quarta-feira, 30 de junho de 2021

UM DIA DE CÃO PARA O GOVERNO BOLSONARO QUE SE DIZIA INCORRUPTÍVEL, POR FERNANDO BRITO

O governo Jair Bolsonaro está feito barata-tonta desde o final da semana passada, quando o deputado Luís Miranda e seu irmão denunciaram irregularidades na compra das vacinas indianas Covaxin e que delas estaria ciente Jair Bolsonaro.

Para um presidente desastroso e crescentemente rejeitado, foi atingir sua alegação remanescente de legitimidade, ironicamente comemorada há dez dias, em meio a manifestações por todo o país com aquele “900 dias sem corrupção” em que se auto-louvava.

Ainda assim, a noite de ontem só foi comparável à de sexta-feira, na qual os Miranda entregaram o nome do líder do Governo na Câmara, Ricardo Barros, como dono do “rolo” das vacinas superfaturadas.

Vale repassar o que ocorreu.

Até à tarde, havia danos, mas limitados.

O único fato novo era a terceira versão oficial sobre a reação oficial à denúncia. Agora, se dizia que Bolsonaro teria mandado Eduardo Pazuello apurar o que se passava e este teria repassado a missão a seu Secretário Executivo, o coronel Élcio Franco, que teria, em 24 horas, concluído que tudo estava correto. Isolada, a história já estaria mal contada e fica absolutamente inverossímil depois que o próprio Élcio, ao lado de Onyx Lorenzoni, disse que tudo era uma invenção dos Miranda, a partir de um documento falso que, em seguida, provar-se-ia verdadeiro e presente no sistema eletrônico do Ministério.

À tardinha, mais uma confissão de culpa: a ordem para suspender a compra da Covaxin, dada por Bolsonaro, através do Ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, e pelo chefe da Controladoria Geral da União, Wagner do Rosário.

Logo a seguir, a aparente “boa notícia”, com a manifestação da Procuradoria Geral da República para que se deixasse em “banho maria” a notícia crime apresentada contra o presidente por senadores, sugerindo que se esperasse o fim das investigações da CPI para investigar a ocorrência de prevaricação nas atitudes de omissão diante da denúncia de irregularidades. A questão é que há um conteúdo não escrito, mas perceptível: O Procurador Augusto Aras deixou uma espada pendurada sobre Bolsonaro, para ser indicado ministro do STF.

Veio, então, a bomba na reportagem de Constança Rezende, na Folha, uma história que vai abrir novas galerias nos esgotos abertos da compra de vacinas, na qual o representante de uma empresa comercializadora de medicamentos teria ouvido o pedido de “um dólar por dose” feito pelo Diretor de Logística do MS, Roberto Dias, um indicado pelo PP de Ricardo Barros, para alimentar o bolso do “grupo”.

A demissão imediata de Dias, em outras circunstâncias uma rejeição a desonestidades, veio apenas carimbar a realidade de que havia um esquema de coleta de vantagens nas compras de medicamentos, que sobrevive e se amplia desde que Barros foi ministro de Michel Temer e, depois, passou a ser homem forte de Bolsonaro.

Daqui a pouco, começa a sessão da CPI e será votado o requerimento da presença do vendedor que teria sido achacado por Dias na sexta-feira, que será outra cena dantesca. A seguir, outro espetáculo de horrores, com o depoimento do cínico empresário bolsonarista Carlos Wizard, que está diretamente envolvido com os negócios de compra de vacinas por empresas privadas, da qual Ricardo Barros foi um dos grandes agentes.

Tijolaço.

terça-feira, 29 de junho de 2021

AS ESPERTEZAS DE PAULO GUEDES COM O IMPOSTO DE RENDA, POR LUIS NASSIF

Foto: Marcello Casal Jr/Agência Brasil

Paulo Guedes é malaca – expressão que o mercado emprega para os muitos espertos.

Prometeu uma reforma tributária. Em uma ponta, aumentaria as faixas de isenção do Imposto de Renda Pessoa Física. Na outra, reduziria a tributação nas Pessoas Jurídicas.

Onde está a malandragem? Em uma esperteza matemática primária.

As faixas da tabelado imposto de renda são um valor nominal; ao contrário das alíquotas, que são percentuais fixos.

Explico.

1. Na tabela do IRPF, a primeira faixa corresponde a R$ 1,164,01.

2. Se a inflação for de 10% no ano, por exemplo, as faixas precisam ser corrigidas pelo mesmo percentual, para preservar o valor real da isenção. Se não é reajustado, o reajuste da renda, visando apenas manter o mesmo poder aquisitivo, passa a ser tratado como aumento real, sendo tributado. O que Paulo Guedes propõe é aumentar a faixa de isenção de R$ 1.903,98 para R$ 2.500,00, um reajuste de 31%.

Confira, abaixo, estudo feito pelo Sindifisco. A faixa de isenção deveria estar em R$ 4.022,89, para manter o valor real. Ou seja, muito acima do que o reajuste proposto por Guedes.

A tabela em seguida permite algumas leituras.

1. O que se paga a mais de Imposto de Renda, devido ao não reajuste da tabela do Imposto de Renda. Uma renda de R$ 5 mil mensais paga R$ 432,36 a mais.

2. Veja na última coluna, o que representa esse valor a mais sobre a renda do contribuinte. O sub-reajuste afeta mais a renda média de R$ 5.000,00. A partir daí, vai caindo o percentual sobre a renda. A partir de valores maiores, o aumento é percentualmente ínfimo. Se se quisesse justiça fiscal, teria que se criar alíquotas maiores para as últimas faixas de renda.

3. Confira que, a partir de R$de 20.000,00 o aumento de tributação é fixo, em R$ 967,50. Ou seja, quanto maior o salário, menor será o impacto do aumento de tributação devido ao sub-reajuste da tabela.

Portanto, o tal plano Paulo Guedes para Pessoa Física é uma miragem. Bastaria segurar o reajuste por alguns anos, com inflação média, para o presente ser devorado.


GGN.

segunda-feira, 28 de junho de 2021

CLIMA DE VALE-TUDO TOMA CONTA DO GOVERNO, POR FERNANDO BRITO

O Brasil supera a capacidade criativa de qualquer ficcionista.

Nos jornais de segunda-feira, tem-se a impressão que se deve trazer para a cobertura o ‘jornalismo de celebridades’, porque a CPI da Covid abriu as cortinas para situações constrangedoras de toda a espécie, no melhor (ou pior) coquetel de séries de TV: sexo, dinheiro e poder.

O Globo sai na frente, com a história de que as ameaças da ex-mulher de Eduardo Pazuello de depor na CPI seriam provocadas pelo relacionamento que teria com uma jovem tenente-médica do Exército, a qual teria nomeado para alto cargo na Saúde. Seria, diz a jornalista Malu Gaspar, a redatora da nota do Ministério que prescreve cloroquina para Covid.

Já Ricardo Noblat diz que arquivos dos processos do Ministério estão sendo furiosamente apagados por temor de que, logo, logo, baixem por lá policiais federais para operação de busca e apreensão de documentos relativos a compra de vacinas, e não só as indianas.

Em todos os jornais, fecha-se o cerco sobre Ricardo Barros – figura cuja trajetória é um sumário de culpa – e assume-se que o deputado Luís Miranda tem nas mãos uma gravação da conversa em que o presidente aponta Barros como o autor de “rolos” na Saúde. Tenha ou não o áudio, só o fato de usar a ameaça de sua existência como “salvo conduto” diante das ameaças bolsonaristas mostra que, gravado ou não, o teor da conversa era aquele.

Do contrário, o estilo Bolsonaro seria o de desafiar a que se mostrasse o áudio.

Mas ele está, ainda, imóvel, diante de um mecanismo que não controla e que o espreme pela perda do poder e eternizar-se no comando do país. E que percebe estar dirigido para usar a sua deposição como fórmula desesperada de criar uma alternativa eleitoral ao favoritismo de Lula

Não ficará assim, é claro.

É preciso deixar os fatos se sucederem sem que isso nos leve para o meio deles.

Tijolaço.

domingo, 27 de junho de 2021

“CABOS” ELEITORAIS. E SOLDADOS, SARGENTOS, OFICIAIS… HIERARQUIA PARALELA, POR FERNANDO BRITO

“Isenção de IPI na compra de automóveis, crédito imobiliário e promessas de uma nova lei orgânica da Polícia Militar e da Polícia Civil para esvaziar o poder dos governadores. Essas são medidas com as quais o presidente Jair Bolsonaro busca garantir apoio dos policiais para sua campanha à reeleição em 2022 (…). Bolsonaro também nutre planos de politizar e aumentar a representatividade das forças estaduais no Congresso”.

A chamada de capa do Estadão elenca o que sempre foi um sonho deste governo: a manipulação política das forças de segurança, um terreno fértil não apenas para conseguir-se cabos eleitorais, mas, literalmente, além deles, soldados, sargentos e oficiais que sigam uma hierarquia paralela, onde os interesses mútuos – deles e do presidente – se sobreponham aos seus deveres e cadeias de comando regulares.

Numa palavra: pronto a agirem como um partido político e a amotinarem-se em defesa do que acham serem direitos – e também privilégios – devidos em razão de seus “méritos”.

Bolsonaro, acenando com vantagens, estimula o mesmo comportamento que o caracterizou quando era um simples tenente que planejava explodir bombas em latrinas de quartéis para conseguir aumentos de soldo. Fora, claro, dos aumentos “informais” que acha legítimo, com as atuações paralelas em organizações de segurança e esquemas milicianos.

Mas não é só: a reportagem de Vinícius Valfré e Felipe Frazão escancara a distribuição de cargos a policiais para usá-los como trampolins para futuros mandatos parlamentares e o uso das próprias instalações policiais para a “pré-campanha” presidencial. Não existiu nenhum governo no Brasil, mesmo no final do regime militar, que praticasse aquilo que o atual vice-presidente, general Hamilton Mourão: que, nos quartéis, “se entra política pela porta da frente, a disciplina e a hierarquia saem pelos fundos”.

Com um detalhe deprimente: já nem são os quartéis do Exército, Marinha e Aeronáutica, mas nos da PM e delegacias de polícia, que se espraiam pelas ruas permanentemente, ao contrários dos

Ao se reerguer a democracia brasileira – contra os perigos e ameaças que isso tem trazido – será obrigatório lançar mão de freios à ocupação da política pelos servidores públicos que, em nome do Estado, dispõe dos poderes de repressão, sejam juízes, promotores, militares ou policiais.

Não se trata de retirar-lhes os direitos políticos, inclusive os de serem votados. Mas de estabelecer, como a todos que usufruem de poderes acima do que tem qualquer cidadão, quarentenas até que possam separar o que fazem em nome da sociedade do que significa representá-la.

Até algum tempo atrás, a autocontenção de seus atos era o sugiciente para fazer disso uma questão menor. Já não é mais, a menos que queiramos, em pleno século 21, viver sob um estado policial.

Tijolaço.

sábado, 26 de junho de 2021

BOLSONARO EM PERIGO PODE RESULTAR EM STF COM DEZ MINISTROS, POR FERNANDO BRITO

Mais do que nunca, Jair Bolsonaro precisa manter o controle da Procuradoria Geral da República, garantindo que ela continue neste sua configuração sonolenta e que não se atreva a pretender instaurar apurações em que ele figure como investigado e que, portanto, possam vir a resultar em pedidos a que a Câmara dos Deputados decida se aceita ou não denúncia para processarr o presidente da República.

Para quem se esqueceu, foi o que Michel Temer, com centrão e com tudo, teve de enfrentar em duas ocasiões pelos fatos que surgiram com a gravação e as delações de Joesley Batista. Foram votações apertadas : 263 a 227 na primeira votação e 251 votos a 233, na segunda, ambas em 2017.

E é claro que terá muito peso a ambição pública do Procurador Geral Augusto Aras em ocupar uma cadeira no Supremo conduzir o Caso Covaxin com muito cuidado para não expor Bolsonaro a, pelo menos, um “mini-impeachment”: os 180 dias legais para a apuração, no caso de o STF aceitar a denúncia, depois de autorizada pela Câmara, em caso de crimes comuns (artigo 86 da Constituição).

E seria Aras quem poderia denunciá-lo. Substitui-lo, fosse por quem fosse, seria um risco adicional.

Mantê-lo, porém, nomeando outro para a cadeira que Marco Aurélio Mello deixará vazia logo, é quase o mesmo que fazer Aras dizer adeus à cadeira que almeja no STF e o recalque, todos sabem, é conselheiro de traições.

Pode ser, assim, que Bolsonaro atrase a indicação ao Senado do novo ministro, deixando que os apetites continuem a estimular fidelidades.

Mas, para isso, é preciso que creiam que ele pode ganhar as eleições e que, por isso, o Senado aceite um nome “terrivelmente terrível” para a Suprema Corte. Ou três, porque com o segundo mandato Bolsonaro teria a chance de encher de nulidades a Suprema Corte.

Tijolaço.

XADREZ DOS JOGOS DE PODER EM TORNO DO IMPEACHMENT DE BOLSONARO, POR LUÍS NASSIFF

Dois episódios recentes, fundamentais, ditarão os cenários políticos futuros: as últimas pesquisas, mostrando a probabilidade de Lula ser eleito no 1o turno; o escândalo Biontech-Covaxim, expondo as relações políticas e de negócios entre a família Bolsonaro (representada por Flávio) e o Centrão (representado pelo líder do governo Ricardo Barros.

Entenda.

PEÇA 1 – A ECONOMIA, O MOMENTO E O FUTURO

A pesquisa reflete o momento, os desastres continuados de Bolsonaro no combate à pandemia, seus arroubos e a permanência da crise econômica.

Há um conjunto de fatores pela frente, com vistas a 2022, cujos desdobramentos são de difícil aferição:

Recuperação relativa da economia – aumento das commodities, recuperação relativa da ociosidade da indústria poderão melhorar os indicadores de PIB. Por outro lado, permanece o enorme exército de desempregados.

Inflação em alta – a inflação está sendo pressionada pela soma de alta internacional das commodities e desvalorização cambial. Os últimos movimentos, de apreciação do câmbio poderá reduzir um pouco a pressão. Mas a elevação dos preços comprimiu as margens das empresas. Por isso, é pouco provável que a apreciação do câmbio se reflita sobre os preços.

Alta nos juros – a irracionalidade da política de metas inflacionárias levou o Banco Central a promover nova rodada de alta de juros, com impacto na recuperação da economia .

Efeitos da vacinação – em tese, deveria reduzir a incidência do Covid-19. Mas há sinais claros de entrada da terceira onda da pandemia, em um momento em que parcela pequena da população foi completamente vacinada.

Crise energética – a partir do segundo semestre haverá racionamento de energia ou, nos dizeres do governo, racionalização do consumo da energia. Haverá impacto óbvio nas tarifas de luz, impactando o Índice de Preços ao Consumidor Ampliado e, também, o custo de produção das empresas.

Há uma probabilidade menor de recuperação da economia. Mas há que se considerar que qualquer melhoria, por mais discreta que seja, muda relativamente os humores do eleitorado.

Os próximos movimentos políticos se darão em torno desse jogo de dados sobre o potencial eleitoral de Bolsonaro.

PEÇA 2 – A CRISE DA BHARAT BIOTECH

A sucessão de escândalos em torno da vacina, obrigará as instituições a tomarem posição. Bolsonaro está se tornando insustentável. O que o mantém são apenas os cálculos em relação a 2022, pela dificuldade de se avaliar os desdobramentos do que vier a acontecer.

1. Se Bolsonaro é mantido no cargo, chegará a 2022 como uma ameaça de continuidade. Essa perspectiva reforçará a ideia do pacto em torno de Lula, afastando a viabilidade da terceira via.

Pelo contrário, se Bolsonaro cai, há dois movimentos subsequentes.

2. O primeiro, a tentativa do Partido Militar de se recompor em torno do vice-presidente Hamilton Mourão. Impressiona pelo eventual potencial golpistas, jamais por fôlego político.

3. A segunda, a tentativa de empinar a candidatura de um terceira via, da centro-direita autoritária, com probabilidade de ser Ciro Gomes.

Uma terceira possibilidade – menor – seria o bom senso baixar em um país e se manter a ideia de um pacto mais amplo, ensaiado a partir do encontro de Fernando Henrique Cardoso e Lula.

PEÇA 3 – AS DISPUTAS POLÍTICAS

Nos últimos meses, esvaíram-se os últimos ecos da Lava Jato. Sérgio Moro foi jogado no lixo da história sem choro nem vela. Deltan Dallagnol, que um dia julgou se tornar mais popular que Lula, não provoca comoção nem em seu antigo exército de robôs vingadores. No TRF-3, as últimas eleições afastaram de cargos de comando os principais desembargadores avalistas de Sérgio Moro. No Supremo, Luiz Edson Fachin queda e Luis Roberto Barroso se cala, esboçando alguma ação apenas na defesa do voto eletrônico. Mas o Supremo, como um todo, avança para segurar os esbirros autoritários de Bolsonaro.

Em todo esse movimento, foi mantido incólume a espinha dorsal da corrupção brasileira, o Centrão, a mais espúria força política do período pós-Constituinte. O grupo assumiu postos relevantes no governo FHC, quando houve a crise da energia, no governo Lula, depois do “mensalão”. E, quando extirpado do governo Dilma, promoveu o impeachment. 

Ontem, a CPI confirmou o que o GGN vem antecipando há semanas: o papel do Centrão e do líder do governo, deputado Ricardo Barros (PP-PR) no caso Covaxin-Biotech, talvez o maior escândalo da história da República, devido ao envolvimento direto do presidente da República no episódio.

O oportunismo da Lava Jato e Sérgio Moro de atuarem como atores políticos, acabou poupando o Centrão, com exceção do breve interregno da prisão de Michel Temer e da condenação de Eduardo Cunha. Nada aconteceu com Eliseu Padilha, Wellington Moreira Franco, Fernando Bezerra, Ricardo Barros.

Agora, o episódio liga o Centrão, articulado por Ricardo Barros, diretamente ao esquema Bolsonaro, representado por seu filho Flávio Bolsonaro. Ontem, a revista Veja mostrou que Flávio teve reunião virtual com o presidente do BNDES para interceder pelos donos da Precisa, a distribuidora de medicamentos por trás do escândalo Covaxim-Biontech.

O episódio pega a centro da corrupção política brasileira, com desdobramentos imprevisíveis. De qualquer modo, acendeu uma luz para iluminar o futuro. Daqui para frente, o desmanche do Centrão entra no foco de qualquer reforma política futura. E será peça central para a disputa em torno do impeachment de Bolsonaro.

PEÇA 4 – AS DISPUTAS ECONÔMICAS

O ponto central, para o pós-Bolsonaro, é a disputa econômica. O extraordinário poder acumulado pelo lobby financeiro levou  à tragédia atual. Valeram-se da crise do governo Dilma para impor o início do desmanche do Estado brasileiro, com a “ponte para o futuro”, a destruição de qualquer veleidade de estado social, com Lei do Teto, reforma da Previdência e reforma trabalhista e os obscuros negócios da privatização. E mantiveram intocado o controle do mercado sobre a política econômica

Nos próximos meses, no embalo das novas formações políticas, visando o pós-bolsonarismo, ficarão mais nítidas as diferenças entre a centro-esquerda progressista e a centro-direita liberal. Ambas tratarão de avançar em discursos sociais. A diferença é que a centro-direita se limitará a demonstrações de bom mocismo, preservando a extraordinária concentração de renda no país, a continuação do desmanche do Estado e a privatização de estatais estratégicas.

Haverá consenso apenas em relação às políticas de saúde, educacional e de renda básica.

PEÇA 5 – OS PROVÁVEIS ATORES POLÍTICOS

O próximo tempo político provavelmente será ocupado por Lula e Ciro Gomes. O restante é perfumaria, Mandetta, Sérgio Moro, Dória, Huck.

Lula é o negociador nato, com todas as vantagens e desvantagens dessa posição. No grande pacto que pretende montar, como ficariam as relações com o mercado? Mudaria as políticas de câmbio e juros? Conseguiria implementar suas bandeiras de desenvolvimento social com as restrições monetárias e fiscais? A necessidade de manter a governabilidade permitiria reconstruir parte do estado social destruído? 

Tem a vantagem de um acervo de experiências bem sucedidas, e de experimentos mal sucedidos – com as lições de como corrigir erros. E, certamente, conseguirá reverter os maiores exageros do período Paulo Guedes, fortalecendo novamente as representações de trabalhadores, da indústria e do setor real.

Mas o grande pacto do passado – PT e PSDB – hoje é apenas simbólico, representado pelo encontro FHC-Lula, depois que o PSDB derivou irremediavelmente para a direita.

Ciro Gomes é um camaleão político de viés autoritário. Com exceção da idoneidade e do melhor preparo intelectual, é parecido com José Serra. Fareja determinadas bandeiras, de nicho ou mais amplas, e incorpora em seu discurso, sem se preocupar muito com a coerência.

Por exemplo, no auge dos abusos da Lava Jato, chegou a afirmar que, se sua casa fosse invadida, como foram as de tantas outras vítimas – inocentes ou não – da Lava Jato, receberia Moro à mala. Agora, vendo a bandeira do punitivismo sem dono, incorpora o moralismo exacerbado da Lava Jato, pretendendo herdar os lavajatistas órfãos.

No início do Real, tornou-se um defensor ultra-radical das políticas de câmbio e juros. Depois, se tornou um crítico visceral da política de câmbio e juros. Nos últimos tempos, de crítico severo de FHC tornou-se admirador.

Percebeu que o desenvolvimentismo estava órfão de candidatos e se aproximou dos principais pensadores. Depois, se tocou que a Terceira Via estava sem candidato e tratou de empinar seu papagaio em direção a ela e ao mercado. E, agora, soma seu caráter bélico a João Santana, marqueteiro especializado em destruir adversários e responsável pelos momentos mais ilegítimos da campanha de Dilma Rousseff e radicaliza um antipetismo anacrônico e iracundo.

O que seria o presidente Ciro? Em relação à economia manteria o desenvolvimentismo ou negociaria com o mercado? Qual seria reação teria se medidas suas fossem contidas pelo Supremo? A única certeza é que, pelo seu temperamento, jamais se abriria para a sociedade civil, movimentos sociais, associações empresariais, corporações públicas, fórum de prefeitos e governadores, já que é dono de convicções mutantes, porém inabaláveis em cada etapa da mudança.

Em suma, mesmo após o pesadelo Bolsonaro, há um longo caminho para a conquista da democracia e do pacto em torno de um projeto de desenvolvimento social.

GGN.

sexta-feira, 25 de junho de 2021

SEGUNDO PESQUISA IPEC LULA VENCERIA NO 1° TURNO; RESTA BOLSONARO ESPERNEAR PARA NÃO SE DISSOLVER

Estava evidente e foi assinalado aqui, ontem à tarde que se a pesquisa de aprovação (e, sobretudo, de reprovação) do governo, se tivesse um capítulo sobre intenções de voto, não há dúvida que revelará um cenário onde o favoritismo de Lula vai esboçando uma decisão em primeiro turno.

E, de madrugada, vieram os números do Ipec, o ex-Ibope, devastadores tanto para Bolsonaro quando para os crentes da “Terceira Via”, apontando uma vitória, folgada, de Lula no 1° turno.

Os 49% que ele registra, convertidos em percentagens sobre os votos válidos, equivale a 59% para o ex-presidente, mais do que qualquer candidato petista teve em quaisquer das eleições presidenciais em toda a história.

E em tendência forte de alta, enquanto Bolsonaro mingua em todas as áreas do eleitorado. Mesmo nos recortes onde se sai melhor, não chega a um terço do eleitorado.

Ciro e Dória, como mostra a ilustração, continuam encruado em índices miúdos e, pior, ver mesmo isso se dissolver no crescente antibolsonarismo do eleitor, ansioso por dar fim a esta experiência malograda para o país.

Mandetta, o lanterninha entre os cinco nomes medidos na pesquisa, segue firme na sua cruzada para ser candidato a vice ou garantir uma eleição à Câmara ou Senado como campeão de votos, e talvez fora do Mato Grosso do Sul, onde enfrentaria problemas de espaço com seus sempre patrocinadores, a família Trad.

A pesquisa vai levar Bolsonaro a uma nova onda de agressividade antilulista, a forma que tem de segurar seus decrescentes eleitores.

E Lula?

Lula sabe que ainda não é hora de sacudir o seu favoritismo em praça pública, embora sinta-se cada vez mais atraído por mergulhar no rio Estige, aquele onde Aquiles foi banhado para tornar-se invulnerável.

Sabe, porém, que precisa proteger seu calcanhar – a ainda resistente ideia de que tem rejeição pela onda de ódio que dispensava argumentos.

Vai deixar que a força gravitacional que sua liderança folgada siga desagregando os blocos de resistência que ainda existem e, ao contrário, vá somando apoios dos quais irá precisar, se não para ganhar, para governar um país em ruínas.

Tijolaço.

quinta-feira, 24 de junho de 2021

LULA ESTÁ PERTO DE NÃO TER PROCESSOS NA JUSTIÇA, POR FERNANDO BRITO

A decisão de Gilmar Mendes de estender a dois outros processos da “Lava Jato” a declaração de suspeição de Sérgio Moro: além do caso do “triplex” de Guarujá, também os do “Sítio de Atibaia” e o do “terreno do Instituto Lula”. Na 13ª Vara Criminal de Curitiba, resta apenas o que tenta incriminá-lo por doações ao Instituto Lula, negócio privado, igual aos realizados pelo Instituto Fernando Henrique Cardoso, que não tem bases sólidas para prosperar, mas que não teve participação direta de Sergio Moro, embora estivesse lá a turma de Deltan Dallagnol.

Todas estas acusações, se o MP quiser retomar, terão de ser iniciadas do princípio, com o oferecimento de denúncia e em outras varas, porque sobre a do Paraná sobrevive a decretação de incompetência territorial afirmada por Luiz Edson Fachin e referendada pelo pleno do STF.

Em resumo, deixaram de existir.

Há boas chances de que Lula vá à disputa eleitoral sem ser réu em nenhum processo.

Seu melhor advogado, hoje, chama-se Sérgio Fernando Moro, o ex-herói maldito, o homem que levou Jair Bolsonaro ao poder.

Na decisão que estendeu a nulidade por suspeição de suas decisões nos processos de Lula, Gilmar Mendes assume claramente este veredito:

“O último fato indicativo da perda de imparcialidade do magistrado consiste no fato de haver aceitado o cargo de Ministro da Justiça após a eleição do atual Presidente da República, Jair Bolsonaro, que há muito despontava como principal adversário político do paciente. Sergio Moro decidiu fazer parte do Governo que se elegeu em oposição ao partido cujo maior representante é Luiz Inácio Lula da Silva. O ex-juiz foi diretamente beneficiado pela condenação e prisão do paciente”.

Quem pode, hoje, descrer que Moro tenha sido o mentor de um delírio que fez o Brasil entrar na desventura Bolsonaro?

Ou de que Lula é o remédio, ainda que amargo para alguns, para este pesadelo?

Tijolaço.

O DOCUMENTO ‘FALSO’ ESTÁ NO SISTEMA DO MINISTÉRIO DA SAÚDE, PORTANTO, É REAL, POR FERNANDO BRITO

O jornal O Globo publicou, agora há pouco, a prova de que é mentira a alegação feita ontem por Onyx Lorenzoni de que o documento apresentado pelo servidor Luis Ricado Miranda e por seu irmão, o deputado Luís Miranda e entregue por ambos a Jair Bolsonaro seria forjado.

O documento está no sistema de documentação do Ministério da Saúde e contém exatamente o que os Miranda alegavam: a nota é de uma outra empresa, o pagamento está consignado como “adiantado” e diz que os 300 mil frascos (3 milhões de doses) seriam despachados ao longo do mês de abril.

Ontem, Lorenzoni e o coronel Élcio Franco disseram que o documento era “falso” e iam pedir perícia sobre ele.

Todos os documentos mostrados por ambos como sendo os verdadeiros são posteriores ao dia 20 de março e, portanto, são eles que podem ter sido produzidos para darem cobertura a uma tentativa de encobrimento de negócios ilícitos.

Aliás, há o registro de uma “retificação” posteiror da “nota fiscal” das vacinas.

É provável que acabe acontecendo – que vergonha! – uma ação de busca e apreensão nos computadores do Ministério, para a coleta de documentos relativos à compra da Covaxin.

E certo de que Onyx seja convocado a depor e a narrar de onde lhe apareceu a história da “falsa falsidade” do documento que exibiu em pleno Palácio do Planalto.

Tijolaço.

ENTENDA A CRISE DA COVAXIN, COM PREÇOS EXORBITANTES, ATRAVESSADORES, TRAIÇÃO E REVOLTA

Documentos mostram suposto esquema de corrupção dentro do governo na compra de imunizantes indianos.

Deputado Luis Miranda (DEM-DF) ao lado de Jair Bolsonaro, no dia em que o parlamentar alega ter apresentado provas da fraude ao presidente - Reprodução/Twitter.

O cerco está se fechando e a Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) da Covid já começa a fazer importantes descobertas sobre supostas negligências e casos de corrupção na contenção da pandemia do novo coronavírus no Brasil. A mais importante delas até agora foi sobre as suspeitas de irregularidades na compra das doses da vacina indiana Covaxin pelo governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

A suspeita é de que o governo brasileiro teria pago um valor total de R$ 1,6 bilhão para receber 20 milhões de doses da Covaxin. De acordo com documentos obtidos pela CPI, o valor de US$ 15 - o equivalente, nesta quinta-feira (24), a R$ 73,98 - por dose da vacina ficou muito acima do preço inicial, de US$ 1,34, cerca de R$ 6,61.

Em agosto, o Itamaraty recebeu um telegrama da embaixada brasileira em Nova Délhi, dizendo que a vacina tinha o preço estimado em US$ 1,34 por dose. No entanto, em fevereiro, o Ministério da Saúde, que era liderado pelo general Eduardo Pazuello na época, concordou em relação a um pagamento de US$ 15 por unidade. Na cotação da época, o equivalente a R$ 80,70, fazendo com que esse fosse o imunizante mais caro de todos os seis que foram comprados pelo Brasil até o momento.

:: Brasil pagou 1000% a mais em vacina indiana que valor informado por embaixada no país ::

Em seu depoimento à CPI, Pazuello disse que um dos motivos para que o Brasil recusasse 70 milhões de doses da Pfizer em 2020 seria o preço exorbitante da vacina. No entanto, ela tinha sido oferecida por US$ 10, o equivalente a metade do valor que estava sendo cobrado aos governos dos Estados Unidos e da Inglaterra.

Além disso, nesta terça-feira (22), foi revelado, pelo deputado federal Luis Miranda (DEM-DF), irmão de Luís Ricardo Fernandes Miranda, chefe da divisão de importação do Ministério da Saúde, que teria sido alertado sobre o esquema de fraude na negociação entre o Ministério da Saúde e a empresa Precisa Medicamentos para a compra de doses do imunizante, que é produzido pelo laboratório indiano Bharat Biotech.

Os documentos que provam a fraude também teriam sido levados pessoalmente ao próprio presidente no dia 20 de março pelos irmãos. O encontro, no entanto, não consta na agenda de Bolsonaro. Mas Miranda, em seu perfil no Twitter, publicou uma foto ao lado de Bolsonaro e afirmou que ambos falaram sobre “assuntos que são importantes para o Brasil”.

Antes de se encontrar com o presidente, ele enviou mensagens a um assessor de Bolsonaro falando sobre um “esquema de corrupção pesado” dentro do Ministério da Saúde para a aquisição das vacinas.

“Tenho provas e testemunhas. (...) Não esquece de avisar o PR [presidente]. Depois não quero ninguém dizendo que implodi a República. Já tem PF e o c****** no caso. Ele precisa se antecipar”, afirmou o parlamentar nas mensagens. Logo depois, afirmou que “estava a caminho”.

Ainda de acordo com o deputado, Bolsonaro teria prometido acionar a Polícia Federal para investigar o caso. Porém, nem ele e nem a PF deram um retorno ao parlamentar, como alegou o próprio. Na manhã desta quarta-feira (23), Luis Miranda falou à CNN que “o presidente sabia que tinha crime naquilo". O parlamentar ainda destacou que o caso é “gravíssimo: tem desvio de conduta, invoice [nota fiscal] irregular, pedido de pagamento antecipado que o contrato não previa, quantidades diferentes".

Em um depoimento ao Ministério Público Federal em 31 de março, Luis Ricardo disse que sofreu uma pressão inusitada para assinar o contrato de importação do imunizante. O servidor da pasta teria citado o tenente-coronel do Exército, Alex Lial Marinho, que foi coordenador-geral de Logística de Insumos Estratégicos, como responsável por pressionar a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) a aprovar a importação. O relato, anexado ao inquérito do MPF, foi enviado aos parlamentares da CPI, que irão escutar os irmãos na próxima sexta-feira (25).

Francisco Emerson Maximiano, sócio da empresa Precisa Medicamentos, que representa o laboratório indiano Bharat Biotech, foi convocado para comparecer à CPI nesta quarta-feira (23). Mas justificou sua ausência de última hora e disse que não compareceu devido ao cumprimento de isolamento social, uma vez que chegou da Índia no dia 15 de junho. 

Enquanto Luis Miranda dava entrevista à CNN, o senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), vice-presidente da comissão, afirmou em suas redes sociais que a CPI solicitou segurança ao deputado, irmão e outros familiares. “As informações que o deputado está declinando à imprensa e que trará a esta CPI, são de extremo interesse público. Sua vida e a de sua família precisam estar resguardadas”, afirmou Rodrigues.

O contrato com a empresa foi fechado antes de a Anvisa dar o aval para a importação, no dia 25 de fevereiro. A aprovação, no entanto, só veio no último dia 4, e com restrições: somente o uso dos quantitativos e sob condições controladas, determinadas pela própria agência. 

Anteriormente, no dia 31 de março, o órgão regulador já havia negado os pedidos de uso emergencial e importação tanto para a vacina, por falta de documentação sobre segurança e eficácia. Até o momento, nenhuma dose da Covaxin chegou ao Brasil.

Depois de o caso ser revelado, o ministro da Secretaria-Geral da Presidência da República, Onyx Lorenzoni, atacou o deputado federal Luis Miranda e seu irmão durante coletiva de imprensa convocada às pressas, no Palácio do Planalto, nesta quarta-feira (23).

Onyx afirmou que o presidente ordenou a abertura de um procedimento administrativo disciplinar contra o irmão do deputado e propôs à Procuradoria-Geral da República (PGR) que o parlamentar e o familiar sejam investigados por supostamente adulterar documentos.

"Luis Miranda, Deus está vendo. Mas o senhor não vai só se entender com Deus, vai se entender com a gente também. E vem mais. O senhor vai explicar e o senhor vai pagar pela irresponsabilidade, pelo mau-caratismo, pela má-fé, pela denunciação caluniosa e pela produção de provas falsas", disse Onyx.

Durante o pronunciamento, o ministro esteve ao lado do coronel Elcio Franco, ex-secretário-executivo do Ministério da Saúde na gestão do general Eduardo Pazuello. Os jornalistas não foram autorizados a fazer perguntas. Os dois negaram as acusações de fraude na compra da vacina.

Onyx disse ainda que Luis Miranda teria falsificado provas apresentadas durante a série de entrevistas concedidas na manhã desta quarta-feira. Exaltado, iniciou seu discurso citando trecho bíblico, dizendo que luta "contra forças espirituais do mal".

::Quem é Onyx Lorenzoni, perdoado por Moro, da Bancada da Bala e braço direito de Bolsonaro::

"Quero começar lembrando o Efésios 6:12. 'Porque nossa luta não é contra sangue e carne, mas contra principados as potestades. Contra os dominadores, sob mundo tenebroso. Contra forças espirituais do mal'. Quanto mal tentou o deputado Luis Miranda construir hoje contra o senhor Jair Messias Bolsonaro", declarou.

"Quero lembrar aqui que este governo está no 30º mês sem nenhum caso de corrupção e assim continuará. Gostem ou não, somos diferentes, muito diferentes deles. Nosso compromisso é com o povo brasileiro. Compreendemos a pressa para se apegar a qualquer coisa dita por qualquer pessoa sem nenhum filtro, sem nenhuma análise, desde que esse qualquer ataque ao presidente da República", continuou.

Na sequência, disse que as acusações de Luis Miranda podem ser enquadradas como crime: "Quero alertar ao deputado Luís Miranda que o que ele fez é uma denunciação caluniosa e isso é crime tipificado no Código Penal. O coronel Elcio Franco vai participar para demonstrar tecnicamente com documentos e a verdade. Como sempre, ela é o farol que guia o governo presidido por Jair Bolsonaro".

Depois do pronunciamento de Onyx, Elcio Franco fez uma breve apresentação em que isentou Bolsonaro ou o próprio Ministério da Saúde de responsabilidade no caso. Ele reforçou que os pagamentos não foram feitos. A informação, no entanto, logo foi contestada pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP). Segundo o integrante da CPI da Pandemia, a nota de empenho do Ministério da Saúde estava pronta e o pagamento só não foi efetivado por causa das denúncias.

Em seu Twitter, Luis Miranda rebateu dizendo: “Cobramos no dia 20/03, 22/03, 23/03 e 24/03, e tenho certeza que tomou a melhor decisão para travar, tanto que até hoje não efetuou nenhum negócio. Então porque me atacar com fake news através do Onyx? Só tentei combater uma possível corrupção. Deus sabe da verdade”.

Antes, ele disse ainda: “Diga a verdade presidente Jair Bolsonaro, e que de fato estivemos com o Senhor dia 20/03 e denunciamos uma irregularidade na aquisição da Covaxin e que o Senhor deu o devido tratamento ao caso, conforme informou que o DG da PF receberia os documentos ainda no dia 20/03”.

E também falou: “Presidente Jair Bolsonaro, você fala tanto em Deus e permite que eu e meu irmão, sejamos atacados por tentarmos ajudar o seu governo, denunciando para o Senhor indícios de corrupção em um contrato do Ministério da Saúde! Sempre te defendi e essa é a recompensa”? 

Brasil de Fato.

FERNANDO BRITO: A “VERDADE CORPORATIVA’ AGORA É ARGUMENTO JURÍDICO?

Encerrou-se o julgamento da parcialidade de Moro, na prática já decretada em abril, quando o STF formou maioria pela suspeição do ex-juiz nas ações contra o ex-presidente Lula.

Restaram as últimas manifestações do morismo e a dele próprio, umas e esta baseadas no que eles próprios não percebem ser tão parciais quanto estúpidas, argumentos arranjados para, tal como ocorre nas suspeições, declaradas ou não, justificar convicções desprovidas de razão.

Veja-se a primeira, brandida pelo presidente do Supremo, Luís Fux.

O eixo de sua argumentação é a de que não houve prejuízo para a defesa do ex-presidente pelo fato de que o processo tenha corrido na incompetente 13ª Vara Criminal de Curitiba, caracterizado o bordão jurídico do pas de nullité sans grief (“não há nulidade sem prejuízo para defesa ou acusação”, numa interpretação obtusa artigo 563 do Código de Processo Penal), tanto é, disse, que cumprimentava a defesa de Lula por sua pertinaz atuação.

É uma rematada estupidez, como seria dizer que um corredor, usando um cinto de 10 quilos de chumbo à cintura, vencendo uma corrida, não teria prejuízo por aquele peso extra apenas porque conseguiu disputar com os adversários. É óbvio que o peso o prejudicou, sem embargo de ter sido competitivo.

É fácil e até intuitivo demonstrar que a incompetência da vara de Moro, afinal reconhecida, depois de cinco anos e pico de questionada continuamente pela defesa, ter sido prejudicial a Lula (e a outros réus). É só verificar quantas vezes, falava-se, na imprensa e publicamente, que “cair em Curitiba” ou “escapar de Curitiba” era “derrota ou esperança” porque, é obvio, significaria uma inevitável condenação.

Ser julgado em Curitiba – e o caso de Lula foi separado de um processo em São Paulo, que resultou só em absolvições – era a “garantia” de ser condenado, por uma simples razão: Moro era um juiz parcial e, portanto, o resultado de seus julgamentos, previsível.

Suspeição e incompetência da 13ª Vara Criminal de Curitiba de Sergio Moro jamais foram coisas distintas, mas gêmeas univitelinas.

O segundo argumento, usado por Moro, em complemento ao de que a defesa podia livremente falar – embora jamais fosse ouvida -, é o de que culpa de Lula “foi reconhecida por dez juízes”.

A Lei de Lynch, a dos linchamentos, não encontraria razão melhor, como também não se acharia melhor metáfora para os julgamentos do Coliseu, onde a plateia, com seus polegares, julgava em vida ou morte com os polegares, acompanhando o julgamento do César da ocasião.

Será que alguém tem dúvidas, em raciocínio sereno, que se formou, tal e e qual o “clamor público” que os juízes cansam de rejeitar, um “clamor judicial”, no qual boa parte do Poder Judiciário deixou-se arrebanhar por Moro por conta de seus pendores ideológicos e por ambição de poder que, afinal, resultou em ser considerado o poder que está “do outro lado”, nas palavras do presidente que fez eleger?

Aliás, é isso que precisa ser compreendido: a derrota judicial de Moro, ainda que inquestionável pelos princípios do Direito, aconteceu por conta da política: a de Moro, que usou seu poder de juiz para buscar o poder e a de Bolsonaro, a quem Moro fez presidente excluindo Lula das eleições.

Quem judicializou a política não pode esperar que não se corrija a politização da Justiça.

Tijolaço.

quarta-feira, 23 de junho de 2021

BRASIL TEM MAIOR NÚMERO DE CASOS DESDE INÍCIO DA PANDEMIA, POR FERNANDO BRITO

O Brasil registrou o maior número de casos confirmados de contaminação pelo novo coronavírus desde o início da pandemia, em março do ano passado.

Foram 115.228, 15% acima do recorde anterior, apesar da persistente subnotificação causada pela falta de aplicação de testes em massa, além de 2,4 mil mortes.

Isso, é claro, significa mais mortes daqui a alguns dias porque, com a atual taxa de letalidade da doença (2,8%) a tendência é que isso se reflita em 3.226 óbitos.

Está claro que só a vacinação, que mal começa a engatar, apesar dos ruídos criados pela falta de critérios únicos de vacinação que provoca seguidos episódios de paralisação da aplicação do imunizante por falta de doses.

Os dados do Imperial College de Londres sobre as taxas de transmissão indicam que elas vêm subindo.

As medidas restritivas, que já desapareceram, na prática, não vão deixar que as mortes diminuam com a velocidade que deveriam e isso empurra o nosso horizonte sombrio de perdas de vidas para números cada vez maiores.

Podemos chegar perto de 600 mil mortes ainda no fim de junho e passarmos a ser o país com mais mortes no mundo ainda em agosto.

Tijolaço.

DEU NO TIJOLAÇO, GOVERNO EM FRANGALHOS: SALLES CAI E RURALISTA ENTRA EM SEU LUGAR

A demissão do ministro Ricardo Salles, infelizmente, não é uma esperança na mudança na política ambiental brasileira.

Para o seu lugar vai um ruralista, Joaquim Álvaro Pereira Leite, ligado à Sociedade Rural Brasileira, celula mater da Frente Parlamentar da Agropecuária.

Tende a ser, como Salles, um ministro da devastação ambiental.

Há uma certeza – a de que ele foi demitido e não demitiu-se – e várias possibilidades para este desfecho, não excludentes entre si.

A primeira é a de que o governo precisava de um fato para distrair atenções deste Covaxin Day.

Outra, um aviso amigo de que Salles está na iminência de tornar-se réu por contrabando de madeira.

E, por fim, por ter perdido qualquer capacidade de participar dos negócios ambientais que fazem parte hoje da economia e da diplomacia.

Joaquim Pereira Leite não tem a menor passagem nos círculos ambientalistas, diálogo zero com os players do setor.

É nome escolhido não para brilhar, mas para apagar-se e seguir na linha de “Garimpeiros acima de todos; madeireiros acima de tudo”.

O ministro da devastação, de fato, ainda é o mesmo: Jair Messias Bolsonaro.

“CAMINHO DA ÍNDIA” FEITO PELO GOVERNO VIRA O CENTRO DA CPI, POR FERNANDO BRITO

O assunto brotou no final de semana, com a notícia de que um funcionário do Ministério da Saúde falava em pressões de um tenente-coronel, subordinado a Eduardo Pazuello para que se encontrasse a “exceção da exceção” para comprar a vacina indiana Covaxin.

Ganhou volume ontem, quando o cheiro forte do dinheiro apareceu no preço mais alto do imunizante, equivalente a R$ 82 por dose na data em que a compra foi anunciada (25 de fevereiro), antes mesmo da compra da da Pfizer (comprada a 19 de março, ao preço anunciado de pouco mais de R$ 54).

E ameaça virar um imenso escândalo com o depoimento, previsto para sexta-feira, do deputado Luís Miranda, do DEM, e de seu irmão, que é o tal funcionário que prestou depoimento denunciando a pressão para a compra suspeita.

A remuneração milionária da tal Precisa Medicamentos, uma simples distribuidora, que não tem nenhuma capacidade técnica como laboratório acrescenta personagens mais do que suspeitos ao caso.

O ‘caminho da Índia’, que já se havia desenhado com os telefonemas de Jair Bolsonaro pressionando por remessas de cloroquina parece agora aberto para transformar-se na desmistificação deste governo em seu único argumento remanescente, depois de ter sido um desastre em tudo: o “acabou a corrupção”.

Vamos ver, nos próximos dias, aonde ele vai levar.

Tijolaço.

SEM HELENO, BOLSONARO SE IRRITA COM MILITARES, DIZ LUÍS COSTA PINTO, POR FERNANDO BRITO

Quem faz jornalismo político fora de Brasília tem a grande desvantagem de não poder tatear entre as conversas reservadas, segredos que vazam e indiscrições “discretas”. E quem conhece aqueles pagos, como Luís Costa Pinto, repórter também dos desvãos brasilienses, que colheu o depoimento histórico de Pedro Collor, que precipitou o processo de impeachment de seu irmão Fernando, sabe tudo o que se passa fora da ribalta do poder.

Em artigo publicado há pouco no Plataforma Brasília, ele esclarece o que está por trás do sumiço do general Augusto Heleno que, ao lado de Eduardo Villas Boas, sustentou o dispositivo militar que levou Jair Bolsonaro ao poder e aponta a precária composição de forças que se faz entre ele e uma camada acovardada e bulímica camada militar a qual, agora, parece faltar calço firme na alta hierarquia militar.

O que apavora um presidente à beira – ou já mais que isso – de um ataque de nervos.

BOLSONARO PRESSENTE DEPOSIÇÃO E REAGE: DESCONFIA DOS MILITARES

Luís Costa Pinto

Augusto Heleno, general-de-Exército da reserva, chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, está fora de combate. Tomado por uma crise aguda de depressão clinicamente diagnosticada, submete-se a tratamento rigoroso.

 Com o comandante fora da trincheira do GSI, a coordenação da segurança presidencial foi entregue a militares com os quais Jair Bolsonaro não tem intimidade e que não gozam da confiança dos filhos do presidente.

 O vereador Carlos Bolsonaro, integrante do clã presidencial que mais se imiscui nos porões palacianos, foi o responsável indireto pela espoleta que fez o pai explodir qual pistola com bala de festim na última segunda-feira em Guaratinguetá (SP).
Tão logo saltou do veículo que o conduzia, Bolsonaro foi saudado por gritos de “genocida!”, “impeachment, já!”, “vacina no braço, comida no prato!”. Sempre aziago, o mau humor presidencial desandou de vez. Ele lançou um olhar enfurecido pelo oficial do GSI responsável pela segurança do evento e passou-lhe uma descompostura de fazer corar até alguns dos sem-vergonha que o acompanhavam (foi o caso da deputada federal Carla Zambelli e do prefeito do município do interior paulista).

A COVARDIA DO PRESIDENTE

Frouxo e covarde, com temor explícito às reações e reprimendas do general Heleno que, sabia, não viriam dado as condições clínicas do militar que comanda o GSI, o presidente então deu vezo às reclamações contra sua equipe: sabia que não haveria rebate pelo superior do militar a quem fora designada a missão de garantir sua segurança em Guaratinguetá.
Àquela altura, ele já fora informado que diversos veículos de imprensa tinham informações dando conta da compra de vacinas indianas Covaxin superfaturadas em 1.000% e o líder do governo, deputado Ricardo Barros (PP-PR) e assessores do ex-ministro Eduardo Pazuello haviam se envolvido diretamente no negócio. Não sabia, ainda, que o site Uol receberia mais tarde o vazamento de um relatório da Agência Brasileira de Informações (Abin, controlada por militares) levantando suspeitas sobre a fortuna e o rápido enriquecimento do amigo Luciano Hang, o grotesco dono das Lojas Havan.
Exalando o mau humor que lhe é peculiar e o azedume dos maus bofes que marcam a sua personalidade, Jair Bolsonaro explodiu contra os repórteres que improvisaram uma entrevista coletiva no corredor que era caminho único para seu evento no interior paulista. Sem guardar resquícios da compostura exigida para um Chefe de Estado, soltou impropérios contra a imprensa em geral e a Rede Globo e a TV CNN em particular (também lançou perdigotos ao léu, contra as repórteres encarregadas de cobrir o ato, ao tirar ilegalmente a máscara em meio a um acesso de ira quase animal).
No regresso ao comboio presidencial, o oficial do GSI destacado para coordenar aquele deslocamento da comitiva presidencial foi mais uma vez desancado como égua arisca nas mãos de capataz bêbado em estrebarias de fazendas de gado nos rincões de Goiás.

MILITARES GERAM DESCONFIANÇA

Bolsonaro desconfia cada dia mais dos militares que o cercam. E crê ter muitas razões de sobrar para manter acesas tais suspeições.

 Um dos catalisadores dos acessos de cólera do presidente é seu vice, o general da reserva Hamilton Mourão. Nos últimos cinco dias, em pelo menos três pronunciamentos públicos, Mourão deixou claro que não é ouvido pelo titular da chapa por meio da qual galgou à vice-presidência. A um interlocutor comum dele e do cabeça-de-chapa de 2018 disse que não há “nosso governo”. Haveria, sim, um “governo dele (Bolsonaro)”. Os erros e descaminhos da gestão, portanto, seriam frutos exclusivos das escolhas e das companhias do presidente da República.

 Jair Bolsonaro sabe que não era a primeira opção dos militares na última eleição. Organizados nos Clubes Militares, os oficiais da reserva até denotavam uma preferência por eles. Mas, além de não terem voz ativa, eram minoria. Liderados pelos generais Sérgio Etchegoyen, Eduardo Villas-Boas e Silva e Luna, os quarteis do Exército não escondiam desconforto pelo primarismo de Bolsonaro. Torciam pela decolagem, na campanha, de nomes como Geraldo Alckmin, João Amoedo e até Luciano Huck (que refugou no lançamento de sua candidatura).
A greve dos caminhoneiros de maio de 2018, episódio que terminou de derrubar quaisquer aspirações de Michel Temer a sair um pouco melhor do Palácio do Planalto depois de ter usurpado a cadeira presidencial entrando pela porta dos fundos na sede de governo, pôs os militares definitivamente na mediação da crise política nacional. Bolsonaro cresceu naquele momento, disseminou o próprio nome entre os grevistas, mas, não foi ali que se converteu na alternativa militar.
Disputando pelo obscuro PSL, Jair Bolsonaro só passou a ser o “Plano Único” dos estrategistas fardados depois do episódio do atentado a faca do qual foi vítima em Juiz de Fora (MG). Divisor de águas no curso da campanha e responsável por determinar uma guinada patética da cobertura da mídia no processo eleitoral, a conversão do atual presidente em “vítima” do sistema (algo que nunca foi, muito pelo contrário) concedeu ao seu nome um verniz de outsider. Era um falso brilhante. O verniz, contudo, foi decisivo para a vitória.

GENERAIS MANOBRARAM A JUSTIÇA

Sérgio Etchegoyen, chefe do Gabinete de Segurança Institucional de Temer, e Eduardo Villas-Boas, chefe do Estado Maior do Exército sob Dilma e que seguiu no posto após o golpe jurídico/parlamentar/classista que apeou a ex-presidente porque serviu à construção do enredo golpista, foram personagens ativos na ascensão eleitoral de Bolsonaro em 2018 no curso de uma campanha assimétrica.

Etchegoyen entrincheirou-se no Tribunal Superior Eleitoral e, em reuniões nas quais inflava o clima de conspiração e de conflagração nos quarteis, açulou os ministros da Corte eleitoral a concederem benefícios de campanha a Bolsonaro – tais como dar uma entrevista individual à TV Record no mesmo dia e hora do derradeiro debate entre os candidatos no primeiro turno.

 Alegando mal-estar, Bolsonaro recusara o convite para o debate. No segundo turno, o TSE, por meio de uma decisão do então ministro Admar Gonzaga, permitiu que todos os debates fossem cancelados, no lugar de terem sido convertidos em entrevistas. O candidato apoiado explicitamente pelos militares transformou sua campanha em notas oficiais lidas em off pelos telejornais, ausentando-se do debate de ideias e do cotejamento de propostas.

 A urdidura de Etchegoyen teve o auxílio vergonhoso de Admar Gonzaga, então ministro do TSE que havia sido advogado de Carlos Bolsonaro e deixou o tribunal por lhe terem sido impostas contingências da Lei da Maria da Penha (foi acusado de agredir a esposa). Ao deixar o TSE, Gonzaga virou advogado e secretário-geral do grupo que tenta criar um partido para Bolsonaro.
Villas-Boas, como é público e notório, é réu confesso do crime de ameaça ao Supremo Tribunal Federal. Em dois tuítes, na véspera de a Corte Suprema decidir sobre a possibilidade, ou não, de o ex-presidente Lula disputar a Presidência (ele era o favorito naquele momento em todas as pesquisas pré-eleitorais do pleito de 2018), o então Comandante Geral do Exército soprou eflúvios de veneno golpista e de interrupção da construção democrática brasileira caso o STF não tirasse Lula da corrida eleitoral. Acovardados, os ministros do Supremo acolheram a chantagem militar.

OS COMANDANTES FORAM INGÊNUOS?

 Ouriçados com a vitória do pupilo, os comandantes militares das três forças estavam crentes na capacidade que teriam para tutelar a criatura primária, de rala formação moral e escasso preparo intelectual, que se elegera.

 Péssimos estrategistas, os integrantes da cúpula militar estavam enganados. Na melhor das hipóteses, foram ingênuos em demasia. Ninguém tutela um presidente da República eleito com 54 milhões de votos, tampouco uma personalidade deformada como a de Jair Bolsonaro. Ele é um ser acometido de possessões diárias da “Síndrome da Pequena Autoridade”, os mesmos desvios de caráter e de conduta que se verificam nos famosos “guardas da esquina” nos processos de ascensão de regime nazi-fascistas.

Quanto mais reivindica lealdade dos militares a seu projeto de poder personalista, dando pistas de que não se resignará a uma derrota nas urnas de 2022 que parece iminente e óbvia a dezesseis meses do pleito, mais distante Bolsonaro fica da meta almejada de reunir o consenso das Forças Armadas a si.

Tendo cruzado o rubicão da política e aberto os portões dos quarteis para um debate franco em torno de opções eleitorais – o que é descabido e impensável entre militares profissionalizados e ciosos do papel de garantidores da Constituição que detêm – os atuais comandantes das três forças desejam se manter influentes e afluentes no poder. Contudo, sabem que o caminho tomado por Bolsonaro inviabiliza da manutenção do Brasil no rol das nações consideradas democracias institucionais maduras.

Não passa pela cabeça nem pela prancheta dos comandos militares brasileiros quaisquer tipos de golpes tradicionais como o de 1964. Há uma janela aberta, com fresta exígua, para um golpe parlamentar como o de 2016 que depôs Dilma Rousseff sem crime de responsabilidade – fazer o presidente da Câmara, Arthur Lira, mudar de lado nos próximos meses e aceitar um pedido de impeachment.
Um impeachment clássico (razões e crimes de responsabilidade não faltam no prontuário de Bolsonaro) é o melhor caminho para conservar o esmalte “democrático” do Brasil no exterior e dar margem e poder de manobra para o vice Hamilton Mourão convocar um breve governo de “conciliação e união” do centro à direita e tentar se viabilizar candidato ou inventar uma chapa “liberal-democrática” com seu apoio nos moldes do que foi construído pela dupla Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso em 1994.

BOLSONARO E “O RETRATO DE DORIAN GRAY“

No momento, uma certeza dilacera os militares que colaram suas reputações e seus projetos pessoais em Jair Bolsonaro: ele perde a eleição para qualquer um em 2022 e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, do PT, é o favorito em todos os cenários pré-eleitorais.
Na caserna, não se crê em recuperação da economia, muito menos no programa de privatizações vendido pelo ministro Paulo Guedes como panaceia – espécie de cloroquina econômica. Só ao custo de uma divisão inédita dos comandos militares as Forças Armadas perfilariam a favor de uma aventura de não reconhecimento do resultado do pleito presidencial.

 A imagem de Jair Messias Bolsonaro afixada nas fotos oficiais dos QGs brasileiros assemelha-se, a cada dia que passa, ao retrato de Dorian Gray, no romance homônimo do escritor e dramaturgo britânico Oscar Wilde.

 Assim como o personagem de Wilde, Bolsonaro vendeu sua alma aos comandantes militares e firmou uma profissão de fé de que seriam felizes juntos e para sempre no comando do País. Contudo, ao se descobrir Presidente, acreditou ser onipotente e deixou vazar os matizes mais grotescos e bizarros de sua alma deformada. Assustados com as perversões que ajudaram a implantar no Palácio do Planalto e envergonhados com a péssima figura externa que o Brasil faz hoje no mundo, os chefes das Forças Armadas querem apagar a foto e exorcizar a culpa que têm por terem-na encomendado. Dar cabo dessa missão, entretanto, é tarefa para um Estadista – e não há biografias disponíveis no espectro de direita com tamanha envergadura para suportar a dimensão desse adjetivo superlativo.

Luís Costa Pinto, 52. Jornalista profissional desde 1990. Começou como estagiário no Jornal do Commercio, do Recife. Foi repórter-especial, editor, editor-executivo e chefe de sucursal (Recife e Brasília) de publicações como Veja, Época, Folha de S Paulo, O Globo e Correio Braziliense. Saiu das redações em agosto de 2002 para se dedicar a atividades de consultoria e análise política. Recebeu os prêmios Líbero Badaró e Esso de Jornalismo em 1992. Prêmio Jabuti de livro-reportagem em 1993. Diversos prêmios “Abril” de reportagem. É autor dos livros “Os Fantasmas da Casa da Dinda”, “As Duas Mortes de PC Farias” e “Trapaça – Saga Política no Universo Paralelo Brasileiro” que já tem dois volumes lançados e o volume 3 está em fase de edição.

Tijolaço.