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sexta-feira, 7 de dezembro de 2018

XADREZ DO INACREDITÁVEL MUNDO DOS BOLSONARO, POR LUIS NASSIF

Peça 1 – os núcleos de poder
Conforme já descrevemos em outros Xadrez, há quatro grupos iniciais de poder do futuro governo Bolsonaro.
A corte familiar, englobando os três filhos, mais os ministros ideológicos.
A núcleo militar, ocupando a infraestrutura e monitorando as ações de Bolsonaro, corrigindo cada declaração estapafúrdia.
Paulo Guedes e seus chicagos boys.
Correndo por fora, Sérgio Moro tentando fincar uma torre fora do alcance de Bolsonaro.
Peça 2 – sobre a a família Bolsonaro
Trata-se de um jogo de fácil previsão:
Bolsonaro, o Jair, é emocionalmente frágil, intelectual e socialmente dependente dos filhos.
Os filhos têm a agressividade dos toscos. Não se trata meramente de grossura. Grosso por grosso, ACM era, assim como Gilmar Mendes e outros personagens da política, mas que sabem utilizar a grossura como recurso político. Os Bolsonaro são grossos de graça, primários, valentões de rede social.
Agora, as revelações do COAF (Conselho de Controle de Atividades Financeiras) comprovam que a família compartilha hábitos comuns ao baixo clero político, de receber mesadas e dinheiro de fontes desconhecidas. Não têm escrúpulos, mas também não têm a sofisticação para as grandes tacadas.
O caso COAF foi apenas um aperitivo. A rapidez com que Carlos Bolsonaro e o futuro governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel, correram a anunciar negócios milionários com Israel, na área de segurança, mostra um apetite e uma imprudência que atropelam qualquer noção de autopreservação.
Há pistas que surgiram ao longo dos últimos tempos, mostrando ligações dos Bolsonaro com policiais ligados a milícias. Pode ser que sejam apenas apoiadores da família. Mas, com a total falta de noção dos irmãos, e com dinheiro brotando nas contas dos seguranças, reforçam as suspeitas de seu envolvimento com as milícias.
A maneira como reagiram às denúncias demonstra falta de malícia a toda prova. Indagado sobre o dinheiro recebido pelo segurança, Carlos Bolsonaro limitou-se a responder que ele é de sua estrita confiança e não há nada que o desabone. Claro que é de sua estrita confiança! Como o contador de Al Capone era de sua estrita confiança. Só faltava terceirizar operações dessa natureza para alguém que não merecesse sua confiança.
Indagado sobre o tema, Onyx Lorenzoni, o porta-voz político, limitou-se a perguntar “onde estava a COAF” nos escândalos petistas. Recorreu ao álibi universal – de se defender mencionando o PT -, sem saber que a COAF foi peça central no rastreamento do dinheiro pela Lava Jato.
O pai Jair teve comportamento pior. Depois de segurar a taça do campeonato do Palmeira com total desenvoltura, alegou recomendação médica para fugir do primeiro evento público após a divulgação da denúncia. Bateu em retirada mesmo.
Tem-se aí, portanto, um quadro de ampla vulnerabilidade para a governabilidade do futuro governo.
Peça 3 – a esperteza de Sérgio Moro
O abre-te Sésamo de Sérgio Moro continua sendo a cooperação internacional. Sua última tacada é a tentativa de induzir o Congresso a aprovar uma legislação tendo por base a resolução 1373, de 2001, do Conselho de Segurança da ONU, sobre lavagem de dinheiro e terrorismo.
Hoje a CBN diz que se o Brasil não adotar essa legislação irá para as catacumbas do inferno, perderá investimentos, dinheiro sairá do Brasil.
Explica nosso colunista André Araújo:
Resoluções da ONU são milhares, e de valor sempre RELATIVO. Alguns países cumprem, muitos nem tomam conhecimento. Os EUA usam essas resoluções quando lhes convém, quando não ignoraram completamente. Israel nem se fala, a Rússia e a China descumprem a maioria.
Essa Resolução veio no rescaldo do 11 de Setembro nos EUA e seu foco é muito mais o terrorismo do que o tráfico, corrupção, crimes financeiros. Mas como é um balaio onde cabe tudo o que se quiser colocar.
A Resolução já está rondando há mais de 15 anos, e o Brasil até agora não tomou conhecimento. A própria consultoria jurídica da ONU opinou que a resolução 1273 é ilegal dentro do direito internacional. Lia aqui: “Medidas do Conselho de Segurança contra terrorismo não têm base legal, afirma especialista independente da ONU
O Ministro Moro joga com a bandeira da ONU, na verdade ele quer  mais poder. O Brasil não está sendo pressionado pela ONU. Esse modo de usar a mão da ONU, do FMI, da OCDE, do Banco de Liquidações Internacionais como arma interna de poder é esperteza antiga.
Nos próximos meses Moro terá que enfrentar desafios bem mais complexos do que como juiz da Lava Jato. Estará sob exposição constante. E terá que demonstrar uma desenvoltura muito maior do que nos interrogatórios de réus e testemunhas.
Além disso, terá pela frente as denúncias contra aliados. Na Lava Jato havia o álibi de que o alvo único era o PT por ser ele o partido que estava no poder.
Será difícil encontrar outra narrativa para eximi-lo de atuar nas denúncias envolvendo o governo Bolsonaro.
Peça 4 – Paulo Guedes e seus chicagos boys
Paulo Guedes continua preso ao dogma de que um ajuste fiscal imediato e radical trará imediatamente os investimentos de volta. A ideologia cega o impede de pensar qualquer política anticíclica.
Esta semana, Michel Temer divulgou a relação das heranças virtuosas que deixará para o sucessor, provavelmente antes de ser preso por corrupção. Entre elas, investimentos de ordem de R$ 300 bilhões prontos para serem deflagrados.
Na verdade, a carteira de financiamentos aprovados pelo BNDES é bem maior do que essa quantia. Mas está tudo paralisado pelas loucuras cometidas pela Lava Jato do Rio de Janeiro, os atos atrabiliários contra funcionários do banco, criminalizando operações normais. O governo Temer não teve sequer a competência de destravar esses financiamentos. E, agora, os apresenta como se tivessem sido preparados em sua gestão.
Nesse ponto, a entrega da infraestrutura para os militares facilitará esse destravamento.
Mas as expectativas fantasiosas do mercado – como a de uma reforma radical da Previdência – não sairão do papel.
Tem-se, hoje em dia, um quadro complexo:
A recessão continua derrubando a arrecadação fiscal. A nova lei trabalhista, ao desestimular o emprego formal, está reduzindo drasticamente as contribuições previdenciárias e a arrecadação fiscal.
A ideia de instituir um regime de capitalização é totalmente fantasiosa. Hoje em dia o sistema é de repartição simples: isto é, a arrecadação de hoje paga os benefícios de hoje. Se a arrecadação está sendo insuficiente para a repartição simples, de onde tirará recursos para a capitalização? Por acaso irá reduzir os benefícios aos militares ou ao funcionalismo público?
A reforma ocorrida anos atrás, instituindo um regime de capitalização para novos funcionários, é a maneira correta, com os benefícios aparecendo gradativamente. Não há milagres que tragam resultados instantâneos.
As únicas medidas de resultado imediato seriam um encontro de contas com os estados, visando resolver a questão da previdência estadual. Mas dificilmente a equipe de Guedes terá imaginação criadora e convicção cartesiana para superar o ideologismo rotundo que a domina.
Peça 5 – o fator militar
A cada dia que passa, a cada declaração dos filhos, dos Ministros da cota dos Bolsonaros, mais nítido fica a falta absoluta de condições de governabilidade. Já se abriram as comportas do escândalo, apesar de todo antipetismo da mídia e do tempo de carência que, geralmente, se trata um novo governo.
Dependendo do ritmo dos escândalos, será inevitável o enquadramento final de Bolsonaro, obrigando-o a afastar os filhos e a reduzir a máquina de falar besteiras. E, pelo fato de ser o único centro de racionalidade do governo, cada vez mais os militares assumirão poder.
GGN

sábado, 13 de janeiro de 2018

O julgamento do TRF4 entrará para História por GRANDEZA ou por covardia - LAWFARE, por Leonardo Isaac Yarochewsky

Faltam poucos dias para o maior e mais importante julgamento da história do país. Nunca se viu tamanha mobilização nas ruas, na mídia e nas redes sociais. Milhões de pessoas, inclusive a imprensa estrangeira, no dia 24 de janeiro próximo voltarão seus olhos para a cidade de Porto Alegre-RS onde está sediado o TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região).
O TRF4 (Tribunal Regional Federal da 4ª Região) entrará para história por julgar em grau de apelação o ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA que foi condenado à pena de mais de 09 (nove) anos e 06 (seis) meses de prisão e multa, pelo juiz da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba – PR sem provas, mas com convicção. 
Os desembargadores Federais do TRF4 que julgarão o ex-Presidente LULA poderão entrar para história de dois modos: i) pela PORTA DA FRENTE, fazendo justiça e absolvendo LULA ou ii) pela PORTA DOS FUNDOS, por onde entram sorrateiramente os covardes e os incapazes de julgar com imparcialidade e independência. 
Porém, de qualquer forma, entrarão para história. Entrarão para história por julgarem o homem que já fez e continua fazendo história, o homem que se confunde com a própria história do país. Uma história de desigualdade e de injustiça. 
Até mesmo a TÊMIS míope seria capaz de enxergar a injustiça que representaria a manutenção da condenação do ex-presidente LULA pela "farsa do Triplex". É certo que o famigerado “Triplex do Guarujá” jamais pertenceu ao ex-Presidente LULA ou a qualquer membro de sua família. De igual modo é verdade que o referido apartamento não foi oferecido ou entregue ao ex-Presidente LULA a título de propina; 
É certo, também, que o juiz Titular da 13ª Vara Federal Criminal de Curitiba-PR em nome do processo penal do espetáculo atropelou o processo penal democrático para condenar o ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA sem qualquer prova, baseando-se tão somente em matéria jornalística, nas palavras levianas e mentirosas de coréu e nas “convicções” do Ministério Público Federal. 
Como bem asseveram WEIDA ZANCANER e CELSO ANTÔNIO BANDEIRA DE MELLO em “Comentários a uma sentença anunciada: o processo Lula”,
a sentença que condenou o ex-Presidente LULA escandaliza, desde logo, porque não só se fez sem suporte em prova, mas até mesmo, efetuou-se frontalmente contra a lei. Pretendeu-se, justifica-la atribuindo-lhe imaginosamente, a propriedade de um dado imóvel, conquanto desde logo inexistisse qualquer documento que atestasse propriedade ou ao menos posse. Acresce que a atribuição dela ao ex-Presidente fez tabula rasa da norma segundo a qual a propriedade imóvel se prova pelo registro imobiliário, diante do que, à toda evidência, sem violar tal lei, não se poder irrogá-la a outrem simplesmente por um desejo do acusador, no caso o magistrado.[1]
Mais adiante, os juristas afirmam que “também não se provou e nem ao menos se afadigou em comprovar que dita propriedade seria fruto de uma propina por facilitar um negócio com a Petrobrás”.[2]
JOÃO RICARDO DORNELLES observa que MORO na sentença condenatória afirmou que “o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva e sua esposa eram PROPRIETÁRIOS DE FATO do apartamento 164-A, triplex, no Condomínio Solaris, no Guarujá”. Fez tal afirmação, salienta DORNELLES, “embora não exista nenhuma testemunha que afirme que Lula ou a sua esposa tenham frequentado o referido imóvel”.[3]
Salienta DORNELLES que “o conceito de ‘propriedade de fato’, usado pelo juiz Moro em sua sentença, não existe no ordenamento jurídico brasileiro (...)” 
Destaca-se que na decisão em que rejeita os embargos, o juiz Federal SERGIO MORO declara que:
“jamais afirmou na sentença ou em lugar algum que os valores obtidos pela construtora OAS nos contratos com a PETROBRAS foram utilizados para pagamento da vantagem indevida para o ex-presidente (...)” Disse, ainda, o prolator da sentença que “não havia essa correlação”. 
Esses são os fatos, essa é a verdade. O resto é ilação ou, se preferirem, “mimimi”.
Desgraçadamente, em todo o famigerado processo que decorre da Operação “Lava Jato”, vem sendo utilizado táticas de aniquilamento do ex-presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA. No preciso dizer do eminente advogado CRISTIANO ZANIN MARTINS, trata-se de uma espécie de "arma de guerra", em que é eleito um inimigo e a lei passa a ser usada ou manipulada contra aquele definido como tal.
Segundo o advogado do ex-Presidente LULA, os vícios do processo permitem que se identifique no “CASO LULA” situação definida por estudos internacionais recentes como “lawfare”. Há muito LULA foi definido como o inimigo número 1 a ser banido do cenário político brasileiro.
ZAFFARONI enxerga no conceito de inimigo um vinculo estreito com o da guerra no Estado de direito o que leva ao Estado absoluto. Como já dito, o conceito de inimigo é incompatível com o Estado de Direito.  Ainda, de acordo com o jurista argentino, o que se discute em doutrina penal é a admissibilidade do conceito de inimigo no direito penal (ou no direito em geral) do Estado de direito, considerando como tal aquele que é punido só em razão de sua condição de ente perigoso ou daninho para a sociedade, que seja relevante saber se a privação dos direitos mais elementares à qual é submetido (sobretudo, a sua liberdade) seja praticada com qualquer outro nome diferente do de pena, e sem prejuízo, tampouco, de que se lhe reconheça um resíduo de direitos mais ou menos amplo.[4]
No dizer de ALFREDO SAAD FILHO, professor titular de economia política na Universidade de Londres, “Lawfare é o mau uso da lei para fins políticos e militares, geralmente apoiado pela grande mídia”.
A estratégia, batizada como "lawfare”, conforme CRISTIANO ZANIN MARTINS e WALESKA TEIXEIRA ZANIN MARTINS - advogados do ex-presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILVA - prevê, entre outras práticas, a "manipulação do sistema legal", a "promoção da desilusão popular" e a "acusação das ações dos inimigos como imorais e ilegais"- técnicas que, de acordo com os combativos advogados, estariam sendo empregada contra o ex-presidente LULA e, também, contra sua família.
Dentro desta odiosa e perversa estratégia de guerra o ex-Presidente LULA, tratado como inimigo – com violação de direitos e garantias – acabou sendo condenado por um juiz suspeito e incompetente.
Caberá agora aos desembargadores Federais do TRF4 declarar e reconhecer a inocência do ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SILV uma vez que está provado,  provado pela laboriosa DEFESA, que o “Triplex do Guarujá” jamais pertenceu ao ex-Presidente LULA ou a qualquer membro de sua família. De igual modo está demonstrado que o ex-Presidente LULA jamais recebeu qualquer valor ou bem a título de propina ou de qualquer vantagem indevida.
Assim, caso pretendam os desembargadores Federais entrar para história pela porta da frente, não existe alternativa possível senão ABSOLVER o ex-Presidente LUIZ INÁCIO LULA DA SIVLA, caso contrário, a história não os absolverá.
Leonardo Isaac Yarochewsky é Advogado Criminalista e Doutor em Ciências Penais pela UFMG. 
[1] ZANCANER, Weida e BANDEIRA DE MELLO, Celso Antônio. Condenação por imóvel: sem posse e sem domínio. In Comentários a uma sentença anunciada: O processo Lula. Carol Proner et al. (orgs.) Bauru Canal 6, 2017, p. 524-527.
[2] Idem, ibidem.
[3] DORNELLES, João Ricardo Wanderley.  O malabarismo judicial e o fim do Estado democrático de direito. In Comentários a uma sentença anunciada: O processo Lula. Carol Proner et al. (orgs.) Bauru Canal 6, 2017, p. 209-214.
[4] ZAFFARONI, Eugenio Raùl. O inimigo no direito penal. Tradução de Sérgio Lamarão. Rio de Janeiro: Revan, 2007, p. 25.
GGN

segunda-feira, 16 de outubro de 2017

A Suprema covardia do Supremo e suas conveniências, por Aldo Fornazieri

Aos golpes do oportunismo, do golpismo, da covardia, do sofismo e da falácia argumentativa, a maioria do STF derrubou a estátua da Justiça em praça pública, espatifou-a na frente da nação, rasgou a Constituição e, com ambas, estátua e Constituição, fez uma grande fogueira onde foram queimados os princípios da república, a igualdade perante a lei a punibilidade de políticos criminosos e a decência nacional. Cinco ministros, que não têm compromissos com a Constituição, mas com subserviência aos raposões corruptos do Senado, jogaram a gasolina. Carmen Lúcia acendeu o fogo e ainda jogou uma pá de cal sobre as cinzas, pintando o cinza o que já era cinza num país condenado a ser vítima de si mesmo por ser vítima de uma elite que não tem seriedade, que não tem responsabilidade e que não tem pudor.​

Carmen Lucia mostrou não ter condições de presidir um centro acadêmico de uma faculdade de direito. Para desgraça do Brasil, no entanto, preside aquilo que deveria ser a mais alta Corte Constitucional do país, cuja virtude primeira dos seus componentes deveria ser a coragem. A partir da semana passada, o STF, que já havia se curvado aos políticos da Câmara e do Senado no processo da derrubada da presidente Dilma, decidiu, em ato formal, tornar-se um poder subordinado, abrindo mão de ser a Corte que decide em última instância.

A decisão da maioria do STF fere a Constituição e não se trata de engano. Basta comparar os argumentos que os juízes usaram quando do afastamento de Eduardo Cunha e os que usaram na decisão do último dia 12. Fica claro que a maioria da Corte votou em função das conveniências políticas e não do espírito e da letra da Constituição. A OAB deveria analisar se estes cinco juízes, mais a Carmen Lucia, não cometeram crime de responsabilidade. Sob o disfarce do julgamento de uma Ação Direta de Inconstitucionalidade, o que decidiram foi o caso específico de Aécio Neves entregando ao Senado a prerrogativa de devolver-lhe o mandato. O mesmo Senado que não cumpriu a Constituição quando decidiu não investigar e não julgar Aécio.

O STF criou uma desordem constitucional. Para casos diferentes, mas com a mesma natureza jurídica, aplicou decisões ao sabor das conveniências: uma para Eduardo Cunha, outra para Delcídio do Amaral, uma terceira para Renan Calheiros e uma quarta para Aécio Neves. A sociedade não pode ter fé e respeito a um tribunal que age dessa forma.

Os magistrados deveriam dignificar o honroso cargo que receberam, alguns sem as competências e/ou as virtudes necessárias. Deveriam ser um exemplo para a sociedade e para os futuros juízes. Deveriam pensar em proporcionar biografias relevantes, pois o bom exemplo e a vida correta são os maiores bens que podemos deixar nesta vida. Mas quem não tem dignidade não pensa em biografia.

Um dos fundamentos adotados pela maioria do Supremo sustenta a tese de que somente os representantes podem decidir acerca de um mandato que emana da soberania popular. Para manter uma coerência lógica, as decisões que afetarem vereadores, deputados estaduais e governadores também precisariam de um aval da Casa legislativa correspondente sempre que uma decisão judicial afetar um mandato.

O STF se tornou um dos principais fomentadores da crise institucional. Note-se a absurda argumentação de Dias Tofoli: "O Supremo Tribunal Federal não pode atuar, portanto, como fomentador de tensões constitucionais, o que ao meu ver viria a ocorrer caso se suprimisse do poder Legislativo o legítimo controle político de restrições de natureza processual penal que interferem no livre exercício do mandato parlamentar".

A argumentação é absurda porque parte de um pressuposto falso: o STF deve julgar segundo a Constituição e não segundo se causa ou não causa tensões constitucionais. Ademais, em nenhum país  democrático o Legislativo tem a prerrogativa de fazer o controle político de restrições de natureza processual penal. Mesmo no processo de impeachment de um presidente, o Senado se transforma em tribunal para julgar politicamente, cabendo ao STF julgar a matéria de natureza penal.

A violação da Constituição
Para que uma Constituição seja democrática e republicana precisa fundamentar-se em alguns pressupostos: nenhum poder é ilimitado, nem mesmo a própria Constituição; Estado de Direito significa poder limitado, valendo isto para os três ramos do poder; os três poderes estão submetidos a uma relação de controles mútuos, de pesos e contrapesos, não existindo um poder soberano sem controle a acima dos outros; definidas as funções específicas de cada poder, com ingerências parciais um no outro, cabe ao tribunal constitucional as decisões últimas em matéria penal e no controle da constitucionalidade.

Uma Corte ou um tribunal constitucional são supremos exatamente porque têm a prerrogativa das decisões finais, indicadas no último item acima. Se não for assim, a Constituição deixa de ser  republicana e democrática. Foi este atentado, foi este crime contra a Constituição, que a maioria do STF perpetrou. A Corte constitucional tem a faculdade de interpretar o direito em vigor, a Constituição, as leis do Legislativo, com uma autoridade que estabelece uma obrigação constitucional dos outros dois poderes.

A prerrogativa de interpretação de uma Corte constitucional, porém, não é aberta e infinita. Ela tem dois limites: 1) a própria Constituição; 2) os princípios fundantes da Constituição republicana e democrática que não podem ser ultrapassados pelo poder constituinte soberano, por uma Corte Constitucional ou pelo poder que tem a prerrogativa de emenda constitucional - no caso, o Congresso. A maioria do STF violou a Constituição ao permitir que a Câmara e o Senado adquiram funções judiciais e possam tomar decisões finais acerca de atos delituosos de deputados e senadores.

O Brasil vive hoje uma situação insuportável do ponto de vista político, institucional e moral. Do ponto de vista político, o sistema e as instituições estão sem legitimidade e desacreditados junto à sociedade. Do ponto de vista institucional, há um  golpe em andamento, um presidente ilegítimo, o Congresso desacreditado com dezenas de políticos denunciados e um STF que viola a Constituição e não faz aquilo que as suas prerrogativas determinam. Do ponto de vista moral, o Brasil é governando por um presidente denunciado duas vezes e por um governo criminoso, que destrói os fundamentos éticos, as condições de futuro do país e  afronta a dignidade das pessoas.

O STF precisa responder à sociedade como é possível que o país seja governando por um presidente e por um governo sobre os quais recaem, não acusações vagas, mas provas evidentes de que se trata de entes delinquenciais. Nenhum país do mundo, minimamente sério e democrático, teria um governo que é expressão de inominável indignidade. O STF precisa responder à sociedade como é possível que ministros delinquentes continuam ministros; como é possível que  deputados e senadores corruptos continuam em seus cargos.


Deputados e senadores só são invioláveis, civil e penalmente, pelas suas opiniões, palavras e votos, diz a Constituição. Não o são por atos criminosos. Quando cometem crimes, precisam ser punidos na mesma condição dos demais cidadãos. Se não for assim, isto é contra os fundamentos e os princípios da Constituição. Se em algum lugar a Constituição garante proteção a políticos criminosos, isto é contra os fundamentos Constituição e o STF precisa pronunciar-se e adotar providências. Se não é assim, a nossa Constituição não é nem democrática e nem republicana. É uma Constituição refém de covardes, de sofistas e de corruptos.

GGN

segunda-feira, 9 de outubro de 2017

Covardia do STF ou golpe do Senado?, por Aldo Fornazieri

Nos próximos dias a política brasileira se moverá em torno da seguinte disjuntiva: covardia do STF ou golpe do Senado. O pano de fundo será o destino do mandado de Aécio Neves. Não que o STF já não tenha dado sinais de covardia ao permitir violações da Constituição, particularmente no caso do impeachment ilegal, sem crime de responsabilidade, contra Dilma Rousseff. O Senado também já se mostrou golpista, ao sacramentar o mesmo impeachment ilegal. Na hipótese de o STF mostrar alguma dignidade e manter Aécio afastado de seu mandato, se o Senado vier a sustar tal decisão, estaria perpetrando um segundo golpe, mergulhando as instituições numa crise sem precedentes, abrindo mais uma porta para os reclamos de uma intervenção militar.​
A suspensão do mandato de Aécio Neves vem suscitando enorme polêmica, inclusive no âmbito dos setores democráticos e progressistas, como foi o caso da desastrada nota da direção do PT, que criticou a decisão do STF de afastá-lo do mandato. Tudo isto mostra o grau de confusão mental, política, moral e teórica que vários políticos, jornalistas, analistas e juristas brasileiros estão metidos - uns por oportunismo e interesses, outros por incompreensão da natureza dos impasses e da crise.
A primeira confusão está na própria Constituição, no artigo 2º, que define que os poderes da União - Legislativo, Executivo e Judiciário - são independentes e harmônicos entre si. Não há como entender os fundamentos de uma constituição de um país democrático republicano presidencialista sem entender os princípios que deram origem à Constituição norte-americana, que é a matriz dessa tipologia de constituições. Quem estudou os Federalistas sabe que a relação entre os poderes não é harmônica, mas conflitiva, baseada numa relação de equilíbrios, pesos e contra-pesos, na qual, cada um dos poderes, tem meios de ataque e de defesa em relação aos outros. A ideia da harmonia é uma ideia bastarda, tipicamente brasileira, herdeira da ideologia da conciliação, que é uma ideologia da dominação das elites.
Em segundo lugar, a relação entre os poderes não é de independência absoluta, tendo cada um, um âmbito de ingerência parcial nos outros, exercendo de forma moderada e marginal, funções dos outros, sem descaracterizar a natureza específica das funções de cada um. Assim, é perfeitamente legítimo que as Supremas Cortes, no caso o STF, exerçam algum âmbito de função legislativa. Em terceiro lugar, não há nenhuma dúvida de que em matéria constitucional, as Supremas Cortes têm a última palavra, não cabendo nem ao Executivo e nem ao Legislativo avocar para si qualquer função revisora de uma decisão de uma Corte Constitucional. Além de decidir sobre conflitos constitucionais em última instância, uma Corte Constitucional pode preencher lacunas constitucionais. Foi isso que a Suprema Corte dos EUA fez no caso do aborto e que o STF fez no caso do casamento homoafetivo, dentre vários ouros casos.
A constitucionalidade da suspensão do mandato de Aécio Neves
Se há alguém que violou a Constituição, no caso do mandato de Aécio Neves, é o próprio Senado. Antes de tudo, é preciso observar que a imunidade parlamentar se refere apenas a opiniões, palavras e votos, conforme define o artigo 53 da Constituição. Na medida em que Aécio cometeu crimes comuns e feriu o decoro parlamentar, deveria perder o mandato por uma decisão do Senado. Quando sequer o Senado abre um procedimento na Comissão de Ética em face de atos  tão graves cometidos pelo senador, há uma evidente violação da Constituição por parte desta Casa. Neste caso, é preciso que o Supremo exerça o controle constitucional. Se a Constituição veda a perda do mandato por uma decisão do STF, ela não proíbe a suspensão do mandato para salvaguardar a moralidade pública e o espírito e a letra da Constituição em face de grave omissão do Senado.
Ademais, o artigo 102 da Constituição, alínea b, afirma que compete ao STF processar e julgar, originalmente "nas infrações penais comuns, o Presidente da República, o Vice-Presidente, os membros do Congresso Nacional, seus próprios Ministros e o Procurador-Geral da República". Então, acabou. A Constituição está acima do Senado e do próprio Supremo. E ela diz que cabe ao Supremo a própria guarda da Constituição.
Em matéria penal, não cabe ao Senado interferir,  pois isto viola a Constituição. Nenhum político e nem mesmo um ministro do Supremo pode estar isento de punição. Isto significa que nenhum senador, nenhum deputado e nem mesmo o presidente da República, nos casos de crimes comuns, podem ser protegidos pelo Senado, pela Câmara dos Deputados ou pela Presidência da República para isentar-se de responder juridicamente pelos seus crimes.
O golpe do Senado
Se o STF tiver coragem e dignidade, manterá a suspensão do mandato de Aécio Neves. Caso contrário, será coberto de opróbrio, de ignomínia e de vergonha eterna pela sua covardia e pela sua capitulação aos interesses corruptos do Senado. Manter a suspensão do mandato de Aécio, além de ser constitucional, significa enfrentar os marajás da corrupção incrustados no Senado. Significa confrontar os patriarcas do atraso, os supressores de direitos sociais, os denegadores da democracia, os sacramentadores do golpe.
Admitindo a hipótese de que resta um lampejo de coragem e de virtude ao STF, mantendo a suspensão do mandato de Aécio, se o Senado revisar esta decisão, será um golpe brutal no sentido e no conceito de República e na Constituição. Significa que o Senado se transformará em Supremo Senado da Federal, um poder usurpador e com uma soberania equivalente à dos monarcas absolutos que não eram passíveis de responder criminalmente e que, pela sua suposta descendência divina, eram irresponsáveis, penal e politicamente. Se o Senado fosse um poder politicamente soberano, com prerrogativa de revisão constitucional e decisão política em última instância, então, o impeachment de Dilma não teria sido golpe.
Na República Democrática não existem poderes soberanos e ilimitados. A soberania, pertencente ao povo, se expressa na Constituição. A própria Constituição é limitada e ela não pode ser modificada por nenhum poder constituinte de forma absoluta, pois ela precisa expressar um Estado de Direito. Este Estado significa que o poder deve ser limitado pelos direitos dos cidadãos e que estes não podem ser passíveis de supressão. Se o Senado confrontar o STF significa que ele se auto-instituirá como um poder político supremo e soberano. Este tipo de poder tem nome: é uma ditadura, seja ela conduzida por um general, por um ditador, por um corpo colegiado ou mesmo por um Senado.
O que se espera dos partidos progressistas (PT, PSol, PC do B, Rede, PDT, PSB etc.) é que não dêem um passo em falso se esta questão do mandato de Aécio vier a ser decidida no Senado. É preciso manter uma coerência democrática, republicana e anti-golpista. Manter Aécio Neves no Senado é uma indignidade, uma violação da Constituição, assim como é manter Temer na presidência da República. Nenhum cálculo político e eleitoral pode justificar qualquer condescendência com esses dois políticos abjetos. O aventureirismo político de Aécio foi a origem da desorganização da democracia e do próprio golpe.
Aldo Fornazieri - Professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP).

 GGN