Uma
notícia publicada hoje em La República, diário peruano, coloca uma dúvida a
mais nos métodos da Lava Jato.
A
notícia "Jueza de Andorra, uma valiosa
aliada" fala sobre a colaboração entre o Ministério Público local
e o de Andorra[1],
que permitiu mapear os subornos da Odebrecht no país.
A
reportagem cita o advogado Rodrigo Tacla Durán, apresentando-o como
"colaborador" da justiça de Andorra.
Segundo
o diário, Tacla Durán se converteu em um dos principais informantes da juíza de
instrução Canólic Mingorance. Ao diário, ele declarou que a Odebrecht subornou
mais de mil pessoas na América Latina, de todos os partidos, de esquerda e
direita, do governo e da oposição. E não apenas políticos.
A
partir das informações de Duran, a reportagem narra o modo de operação do
grupo. Havia um sistema de comunicação para não deixar nenhum rastro na
movimentação do dinheiro, nem obrigar os funcionários beneficiados a se
locomover até Andorra. Os encontros eram na Espanha, França e mesmo em Lima.
O
BPA cobrava comissão e registrava as transações em uma contabilidade paralela,
através da offshore panamenha Landstreet.
As
informações de Duran ajudaram a rastrear as atividades do BPA no Panamá e no
Uruguai.
Tacla e a Lava Jato
Nenhuma
dessas informações interessou à Lava Jato.
Duran
começou a trabalhar com a Odebrecht em 2007. Quando estourou a Lava Jato, foi
trabalhar na defesa da companhia, tendo acesso a documentos que não poderiam
ser informados para qualquer advogado. Fez parte de uma equipe da casa,
incumbida de uma triagem prévia dos documentos.
Nesse
trabalho, aprendeu o modo de operação do marqueteiro João Santana.
Segundo
sua versão, Santana era marqueteiro da Odebrecht, não de Lula ou de outros
presidentes latino-americanos.
A
Odebrecht vendia pacote: financio sua campanha, obras são importantes para
plano de governo e vamos buscar recursos em bancos de desenvolvimento. E
forneço o marqueteiro e os recursos de campanha.
O
depoimento de Duran não interessou à Lava Jato, por fugir da narrativa criada,
de colocar Lula no centro do esquema.
Ele
chegou a ser procurado pelo procurador Roberto Pozzobon. Em uma reunião a dois,
Pozzobon o teria informado sobre o teor do depoimento que seria aceito em um
acordo de delação premiada, assim como a punição. Tacla não aceitou.
Ele
se pretendia apresentar apenas como um colaborador que prestava serviços à
Odebrecht. A Lava Jato pretendia enquadrá-lo no centro de um esquema em que transitava
dinheiro de várias empreiteiras.
As
relações com a Lava Jato azedaram de vez e, para não ser preso, Tacla fugiu
para a Espanha, onde estava protegido pela dupla cidadania.
No dia 11 de abril de 2017 foi denunciado
por práticas na Petrobras.
A guerra de informações
Desde
então, Tacla resolveu encarar a Lava Jato. Alegou estar sendo perseguido por
não aceitar a narrativa que tentavam lhe impor.
Da
Espanha, vazou um projeto de livro, onde denunciava o advogado Carlos Zucoloto
Junior de lhe propor facilidades junto à força-tarefa, redução das multas
impostas, mediante o pagamento de R$ 5 milhões por fora.
Para
surpresa geral, antes que Zucoloto se pronunciasse, o amigo Sérgio Moro saiu em
sua defesa, sustentando que não se poderia confiar na palavra de um réu – como
se toda a Lava Jato não tivesse sido montada em cima de delações de réus
confessos.
Logo
depois, foi divulgado pela revista Veja documento da Receita Federal na qual se
vê que o escritório de Tacla tinha como correspondente em Curitiba o escritório
do qual são sócios Carlos Zucoloto Junior e Rosângela Moro, respectivamente
primeiro amigo e esposa de Sérgio Moro.
Pelo
que consta, o escritório tornou-se correspondente de Tacla há tempos, para
tratar de temas de interesse em Curitiba, terra de sua mãe, onde havia alguns
conflitos por herança.
A
guerra das informações prosseguiu com matérias do Estadão tentando
desqualifica-lo, algumas delas baseadas em artigos publicados pelo site Altaveu.com, de Andorra, do proprietário do
banco BPA, denunciado por ele.
No
dia 18 de setembro passado, Sergio Moro solicitou ao Ministério Público
Federal, no âmbito do tratado de cooperação com a Espanha, a intimação par
Tacla responder a uma ação penal:
Expeça
a Secretaria pedido de cooperação jurídica internacional tendo por base o
Acordo de Cooperação e Auxílio Mútuo em Matéria Penal entre a República
Federativa do Brasil e o Reino da Espanha celebrado em 22/05/2006 e promulgado
no Brasil pelo Decreto no 6.681, de 08/12/2008.
Por
meio dele solicite-se a citação de Rodrigo Tacla Duran para responder à ação
penal com prazo de dez dias para apresentar resposta.
Solicite-se
ainda a intimação para comparecimento em audiência no prazo de 10 dias úteis
perante este Juízo para viabilizar a continuidade da ação penal, sob pena de
revelia.
A
intenção de Moro seria manter o caso sob seu controle absoluto. O pedido foi
indeferido pelo Tribunal de Audiencia Nacional da Espanha. Tacla poderia ser
processado pelas autoridades espanholas, “desde que sejam enviados os meios de
prova necessários para que seja dado início à persecução penal naquele país”,
conforme ofício endereçado ao procurador Deltan Dallagnol pelo procurador
Douglas Fischer, Secretário de Cooperação Internacional da PGR.
Para
alcançar o intento, Moro teria que apresentar mais do que delações contra
Tacla. Sem provas, a justiça espanhola não atenderá a Moro.
Aliás,
pela clara impossibilidade do pedido ser acatado, a impressão que ficou é que Moro
pretendeu apenas atrasar os acordos de cooperação e Tacla com a justiça de
outros países.
Agora,
com a Justiça de Andorra aceitando-o como colaborador, fica fortalecida a
versão de Tacla, de que sua delação não foi aceita por não atender aos
objetivos políticos da Lava Jato.
GGN
[1] Situado nos Pirenéus, entre a
França e a Espanha, o Principado de Andorra é um país emocionante, com vários
resorts de esqui e trilhas espalhadas por uma região montanhosa.