Existem muitos pontos
nebulosos na Lava a Jato. Tantos que o correto seria que a ação fosse toda
revisada por um grupo de juízes e juristas sérios e isentos. Tanto pela
importância quanto pelo resultado, a Lava a Jato tenta se colocar na condição
de “sui generis”, o que até já foi usado pelo TRF4 para legitimar algumas
barbaridades feitas pela República de Curitiba.
Muitos dos defensores
dos abusos de Curitiba usam o argumento da manutenção das decisões em
instâncias superiores para robustecer as barbeiragens técnicas do juiz de
Curitiba. O argumento é claramente de natureza científica, se baseia no
indutivismo e tem uma falha grotesca. A ideia é que se a mesma observação passa
pelo crivo de vários sujeitos distintos e todos chegam à mesma conclusão, temos
que é mais provável que esta conclusão esteja certa. Ocorre que todas as
decisões de segundo grau a respeito da Lava a Jato são tomadas sempre pelas
mesmas 3 pessoas. Os três de Porto Alegre, Laus, Gebran Neto e Paulsen. Assim,
ao invés da segunda instância contar como um “terceiro desinteressado” a olhar
o caso, ela conta como mais uma instância de pré-determinação. Aumentando, e
não diminuindo a sensação de que algo muito errado ocorre com a Lava a Jato.
A Lava a Jato se
origina do inquérito 714/2009 da Polícia Federal que, segundo o governador
Flávio Dino, inicia-se com um pedido de investigação do governo norte-americano.
O inquérito já começa mal pois se trata da investigação de crimes do Deputado
Federal José Mohamed Janene (PP-PR) mas a PF, sabendo que o inquérito teria
foro privilegiado, apresenta a investigação como sendo contra “Yousseff, Stael
Fernanda Rodrigues Janene (esposa do parlamentar), Rosa Alice Valente
(assessora do parlamentar) e Meheidin Hussein Jenani (primo do deputado).
Assim, a PF usando de ardil ilegal evita o deslocamento de competência mesmo
que as investigações já apontassem para o papel central do parlamentar.
Janene morreu em 2010,
embora sua esposa tenha pedido exames no corpo sepultado por afirmar que o
marido não está morto. E as investigações que começam sobre um parlamentar vão
se focar num posto de gasolina (usado para lavagem de dinheiro) localizado em
Brasília e terminam discutindo um apartamento em SP e a Petrobrás que tem sede
no RJ. Como uma investigação sobre um parlamentar a respeito de um posto em
Brasília, um apartamento em SP e uma empresa no RJ terminam na mão de um obscuro
juiz em Curitiba? Isto é parte dos estranhos e nebulosos caminhos da Lava a
Jato.
Mas a PF não apenas
cometeu o desvairio de omitir o alvo real da investigação falseando como se
fossem primos e assessores de parlamentar (e quantos hoje podem estar na mesma
situação?), a PF também “esquentou” documentos, através de diligências forjadas
combinadas com a contadora de Yousseff, para “achar” documentos que levariam
Moro à Petrobrás e, assim, manter o foro de forma ainda mais estranha. De
imediato pergunta-se: Só um juiz faz justiça, no Brasil? Somente Sérgio Moro é
justo e imparcial? Porque evitar que qualquer outro viesse a pegar uma
investigação sobre um posto de gasolina e um deputado morto?
As articulações para
manter toda a investigação na mão de um grupo determinado de juízes e
procuradores não terminam por aí. E agora entra o famoso 2013. Ainda que nossos
juízes de primeiro grau tenham poder sobre o céu, a terra, a água e a vida de
todos no território nacional (comparativamente com outros sistemas judiciários
no mundo, nossos juízes são os que, de longe, detém maiores prerrogativas),
suas decisões podem e comumente são questionadas por uma turma de três
desembargadores em segundo grau.
Qualquer tentativa de
burlar o “juiz natural” no Brasil deveria também articular um segundo grau
inepto ou condescendente com os desmandos do juiz de piso. O TRF4 tem apenas
duas turmas que tratam de direito penal (a 7ª e a 8ª), assim, qualquer
articulação já teria 50% de chances de ser bem-sucedida. Pedro Gebran Neto, que
foi colega e é amigo de Sérgio Moro, é convocado para substituir o
desembargador Paulo Afonso Brum Vaz, no dia 12 de junho de 2013, tomando posse
(como desembargador) em 16 de dezembro do mesmo ano. Gebran já figurava como
juiz convocado na mesma vara. No mesmo momento é chamado para a oitava turma
Leandro Paulsen, pelo ato 503/2013. Exatamente em junho de 2013 uma turma, das
duas possíveis para casos penais, recebe dois desembargadores ao mesmo tempo,
sendo um deles amigo pessoal do juiz que se havia feito todo um esforço para
ter jurisdição sobre os casos envolvendo a Petrobrás.
Ainda assim, o Brasil
teve sorte. A competência dos julgamentos em segundo grau sobre a Lava a Jato
seria definida (sorteada) por conta do Mandado de Segurança número
0003460-89.2013.404.0000 que foi sorteado (em 15 de agosto de 2013) para
Claudia Cristofani, empossada desembargadora federal em 9 de julho de 2013, e
lotada na sétima turma!!! Toda a articulação corria o risco, pelo bom
funcionamento do sorteio, de ser malsucedida se a desembargadora simplesmente
tivesse aceitado o julgamento do Mandado de Segurança.
Ocorre que a
desembargadora, sabe-se lá por quais motivos, envia ofício a Gebran Neto
dizendo que o desembargador que ele, Gebran, substituíra havia julgado
apelações em 2006 (2006.70.00.020042-0 e 2006.70.00.26752-5) sobre lavagem de
dinheiro e assim, “pergunta” ao “nobre colega” se ele não aceitaria o
julgamento do singelo Mandado de Segurança que, no fim, atrairia TODOS os
julgamentos da Lava a Jato para Gebran e Paulsen. Não é preciso dizer que
Gebran aceitou o “múnus”, até com certa satisfação.
Gebran foi escolhido
para o tribunal por “merecimento”, que significa dizer que não era o mais
antigo e seu nome é fruto de escolha pessoal do presidente do tribunal, depois
chancelada pela presidenta Dilma Rousseff. Já Paulsen era o mais antigo e sua
nomeação era “obrigatória”.
No fim, o famigerado
junho de 2013 teve mais uma “estranha” relação com o cataclismo que se abateu
sobre o país. E Dilma assina a posse dos desembargadores que viriam a fazer
parte da patranha da condenação de Lula. Como se vê, se a competência do juiz
de Curitiba não é corretamente aplicada à ação, visto os objetos e até mesmo o
deputado investigado, tampouco o segundo grau foi “sorteado aleatoriamente”. Todo
o caminho jurídico da Lava a Jato foi delimitado por pessoas com grande poder
de manipular a justiça brasileira, para que as decisões de primeiro e segundo
graus, ficassem dentro de um grupo pré-escolhido de magistrados. Do início ao
final, o processo que culmina ceifando a democracia brasileira é viciado e
politicamente interessado.
GGN