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terça-feira, 6 de março de 2018

Pierpaolo Cruz Bottini explica PORQUE MORO ERROU ao condenar Lula por lavagem do triplex

O advogado Pierpaolo Cruz Bottini, professor de Direito da USP e membro do escritório que defende empresários da JBS, publicou artigo no Conjur, no último dia 5, mostrando, com base em teses de diversos autores, que "não parece haver lavagem de dinheiro no caso Lula". 
Segundo Bottini, a sentença do ex-presidente no caso triplex, dada pelo juiz Sergio Moro, é motivo de "controversa" no meio acadêmico e jurídico.  
Ao analisar a condenação, ele destacou que o conceito de lavagem de dinheiro está atrelado à dissimulação do produto do crime, justamente porque os envolvidos tentam se afastar do bem. 
E, no caso do triplex, não há nenhuma tentativa nesse sentido. O apartamento pertence à OAS e mesmo que tenha sido destinado a Lula, não poderia haver lavagem de dinheiro sem dissimulação. Isso, hipotéticamente. Porque a realidade dos fatos é outra: o imóvel nunca foi transferido ao ex-presidente, mas Moro usou a "não-transferência" para sustentar o crime de lavagem. 
No artigo de Bottini só não ficou esclarecido que em nenhum momento o ex-presidente Lula fez uso do imóvel considerado objeto de lavagem.
A suposta lavagem de dinheiro no caso triplex*
A confirmação da condenação do ex-presidente Lula, pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, por corrupção passiva e lavagem de dinheiro tem sido objeto de intensos debates em todos os fóruns jurídicos ou leigos, no país e no exterior. Discute-se a competência do juiz, a insuficiência de provas da corrupção, a necessidade de demonstração do “ato de ofício”, o momento da execução da pena, dentre outros temas relevantes. 
O presente artigo tem por objeto analisar um ponto específico da sentença condenatória mantida pelo TRF: a lavagem de dinheiro. Lula foi condenado por corrupção por supostamente receber um apartamento tríplex no Guarujá de uma construtora. 
Também foi condenado por lavagem de dinheiro porque a transferência do apartamento teria ocorrido de maneira sub-reptícia, com a manutenção da titularidade formal do bem em nome da construtora, com o objetivo de ocultar e dissimular o ilícito (sentença condenatória, item 305). 
A questão é controversa. Lula foi condenado pela modalidade de lavagem de dinheiro prevista no art. 1º, caput, da Lei 9.613/98: “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal.” 
A infração penal antecedente, que gera o produto a ser lavado, no caso Lula, é a corrupção passiva. Segundo o Código Penal, tal crime se caracteriza por “solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem” (CP, art.317). Ou seja, é necessário solicitar ou receber algum benefício ilegítimo – no caso Lula, um apartamento no Guarujá, segundo a acusação. 
Não se discute aqui a existência ou não de provas das imputações. Esse não é o objeto das presentes reflexões. Partamos da premissa da acusação, de que o apartamento foi recebido pelo ex-presidente, para que a análise jurídica não seja tomada pela disputa a respeito do conceito de prova, indício ou dos critérios de sua valoração. 
A punição à lavagem de dinheiro supõe a ocultação da origem ilícita do bem, ou seja, o distanciamento entre o produto e o crime que lhe deu origem. Em estudo específico sobre o tema com BADARÓ, apontamos que “a primeira fase da lavagem de dinheiro é a ocultação (placment/ colocação/ conversão). Trata-se do movimento inicial para distanciar o valor de sua origem criminosa, com a alteração qualitativa dos bens, seu afastamento do local da prática antecedente, ou outras condutas similares”. [1] 
O Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) explica que, “para disfarçar os lucros ilícitos sem comprometer os envolvidos, a lavagem de dinheiro realiza-se por meio de um processo dinâmico que requer: primeiro, o distanciamento dos fundos de sua origem, evitando uma associação direta deles com o crime; segundo, o disfarce de suas várias movimentações para dificultar o rastreamento desses recursos; e terceiro, a disponibilização do dinheiro novamente para os criminosos depois de ter sido suficientemente movimentado no ciclo de lavagem e poder ser considerado "limpo".”[2] 
Na mesma linha, BALTAZAR JR.: “a criação desse tipo penal (lavagem de dinheiro) parte da ideia de que o agente que busca proveito econômico na prática criminosa precisa disfarçar a origem dos valores, ou seja, desvincular o dinheiro de sua procedência delituosa e conferir-lhe uma aparência lícita, a fim de poder aproveitar os ganhos ilícitos, considerado que o móvel de tais crimes é justamente a acumulação material” (BALTAZAR, José Paulo, Crimes federais, 8ª ed., São Paulo: Saraiva, 2012). 
Se o crime antecedente é descrito como corrupção de uma empreiteira para beneficiar Lula, a lavagem de dinheiro implicaria a prática atos para distanciar a titularidade do imóvel tanto da empreiteira como do beneficiário da vantagem, a fim de ocultar qualquer relação entre o político e a empresa que possa levantar suspeitas sobre a origem ou a natureza da transação que resultou na transferência do imóvel. 
Nesse contexto, a manutenção do apartamento em nome da empresa acusada de corrupção, enquanto o político supostamente corrompido usufrui dele não parece ser um ato de ocultação ou dissimulação. 
Não existe um distanciamento do bem em relação aos agentes do crime. Ao contrário, a permanência do imóvel em nome da empresa enquanto o agente político o utiliza é ato que evidencia a prática do delito, que faz transparecer a proximidade entre corruptor e corrompido, que revela a existência de uma relação de fato que demandaria explicações. 
Assim, se o delito de lavagem na modalidade ocultação “requiere um estado de oscuridad o confusión tal, que haga difícil el estabelecimiento de lazos entre los bienes y su raiz delictiva”[3], não parece ser possível classificar como ocultação o fato de um funcionário público usufruir de um imóvel em nome do corruptor. 
A retenção do bem no patrimônio do último enquanto o beneficiário da corrupção o utiliza e dele dispõe seria prova da corrupção e não ato de dissimulação capaz de mascarar a prática delitiva. 
CARLA DE CARLI, em estudo sobre o tema, aponta como “exemplo de lavagem de dinheiro na modalidade ocultação é o simples depósito de valores recebidos em paga de corrupção em conta de terceiro – oculta-se a origem, a localização e a propriedade dos valores ilicitamente havidos. A chave, aqui, é ser a conta bancária de terceiro. Caso estivesse em nome do autor do delito de corrupção não haveria lavagem, porque ele não estaria ocultando a verdadeira propriedade desses valores” (Lavagem de dinheiro, Prevenção e controle penal, p. 240). 
É possível que a autora tivesse em mente afastar a lavagem de dinheiro apenas no caso em que os bens estiverem em nome do corruptor passivo, destinatário das vantagens indevidas. Mas o mesmo raciocínio parece possível nos casos em que o corruptor ativo mantém o bem em seu nome, enquanto o corrompido dele usufrui. 
Não existe aqui a figura do laranja, do testa de ferro, porque aquele que oferece a vantagem indevida é parte no crime, de forma que não presta a dissimular nada. Seu contato com o bem o contamina, dificultando – e não facilitando – o distanciamento deste de sua origem criminosa. 
GÁLVEZ BRAVO apresenta, em sua obra “Los modus operandi em las operaciones de blanqueo de capitales” uma vasta tipologia das técnicas de lavagem de dinheiro, que inclui jogos de azar, contratos fictícios, uso das mais diversas operações financeiras, atividades simuladas no mercado de valores mobiliários, manejo de meios de pagamento pela internet, de seguro e inúmeros outros. Nenhuma delas consiste no ato de retardar a transferência de um bem por parte do corruptor ativo para o corruptor passivo. 
Considerar a ausência da transferência do imóvel um ato de ocultação significa reconhecer que todos os casos de corrupção passiva em que o corruptor não transfere a vantagem indevida ao corrompido por qualquer motivo deveriam ser punidos em concurso com lavagem de dinheiro. Não parece correto sob o aspecto da tipicidade, nem sob uma perspectiva politico-criminal. 
Por isso, não parece haver lavagem de dinheiro no caso Lula. 
[1] BOTTINI, Pierpaolo e BADARO, Gustavo. Lavagem de dinheiro. 3ª ed., p.32. Blanco Cordero, El delito de blanqueo de capitales, 3. ed. Cap. I, 3, Caparrós, Eduardo A Fabián, El delito de blanqueo de capitales, p. 50, Callegari, Lavagem de dinheiro, 45.
[3] GÁLVEZ BRAVO, Rafael. Los modus operandi em la operaciones de blanqueo de capitales, 2ª ed., Barcelona: Bosch, 2017, p.46 
Pierpaolo Cruz Bottini é advogado, sócio do escritório Bottini e Tamasauskas e professor livre-docente de Direito Penal da Faculdade de Direito da USP.
GGN

terça-feira, 9 de maio de 2017

A parcialidade de Moro e a ruína do sistema penal

A parcialidade de Moro e a ruína de todo o sistema penal inscrito na Constituição

Se na interpretação da lei, o intérprete pudesse chamar de crime o que não é crime, de prova o que não é prova, de imparcialidade o que não é imparcialidade... ruiria todo o sistema penal inserido na Constituição.
  
Por outro lado, é certo que se pode interpretar a lei, de modo a arredar a inconstitucionalidade ou suprir eventual lacuna. Mas interpretar interpretando e, não, mudando-lhe o texto e, menos ainda, criando algo novo, que a lei não criou e a constituição não permite. (texto baseado na lógica do Ministro Luiz Galotti, em voto proferido no RE 71758/GB)*

A impossibilidade de restrição de garantias individuais conforme expresso no texto constitucional.

A proteção dada aos direitos e garantias individuais, pela CF/88, é tamanha que seu art. 60, impede que o Congresso Nacional, o Presidente da República ou as Assembleias dos Estados(cada uma delas pela maioria de seus membros)  possam, até mesmo deliberar acerca de eventual supressão, quanto mais efetivar a retirada de algum direito ou garantia individual.

Art. 60.  (omissis)§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda tendente a abolir: (omissis) IV - os direitos e garantias individuais.

Entretanto, sistematicamente, nos processos contra o ex-Presidente Luís Inácio Lula da Silva, estes direitos e garantias, normas fundamentais, passaram a ser solenemente transgredidas ou simplesmente ignoradas.

Segue, abaixo, alguns conhecidos exemplos de tais arbitrariedades.

A transgressão absoluta. Um crime não albergado em nenhum lugar do mundo.

Em nenhum lugar do mundo, se concebe que o governante maior seja espionado e tenha suas conversas divulgadas de acordo com a vontade do interceptador (no caso, um juiz de primeira instância).

O mundo amanheceu perplexo e, até mesmo o Ministro do Supremo Tribunal Federal Marco Aurélio Mello, demonstrou toda sua contrariedade:  Marco Aurélio Mello: Ele não é o único juiz do país e deve atuar como todo juiz. Agora, houve essa divulgação por terceiros de sigilo telefônico. Isso é crime, está na lei. Ele simplesmente deixou de lado a lei. Isso está escancarado e foi objeto, inclusive, de reportagem no exterior. Não se avança culturalmente, atropelando a ordem jurídica, principalmente a constitucional. O avanço pressupõe a observância irrestrita do que está escrito na lei de regência da matéria. Dizer que interessa ao público em geral conhecer o teor de gravações sigilosas não se sustenta. O público também está submetido à legislação. (http://www.sul21.com.br/jornal/moro-simplesmente-deixou-de-lado-a-lei-is)..

- CF/88, art. 5º, inciso XXXVII - não haverá juízo ou tribunal de exceção;

Por ocasião do julgamento de ação promovida pela Presidente Dilma Roussef em relação a interceptação e quebra do sigilo de suas comunicações, mormente enquanto maior mandatária do país, foi sintomática a decisão do TRF4, que analisou o tema sob a ótica do Estado de Exceção, como foi corajosa e brilhantemente exposto pelo desembargador Rogério Favreto:

O único voto contrário ao do relator partiu do desembargador Rogério Favreto que considerou inadequada a invocação da teoria do estado de exceção, sustentada por Eros Roberto Grau em alguns votos no Supremo Tribunal Federal e reivindicada pelo relator para a adoção de “soluções inéditas”. “O Poder Judiciário deve deferência aos dispositivos legais e constitucionais, sobretudo naquilo em que consagram direitos e garantias fundamentais. Sua não observância em domínio tão delicado como o Direito Penal, evocando a teoria do estado de exceção, pode ser temerária se feita por magistrado sem os mesmos compromissos democráticos do eminente relator”, assinala Favreto.

O desembargador sustenta que Sérgio Moro transgrediu a Lei 9.296/1996 ao determinar o levantamento do sigilo de conversas captadas em interceptações telefônicas. “A lei não autoriza ao contrário, veda expressamente ­ a divulgação do teor de diálogos telefônicos interceptados. Ante o regramento explícito, não cabe evocar o interesse público ou a prevenção de obstrução à justiça como fundamentos para publicizar conversas captadas”, diz Favreto. Além disso, acrescenta, o juiz Moro descumpriu normativa do Conselho Nacional de Justiça, expressa na Resolução n° 59, artigo 17: “Não será permitido ao magistrado e ao servidor fornecer quaisquer informações, direta ou indiretamente, a terceiros ou a órgão de comunicação social, de elementos contidos em processos ou inquéritos sigilosos”.( https://rsurgente.wordpress.com/2016/09/26/desembargador-critica-adocao-de-estado-de-excecao-pelo-judiciario/)

- CF/88, art. 5º, inciso XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal;

Em vários campos, emergem evidentes inconstitucionalidades, como a referente a “prisão” sem fundamento legal ou constitucional, denominada eufemisticamente condução coercitiva. Nesse sentido temos a lição do eminente jurista Lênio Streck  (professor de direito constitucional e pós-doutor em Direito, Procurador de Justiça aposentado).

Vimos um espetáculo lamentável na sexta-feira, 4 de março. Este dia ficará marcado como “o dia em que um ex-presidente da República foi ilegal e inconstitucionalmente preso por algumas horas”, sendo o ato apelidado de “condução coercitiva”. Sem trocadilho, tucanaram a prisão cautelar.

Nem preciso dizer o que diz a Constituição acerca da liberdade e sobre o direito de somente se fazer alguma coisa em virtude de lei, afora o direito de ir e vir. Todo o artigo 5º da CF pode ser aplicado aqui.

Mas, em um país em que já não se cumpre a própria Constituição, o que é mais uma rasgadinha no Código de Processo Penal, pois não?  Há dois dispositivos aplicáveis: o artigo 218 (caso de testemunha) e 260 (caso de acusado — Lula é acusado? Lula é indiciado? Lula é testemunha?) do Código de Processo Penal diz que

Art. 218 - A testemunha regularmente intimada que não comparecer ao ato para o qual foi intimada, sem motivo justificado, poderá ser conduzida coercitivamente.

Art. 260 - “Se o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer ato que, sem ele, não possa ser realizado, a autoridade poderá mandar conduzi-lo à sua presença”. Parágrafo único: “o mandado conterá, além da ordem de condução, os requisitos mencionados no artigo 352, no que lhes for aplicável”.

Ora, até os minerais sabem que, em termos de garantias, a interpretação é restritiva. Não vale fazer interpretação analógica ou extensiva ou dar o drible hermenêutico da vaca.  A lei exige intimação prévia. Nos dois casos.  (Lênio Streck - http://www.conjur.com.br/2016-mar-04/streck-conducao-coercitiva-lula-foi...)

- CF/88, art. 5º, inciso LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes;

Até mesmo em questões básicas e que seriam até corriqueiras, há evidente e indisfarçável cerceamento de defesa, dois deles chamaram a atenção nestes últimos dias, por um motivo singelo, no processo penal, principalmente, não se concede a realização de atos tendentes a concretizar a defesa (que, no caso, foram reconhecidos como pertinentes pelo referido juiz), sem que se deem os meios para realiza-los, pois o contrário seria o mesmo que negá-los.

Pois bem, o primeiro refere-se a imposição direcionada a Lula, para que este fosse obrigado a presenciar o depoimento de todas as testemunhas arroladas por sua defesa (num total de 86), o que o obrigaria a praticamente deixar de fazer toda e qualquer atividade para se deslocar para Curitiba e assistir as audiências da oitiva. Neste caso, interposto recurso pela defesa, por ser algo tão aberrante, o Tribunal Regional Federal da 4ª Região, Juiz Nivaldo Brunoni, sem outra saída, deferiu o pedido para que o ex-Presidente não necessitasse comparecer.

Em que pese não ser objeto de insurgência na presente impetração, deve-se anotar, a título de contextualização, que no sistema processual vigente o juiz é o destinatário da prova e pode recusar a realização daquelas que se mostrarem irrelevantes, impertinentes ou protelatórias, conforme previsão do art. 400, §1º, do Código de Processo Penal.

De fato, a ampla defesa não pode ser confundida com a possibilidade de realização de todo e qualquer ato processual que pretenda, mesmo que sem qualquer utilidade prática. Ampla defesa não é o que a defesa quer, mas o que pode fazer à luz da concretização de todos os princípios constitucionais no processo penal. Portanto, não está em jogo apenas a ampla defesa, mas também o devido processo legal (que é devido pra ambas as partes), em que um dos princípios reguladores também é a celeridade processual. (PACELLI, Eugênio e FISCHER, Douglas. Comentários ao Código de Processo Penal e sua Jurisprudência, 5ª ed., São Paulo: Atlas, 2013, p. 860).

Cabendo ao julgador o indeferimento de provas que, a seu juízo, são desnecessárias para a formação de seu convencimento, não haveria óbice à limitação do número de testemunhas. Alternativamente, é facultado ao juiz condutor da causa, diante das circunstâncias do caso, ampliar o rol de testemunhas.

2. Assim colocadas tais premissas, não parece razoável exigir-se a presença do réu em todas as audiências de oitiva das testemunhas arroladas pela própria defesa, sendo assegurada a sua representação exclusivamente pelos advogados constituídos. Sobre o tema, já se manifestou este Tribunal em julgado da E. 7ª Turma, assim ementado:

Omissis... (TRF4, 'HABEAS CORPUS' Nº 2008.04.00.020693-2, 7ª TURMA, Juiz Federal MARCOS ROBERTO ARAUJO DOS SANTOS, POR UNANIMIDADE, D.E. 30/07/2008, PUBLICAÇÃO EM 31/07/2008).

O acompanhamento pessoal do réu à audiência das testemunhas é mera faculdade legal a ele conferida para o exercício da auto-defesa, podendo relegá-la em prol da defesa técnica constituída, sobretudo quando não residir no local da sede do juízo onde tramita o processo.

Nesse aspecto, o caso ora tratado não guarda semelhança com a necessidade de comparecimento pessoal do réu para o seu interrogatório pessoal, cuja ausência injustificada poderia, inclusive, acarretar-lhe a decretação de revelia. Desse modo, em se tratando de réu devida e notoriamente representado, mostra-se desnecessária a sua presença pessoal nas audiências de depoimento das testemunhas por ele arroladas.

3. Assim, tendo em conta o princípio da intervenção mínima necessária no exame das medidas cautelares, tenho que não há prejuízo ao prosseguimento da instrução processual, deferindo-se a liminar exclusivamente com relação ao pedido subsidiário para dispensar o paciente do comparecimento pessoal às audiências de oitiva das testemunhas defesa.
  
O outro caso, ainda pendente de apreciação, consiste no indeferimento de prazo mínimo, razoável e proporcional, para que a defesa tenha acesso a um volume considerável de documentos, com os quais pretende provar a inocência de seu cliente.

O pedido, apesar de manifesta contrariedade, acabou por ser deferido, sob a justificativa que poderia ensejar pedido de nulidade por cerceamento de defesa. Não obstante tal constatação, agora, anexados os documentos aos autos, e constituindo-se estes em um enorme emaranhado de documentos, acontece o imponderável, não é concedido um tempo razoável para aferição do conjunto probatório. Neste sentido a Nota da Defesa de Lula:

Documentos da Petrobras que a defesa do ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva pede desde 10/10/2016, quando foi apresentada sua primeira manifestação na Ação Penal nº 5046512-94.2016.4.04.7000/PR, foram levados - em parte -ao processo  somente nos dias 28/04/2017 e 02/05/2017, por meio digital. A mídia apresentada perfaz 5,42 gigabytes e foi levada aos autos sem índice e de forma desorganizada. Há cerca de 5 mil documentos (técnicos, negociais e jurídicos) e são estimadas cerca de 100 mil páginas.

É materialmente impossível a defesa analisar toda essa documentação até o proximo dia 10, quando haverá o interrogatório do ex-Presidente e será aberto o prazo para requerimento de novas provas (CPP, art. 402). Sequer a impressão foi concluída a despeito da contratação de uma gráfica para essa finalidade. Mas o juízo da 13ª Vara Federal de Curitiba negou prazo adicional por nós requerido e também negou a entrega do restante da documentação não apresentada, contrariando sua própria decisão anterior e o compromisso assumido pela Petrobras em audiência de disponibilizar tudo o que havia sido solicitado.

A negativa do juiz causa inequivoco prejuizo à defesa de Lula, pois a acusação faz referência a 3 contratos firmados entre a Petrobras e a OAS e ao processo de contratação que o antecedeu, mas somente algumas peças foram anexadas à denúncia após terem sido selecionadas pelo Ministério Público Federal.

- CF/88, art. 5º, inciso LX - a lei só poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa da intimidade ou o interesse social o exigirem;

- CF/88, art. 93, inciso IX.  todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)

Por fim, nesta breve síntese, em relação às últimas medidas, tendentes a impedir que haja atos a favor do acusado Luis Inácio Lula da Silva, vemos a negativa ao direito de manifestação por parte do Judiciário.

Ora, o direito de manifestação encontra sua essência no fundamento democrático da liberdade, do direito de ir e vir e de defender suas opções, sem grades ou repressão, apenas o desejo/direito de ter  voz e de ser ouvido/ouvida, é sem dúvida o mais delirante exercício da democracia, e, na ausência dele (ou sua proibição) resta apenas o totalitarismo e a barbárie das ditaduras.

O direito de defesa...  A quem cabe acusar, a quem cabe defender... a quem cabe julgar

A supressão de garantias, tais como estão sendo feito pela República de Curitiba – que age como um só bloco monolítico – Ministério Público Federal, Juiz Sérgio Moro e Polícia Federal, não cabe no nosso ordenamento jurídico que define claramente no texto Constitucional que dispõe que o Ministério Público é o titular da Ação Penal Pública, apenas a ele, cabe neste caso, precipuamente a tarefa de denunciar, ao Juiz, no caso, Sergio Moro, destinatário das provas e denúncia da acusação, bem como das alegações contrárias e contraprovas da defesa, cabe analisar e julgar em conformidade com o ordenamento legal e constitucional se a acusação é procedente.

Entretanto, no caso, o Juiz age com nítido propósito acusatório, sendo tal conduta de tal forma explícita ,que mesmo a grande mídia esquece que ele deveria agir como Juiz e não como parte, e o coloca como contendor frente ao acusado (Lula), se constituindo tal atitude,  que no direito se chama fato notório (que dispensa comprovação), em fundamento legal para seu afastamento do processo.

Tal conduta deveria inevitavelmente levar  a seu impedimento para julgar a demanda, uma vez que, ao agir como parceiro do Ministério Público, desveste-se do hábito de julgador e perde a isenção e imparcialidade necessárias para exerceu suas atribuições.

Da Constituição Federativa da República do Brasil – preambulo.

Ante tais fatos, acima brevemente relatados, vemos, não sem uma tristeza profunda, que todo o humanismo, solidariedade e generosidades insertos na Constituição Brasileira, estão sendo atacados em sua essência, e, se nada fizermos para confrontarmos todas estas forças desumanas e bárbaras, nada restará do que um dia foi chamado Brasil, nem mesmo o riso que se pretendia ouvir e ver estampado no rosto de nossas crianças.

Constituição Federal da República Federativa do Brasil

PREÂMBULO
 Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em Assembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDERATIVA DO BRASIL

*Texto tradicional sobre direito tributário, que contém uma passagem excepcional e que serve como uma luva para as interpretações e subversões da norma legal pelo juiz Sérgio Moro.

Trecho do Voto do Ministro do STF, Luiz Galotti, proferido no RE 71.758/GB, há 45 (quarenta e cinco) anos, mais precisamente em 14 de junho de 1972, no qual, em síntese, ele formula uma proposição que, mutatis mutandi  (mudando o que deve ser mudado) contrapõe toda a aplicação do direito na forma que o Moro esta usando:

“É certo que podem interpretar a lei, de modo a arredar a inconstitucionalidade. Mas interpretar interpretando e, não, mudando-lhe o texto e, menos ainda, criando um imposto novo, que a lei não criou.

Como sustentei muitas vezes ainda no Rio, se a lei pudesse chamar de compra o que não é compra, de importação ou que não é importação, de exportação ou que não é exportação, de renda o que não é renda, ruiria todo o sistema tributário inserido na Constituição.”

Do GGN