo, depois do desmonte da indústria brasileira que a Lava-Jato promoveu, atingindo diversos setores industriais.

De acordo com Roberto Schmidt (diretor de marketing da TV Globo), o objetivo da iniciativa é conectar o consumidor com o produtor rural e ao mesmo tempo desmistificar a produção agrícola aos olhos da sociedade urbana – dado o conjunto da obra, “desmistificar” deveria ser mostrar a agricultura não só como uma indústria, mas como uma indústria moderna, confrontando um imaginário de rural como não-tecnológico, atrasado. “Queremos mostrar que a riqueza gerada pelo agronegócio movimenta os outros setores da economia”, salientou, acrescentando que: “a ideia é fazer com que o brasileiro tenha orgulho do agro”.

Não tenho dúvidas: a ideia é fazer com que o brasileiro tenha orgulho de algo que seria “do Brasil”, porém, algo do qual ele não necessariamente se beneficia, pelo menos de maneira direta ou efetiva. Assim, cabe perguntar: e o orgulho do brasileiro em relação às universidades, à ciência, ao SUS, por exemplo? Há em curso processos de destruição e/ou de deterioração, que atingem tudo o que pode tirar da miséria o brasileiro. E o que sabe disso o brasileiro que deve ter orgulho da indústria-riqueza?

A destruição atinge os direitos trabalhistas, aprofundando a direção neoliberal no atual governo. Atinge o direito à terra, no percurso mesmo dos incêndios e invasões ilegais em terras da União, no cerne da guerra política, econômica, cultural uma vez posta no “meio ambiente” e nunca cessada. E atinge o Sistema de Saúde e a educação básica, para ficar nos serviços públicos mais fundamentais. Se a pandemia, como dizem, afeta “desigualmente” o brasileiro, afeta diretamente o trabalhador assalariado ou informal, o microempresário, aqueles que mais dependem não só do “livre comércio”, mas também de todo um sistema público, hoje estressado, sucateado ou desmoronando. Portanto, cresce hoje absurdamente a população refém dos auxílios – o mínimo de um mínimo a um espetacular número de brasileiros. Mas a pandemia não é ela mesma a responsável direta por esse crescimento da miséria no país, senão o próprio contexto histórico-político, coroado pelas piores decisões no seu enfrentamento.

O que dizer de um governo que, na crise sanitária que se instalou com a pandemia, troca um ministro da Saúde médico, e outro em seguida, instalando um general que assume que não entende nada do SUS? O que se disse a respeito na mídia foi muito, muito pouco. Muito mais poderia ser dito a respeito da decisão do governo de deixar o vírus correr solto.

Embora o SUS no momento esteja muito presente nas pautas televisivas e esteja sendo referido por comentaristas como exemplo mundial de sistema público de Saúde, parece-me que falta à população informação com relação ao que existe de fato para que esse funcionamento se dê, em termos de uma estrutura pública de Educação superior, Ciência e Saúde — estruturas que são visadas como possíveis terrenos de encampação pelo setor privado. Então: propagandeia-se um orgulho pela safra recorde e os profissionais de saúde, entre outros funcionários públicos, devem ter seus salários congelados. E os profissionais da saúde e da educação do sistema público são ainda e de novo exaltados enquanto heróis, em seu sacrifício diário – perversa ladainha das mais antigas nesse país.

O SUS faz parte de uma política por meio da qual uma atenção mínima à população deu-se a partir de uma estrutura que não é pequena nem simples, nem pode ser simplificada, pois demanda de diversas áreas e demandou de fato uma série de ações e incentivos díspares, que inclui a estruturação e provisionamento, não no ideal, certamente, do Sistema Único de Saúde para atingir, nesse território gigante, o maior número possível de cidadãos – mas passa também pela pesquisa populacional (IBGE) e pelo sistema de monitoramento ambiental do território da União (INPE), ambos atacados/desmontados pelo governo federal atualmente.

E ainda pela legislação ambiental, que foi investida nesses últimos anos e é das mais atualizadas frente ao contexto internacional. Com ela, assegura-se o direito à terra para populações que vivem de forma coletiva, por exemplo em regime de extração sustentável. A legislação ambiental, como sabemos, tem sido escancaradamente inoperada (com o desmonte do IBAMA e ICMBio, o perdão de multas, a regularização fundiária). Falta dizer que essa inoperância hoje da legislação ambiental no Brasil se dá na direção do melhor aproveitamento do capital, desse mundo financeiro que reproduz o dinheiro à custa de vidas, da fome, de vidas miseráveis ou perdidas ou iludidas.

Ocorre que, no momento mesmo da safra recorde, a estrutura mínima de proteção à população desse país, gigantesco, tem sido minada, tem sido golpeada, escasseada, arrasada. O processo de destruição em curso foi visível em sua gritante imagem nos inumeráveis incêndios florestais ocorridos no país, criminosos, em que vislumbramos novamente, e sempre, um território rendido aos interesses pífios de uma elite – mesmo que aparentemente sejam os chamados grileiros a fazer o trabalho sujo da expansão agrícola. Além de uma mineração primitiva e selvagem, que persiste na maior parte das vezes pela ilegalidade, também os grandes negócios na agricultura têm na sua constituição as sucessivas “legalizações” de terras que foram barganhadas, tomadas, ao destituíram delas ou mesmo ou matar indígenas e caboclos, por exemplo – as “regularizações fundiárias”.

O “auxílio emergencial” é minguado e descontínuo e os outros auxílios vão se escasseando ou talvez tornados um luxo, entre a parcela “mais afetada”, ou seja, entre aqueles sujeitos que nada têm diante de um Estado que deve ter – exigência do mercado, que tudo comanda – cada vez menos a oferecer a eles.

O Estado, que se quer sempre cada vez mais mínimo, atuava minimamente na proteção da população, graças a uma política nesse sentido que buscou atender no básico a uma população enorme que se espalha nesse território gigantesco, com suas especificidades regionais – os brasileiros, não?

Tais questões passam pelos noticiários da imprensa tradicional, mas os “fatos noticiados” na grande mídia não são destrinchados em uma perspectiva crítica que os correlacione, e o que resta é a repetição de determinadas “conclusões” como: a pandemia afeta de modo desigual a população, o presidente deve ser afastado da gestão da pandemia, os remédios tais, tal, tal “não tem eficácia comprovada”. Aliás, intrigante essa construção: dizer que “não tem eficácia comprovada” deixa uma margem de possibilidade, um “pode-se ainda comprovar”. Melhor seria dizer que comprovadamente não tem eficácia nenhuma contra a covid.

Hoje, na cobertura da imprensa – falo em especial da televisiva –, chama atenção a produção de uma imagem crítica ao governo, à custa de observações sobre a sua inoperância na pandemia. As “conclusões” ocupam na emissão jornalística o lugar dos seus silêncios sobre a cena política. Depois, a pesquisa de opinião pública colhe os frutos, bem como as eleições. Portanto, tal circulação de “conclusões” – digo conclusões tal o efeito sintético quanto aos fatos-alvo das notícias – tampona uma crítica mais efetiva, funcionando na sustentação de um silêncio, por exemplo, quanto à relação entre a produção de grãos, o desmonte do que é público e a fome.

É lado a lado ao desmonte do que é público, de tudo aquilo que pode beneficiar a população, que as safras de grãos assumem sucessivos recordes, enriquecendo um produtor que, em sua maioria, produz em grandes propriedades, remontando ao histórico da grande plantação, o latifúndio, contando sempre com o financiamento público de seus investimentos e, quanto ao exportador, contando ainda com a isenção de impostos. Como pedir que tenhamos orgulho dessa produção tutelada pelo Estado, nesse Estado que não deve mais dar o mínimo ao brasileiro?

Não se identifica nas imagens da campanha “Agro é tech” uma entidade que a estaria promovendo, o que coloca a Rede Globo como autora responsável. Porém, nesse falar de uma aparente “agricultura generalizada”, justamente, não é difícil identificar sobre qual produtor rural está se falando: é sim o produtor rural das safras recordes, o produtor do agrobusiness, é o sujeito que produz commodities, ou seja, um “agricultor” entre aspas pois o que produz não é alimento, e sim mercadoria (dinheiro, capital). Daí que não haja espanto algum que as safras recordes se deem no país que entra nesse momento numa situação de fome calamitosa.

Ao mesmo tempo em que propagandeia o agronegócio, a emissora mostra em suas reportagens um governo ineficiente, nocivo, genocida, um ministro do meio ambiente vendido. Bolsonaro esbraveja com os jornalistas, com destaque à Globo, e a imagem de um jornalismo crítico se produzindo parece colar. No quadro de uma crítica ao desastre que se instalou no país, sobretudo após as últimas eleições federais, falam ministros do STF, fala o líder da Câmara dos deputados, mostram-se cartas de repúdio, que se somam, junto aos pedidos de impeachment. E comentaristas avaliam que o governo perde apoio, por isso, isso e isso.

Tendo tudo sido exposto na televisão, a crítica parece estar sendo feita, considerando esse papel de enorme responsabilidade da imprensa: a opinião pública não é algo que está presente na população, de antemão, a qual a mídia detecta com a pesquisa, mas algo que a própria mídia produz ao produzir indignação ou produzir orgulho, ou manter silêncio.

Seria o caso de compreender o silencio naquilo que é dito na emissão jornalística. Com relação ao agronegócio, uma reportagem no dia 24 de fevereiro de 2021 no Jornal Nacional fala em 13 mil empregos gerados pela soja, sem nenhum elemento crítico que possa colocar uma tensão no dado numérico e seu “efeito informativo”. Seria preciso, se se trata de um jornalismo mínimo, relembrar ao telespectador o caráter ínfimo desse dado. Para começar, não são empregos, mas “bicos”: os postos de emprego noticiados pela reportagem duram o tempo da colheita. Para terminar, o que são 13 mil postos de emprego numa economia que rendeu os milhões de sacas que a soja propagandeia? Para se ter uma ideia do absurdo de se propagandear esses 13 mil postos de emprego, na agricultura familiar – a atividade agrícola que de fato nos sustenta, nos alimenta – são 10 milhões de postos.i

Quanto à promoção do agronegócio como indústria-riqueza do Brasil, o mais importante é não só olhar para o incremento dessa produção agrícola enquanto produção de mercadoria, que enriquece meia dúzia e encarece a oferta do alimento no mercado interno. Mas principalmente considerar como isso está em oposição flagrante a outras políticas como a política de fortalecimento da agricultura familiar e/ou da agricultura orgânica; bem como à política das áreas protegidas enquanto terras da União, que dá possibilidade de existência a outras culturas, em suas formas de se relacionar com a terra, diversas sobretudo daquela voltada unicamente para o rendimento monetário, que ignora a alimentação da população e que esgota a terra. Temos alguns trabalhadores do campo, algumas populações tradicionais que resistem produzindo alimentos, muitas vezes orgânicos, alguns destes derivando do movimento MST criminalizado pela Rede Globo.

Seria o caso, quanto à reportagem mencionada, de se questionar se se pode considerar strito sensu ser parte de uma prática de jornalismo, embora o fato de inscrever no jornal televisivo mais destacado do país possa assim significá-la. Há, no meio jornalístico, o termo “matéria paga”. No silêncio em torno do número (13 mil) sobre os empregos no âmbito do agronegócio (um número que não diz nada no contexto nacional), o jornalismo da Globo escancara sua relação com esse mesmo governo genocida que é criticado pela gestão.

DCM.