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quinta-feira, 3 de agosto de 2017

O Xadrez da prova que sumiu da Lava Jato, Luís Nassif

É curiosa a maneira como porta-vozes midiáticos da Lava Jato justificam a ausência de provas que têm marcado os inquéritos, depois que viram denúncias.

Alegam que crimes financeiros são mais complexos, organizações criminosas são mais estruturadas, por isso mesmo não se pode esperar provas simples, como no caso de um homicídio.

Fantástico! Significa que em outros países as investigações também chegam ao final sem a apresentação de provas substanciais porque, por princípio – segundo eles – crimes complexos não têm soluções racionais, mas apenas convicções?

​Justamente por não ser uma investigação trivial, a Lava Jato contou com um conjunto de facilidades inéditas na história das investigações criminais do país.

Contou com o poder de pressionar mais de uma centena de delatores, dispostos a entregar até a mãe por uma redução da pena. Premiou os maiores criminosos com a quase extinção da pena. Contou com ampla colaboração internacional, do Departamento de Justiça dos Estados Unidos aos Ministérios Públicos suíço e espanhol, rastreando contas em paraísos fiscais. Internamente, teve acesso integral aos bancos de dados da Receita Federal, do COAF, dos cartórios, das remessas ao exterior. Ganhou até o poder de torturar psicologicamente suspeitos, afim de pressioná-los a delatar. Provavelmente apenas a luta contra o terror, nos EUA, conseguiu suspender tantas normas constitucionais de direitos individuais.

Nenhum dos álibis da má investigação – má vontade do Judiciário, excesso de recursos – vale para a Lava Jato. Certamente foi a investigação que consumiu mais recursos do Ministério Público Federal e da Polícia Federal e que dispôs de mais poder institucional, mais influência, em relação aos juízes e advogados de defesa.

Depois de todo esse aparato, surge a cândida explicação: a opinião pública cobra provas por ser desinformada e não saber que, em investigações de crimes de colarinho branco, não é fácil levantar provas.

O que a Lava Jato expõe, com a falta de provas, é a supina incompetência tanto dos procuradores quanto dos policiais federais da força tarefa, em trabalhar com eficiência os dados levantados.

Entraram na investigação com viés ideológico, mais preocupados em alimentar a imprensa com declarações de réus confessos, sem a preocupação de conferir as provas, porque para a imprensa só interessa a perfumaria. E havia a preocupação de gerar manchetes diárias, de acordo com a receita formulada em 2005 por Sérgio Moro ao analisar a operação “mãos limpas”.

A preocupação em transformar a Lava Jato na “maior investigação do planeta”  - como a definiu a procuradora deslumbrada de São Paulo – engoliu a capacidade de investigação da turma, que já não deveria ser das mais experientes.

Em vez de concentrar nos casos centrais e formular narrativas condizentes com os dados delatados  e levantados, comportaram-se como repórteres principiantes, primeiro criando a narrativa, depois juntando declarações que coubessem nela, sem a preocupação de checar a consistência dos fatos ou reformular as narrativas à luz dos dados levantados.

Será conhecida, no futuro, como uma operação malcuidada, cujo único objetivo foi contribuir para um golpe de Estado e conferir fama – e os ganhos provenientes dela – aos seus protagonistas. E tudo isso se vangloriando de estar enfrentando as forças mais temíveis da Nação – na verdade, um governo mais indefeso do que freira carmelita em cabaré. Quando finalmente estiveram frente a frente com o poder, dançaram. Estão sendo comidos com pão e farofa.

Nem se culpe a arrogância de procuradores e delegados da Lava Jato, quando se consideraram donos da cocada preta. São apenas funcionários públicos que se deslumbraram da mesma maneira que um anônimo quando contemplado pela loteria.

A culpa é de um país que, em nome de um combate a um partido, aboliu regras jurídicas, respeito à democracia e às instituições.

GGN

sábado, 8 de julho de 2017

Lava jato: desmonte como autoproteção, por Marcelo Auler

O diretor-geral do DPF, Leandro Daiello, que ganhou o manto protetor costurado pela Força Tarefa da Lava Jato, agora faz o desmonte da mesma até para evitar punições.
Só os mais ingênuos é que estranharam o anúncio feito pelo Departamento de Polícia Federal (DPF) do desmonte do que restou da Força tarefa da Lava Jato na Superintendência Regional do DPF no Paraná (SR/DPF/PR). O desmonte, por um governo golpista repleto de investigados não só da Lava Jato, mas de outras operações policiais, era mais do que esperado. Lembremos que todos os que defenderam e lutaram pelo golpe que derrubou a presidente legitimamente eleita, Dilma Rousseff, entre outras causas para retirá-la alegavam que ela faria isso. Em 30 de maio de 2016, quando Eugenio Aragão assumiu o ministério da Justiça, na postagem Fantástico: Michel Temer coloca a raposa para cuidar do galinheiro, chegamos a republicar um trecho do artigo de Miriam Leitão com este tipo de acusação, oportunidade que a rebatemos:

“Minha colega e ex-chefe, Miriam Leitão, por exemplo, escreveu a coluna “O homem amigo“, em O Globo, acusando o então novo ministro de “buscar um pretexto para intervir na equipe da Lava-Jato. Mesmo sem ter tido sequer cheiro de vazamento, ele continuou. Circulam rumores de que ele tem uma lista das cabeças que cortará. O “Valor” ontem falou de duas dessas cabeças: Rosalvo Ferreira, superintendente da Polícia Federal no Paraná, e Igor Romário de Paula, diretor de combate ao crime organizado no Paraná. Além, claro, do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello”.

O que as pessoas não percebem, mas é comentário solto no DPF em Brasília, é que o desmonte da Força Tarefa tem outros objetivos além de arrefecer as investigações no momento em que elas resvalam e tendem a descambar em “não Petistas”, o alvo maior da chamada República de Curitiba. Em sua coluna neste sábado (07/07) na Folha de S. Paulo, André Singer toca nesse ponto:

“E o que desejam os parlamentares, entre eles o próprio Maia, um investigado? Que a Lava Jato pare. Desde esse ponto de vista, não poderia ser mais conveniente a informação, também em todos os jornais, de que a Polícia Federal encerrou as atividades do grupo dedicado à operação em Curitiba. Convém lembrar, igualmente, que diversos processos foram tirados do juiz Sergio Moro nas últimas semanas.

Em outras palavras, pela primeira vez há sinais de arrefecimento do núcleo paranaense que lidera as investigações desde 2014, o que deve soar como música aos ouvidos dos congressistas”.

Leandro Daiello, o diretor-geral cujo futuro é desconhecido, ao desmantelar o grupo, na verdade tem um segundo – principal??? – objetivo: protegê-lo e proteger a si mesmo. Quer dificultar ao máximo que alguém – a nova Procuradora-geral da República, Raquel Dodge, por exemplo, que seria adepta de o MPF exercer mais fortemente o controle externo das atividades policiais  – caia na tentação de apurar as muitas irregularidades cometidas em nome do combate à corrupção.

Tais ilegalidades, na verdade, aconteceram com o objetivo maior de caça aos petistas, com a tentativa de acobertamento dos erros e crimes de tucanos, peemedebistas e de políticos de outros partidos, como o possível presidente interino, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Tanto o desmonte, como a não apuração – para evitar punição e, quem sabe, questionamentos e anulações em tribunais superiores de muito do que se fez – já ocorrem há algum tempo. A equipe da Força Tarefa começou a ser desfeita com a transferência de duas cabeças do grupo dentro da SR/DPF/PR: a delegada Érika Mialik, que em dezembro foi “promovida” e transferida para Santa Catarina; e Marcio Adriano Ancelmo, em fevereiro empossado como Corregedor do DPF do Espírito Santo, apesar das muitas suspeitas de, no mínimo, irregularidades que cometeu.

A “proteção” vem sendo armada na medida do possível. Um exemplo é o caso da  delegada Daniele Gossenheimer Rodrigues, chefe do Núcleo de Inteligência Policial (NIP), que respondeu a um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) após uma sindicância refeita confirmar que ela ordenou a instalação de um grampo no fumódromo da Superintendência, sem autorização judicial. Queria bisbilhotar  quem criticava o trabalho da Força Tarefa, comandada por seu marido Igor de Paulo Romário, coordenador da Delegacia Regional do Combate ao Crime Organizado (DRCOR).

Porém, mesmo sendo considerada culpada de um suposto crime, sua punição limitou-se a uma “suspensão” que não gerou nem mesmo a perda do cargo de chefia, tal como narramos em: Para o DPF, grampo ilegal na Superintendência do PR é transgressão disciplinar.

GGN

quinta-feira, 6 de julho de 2017

Lenio Streck: A esquizofrenia das teorias da prova no caso Lula

Recentemente, o conselheiro do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) Valter Shuenquener concedeu liminar para anular a questão número 9 do 54º concurso público para promotor de Justiça do Estado de Minas Gerais. Razão: a pergunta versava sobre coisa exóticas chamadas “teoria da graxa” e “estado vampiro”. Esse tipo de questão mostra a esquizofrenia do direito e do ensino jurídico no país.

Pois parece que o recado do CNMP não retumbou em certas teorias – bem exóticas - utilizadas pelo Ministério Público Federal nas alegações finais subscritas recentemente no processo criminal movido contra o ex-Presidente Lula. Qual é o limite ético do uso de determinadas teses, tratando-se de uma Instituição que deve ser imparcial (MP deveria ser uma magistratura) e zelar pelos direitos e garantias dos cidadãos e da sociedade? Eis o busílis.

É possível, na ânsia de condenar, jogar para o alto tudo o que já se ensinou e escreveu nas mais importantes universidades do mundo sobre a prova?  O que diz o Procurador? Vamos lá. “As duas mais modernas teorias sobre evidência atualmente são o probabilismo, na vertente do bayesianismo, e o explanacionismo. Não é o caso aqui de se realizar uma profunda análise teórica delas, mas apenas de expor seus principais pontos, a fim de usar tal abordagem na análise da prova neste caso”. (grifei) E ele explica: “Muito sucintamente, o bayesianismo, fundado na atualização de probabilidades condicionais do Teorema de Bayes, busca atualizar a probabilidade de uma hipótese com base em evidências apresentadas. (...).”  Bom, dizer que são as duas mais modernas teorias da prova é porque o Procurador quer. Faltou só colocar a fórmula do Teorema de Bayes, que, se colocado aqui, arrepiaria os cabelos dos juristas.

Em vez de apresentar provas concretas, o Procurador usa teoria que fala de “paradoxo de injunções”. Deve ser esse o busílis do teorema aplicado à teoria da prova. Fico imaginando o juiz dizendo: “ - Condeno o réu porque o Pr(A), na conjunção com o Pr(AB) deu 0,1. Isso porque a probabilidade a posteriori indicava que Pr(B-A) era inferior a Pr (B+). Perdeu. A casa caiu; a pena aplicada é de x anos”.

Mas a peça é ornamentada com mais uma “teoria jurídica”: O explanacionismo, que “tem por base a lógica abdutiva, desenvolvida por Charles Sanders Peirce no início do século XIX (...)”. Na verdade, o signatário errou de século. Mas, OK. Depois mistura Sherlock Holmes, Umberto Eco. Segundo a peça processual, “ na linguagem explanacionista, a hipótese fática H que é tomada como verdadeira é aquela que melhor explica a evidência E, ou o conjunto de evidências do caso. (...) Combinando o explanacionismo com o standard de prova da acusação, que se identifica como a prova para além de uma dúvida razoável, pode-se chegar à conclusão quanto à condenação ou absolvição do réu”. (sic)

Pronto. Sherloquianamente, a partir do explanacionismo, chega-se à conclusão de que... de que, mesmo? Ou seja: Lula pode ser condenado porque a hipótese fática H foi tomada como verdadeira pelo MPF porque é a que melhor explica a evidência E. Bingo. Não questiono a importância de Bayes,  explanacionismo e quejandos. Mas daí a substituir provas, vai uma distância enorme.


Temos de levar a sério a teoria da prova. Ministério Público não pode querer disputar com a defesa em um “perde-ganha”. Ou tem provas ou não tem. Não pode inventar. Se o Procurador que firmou a peça perguntar isso em um concurso, o CNMP anula. Por exotismo.

GGN, por Lenio Streck – ex-Procurador de Justiça-RS, Doutor em Direito e advogado.

PF deixa a força-tarefa de Curitiba

A Polícia Federal confirmou, nesta quinta (6), que encerrou o grupo exclusivo que atuava em Curitiba por conta da Operação Lava Jato. Em nota, a direção da PF admitiu que os grupos de trabalho dedicados à Lava Jato e à Carne Fraca serão dissolvidos e passarão a integrar a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (Delecor).

A informação foi disseminada na imprensa após a revista Época antecipar o fim do GT e afirmar que procuradores de Curitiba avaliaram a medida como uma tentativa de "asfixiar" as investigações.

"Não há dúvida entre os investigadores de que a produção de provas em processos altamente relevantes – como os dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, entre dezenas de outros – será severamente prejudicada. O mesmo vale para novas frentes de investigação sigilosas, envolvendo, entre outros, operadores e políticos do PMDB e do PSDB. Diante da escassez de recursos e pessoal, novas fases da operação podem nem sequer ser deflagradas, de acordo com procuradores da República e uma fonte no GT da polícia. 'É uma asfixia', diz um dos investigadores", disse o portal da Revista.

Abaixo, a nota completa da PF:

1.   Tendo em vista que cada delegado do Grupo de Trabalho da Lava Jato possuía cerca de vinte inquéritos cada um, essa equipe, juntamente com o Grupo de Trabalho da Operação Carne Fraca, passou a integrar a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (DELECOR);
2.   A medida visa priorizar ainda mais as investigações de maior potencial de dano ao erário, uma vez que permite o aumento do efetivo especializado no combate à corrupção e lavagem de dinheiro e facilita o intercâmbio de informações;

3.   Com a nova sistemática de trabalho, nenhum dos delegados atuantes na Lava Jato terá aumento de carga de trabalho, mas, ao contrário, ela será reduzida em função da incorporação de novas autoridades policiais;

4.   O número de policiais dedicados a essas investigações chega a 70;

5.   A iniciativa da integração coube ao Delegado Regional de Combate ao Crime Organizado do Paraná, delegado Igor Romário de Paula, coordenador da Operação Lava Jato no estado, e foi corroborada pelo Superintendente Regional, delegado Rosalvo Franco;

6.   O modelo é o mesmo adotado nas demais superintendências da PF com resultados altamente satisfatórios, como são exemplos as operações oriundas da Lava Jato deflagradas pelas unidades do Rio de Janeiro, Distrito Federal e São Paulo, entre outros;

7.   Também foi firmado o apoio de policiais da Superintendência do Espírito Santo, incluindo os delegados Márcio Anselmo e Luciano Flores, ex-integrantes da Operação Lava Jato;

8.   O atual efetivo na Superintendência Regional no Paraná está adequado à demanda e será reforçado em caso de necessidade;

9.   Conforme nota divulgada no dia 21/05/2017, deve-se ressaltar que as investigações decorrentes da Operação Lava Jato não se concentram somente em Curitiba, mas compreendem o Distrito Federal e outros dezesseis estados;

10.  Desde o início, a Polícia Federal, de forma republicana e sem partidarismos, trabalha arduamente para o êxito das investigações, garantindo toda a estrutura e logística necessária para o esclarecimento dos crimes investigados.

GGN

sábado, 24 de junho de 2017

Moro e os bastidores da raiz da lava jato preparada pelos EUA para em nome do combate a corrupção destruir o país

Foto ilustração: Joana Brasileiro
Moro, Lava Jato e interesses dos EUA

O juiz Sérgio Moro é louvado em verso e prosa pelos meios de comunicação tradicionais, nacionais e estrangeiros. Foi “personalidade do ano” pelo Globo, esteve entre “as 100 personalidades mais influentes” da revista Time, alçado à condição de 13o entre “os maiores líderes mundiais” pela revista Fortune e 10o entre os mais influentes da agência de notícias financeiras Bloomberg.

O que teria levado o juiz federal ao estrelato? Que apoios teria acumulado para se tornar uma quase unanimidade internacional? Certamente muitos se apressarão em concluir que foi seu trabalho destemido e incansável contra a corrupção. No entanto, outros tentaram e não tiveram sucesso com seus processos, nem tampouco viraram ídolos mundiais, muito ao contrário.

As ocorrências com o juiz Fausto De Sanctis nos dão um exemplo marcante do caminho oposto ao de Moro. De Sanctis teve sua condenação do banqueiro Daniel Dantas revertida e toda a operação Satiagraha anulada, mesmo de posse da gravação da entrega da propina aos policiais federais para que paralisassem as investigações de lavagem de dinheiro e evasão de divisas no Banco Opportunity. Sua carreira, especializada em crimes financeiros, foi encerrada pela “promoção” ao Tribunal Regional Federal para atuar na área previdenciária.
Por que os processos de Moro não tiveram a costumeira gaveta como destino? Qual teria sido seu diferencial?

Alguns amigos do juiz paranaense declararam ao jornal Washington Post que sua abordagem pode ter sido influenciada pela exposição que teve aos processos legais nos Estados Unidos: ele participou de um programa especial na Universidade de Harvard em 1998 e de um programa para líderes potenciais em 2007, patrocinado pelo Departamento de Estado daquele país.

As relações de Moro com as autoridades estado-unidenses já pareciam consolidadas quando ele “determinou em 2007 a criação de RG e CPF falsos e a abertura de uma conta bancária secreta para uso de um agente policial norte-americano, em investigação conjunta com a Polícia Federal do Brasil. No decorrer da operação, um brasileiro investigado nos EUA chegou a fazer uma remessa ilegal de US$ 100 mil para a conta falsa aberta no Banco do Brasil, induzido pelo agente estrangeiro infiltrado”, conforme reportagem dos Jornalistas Livres.

Em seminário sobre o crime organizado no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em maio de 2009, o juiz defendeu a delação premiada e revelou conhecimento sobre os métodos da justiça estado-unidense. Ele afirmou que “nos Estados Unidos entende-se como acordo precioso aquele que tem efeito dominó” e que “a sugestão de juiz dos Estados Unidos é pedir uma amostra ao delator com o compromisso de não utilizá-la, a não ser que haja acordo”.

“Outra experiência que o juiz contou é de que, nos Estados Unidos, foi levada à Suprema Corte um caso em que delator grava declarações do investigado. Alguns sustentaram que isso era vedado, por entender que era autoincriminação. Os EUA, diz Moro, entenderam que o devido processo legal não protege quem confia na pessoa errada e que a autoincriminação só ocorre quando é feita diante de autoridade pública”, revela, ainda, a matéria do Consultor Jurídico.

Projeto Pontes: Construindo Pontes para a Aplicação da Lei no Brasil

No final de outubro, ainda em 2009, a comunicação interna da Agência de Contraterrorismo do Departamento de Estado dos EUA, vazada pelo Wikileaks, destacou a cooperação com juízes, procuradores e policiais brasileiros na realização de uma conferência, denominada Projeto Pontes, no Rio de Janeiro, financiada pela Agência. Sérgio Moro, que fez parte do time de apresentadores, falou sobre os casos de lavagem de dinheiro nas cortes brasileira. Os apresentadores estado-unidenses discutiram vários aspectos relativos à investigação e ao julgamento de casos de transações financeiras ilícitas e de lavagem de dinheiro, incluindo cooperação internacional formal e informal, arresto de bens, delação premiada, entre outros assuntos.

Para os treinamentos futuros, o comunicado do Departamento de Estado sugere que: “Idealmente, o treinamento deve ser de longo prazo e coincidir com a formação de forças-tarefa de treinamento. Dois grandes centros urbanos com apoio judicial comprovado para casos de transações financeiras ilícitas, em particular São Paulo, Campo Grande ou Curitiba, devem ser selecionados como local para este tipo de treinamento. Em seguida, as forças-tarefa podem ser formadas, e uma investigação real utilizada como base para treinamento que evoluiria, sequencialmente, desde a investigação até a apresentação do caso no tribunal e a conclusão do caso. Isso proporcionaria uma experiência real aos brasileiros, em trabalhar em uma força-tarefa proativa, de longo prazo, de transações ilícitas e permitir o acesso a peritos dos EUA para orientação e suporte contínuos”. Destaque-se que a sugestão de “orientar” uma força-tarefa em um caso real ocorreu pouco mais de quatro anos antes do início da operação Lava Jato.

O “monitoramento” da NSA sobre a comunicação da Petrobras

O cientista político brasileiro Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira, ao unir as relações de Moro com os Estados Unidos, apontou, em entrevista ao Jornal do Brasil, que: “a Agência Nacional de Segurança (NSA), que monitorou as comunicações da Petrobras, descobriu a ocorrência de irregularidades e corrupção de alguns militantes do PT e, possivelmente, forneceu os dados sobre o doleiro Alberto Yousseff ao juiz Sérgio Moro, já treinado em ação multi-jurisdicional e práticas de investigação, inclusive com demonstrações reais (como preparar testemunhas para delatar terceiros)”.

Moniz Bandeira denunciou que os prejuízos, causados pela Lava Jato à Petrobras, às construtoras e a toda a cadeia produtiva associada, ultrapassam “em uma escala imensurável” os prejuízos que dizem combater. Contabilizando a desestruturação, a paralisação e a descapitalização das empresas nacionais, públicas e privadas, ele pergunta: “a quem serve o juiz Sérgio Moro, eleito pela revista Time um dos dez homens mais influentes do mundo? A que interesses servem com a Operação Lava Jato? A quem serve o procurador-geral da República, Rodrigo Janot?”

Os crimes apurados nos EUA e na Europa não destruíram as corporações que os cometeram

Na mesma linha de Moniz Bandeira, o professor de Economia Política Internacional da UFRJ, Maurício Metri, observou, na GGN, que os vazamentos de Snowden, em 2013, já revelavam que um dos alvos da espionagem da NSA era a Petrobras. O que torna absolutamente plausível a conclusão que informações sobre a empresa devam ter sido repassados aos operadores da Lava Jato. Processo que culminou com “uma conjuntura que tem fragilizado a própria empresa para além do necessário à averiguação de responsabilidades por malversações, forçando-a a se desfazer de ativos estratégicos e comprometendo a cadeia produtiva ligada a ela”.

O contexto político produzido abriu espaço para a mudança do marco regulatório que dava prioridade à Petrobras na exploração do pré-sal. Metri complementa: “em nome do combate à corrupção, acaba-se por retirar do Estado brasileiro sua capacidade de iniciativa estratégica no setor, atendendo aos objetivos geopolíticos de outros países e de suas respectivas empresas nacionais”.

Para Metri as potências estrangeiras perceberam a política externa autônoma exercida pelo Brasil nos últimos governos, a política de defesa com acesso à energia nuclear e as grandes reservas descobertas de petróleo. O professor finaliza: “alguns dos alvos da operação Lava Jato constituem-se pilares deste conjunto de iniciativas. Sob a névoa das disputas políticas domésticas, as conexões estrangeiras da operação Lava Jato ainda não estão claras, mas seus efeitos já se fazem sentir.”

O Brasil se insinuava forte candidato a tornar-se uma potência média, o que gerou imediatas hostilidades da Superpotência, os EUA, aponta Bruno Lima Rocha, mestre e doutor em ciência política pela UFRGS. “Assim, simplesmente não estamos negando a existência de corrupção, ou mesmo de corrupção estrutural. Afirmamos sim que para a Superpotência, as acusações de práticas empresariais criminosas são um recurso de guerra, uma arma com emprego tático, assim como o uso da força ou da espionagem. Logo, o alvo estratégico da relação EUA com os frutos das delações da Lava Jato, é o desmonte da Petrobras e das empresas de engenharia complexa operando a partir do Brasil.”

Uma bactéria alienígena que se nutria de frações de classes nacionais

“Os órgãos de inteligência americanos, ao passarem as informações da Petrobras, inocularam uma bactéria perigosa no organismo institucional brasileiro, mas que, provavelmente, poderia ter sido contida por anticorpos institucionais básicos em sua fase inicial”, asseverou o estudo A Guerra de Todos contra Todos: A Crise Brasileira, do Instituto de Economia da UFRJ.

A flagrante desestruturação econômica, política e institucional do país atende os interesses externos, especialmente dos EUA, na medida em que “(i) possibilita a abertura da exploração do pré-sal para as empresas estrangeiras; (ii) retarda/paralisa o projeto nuclear brasileiro; (iii) desestabiliza o engajamento do Brasil aos arranjos configurados pelos BRICS; e (iv) desestabiliza a presença das empresas de construção civil nacional na América Latina e África, abrindo mercados para novos entrantes”, complementa o estudo.

“[…] o projeto político aliado com a Lava Jato não se importa com a ‘‘justiça’’, somente em perpetuar uma crise política viciosa como meio de arrastar a sétima maior economia do mundo para a lama”, já afirmava Pepe Escobar antes do impedimento de Dilma Rousseff.

Do GGN/Jornalistas Livres, Cesar Locatelli

segunda-feira, 29 de maio de 2017

As pedras no xadrez da revisão do projeto dos campeões nacionais

Peça 1 – o modelo dos campeões nacionais

O estrago promovido pela Lava Jato na economia obrigará a uma revisão dos conceitos de desenvolvimentismo – e não apenas no Brasil.

Em todos os países que assumiram protagonismo global, o grande instrumento de expansão do poder nacional foram as grandes empresas nacionais como agentes do poder externo do país.

Com o avanço da cooperação internacional, entre autoridades judiciárias dos diversos países, esse modelo entrou em xeque.

Peça 2 – a versão moralista do chutando a própria escada

Ao longo dos séculos, a expansão das empresas multinacionais se deu com corrupção e suborno, no financiamento político dos governos aliados dos países de origem e na conquista de mercados externos. Desse modelo se regalaram as empresas alemãs pós-guerra, como a Siemens, as grandes petroleiras e empreiteiras norte-americanas, os fabricantes de armas. E tudo com ampla complacência dos países de origem.

A partir do início do século 21, o combate à corrupção transacional de outros países tornou-se a principal arma geopolítica comercial norte-americana é. Trata-se de uma estratégia na qual se envolvem as corporações de Estado – FBI, NSA e CIA -, ONGs privadas, Departamento de Justiça. E, especialmente, o poder do Império.

A ação geopolítica norte-americana sempre atuou em duas frentes: as instituições de Estado e as parcerias (ONGs) privadas, um hard power da intervenção militar e um soft power das ações humanitárias. Em vez do discurso do ódio, do anticomunismo, propostas humanitárias, de defesa de princípios civilizatórios, meio ambiente, direitos das populações indígenas, combate à escravidão e outras formas de dumping social, combatendo vícios inerentes ao modelo de expansão das multinacionais das primeiras fases.

Com a ampliação da cooperação internacional, os avanços da espionagem eletrônica, o mapeamento dos fluxos financeiros em paraísos fiscais, as alianças com Ministérios Públicos e. Judiciário nacionais conferiram um poder matador ao país que possuía o poder imperial, os Estados Unidos.

Peça 3 – as tramoias do capital financeiro e do industrial

A maneira como o capital financeiro se apropria de fatias cada vez maiores do orçamento público é institucionalizada e impessoal. Desenvolve teorias pretensamente científicas para justificar os juros e abrir espaço para as diversas apropriações de recursos públicos. Mesmo as tramoias – vazamento de informações sobre leilões de títulos públicos e sobre decisões do Banco Central – não ficam ao alcance do público, seja pela sofisticação, seja pela cumplicidade da mídia.

Já as políticas industriais – aquelas que efetivamente têm reflexos no emprego, crescimento e poder das Nações -  são necessariamente seletivas. Os instrumentos utilizados são tarifas protecionistas, financiamento público, medidas tributárias. Basta o procurador juntar qualquer medida de política industrial com qualquer financiamento de campanha – independentemente da cronologia – para conseguir criminalizar governantes e políticas públicas.

É aí que se baseia a estratégia da ofensiva do capital financeiro sobre as propostas de políticas nacionais autônomas.

Peça 4 – as formas de intervenção externa

Há três formas básicas de intervenção externa – nem todas ilegítimas.

No plano institucional, a parceria dos EUA com o Ministério Público Federal e a Justiça, que arrebentou com alguns dos setores mais relevantes da economia brasileira, como o da engenharia nacional, liquidou com as pretensões brasileiras na África e América Latina e criminalizou políticas conhecidas de Estado -–como financiamentos às exportações de serviços.
A segunda maneira – subjacente à primeira – são as pressões norte-americanas sobre empresas brasileiras apanhadas em malfeitos no exterior, submetendo-as a intervenções diretas de olheiros norte-americanos. É o caso da Embraer, com um interventor fiscalizando de dentro da empresa, com acesso a todas as ações estratégicas da companhia.

A terceira parte são as ONGs do setor privado ligadas a direitos humanos, meio ambiente e outros temas humanitários, pretendendo submeter todos os atos de políticas públicas ao escrutínio internacional. É o caso da ONG Conectas que defende que todo o financiamento do BNDES seja submetido à analise internacional de avaliação de impactos sociais e ambientais.

Peça 5 – os agentes internacionais

Nem se pense em condenar o combate à corrupção e a defesa de bandeiras sociais e ambientais como ações ilegítimas. São bandeiras civilizatórias, necessárias para o aprimoramento social, cultural do país. Reconhecer efeitos antinacionais de suas ações não tira sua legitimidade. Significaria considerar incompatível projetos de país com respeito a avanços sociais e ambientais.

A própria Conectas têm se colocado de forma incisiva contra a selvageria das reformas institucionais, contra a violência da PM nas manifestações populares, contra os massacres de maio de 2006.

Mesmo o MPF tem uma área de defesa de direitos sociais e direitos difusos com grande contribuição às causas sociais. Entre os procuradores, há alguns de bom nível de lado a lado, os liberais e os que enxergam o Estado de forma mais complexa. Mas a resultante, a inteligência corporativa é próxima de zero.

A cara do MPF não é Marcelo Miller – o liberal que largou o MPF – nem Eugênio Aragão – o progressista que está prestes a se aposentar. É Rodrigo Janot, ex-presidente da ANPR (Associação Nacional dos Procuradores da República), o atual José Robalinho Cavalcanti, o antecessor, Antônio Camanho, especializados em cultivar a classe como qualquer populista e montar jogadas com o poder como especialistas em máquinas públicas.
Dado o quadro atual, há um conjunto de lições a se tirar para as próximas décadas.

Peça 6 - As vulnerabilidades do presidencialismo brasileiro

Tem-se, de um lado, um presidencialismo fraco perante o sistema político-partidário. A única alavanca de poder é o crescimento econômico. Quando deixa de existir, expõe o governante à ditadura da maioria. Daí a necessidade da reforma política.

A quadrilha de Temer-Padilha assumiu posição preponderante nos governos FHC, Lula e Dilma após grandes terremotos políticos.

Mas o grande agente oportunista, valendo-se do enfraquecimento do governo, foi a mídia nativa. O poder arbitrário da Lava Jato decorre do apoio que recebeu dos grandes grupos de mídia – que, agora, se rebelam contra ele. Os penalistas do MPF compõem uma boiada sempre o touro guia da mídia. Basta a mídia sugerir qual tema que podem entrar – e garantir holofotes -, para a boiada caminhar na direção apontada.

O mesmo vale para o Supremo Tribunal Federal, no qual Ministros como Luís Roberto Barroso, Luiz Edson Fachin e Carmen Lúcia, dão cada passo tomando a mídia – especialmente a Globo – como referência.

No médio prazo, independentemente do próximo presidente eleito, a reconstrução do país passará por uma ampla redefinição do papel do MPF e da PF, pelo esforço de dotar a estrutura de um mínimo de noção sobre projetos de país, interesse e soberania nacional, para que o combate à corrupção não repita a máquina desgovernada da Lava Jato.

Mas o ponto fulcral é a cartelização da mídia.

Peça 7 - O furo dos campeões nacionais

Todos esses fatos obrigam a uma reavaliação radical do modelo de campeões nacionais.

A lógica econômica dos grupos internacionalizados é abandonar o país de origem e se fixarem no mundo. Foi assim na Argentina dos anos 80. Passou a ser assim no Brasil pós anos 90.

Tanto a Ambev quanto a JBS cresceram graças ao mercado interno, à capacidade de influenciar os órgãos públicos e se alavancar com os financiamentos do BNDES. Adquirida dimensão continental, pulam fora do barco. A Ambev se tornou uma multinacional belga e a JBS há tempos ambiciona a naturalidade norte-americana.

A ideia de Luciano Coutinho – ex-presidente do BNDES – de que os “campeões nacionais” seriam os condutores do desenvolvimento é tão equivocada quanto a da turma de FHC, de que bastaria fortalecer os grandes bancos de investimento que o desenvolvimento viria como consequência.

Ambos – tanto o mercado quanto os campeões nacionais – são relevantes desde que subordinados a uma lógica de país.

Em nome dessa bandeira, o BNDES apoiou setores de baixíssimo nível tecnológico, como o dos frigoríficos, conferiu um poder de cartel para os grandes frigoríficos, em detrimento dos produtores para que a JBS se tornasse uma empresa norte-americana, com papel-chave no fornecimento de proteína para os grandes países competidores dos EUA, China e Rússia.
Na mesma época, negou à Opticom – empresa brasileira na área de ótica, altamente tecnológica – apoio para adquirir um concorrente norte-americano, cujo preço ficara altamente atrativo com a crise de 2008 e que lhe permitiria abrir o mercado norte-americano. Sinal de que também o banco precisa colocar seu enorme acervo de cérebros e de conhecimento setorial para discutir seu papel nas próximas décadas. E não será com o simpaticíssimo Paulo Rabello de Castro que ocorrerá esse aggiornamento do BNDES.

De qualquer modo, a literatura desenvolvimentista terá que incorporar outros temas em suas bandeiras:

1  Mais do que nunca, a competitividade interna dependerá da criação de um ambiente sistemicamente competitivo, voltando-se a valorizar as políticas científico-tecnológicas, as parcerias entre grandes e pequenas empresas, o trabalho das Fundações de Amparo à Pesquisa aliados ao Sebrae, a atração de laboratórios de multinacionais para o país, conforme ocorreu na primeira fase do pré-sal.

2  São empresas estratégicas aquelas cujas atividades dependam intrinsicamente dos fatores internos – como a indústria do petróleo, antes do desmonte da Lava Jato e de Pedro Parente, a indústria da saúde, e as indústrias de bem-estar em geral.

3  Não dá mais para minimizar os problemas sociais, ambientais e de corrupção corporativa. O país tem que se antecipar às novas pressões internacionais e definir códigos severos de respeito aos direitos fundamentais. Mas há a necessidade de aprofundar os estudos acerca das estratégias geopolíticas dos países desenvolvidos. E envolver nesses estudos o Ministério Público e o Judiciário.

4  É preciso que os Ministros sérios do Supremo se debrucem sobre a questão da soberania jurisdicional brasileira.  

Do GGN

quinta-feira, 18 de maio de 2017

As pedras no Xadrez do fim do governo Temer e diretas já

A delação de Joesley Batista, da JBS - divulgada pelo Globo - é a maior bomba política da história.

Joesley entregou gravações com Michel Temer e Aécio Neves, que revelam por completo o que foi a aventura do impeachment e dos vazamentos da Lava Jato na véspera das eleições.

Não se trata mais de corrupção política, captando recursos de caixa 2 para financiamento de campanha. As gravações mostram claramente duas organizações criminosas no topo da política brasileira, uma liderada pelo presidente Michel Temer, outra pelo presidente do PSDB Aécio Neves.

Peça 1 - o caso Temer
Não houve limites para a desfaçatez de Temer. Mal empossado, levou para dentro do governo seus principais operadores pessoais: José Yunes, Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR); mais Eliseu Padilha, Geddel Vieira Lima e Moreira Franco, conhecidos pela enorme capacidade de sobrevivência aos escândalos mais variados.

As gravações mostram ele avalizando a decisão dos Batista, de pagar pelo silêncio de Cunha. E, mais ainda, indicando Loures para uma mega-propina de 20 anos de prazo.

O país ficou literalmente à mercê de uma quadrilha. Sob o comando de Temer e Padilha, montou-se o maior leilão e o maior aparelhamento da história, com parlamentares negociando emendas, colocando apaniguados em órgãos técnicos, negociando projetos de alto interesse estratégico – como o pré-sal, o satélite brasileiro, a nova lei geral de telecomunicações.

Não há salvação para Temer: os crimes ocorreram em plena vigência de seu mandato de presidente. Vai se livrar da prisão devido à idade.

No Mutirão "O caso do primeiro amigo"  (https://goo.gl/FlcCEE) juntamos as matérias levantadas a partir dos documentos enviados pelo Anonymous.

Peça 2 - o caso Aécio Neves
As denúncias contra Aécio Neves, definitivas, porque acompanhadas não apenas de gravações, mas de outras provas colhidas pela PF, como o rastreamento do dinheiro, jogam no centro da notícia o chamado helicoca, e pode abrir caminho para o levantamento das ligações do mundo político com os narcotraficantes.

O dinheiro entregue ao primo não era para o advogado de defesa, conforme alegou Aécio na conversa com Joesley. O dinheiro foi encaminhado para uma das empresas do senador Zezé Perrela (PMDB-MG), justamente o dono do helicóptero encontrado com os 500 quilos de cocaína.

Não foi o primeiro episódio relacionando Aécio com o submundo.

O aeroporto de Cláudio estava na rota do helicóptero (https://goo.gl/OmFYYc) (https://goo.gl/XIoMdd).  E seu primo, Tancredo Tolentino (o único que herdou o nome do avô), e responsável pelas chaves do aeroporto de Cláudio, foi denunciado por esquemas armados com desembargador do Tribunal de Justiça de Minas Gerais visando libertar traficantes. Cada habeas corpus saia por R$ 120 mil.

Toda a blindagem montada ao longo dos últimos anos se esboroa com as denúncias dos irmãos Batista.

Peça 3 – o incêndio
Agora, se entra em um vazio complicado.

Os vazamentos da Lava Jato, às vésperas das eleições de 2014, quase entregam o país nas mãos do mais atrevido e inescrupuloso político brasileiro, Aécio Neves. O impeachment e a posse de Michel Temer tiveram como padrinhos a mídia, a Lava Jato, o juiz Sérgio Moro – autorizando a liberação das gravações de Dilma e Lula -, o Procurador Geral da República (PGR) Rodrigo Janot – avalizando o vazamento, provavelmente por fraqueza -, o Ministro Gilmar Mendes – impedindo a posse de Lula -, os demais Ministros do STF, endossando todas as arbitrariedades. Ou seja, todos são pais do bebê de Rosemary.

Ao mesmo tempo, Aécio era blindado de todas as formas por Rodrigo Janot e Gilmar Mendes, desafetos, mas aliados no trabalho de procrastinar as denúncias contra ele.

A delação dos irmãos Batista desmonta todo o castelo erigido em torno do golpe.

Haverá muita especulação sobre as razões de O Globo – e o Jornal Nacional – terem dado tanto destaque à denúncia. Não se pense em teorias conspiratórias. A notícia viria de qualquer maneira à tona. E, se divulgada por outro meio, deixaria em maus lençóis a própria Globo, principal madrinha de Temer e do golpe. Tiveram pouco tempo para decidir, conforme se viu nos improvisos do JN.

Provavelmente o fato das investigações terem sido tocadas a partir de Brasília, impediu a blindagem de Aécio pela PF de Minas e pela força tarefa de Curitiba. Recorde-se que o próprio juiz Sérgio Moro impediu Eduardo Cunha de encaminhar perguntas incômodas a Temer. Foi necessário um juiz de Brasília para encaminhar as perguntas.

Em todo caso, foram as ameaças de Cunha – e provavelmente o escândalo da Carne Fraca – que precipitaram a delação.

Nesse episódio, PF e PGR mostraram como deve ser a verdadeira delação premiada, tornando o delator agente direto no levantamento de provas, na chamada ação controlada. PF e PGR atuaram em conjunto, documentando cada passo, rastreando o dinheiro e, aparentemente, juntando provas definitivas para desmantelar as duas organizações, em vez do rosário de irrelevâncias das delações tatibitates de Curitiba.

O ponto central é que, pela bomba apresentada – gravações com Temer e Aécio – nem as muralhas de Itaipu poderiam conter a enchente.

Peça 4 – e agora?
Não há a menor possibilidade da permanência do governo Temer. Definitivamente acabou, assim como acabaram as tentativas de reformas articuladas no Congresso.

A grande incógnita é o que virá pela frente. A delação pegou a todos de surpresa, não dando tempo de articular uma saída. Até vazar a delação, o que se tinha era um julgamento de cartas marcadas no TSE (Tribunal Superior Eleitoral) condenando Dilma e livrando Temer.

As alternativas pela frente são:

1.     A renúncia de Temer e o presidente da Câmara Rodrigo Maia assumindo interinamente a presidência. Mas haverá resistência do Congresso. E como fica? Aparentemente não haverá resistência no Congresso.

2.     Se Temer não renunciar rapidamente, o caminho mais razoável será a inelegibilidade de Temer pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral).

3.      Não há a menor possibilidade de prolongar o interinato de Rodrigo Maia. Maia é a síntese de Temer com seu sogro Moreira Franco e seu pai César Maia.

4.     Tentativa de emplacar uma eleição indireta. Nesse caso, o nome de maior aceitação poderia ser o ex-Ministro Nelson Jobim, aliado dos tucanos mas que, nos últimos tempos, buscou aproximação com setores ligados a Lula.

5.     Não existe possibilidade da presidente do STF (Supremo Tribunal Federal) Carmen Lúcia assumir a presidência. Não tem estrutura emocional nem traquejo para administrar os terremotos que virão pela frente até a terra se acomodar novamente.

6.     A única maneira de recompor a legitimidade do sistema político seriam eleições diretas em todos os níveis. Hoje à noite já começaram as manifestações por eleições diretas. Mas como convencer o sistema a convocar eleições sem inabilitar Lula? Por outro lado, como conseguir um mínimo de pacificação sem se valer do potencial de negociação de Lula? Finalmente, o que é o sistema, depois da implosão política de hoje?


Fosse um país minimamente civilizado, a esta altura as principais lideranças estariam amarrando um pacto em torno de pontos mínimos de consenso, permitindo que os grupos políticos se comportassem como náufragos em um barco salva-vidas, cuidando de não brigarem para o barco não virar.

Do GGN