sexta-feira, 31 de julho de 2020

LAVA JATO VIROU ‘ESTADO PARALELO’, AFIRMA O DEPUTADO PAULO TEIXEIRA AO DEFENDER CPI

Paulo Teixeira (PT-SP) afirmou que, além de “bisbilhotar” e “chantagear”, procuradores contribuíram para a destruição da indústria da construção civil.
Comandada por Dallagnol, Lava Jato de Curitiba tem 350 terabytes em dados sigilos
Após o procurador-geral da República, Augusto Aras, revelar que a Operação Lava Jato, em Curitiba, possui “documentos encobertos” de cerca de 38 mil pessoas, o deputado federal Paulo Teixeira (PT-SP) defende a criação de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) para investigar esse e outros abusos cometidos pelos procuradores. “A Operação Lava Jato virou um Estado paralelo, que tem um projeto político”, afirmou em entrevista ao Jornal Brasil Atual, nesta sexta-feira (31).
Segundo Aras, a Lava Jato tem mais de 350 terabytes em dados sigilos, enquanto todo o restante do Ministério Público Federal conserva em torno de 40 terabytes. Para Teixeira, é sinal de que os procuradores atuam para “bisbilhotar” a vida das pessoas. “E não só bisbilhotar, mas chantagear.”
Teixeira citou, por exemplo, o caso do advogado e doleiro Rodrigo Tacla Duran. Ele acusa o advogado Carlos Zucolotto de ter recebido US$ 5 milhões para ajudá-lo a obter vantagens no acordo de delação. Zucolotto é amigo íntimo do ex-juiz Sergio Moro.
Além da espionagem indevida, Teixeira afirma que a Lava Jato entregou dados de empresas brasileiras aos Estados Unidos. E, ainda, praticou a troca de informações, fora dos parâmetros legais, com o Ministério Público da Suíça. “Destruiu a indústria da construção pesada e foi responsável por uma queda expressiva no PIB. Tudo isso indica a necessidade de ter uma CPI da Lava Jato”, afirmou o deputado
Entulho autoritário
O parlamentar também é autor do projeto de lei (PL) que pretende revogar a Lei de Segurança Nacional (LSN). No lugar dessa legislação – anacrônica e autoritária –, o parlamentar propõe a criação da Lei de Defesa do Estado Democrático de Direito. O governo Bolsonaro tem frequentemente tentado intimidar opositores com a LSN, como já fez contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, o cartunista Aroeira, o jornalista Hélio Schwartsman e o ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF).
Por outro lado, a nova legislação prevê punições para aqueles que fizerem apologia da ditadura ou tentarem ameaçar as instituições democráticas. Ademais, as penas são agravadas no caso de funcionários públicos, como forma de inibir o golpismo de parte dos integrantes das Forças Armadas.
Da RBA

PRECISAVA UMA PANDEMIA PARA MOSTRAR O FOSSO SOCIAL NO BRASIL?, POR RUI DAHER


De mais evidente, no entanto, a pandemia rasgou, retalhou, sapateou sobre a máscara social em que vivemos – difícil precisar os tempos – há anos, décadas, talvez séculos, sem notar que fossos sociais levam a fossas escatológicas.
Impossível, hoje em dia, passar por qualquer texto opinativo, seja qual for o tema proposto, sem abordar os efeitos atuais e futuros trazidos pela pandemia causada pelo novo coronavírus.
Massificada pela instantaneidade dos novos meios de comunicação, o que não acontecia em situações similares do passado, a Covid-19 concentrou mazelas e, parece, tornou-se única e onipresente no pensamento científico e social.
Não é.
Claro que também não é um evento local, de proporções limitadas, a ponto de ser tratada como uma “gripezinha”. Cientistas, pesquisadores, organizações mundiais, profissionais de saúde e, principalmente, números comprovam veracidade dos pânicos, contaminação, fatalidade e de estragos virulentos (epa!) na economia, tanto em potências mais abrigadas de colapsos, como nas mais vulneráveis e nos agrupamentos da miséria e do refúgio.
De mais evidente, no entanto, a pandemia rasgou, retalhou, sapateou sobre a máscara social em que vivemos – difícil precisar os tempos – há anos, décadas, talvez séculos, sem notar que fossos sociais levam a fossas escatológicas.
Tem-se discutido com vigor o novo mundo que virá, descobertas vacina e cura. Mais uma vez serei cético. O sistema econômico que se instalou no Ocidente após a Revolução Industrial e as duas Grandes Guerras Mundiais, hoje em dia já foi transplantado para o Oriente, com leves nuances, e está de tal forma entranhado no modo de vida das pessoas, que nem mesmo ferro e fogo serão capazes de fazerem ruir tais estruturas.
Algumas mudanças tópicas e graduais em hábitos e costumes de quem mais pode talvez venham a se consolidar. Penso-as até imperceptíveis, pois somente sabe do topo da pirâmide social quem está em seu topo. O mesmo acontece com a hegemonia entre as nações. No mais, senhoras e senhores, bem antes do coronavírus várias gerações já vinham sendo arrastadas pelos tentáculos do polvo que não mudará.
A ganância do maior acúmulo para consumo conspícuo, a pauperização do trabalho, a lesão de cima para baixo nas regras do comércio internacional, a destruição mundial do meio ambiente, hoje em dimensões amazônicas, o conceito de mérito que faz a miséria ajoelhar-se e agradecer um Deus que, na enxurrada ou vendaval, permitiu-lhes salvar um fogão. A lenha, talvez.
Quanto às perspectivas para o agronegócio brasileiro, creio que mais graves do que a pandemia pelo coronavírus são as atrocidades cometidas pelo governo federal em atos belicosos e descuidados com proteção ambiental e boquirrotos de relações exteriores. Ajudam formar milícias de motosserras e inflamáveis.
Na produção de commodities para exportação, tais infantilidades estão se tornando perigosas. Não à toa as recentes manifestações de grandes empresas, associações e federações, preocupadas com as queimadas e o crescimento do desmatamento na Amazônia.
Não devemos acreditar em vantagens ou desvantagens da guerra comercial – não é somente comercial, não se iludam – entre EUA e China. Quando acontecer para valer, seja lá qual for a raiz do conflito, os dois gigantes sairão ganhando e, nós, Davi de frouxa borracha no estilingue, teremos perdido.
Lembrem-se: se Elvis Presley e John Lennon não morreram, muito menos Donald Trump.
Nisso, a Covid-19 tem sido exemplar. Não importa sua origem, se do morcego chinês ou não, mas sim aonde pararam seus desdobramentos. Entre as duas hegemonias, aquietados e desavisados, com tanta beleza a diverti-los, italianos, suecos, espanhóis, portugueses, britânicos, entre outros países da Europa, sofreram e ainda sofrem duras penas. Pubs, por exemplo.
Creio que àquela altura ninguém mais duvidava de como a infecção pousaria nos países do hemisfério sul, especialmente no gigante adormecido, agora reforçado no “Pátria Amada Brasil”, e focado em batalhas intestinas, sim, não é feio se expressar, aquelas que só acabam dando em merda.
O Brasil está terminando de colher mais uma safra recorde. Duzentos e cinquenta milhões de toneladas de grãos. Beneficiado pelo câmbio e pela sustentação de preços das commodities nas bolsas internacionais, o Valor Bruto da Produção (VBP) em 2020 deverá beirar R$ 720 bilhões, outro recorde. Isto, quando analisamos o agronegócio “visto assim do alto”. Quando olhamos através da lupa, muita coisa muda.
Recente estudo realizado pelo Instituto de Manejo e Certificação Florestal e Agrícola (Imaflora), coordenado pelo engenheiro agrônomo Luís Fernandes Guedes Pinto, a quem entrevistei para a revista CartaCapital (edição de 03/06/2020), calcula “5,3 milhões de imóveis rurais no País, ocupando 422 milhões de hectares de terra, uma área média de 102 hectares (…) um quarto delas são ocupadas por 15.686 dos maiores imóveis do País, ou 0,3% do total (…) outros 25% – quase quatro milhões de propriedades (77%) – com áreas menores”.
O estudo do Imaflora, junto a nove outras universidades, Quem são os poucos donos das terras agrícolas no Brasil – O Mapa da Desigualdade, levou em consideração o índice de Gini, que mede a concentração de renda em determinado grupo. Pobres versus ricos, se bem me entendem.
Nisso nem cético serei. Tenho certeza de que nada irá mudar. Até pelo fato de uma reforma agrária estar completamente desacreditada pelo pensamento dominante atual, que extinguiu o ministério do Desenvolvimento Agrário, emasculou suas estruturas de apoio Incra (Instituto Nacional para Reforma Agrária), Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis), Funai (Fundação Nacional do Índio), e mesmo a ANTR.
Como? Não a conhecem? Associação Negacionista da Terra Redonda.
Entendam. Não estou negando dimensão, valor e benefícios dos agronegócios. Devem ser mantidos e incentivados, originados que são de má formação de estrutura fundiária pensada sempre para conformar o acordo secular de elites. Afinal, é o que temos. Indústria, renda para consumo mercantil, inovações tecnológicas, formação educacional e científica não são exatamente o nosso forte. A cultura popular é, mas está sendo destroçada.
No agronegócio, o que não podemos é ficar dando mole para a OCDE (Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico) em detrimento da OMC (Organização Mundial do Comércio), bobos que somos em não distinguir os EUA como concorrentes e não clientes.
Defendo e não hesito no conceito: tudo o que é produzido dentro dos limites das propriedades rurais é agronegócio. Da soja plantada em 10 mil hectares de Sapezal (MT) ao mel de abelhas produzido em dois hectares das Serras Fluminenses, lá processado, embalado, e vendido para uma Garota de Ipanema.
Nem tudo é preciso ter grandes dimensões para fortalecer o desenvolvimento e a economia. Demorou quase quatro séculos para a agropecuária brasileira sair dos ciclos de monoculturas para a diversificação de bens primários, à exceção da pobreza, que precisou se atirar na subsistência.
Mas, velho articulista, somente pessimismo, nenhuma esperança?
Com o quê, amigos leitores? O vírus ou o verme? Do primeiro, sim. Espero para breve vacina e cura. Do segundo? Bem, a eleição, se deixarem, ainda está longe.
Só que não. Traz-me otimismo o cada vez maior o número de economistas e analistas econômicos que enxerga o Brasil fundamental. Gente daqui e de fora.
Eles começam a fazer envelhecer e fenecer o neoliberalismo. Se não completamente, pelo menos o ultra, aquele que sai dos púlpitos da ultradireita.
De extração nacional, noto Armínio Fraga, André Lara Resende, Bresser- Pereira, Paulo Nogueira Batista Jr., Luiz Gonzaga Belluzzo, Ricardo Carneiro, Laura Carvalho e outros. Todos associando menor desigualdade social a manter e estabilizar democracias e Estados de Direito.
De importação acadêmica e literária, vejo o mesmo em Joseph Stiglitz, Martin Wolf, Dani Rodrik, Thomas Piketty, Mariana Mazzucato e Paul Krugman.
Esses e tantos mais, alguns desde sempre, outros somente agora menos afetados por Chicago, formam meus pensamentos e leituras.
Inté!
Rui Daher – É diretor da consultoria Biocampo Desenvolvimento Agrícola.
Do GGN

quinta-feira, 30 de julho de 2020

LOGÍSTICA? NÃO, INCOMPETÊNCIA, DESCASO E POLÍTICA, POR FERNANDO BRITO

A indicação do “predestinado” – palavra de Jair Bolsonaro – general Eduardo Pazuello para o Ministério da Saúde foi justificada ao país por ser ele um “especialista em logística”.
Ai do Exército brasileiro se depender da capacidade de Pazuello de fazer com que cheguem à frente de batalha os suprimentos de que as tropas necessitassem: é possível que fossem as fardas, mas não os coturnos, ou os fuzis, faltando as balas.
manchete do Estadão põe a nu a tão decantada capacidade do general: quase 10 milhões de testes RT-PCR (os mais acurados) para Covid-19 estão parados em depósitos por falta de reagentes que lhes evidenciam os resultados.
Em resumo, não podem ser aplicados nos brasileiros, embora estejamos sobrando cerca de mil baixas fatais todos os dias, há mais de dois meses.
E Pazuello, para amenizar sua incompetência – sim, ela também é de seus antecessores – diz que “testagem não é essencial“:
O diagnóstico é clínico, é do médico. Pela anamnese, pela temperatura, por um exame de tomografia, por uma radiografia do pulmão, por exame de sangue, podendo até ter um teste. Criaram a ideia de que tem de testar para dizer que é coronavírus. Não tem de testar, tem de ter diagnóstico médico para dizer que é coronavírus. E, se o médico atestar, deve-se iniciar imediatamente o tratamento”
O “doutor” Pazuello é mais sabido que a Organização Mundial de Saúde, que orienta a “testar, testar, testar“, embora é óbvio que, numa epidemia qualquer médico saiba que, na falta de comprovação laboratorial, o tratamento deve supor que é a esta doença o provável e inicie o tratamento possível nesta situação. O número de testes no Brasil é ridiculamente inferior ao de demais nações com nosso tamanho e a maioria são testes “rápidos”, de qualidade muito inferior ao do RT-PCR.
Mas se o general é deficiente ao cumprir suas obrigações para com a população, é bom para o ex-capitão que o comanda: quando não tem teste, não tem número, nem de casos e nem de mortes, até porque há médicos que, sem eles, atestam outra causa mortis, pois a Covid-19 mata por outras complicações ou os óbitos ficam “sob investigação” para serem confirmados depois, “achatando a curva”.
Aliás, a esperteza que Pazuello tentou implantar nas estatísticas fez escola e o prefeito de São Paulo, Bruno Covas, também está usando o método de colocar os números em algum lugar do passado para baixar os indicadores da capital. O El País mostra isso e o documenta, com boletins alterados onde, por exemplo, o último dia 15 de julho “começa” com 217 mortes “a menos” do que seriam registrados, para a mesma data, cinco dias depois.
A diluição de números de maneira retroativa fez com que na semana entre os dias 9 e 16 de julho, 185 mortos sumissem dos cálculos daquele período. É provável que esses óbitos tenham sido redistribuídos por outros dias anteriores, mas não é possível saber, já que os boletins informam somente os números dos últimos sete dias. A única informação nova trazida nos informes foi que os números correspondem aos “óbitos registrados por data de ocorrência”.
Como esta manobra “não colou” no plano federal, a “solução” é segurar os testes, mesmo que isso não permita ajustar medidas sanitárias ou, talvez, até por isso, porque a ordem é “abrir tudo”, talquei?
A expertise do general não é logística, é “esperteza”.
Do Tijolaço

OS FATOS, SENHORES, OS FATOS DA LAVA JATO QUE INVADIU DADOS DE 38 MIL PESSOAS, POR FERNANDO BRITO

Não basta que o Procurador Geral da República diga que a Lava Jato de Curitiba tenha, sozinha, um volume de dados sigilosos 9 vezes maior do que toda a direção da PGR, nem que haja 50 mil documentos ocultos na investigação ou que existam 38 mil pessoas com seus sigilos violados nos HDs de Deltan Dallagnol e Companhia.
A fala de Aras é uma notícia, não uma opinião.
Não é uma polêmica política, sujeita a opiniões sobre ser “contra ou a favor” da Lava Jato. São, se ocorreram, ilegalidades e desvios funcionais e, portanto, deve gerar de imediato procedimentos administrativos e penais que levem a consequências.
O resto é jogar no campo da politicagem com procedimentos judiciais, ambiente próprio para o “lavajatismo”, que procura sustentar por motivos “éticos” as suas ilegalidades.
Sérgio Moro, que não foi acusado de coisa alguma neste caso – embora seja inacreditável que ele não soubesse dos fichários do “SNI” do MP. E diz aos jornais que ‘desconhece segredos ilícitos’ da operação. Aliás, a repórter que assina o texto, no Estadão, diz que ele a “comandou por mais de quatro anos” assumindo o óbvio: que tudo se passava ali sob a orientação de Moro.
É preciso que uma investigação responda às perguntas que a grande imprensa não vai fazer: o que contêm as milhões de páginas de textos, planilhas e imagens que lotam o equivalente a 350 terabytes, ou 700 computadores como este em que trabalho? O que está nos 50 mil “processos invisíveis”, citados por Aras? Quem são os 38 mil cidadãos que tiveram seus dados pessoais e a intimidade violados por Deltan Dallagnol & cia?
O que interessa agora são fatos, não opiniões.
Juridicamente, importa é a materialidade dos crimes praticados à sua sombra e a discriminação das responsabilidades pelo cometimento deles.
Do Tijolaço

terça-feira, 28 de julho de 2020

O CRIME DE ESTELIONATO QUE A LAVA JATO CURITIBA ESCONDE ESPERANDO PRESCREVER


Nos diálogos divulgados pela Vazajato, Diogo Castor admitiu aos colegas ter pago pelo outdoor.
Os jornais noticiam que o procurador Diogo Castor, acusado de ter financiado um outdoor em Curitiba, de exaltação à Lava Jato. O episódio é relevante para mostrar como a Lava Jato instrumentalizou os principais recursos judiciais que ela sempre condenou.
Um deles, a postergação indefinida dos casos, visando a prescrição. Foi o que ocorreu com o Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) e não apenas em relação a Diogo Castor, mas ao próprio Deltan Dallagnol. A denúncia do powerpoint foi retirada de pauta  quarenta vezes e também caminha para a prescrição.
Mais grave é que o caso Diogo Castor encobre um episódio nítido de estelionato.
Segundo matéria da UOL de 27 de setembro de 2019, os procuradores valeram-se de um CPF de terceiro para pagar a conta, do baterista João Carlos Queiroz Barbosa. Ele só soube do fato em abril do ano passado, quando recebeu uma ligação da Polícia Federal intimando-o a dar um depoimento sobre o episódio.
Segundo a reportagem,
“Barbosa, o JC Batera, só descobriu o motivo da intimação ao ficar de frente para o delegado Maurício Moscardi Grillo. O delegado da PF explicou que precisava saber se ele tinha contratado a instalação de um outdoor em homenagem aos cinco anos da operação Lava Jato, em março, numa via de acesso ao aeroporto Afonso Pena, na região metropolitana da capital paranaense. “Eu não contratei nada”, disse Barbosa ao UOL, repetindo as informações que deu à PF. “Os R$ 4.100 que disseram ter custado esse outdoor passam longe do que ganho por mês como músico e instrutor de bateria.” Barbosa havia sido contatado pela PF pois seu nome e alguns de seus dados pessoais constavam de um recibo emitido pela empresa Outodoor midia”.
O único ponto em comum com a Lava Jato é o fato de ter vínculo com uma igreja evangélica de Curitiba. Nos diálogos divulgados pela Vazajato, Diogo Castor admitiu aos colegas ter pago pelo outdoor.
No final de julho, Barbosa foi ao 11º Distrito Policial de Curitiba e registrou boletim de ocorrência. Não obteve detalhes nem da Polícia Federal nem da Civil.
No final da reportagem, a esperança vã de Barbosa: “Espero que essa investigação não demore tanto assim para terminar”.
Do GGN

NA TV AL JAZEERA, LULA DIZ QUE BOLSONARO QUIS GOLPE, MAS RECUOU, POR FERNANDO BRITO

Confira, abaixo, a entrevista de Lula à emissora árabe Al Jazeera como jamais foi chamado a falar numa televisão brasileira.

Durante 25 minutos, ele fala à repórter Teresa Bo, correspondente da emissora na América Latina. sobre a pandemia, sobre o governo Bolsonaro e sua cloroquina – pelo que, diz ele, o atual presidente acabará sendo responsabilizado – e sobre a interferência dos EUA na América Latina, apelando à fermentação de golpes para impedir um desenvolvimento soberano da região.

Sobre Bolsonaro, diz que “ele chegou a pensar em ser um ditador neste país”, mas que “a sociedade reagiu” e que o atual presidente vai ter de aprender a respeitar seus adversários.

Assista, faz tempo que não vejo Lula numa entrevista tão positiva e cheia de energia.

Do Tijolaço

segunda-feira, 27 de julho de 2020

“REJEITEMOS AS OBRAS DAS TREVAS”, DIZEM 152 BISPOS AO CRITICAR INCAPACIDADE DE JAIR BOLSONARO


Em “Carta ao Povo de Deus”, 152 bispos criticam “incapacidade” de Jair Bolsonaro. O documento é assinado pela ala progressista da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB).
Há duas semanas, dois bispos escutados pela reportagem do Brasil de Fato falaram sobre a existência de uma articulação entre os integrantes da ala progressista da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) visando a criação de uma frente para que a entidade tenha “influência” no debate contra o governo de Jair Bolsonaro.
Hoje, 152 bispos, arcebispos e bispos eméritos brasileiros divulgaram um documento denominado Carta ao Povo de Deus, no qual fazem duras críticas ao capitão reformado, principalmente diante da pandemia de covid-19, e ao bolsonarismo.
“Analisando o cenário político, sem paixões, percebemos claramente a incapacidade e inabilidade do Governo Federal em enfrentar essas crises”, afirmam no documento.
“Assistimos, sistematicamente, a discursos anticientíficos, que tentam naturalizar ou normalizar o flagelo dos milhares de mortes pela covid-19 (…) e os conchavos políticos que visam à manutenção do poder a qualquer preço. Esse discurso não se baseia nos princípios éticos e morais, tampouco suporta ser confrontado com a Tradição e a Doutrina Social da Igreja”, afirmam os integrantes da ala progressista.
De acordo com os bispos, essa movimentação não está restrita à CNBB, mas tem encontrado eco em paróquias e igrejas pelo país, onde padres reclamam de perseguição política, por conta das críticas feitas ao governo de Bolsonaro nas missas ou em conversas com fiéis.
O texto é assinado, entre outros, pelo arcebispo emérito de São Paulo, dom Claudio Hummes, pelo bispo emérito de Blumenau, dom Angélico Sandalo Bernardino, pelo bispo de São Gabriel da Cachoeira (AM), dom Edson Taschetto Damian, pelo arcebispo de Belém (PA), dom Alberto Taveira Corrêa, pelo bispo prelado emérito do Xingu (PA), dom Erwin Krautler, pelo bispo auxiliar de Belo Horizonte (MG), dom Joaquim Giovani Mol, e pelo arcebispo de Manaus (AM) e ex-secretário-geral da CNBB dom Leonardi Ulrich.
Leia a “Carta ao Povo de Deus” na íntegra:
“Somos bispos da Igreja Católica, de várias regiões do Brasil, em profunda comunhão com o Papa Francisco e seu magistério e em comunhão plena com a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil, que no exercício de sua missão evangelizadora, sempre se coloca na defesa dos pequeninos, da justiça e da paz. Escrevemos esta Carta ao Povo de Deus, interpelados pela gravidade do momento em que vivemos, sensíveis ao Evangelho e à Doutrina Social da Igreja, como um serviço a todos os que desejam ver superada esta fase de tantas incertezas e tanto sofrimento do povo.
Evangelizar é a missão própria da Igreja, herdada de Jesus. Ela tem consciência de que “evangelizar é tornar o Reino de Deus presente no mundo” (Alegria do Evangelho, 176). Temos clareza de que “a proposta do Evangelho não consiste só numa relação pessoal com Deus. A nossa reposta de amor não deveria ser entendida como uma mera soma de pequenos gestos pessoais a favor de alguns indivíduos necessitados […], uma série de ações destinadas apenas a tranquilizar a própria consciência. A proposta é o Reino de Deus […] (Lc 4,43 e Mt 6,33)” (Alegria do Evangelho, 180). Nasce daí a compreensão de que o Reino de Deus é dom, compromisso e meta.
É neste horizonte que nos posicionamos frente à realidade atual do Brasil. Não temos interesses político-partidários, econômicos, ideológicos ou de qualquer outra natureza. Nosso único interesse é o Reino de Deus, presente em nossa história, na medida em que avançamos na construção de uma sociedade estruturalmente justa, fraterna e solidária, como uma civilização do amor.
O Brasil atravessa um dos períodos mais difíceis de sua história, comparado a uma “tempestade perfeita” que, dolorosamente, precisa ser atravessada. A causa dessa tempestade é a combinação de uma crise de saúde sem precedentes, com um avassalador colapso da economia e com a tensão que se abate sobre os fundamentos da República, provocada em grande medida pelo Presidente da República e outros setores da sociedade, resultando numa profunda crise política e de governança.
Este cenário de perigosos impasses, que colocam nosso país à prova, exige de suas instituições, líderes e organizações civis muito mais diálogo do que discursos ideológicos fechados. Somos convocados a apresentar propostas e pactos objetivos, com vistas à superação dos grandes desafios, em favor da vida, principalmente dos segmentos mais vulneráveis e excluídos, nesta sociedade estruturalmente desigual, injusta e violenta. Essa realidade não comporta indiferença.
É dever de quem se coloca na defesa da vida posicionar-se, claramente, em relação a esse cenário. As escolhas políticas que nos trouxeram até aqui e a narrativa que propõe a complacência frente aos desmandos do Governo Federal, não justificam a inércia e a omissão no combate às mazelas que se abateram sobre o povo brasileiro.
Mazelas que se abatem também sobre a Casa Comum, ameaçada constantemente pela ação inescrupulosa de madeireiros, garimpeiros, mineradores, latifundiários e outros defensores de um desenvolvimento que despreza os direitos humanos e os da mãe terra. “Não podemos pretender ser saudáveis num mundo que está doente. As feridas causadas à nossa mãe terra sangram também a nós” (Papa Francisco, Carta ao Presidente da Colômbia por ocasião do Dia Mundial do Meio Ambiente, 05/06/2020).
Todos, pessoas e instituições, seremos julgados pelas ações ou omissões neste momento tão grave e desafiador. Assistimos, sistematicamente, a discursos anticientíficos, que tentam naturalizar ou normalizar o flagelo dos milhares de mortes pela covid-19, tratando-o como fruto do acaso ou do castigo divino, o caos socioeconômico que se avizinha, com o desemprego e a carestia que são projetados para os próximos meses, e os conchavos políticos que visam à manutenção do poder a qualquer preço.
Esse discurso não se baseia nos princípios éticos e morais, tampouco suporta ser confrontado com a Tradição e a Doutrina Social da Igreja, no seguimento Àquele que veio “para que todos tenham vida e a tenham em abundância” (Jo 10,10).
Analisando o cenário político, sem paixões, percebemos claramente a incapacidade e inabilidade do Governo Federal em enfrentar essas crises. As reformas trabalhista e previdenciária, tidas como para melhorarem a vida dos mais pobres, mostraram-se como armadilhas que precarizaram ainda mais a vida do povo.
É verdade que o Brasil necessita de medidas e reformas sérias, mas não como as que foram feitas, cujos resultados pioraram a vida dos pobres, desprotegeram vulneráveis, liberaram o uso de agrotóxicos antes proibidos, afrouxaram o controle de desmatamentos e, por isso, não favoreceram o bem comum e a paz social. É insustentável uma economia que insiste no neoliberalismo, que privilegia o monopólio de pequenos grupos poderosos em detrimento da grande maioria da população.
O sistema do atual governo não coloca no centro a pessoa humana e o bem de todos, mas a defesa intransigente dos interesses de uma “economia que mata” (Alegria do Evangelho, 53), centrada no mercado e no lucro a qualquer preço.
Convivemos, assim, com a incapacidade e a incompetência do Governo Federal, para coordenar suas ações, agravadas pelo fato de ele se colocar contra a ciência, contra estados e municípios, contra poderes da República; por se aproximar do totalitarismo e utilizar de expedientes condenáveis, como o apoio e o estímulo a atos contra a democracia, a flexibilização das leis de trânsito e do uso de armas de fogo pela população, e das leis do trânsito e o recurso à prática de suspeitas ações de comunicação, como as notícias falsas, que mobilizam uma massa de seguidores radicais.
O desprezo pela educação, cultura, saúde e pela diplomacia também nos estarrece. Esse desprezo é visível nas demonstrações de raiva pela educação pública; no apelo a ideias obscurantistas; na escolha da educação como inimiga; nos sucessivos e grosseiros erros na escolha dos ministros da educação e do meio ambiente e do secretário da cultura; no desconhecimento e depreciação de processos pedagógicos e de importantes pensadores do Brasil; na repugnância pela consciência crítica e pela liberdade de pensamento e de imprensa; na desqualificação das relações diplomáticas com vários países; na indiferença pelo fato de o Brasil ocupar um dos primeiros lugares em número de infectados e mortos pela pandemia sem, sequer, ter um ministro titular no Ministério da Saúde; na desnecessária tensão com os outros entes da República na coordenação do enfrentamento da pandemia; na falta de sensibilidade para com os familiares dos mortos pelo novo coronavírus e pelos profissionais da saúde, que estão adoecendo nos esforços para salvar vidas.
No plano econômico, o ministro da economia desdenha dos pequenos empresários, responsáveis pela maioria dos empregos no país, privilegiando apenas grandes grupos econômicos, concentradores de renda e os grupos financeiros que nada produzem. A recessão que nos assombra pode fazer o número de desempregados ultrapassar 20 milhões de brasileiros. Há uma brutal descontinuidade da destinação de recursos para as políticas públicas no campo da alimentação, educação, moradia e geração de renda.
Fechando os olhos aos apelos de entidades nacionais e internacionais, o Governo Federal demonstra omissão, apatia e rechaço pelos mais pobres e vulneráveis da sociedade, quais sejam: as comunidades indígenas, quilombolas, ribeirinhas, as populações das periferias urbanas, dos cortiços e o povo que vive nas ruas, aos milhares, em todo o Brasil.
Estes são os mais atingidos pela pandemia do novo coronavírus e, lamentavelmente, não vislumbram medida efetiva que os levem a ter esperança de superar as crises sanitária e econômica que lhes são impostas de forma cruel.
O Presidente da República, há poucos dias, no Plano Emergencial para Enfrentamento à covid-19, aprovado no legislativo federal, sob o argumento de não haver previsão orçamentária, dentre outros pontos, vetou o acesso a água potável, material de higiene, oferta de leitos hospitalares e de terapia intensiva, ventiladores e máquinas de oxigenação sanguínea, nos territórios indígenas, quilombolas e de comunidades tradicionais (Cf. Presidência da CNBB, Carta Aberta ao Congresso Nacional, 13/07/2020).
Até a religião é utilizada para manipular sentimentos e crenças, provocar divisões, difundir o ódio, criar tensões entre igrejas e seus líderes. Ressalte-se o quanto é perniciosa toda associação entre religião e poder no Estado laico, especialmente a associação entre grupos religiosos fundamentalistas e a manutenção do poder autoritário.
Como não ficarmos indignados diante do uso do nome de Deus e de sua Santa Palavra, misturados a falas e posturas preconceituosas, que incitam ao ódio, ao invés de pregar o amor, para legitimar práticas que não condizem com o Reino de Deus e sua justiça?
O momento é de unidade no respeito à pluralidade! Por isso, propomos um amplo diálogo nacional que envolva humanistas, os comprometidos com a democracia, movimentos sociais, homens e mulheres de boa vontade, para que seja restabelecido o respeito à Constituição Federal e ao Estado Democrático de Direito, com ética na política, com transparência das informações e dos gastos públicos, com uma economia que vise ao bem comum, com justiça socioambiental, com “terra, teto e trabalho”, com alegria e proteção da família, com educação e saúde integrais e de qualidade para todos.
Estamos comprometidos com o recente “Pacto pela vida e pelo Brasil”, da CNBB e entidades da sociedade civil brasileira, e em sintonia com o Papa Francisco, que convoca a humanidade para pensar um novo “Pacto Educativo Global” e a nova “Economia de Francisco e Clara”, bem como, unimo-nos aos movimentos eclesiais e populares que buscam novas e urgentes alternativas para o Brasil.
Neste tempo da pandemia que nos obriga ao distanciamento social e nos ensina um “novo normal”, estamos redescobrindo nossas casas e famílias como nossa Igreja doméstica, um espaço do encontro com Deus e com os irmãos e irmãs.
É sobretudo nesse ambiente que deve brilhar a luz do Evangelho que nos faz compreender que este tempo não é para a indiferença, para egoísmos, para divisões nem para o esquecimento (cf. Papa Francisco, Mensagem Urbi et Orbi, 12/4/20).
Despertemo-nos, portanto, do sono que nos imobiliza e nos faz meros espectadores da realidade de milhares de mortes e da violência que nos assolam. Com o apóstolo São Paulo, alertamos que “a noite vai avançada e o dia se aproxima; rejeitemos as obras das trevas e vistamos a armadura da luz” (Rm 13,12).
O Senhor vos abençoe e vos guarde. Ele vos mostre a sua face e se compadeça de vós.
O Senhor volte para vós o seu olhar e vos dê a sua paz! (Nm 6,24-26).
Do Viomundo

sábado, 25 de julho de 2020

QUEM VAI PARAR O “DOPS DE BOLSONARO”? POR FERNANDO BRITO

Rubens Valente, em sua coluna no UOL, dá a partida no esclarecimento do que está fadado a ser um dos maiores escândalos do governo Bolsonaro, com direito a respingar sobre o ex-ministro Sergio Moro, com a ciência de que se formou, no ministério da Justiça, uma polícia política destinada a espionar pessoas por “crimes de opinião”, um “Dops bolsonarista“, com um grupo de arapongas montado para espionar opositores políticos do atual presidente.
Ele aponta que, no decreto com que Jair Bolsonaro e Sérgio Moro reestruturaram o Ministério, deu-se à Secretaria de Operações Integradas o poder de “estimular e induzir a investigação de infrações penais, de maneira integrada e uniforme com as policias federal e civis” que, todos pensaram, seria uma espécie de coordenação entre polícias estaduais e federais, como acontecia antes. Moro chegou a anunciar que ela agiria contra as ações do crime organizado de dentro dos presídios.
Entretanto, aponta Valente, logo após o sr. Jair Bolsonaro ter chamado os que se declaravam “antifascistas”de “marginais e terroristas” , a Siopi passou a agir como se fosse ela própria um órgão policial, fazendo investigações sobre servidores públicos e professores, usando para isso órgãos das polícias federais e estaduais, para o que não tem poder.
É evidente que isso irá parar no Supremo Tribunal Federal e o desfecho é óbvio: a anulação de todos os procedimentos e a responsabilização de quem os determinou.
E, neste caso, o bode expiatório possível é o próprio Ministro André Mendonça, que com isso lançará fora suas chances de tornar-se o ministro terrivelmente evangélico do STF. Vai purgar as culpas do verdadeiro mandante: Jair Messias Bolsonaro.
Não será o único, outros virão, nem todos de paletó e gravata.
Do Tijolaço

IMPARCIALIDADE DE MORO JUSTIFICARIA SUA SUSPEIÇÃO EM QUALQUER PAÍS, DIZ O JURISTA ITALIANO FERRAJOLI


Sérgio Moro. Foto: Marcelo Camargo/Agência Brasil
Publicado no CONJUR
O jurista italiano Luigi Ferrajoli, um dos mais importantes teóricos do garantismo penal, afirmou que a “explícita imparcialidade” do ex-juiz Sergio Moro justificaria sua suspeição em qualquer país do mundo. A declaração foi feita em entrevista publicada pela edição da Folha de S. Paulo neste sábado (25/7).
Ao jornal, o ex-juiz e professor emérito de Filosofia do Direito da Universidade Roma Tre criticou o que considerou uma visível confusão entre acusação e órgão julgador durante a condução da “lava jato”; disse que o caso Lula faz a operação mãos limpas parecer garantista; e que o Tribunal do Júri não é um procedimento justo para processar acusados de crimes graves.
“No caso da condenação do ex-presidente Lula, as violações das garantias do devido processo legal foram, desde o início, massivas. Em qualquer outro país, o comportamento do juiz Moro justificaria sua suspeição, por sua explícita falta de imparcialidade e pelas repetidas antecipações de julgamento”, disse.
Para ele, não há dúvida de que os julgamentos italianos do início dos anos 1990 tenham cometido indubitáveis “excessos antigarantistas”, como o abuso de prisões preventivas e o excessivo protagonismo da figura do delator.
No entanto, prossegue, comparados com a atuação de Moro e dos procuradores do MPF em Curitiba, os julgamentos na Itália “parecem um modelo de garantismo”. “Neles, nunca houve confusão entre juiz e acusação: as limitações da liberdade na fase de instrução e, obviamente, as sentenças sempre foram decididas por juízes independentes que, muitas vezes, rejeitavam os pedidos da acusação por considerar que eles não eram fundados em provas suficientes”, disse.
Não é a primeira vez que Ferrajoli critica a atuação de Moro e dos procuradores do Paraná. Em carta publicada na ConJur em 2018, ele expressou preocupações com o “singular traço inquisitório do processo penal brasileiro” e a confusão “entre o papel julgador e o papel de instrução”.
“A impressão que este processo desperta em extenso setor da cultura jurídica democrática italiana, é aquela de uma ausência impressionante de imparcialidade por parte dos juízes e procuradores que o promoveram”, afirmou na ocasião.
Suspeição
Ao que tudo indica, a ação sobre a suspeição de Moro, em análise na 2ª Turma do Supremo Tribunal Federal, deve ser julgado ainda este ano. Se o ex-magistrado da 13ª Vara Federal de Curitiba for considerado suspeito, os processos do ex-presidente Lula voltam à fase de denúncia e o petista poderá voltar a se candidatar.
O processo contra Moro foi ajuizado depois que o site The Intercept Brasil revelou trocas de mensagens entre ele e procuradores da autointitulada “força-tarefa da lava jato” em Curitiba. Nas conversas, as funções de acusação e julgamento se confundem.
O ex-juiz, por exemplo, orientava o trabalho dos procuradores e cobrava eficiência por parte da “força-tarefa”, chegando até mesmo a ordenar operações de busca e apreensão na casa de suspeitos sem provocação do Ministério Público.
Em 2016, Moro chegou a receber uma manifestação inacabada do MP. Depois de ser cobrado pelo ex-juiz, o procurador Deltan Dallagnol enviou a peça sem revisão para que Moro pudesse adiantar uma sentença.
Do DCM

DECISÃO DE AUGUSTO ARAS FORTALECE INVASORES DE TERRA INDÍGENA NO MATO GROSSO


Parecer do PGR favorece a revisão da demarcação do território Kayabi; entre os possíveis beneficiados, o bilionário grupo canadense Brookfield e grandes desmatadores.
Foto: Isac Nobrega/PR
Uma tragédia assombra os indígenas no Mato Grosso. A pandemia explodiu em todo o estado desde maio, e o cenário é tão grave que, ironicamente, pela primeira vez em 50 anos não haverá Kuarup, o ritual em homenagem aos mortos realizado pelos povos do Xingu. Mas a Covid-19 não é a única ameaça no horizonte. Uma decisão recente do procurador-geral da República sinaliza uma tempestade perfeita sobre suas terras. Em junho, Augusto Aras ignorou recomendações contrárias do próprio Ministério Público Federal (MPF) e convocou “todos os envolvidos” para discutir o caso da Terra Indígena (TI) Kayabi.
O estado de Mato Grosso quer de volta ao menos 80 mil hectares das terras Kayabi, na bacia do combalido rio Teles Pires, fronteira com o Pará. O governo estadual se colocou contra a demarcação assim que a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) a assinou, em abril de 2013. O governo paraense, por outro lado, não a contesta. A TI Kayabi se espalha por mais de 1 milhão de hectares entre Apiacás, no extremo norte mato-grossense, e Jacareanga, no Pará.
Larissa Fernandes/Agência Pública
Há muitos interesses em disputa nessas terras. Para o governo mato-grossense, elas já têm donos: grandes desmatadores da Amazônia, além do bilionário fundo canadense Brookfield. Áudios, documentos e relatórios obtidos pela Agência Pública revelam como os “envolvidos” convocados por Augusto Aras pressionam os indígenas a ceder os 80 mil hectares.
Até a Fundação Nacional do Índio (Funai) se vê embrenhada nas denúncias: um de seus servidores é criticado por apoiar um eventual acordo. As acusações respingam no ruralista Nilson Leitão (PSDB-MT), quando ainda era presidente da Frente Parlamentar Agropecuária no Congresso.
Tanto a Funai quanto o MPF sabem da gravidade do caso. O setor dedicado a questões indígenas no MPF – a 6ª Câmara de Coordenação e Revisão – não recomenda acordos ou reuniões, mas um ajuste de contas com os invasores.
“O único acordo que se pode fazer no caso Kayabi é definir quando os intrusos sairão das terras”, disse à Pública o procurador Antônio Carlos Bigonha, responsável pela 6ª Câmara entre 2018 e junho de 2020. Ele afirmou também que as investidas contra a área são algo “completamente afrontoso, sobretudo por já ter sido demarcada” pela Presidência da República.
Segundo apurou a Pública, Aras ignorou os avisos e nem sequer consultou Bigonha, o que causou estranhamento nos que acompanham o caso. A convocatória foi publicada quando o procurador-geral estava bastante ocupado, trocando todos os coordenadores temáticos do MP. Suas escolhas geraram polêmicas, especialmente no caso do procurador Juliano Baiocchi, novo coordenador do setor de Meio Ambiente no MPF.
Procurada, a Procuradoria-Geral da República (PGR) disse que “as audiências públicas visam debater temas como desintrusão, indenizações e dirimir outros conflitos que porventura existam”. Informou ainda que o encontro foi adiado pelo ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Fux, por conta da pandemia.
O cancelamento, porém, não foi definitivo, como querem os indígenas. Não faltam motivos para estarem ressabiados com qualquer tipo de acordo.
Fundo estrangeiro reclama 75 mil hectares das terras – e Mato Grosso apoia
Tanto fazendeiros quanto a prefeitura propõem a diminuição de todas as terras indígenas em Apiacás há mais de 20 anos. As intrusões ali impressionam: somam uma área equivalente a três vezes o município do Rio de Janeiro, só sobre territórios do tipo, segundo o Serviço Florestal Brasileiro.
Durante esse mesmo período, a Agropecuária Vale do Ximari Ltda. luta incessantemente na Justiça para garantir suas posses. Ela alega ser dona das glebas Estância Jardim, Raposo Tavares I e II e Santa Rosa: são aproximadamente 75 mil hectares de floresta amazônica embrenhados nas terras Kayabi. Essa área insere um player de peso na história, o fundo canadense Brookfield.
Originalmente criado por estrangeiros no Brasil, ele ajudou a fundar a companhia de energia Light, do Rio de Janeiro, no início do século passado. Hoje, o grupo é controlado por uma teia de empresas registradas em paraísos fiscais, como no estado de Delaware, nos Estados Unidos, e nas Ilhas Cayman. A Agropecuária Vale do Ximari Ltda. é listada como uma de suas várias “sociedades sob controle comum”.
Discretamente, os canadenses são donos de ao menos 269 mil hectares no país, com fazendas no Maranhão, Mato Grosso do Sul e Minas Gerais, entre outros, e mais de US$ 26 bilhões em investimentos. Aplicam em vários segmentos, como na produção de soja, em usinas de cana-de-açúcar e na pecuária – só em 2015, o Brookfield tinha um rebanho de mais de 40 mil cabeças de gado.
A Receita Federal confirma a relação entre os canadenses e a Agropecuária Vale do Ximari Ltda. O Ministério da Economia lista Esteban Fornasar, Luís Fernando Della Togna e Renato Cassim Cavalini como seus administradores, e o fundo Brookfield como único sócio.
O processo de reintegração de posse está empacado há anos na 3ª Vara da Justiça Federal em Cuiabá, com decisões favoráveis aos Kayabi. Para a Funai e a União, a fazenda do Brookfield em Apiacás pertence aos indígenas, que a retomaram após uma invasão.
O governo mato-grossense dá tanta razão aos estrangeiros que tomou parte nessa ação. Foi em 2009 que o estado pediu para entrar no processo, anos antes da demarcação. A Justiça autorizou, e o governo tornou-se um assistente do bilionário fundo na disputa. O governador era Blairo Maggi (Progressistas), ex-ministro da Agricultura e um dos homens mais poderosos do agronegócio no Brasil.
À Pública, a Brookfield alega ser “a única legítima proprietária e possuidora do imóvel” e diz que luta contra “invasões ilegítimas de indígenas desde 2007”. O grupo canadense garante que não desistirá das terras.
“Vocês vão passar a vida inteira dependendo dos outros”
Como muitos de seus parentes na Amazônia, os Apiaká, Kayabi e Munduruku carregam memórias dolorosas de um passado recente. Nos anos 1960, boa parte foi expulsa da região, onde viviam cercados por cachoeiras, corredeiras e ilhas, à beira do atual Parque Nacional do Juruena.
Militares os sequestraram durante os anos de chumbo, confinando-os no Parque Indígena do Xingu. O método foi repetido à exaustão no Mato Grosso, como na área da Terra Indígena Marãiwatsédé, dos Xavante.
A vida foi uma luta árdua para os que ficaram. Os Kayabi mais velhos não se esquecem do tempo em que viviam escondidos sob as copas de árvores, como castanheiras e copaibeiras, com medo de que também fossem vistos e raptados. São os anciões quem mais resistem às investidas atuais sobre suas terras, já sufocadas por hidrelétricas na região.
A defesa dos territórios indígenas é um dos pilares da Funai. Mas nesse caso um de seus funcionários é acusado de fazer o exato oposto.
Servidor desde os anos 1980, Francisco das Chagas Lopes Rocha trabalhou junto às comunidades, entre 2014 e abril de 2020. Foi logo após, em maio, que ele saiu do anonimato, quando nomeado para uma das chefias da Frente de Proteção Etnoambiental Madeirinha-Juruena.
Lopes Rocha recusou o cargo três dias após a indicação, depois que sua atuação junto aos Kayabi veio à tona. Ele dizia aos indígenas que só teriam paz quando negociassem a porção mato-grossense de suas terras.
“Em volta, todo mundo cria gado, planta soja, planta milho, planta algodão”, afirmou a lideranças, antes de avisá-las de que tinham “um problema muito grande nas mãos”. “Vejo que vocês, aí do Kayabi, continuam nessa situação, calados. Esperando o quê, gente?”, diz Lopes Rocha, em material obtido pela Pública.
Em 2016 a Funai alertava sobre “conflitos sociais e fundiários com os não índios ainda instalados” na TI Kayabi, tida como “muito sensível”. “A incerteza aumenta a tensão e abre espaço para a violência, com risco inclusive para os servidores que atuam no local”, diz o MPF.
A atuação de Lopes Rocha rendeu queixas, afastamento temporário de 60 dias e um inquérito da Polícia Federal (PF), hoje arquivado.
As denúncias sugerem que ele “[fez] com que lideranças jovens acreditem que podem negociar a área com fazendeiros” em troca de benfeitorias, como uma Casa de Apoio à Saúde Indígena e a ampliação da rede de energia elétrica. “Vocês nunca vão ter liberdade para fazerem o que quiserem, quando quiserem, a hora que quiserem. Vocês vão passar a vida inteira dependendo dos outros”, diz Lopes Rocha.
Em depoimento à PF, ele defendeu um acordo “entre Estado de Mato Grosso e União, com a participação dos indígenas” e disse que decisões do ministro Luiz Fux sobre as terras Kayabi provavam que ele “está certo”.
Há outras acusações, ainda mais graves. Há denúncia de manipulação de crianças nas aldeias, pagando-lhes R$ 60 para que colhessem assinaturas sem lhes explicarem nada.
O material endossaria uma carta favorável à diminuição da TI, “afirmando que a comunidade deseja oferecer uma proposta pelas terras objeto de conflito (80 mil hectares ocupados por fazendeiros)”, segundo a PGR.
A Procuradoria da República pediu o arquivamento do inquérito no último dia 13 de maio. Ela alega que “não há elementos que comprovem que ele [Lopes Rocha] esteja patrocinando interesse privado”, ou seja, intercedendo em favor dos fazendeiros.
À Pública, a defesa do servidor alega que desconhece as denúncias e que, “somente após conhecer formalmente tais acusações, tais perguntas poderão ser devidamente respondidas”. Lopes Rocha disse ainda que “reitera seu total compromisso com a defesa intransigente dos direitos dos povos indígenas”. O servidor permanece no Mato Grosso, lotado na coordenação da Funai em Cuiabá (MT).
A POLÍTICA NOS BASTIDORES
Durante conversas com os Kayabi, Lopes Rocha trazia um político à história. Segundo ele, jovens líderes lhe pediam que intercedesse junto ao ex-deputado Nilson Leitão (PSDB). Queriam conversar sobre suas terras com ninguém menos que o então presidente da bancada ruralista no Congresso.
“Se ele [Nilson Leitão] é inimigo, então todo mundo é inimigo: o prefeito, os proprietários, os moradores da cidade, todo mundo pensa diferente do índio”, dizia. “Se eles quiserem fazer, vamos procurar fazer tudo dentro da lei”, também afirma o servidor, antes de garantir que, pela Funai, “já pediram agenda e estão aguardando a confirmação da data” com o ruralista, diz o trecho de um áudio obtido pela reportagem.
Leitão é um entusiasta de acordos como esse, vantajosos aos fazendeiros. Em abril, o ruralista saudou o presidente da Funai, Marcelo Xavier, por permitir a certificação de fazendas em áreas sob demarcação. Só no Mato Grosso, a medida pode abocanhar mais de 480 mil hectares de terras indígenas, contando somente os latifúndios que as invadem.
Leitão e Xavier falam a mesma língua no tema. Talvez seja por conta de seu trabalho conjunto na CPI da Funai e do Incra, em 2017. O líder ruralista relatou as atividades, enquanto Xavier era um dos assessores na comissão. O relatório final criminalizou 67 indígenas, antropólogos, procuradores da República e defensores dos povos originários, incluindo desafetos de ambos no Mato Grosso.
Enquanto isso, o governo lidera uma ofensiva contra áreas indígenas no estado. O atual governador, Mauro Mendes (DEM), patrocina uma lei que certifica fazendas em todas as terras, em vias de aprovação pelos deputados estaduais. O projeto foi lançado dias depois da nova diretriz da Funai, celebrada por Nilson Leitão.
Procurado pela Pública, o ruralista não comentou o caso dos Kayabi nem sua relação com Lopes Rocha, dizendo apenas que recebeu “diversas lideranças indígenas durante os trabalhos da CPI”. Já o servidor disse que “conheceu o ex-deputado em 2017, durante uma audiência pública realizada na Câmara dos Deputados, em Brasília”, mas que não é próximo dele.
DESMATADORES E LATIFUNDIÁRIOS À ESPREITA
Para o governo estadual, as terras Kayabi têm vários donos. Em sua maioria são empresários do Sudeste, do Sul e outros fazendeiros que esperam por um acordo, longe dos holofotes. Grande parte deles se apossou da área enquanto indígenas eram expulsos pelos militares, há mais de 50 anos.
Latifundiários como Jeremias e Moisés Prado dos Santos se estabeleceram nesse ponto da Amazônia ao longo do tempo. Eles partilham o registro de duas fazendas, Matão e Paredão, que, juntas, invadem mais de 13 mil hectares do território Kayabi. É mais de um terço do total invadido, segundo dados do governo mato-grossense.
Outro intruso é Jair Roberto Simonato, dono das fazendas Olho d’Água e Santa Laura Xibanti. Somadas, invadem outros 8,8 mil hectares. Ele é um conhecido pecuarista na região, tido como um dos maiores desmatadores da Amazônia desde os anos 2000.
Em 2006, a PF acusou Jair, Jeremias e Moisés de grilar as terras dos indígenas. Para o Ibama, eles também são responsáveis por desmatar ilegalmente a área durante anos.
Simonato foi punido em mais de R$ 20 milhões, enquanto Jeremias e Moisés somam mais de R$ 16,5 milhões em crimes contra a flora. Considerando apenas as fazendas autodeclaradas dentro da terra indígena, há ao menos R$ 48,5 milhões em multas por desmatamento ilegal – os três ostentam as maiores delas. Os dados do Ibama foram organizados pelo observatório De Olho nos Ruralistas.
GARIMPOS GERAM MILHÕES E MORTES
Garimpeiros se aproveitam das diferenças entre as etnias para costurar acordos ilegais, levando o que podem. A cobiça é alta graças às reservas de ouro dentro do território indígena. A Funai e o Ministério Público sabem dessa verdadeira ofensiva há anos.
“Desde agosto de 2016 a Funai vem alertando sobre a existência de queixas dos índios”, diz o MPF, que ainda descreve um preocupante aumento de atividades proibidas na região, com “balsas de mineração no rio São Benedito”.
Em 2012, uma desastrosa operação da PF revelou um esquema que movimentava milhões em extração ilegal de ouro na região. O ouro era retirado, “lavado” e vendido a um grupo de investidores em São Paulo. Segundo a PF, “uma das empresas movimentou mais de R$ 150 milhões” só durante a investigação.
Um dos alvos foi Cacildo Jacoby, presidente da Cooperativa de Garimpeiros da Amazônia (Coogam). Ele acabou denunciado por formação de quadrilha, usurpação dos bens da União, poluição e extração de bens minerais sem autorização do órgão competente. Esta cooperativa mantém três pedidos à Agência Nacional de Mineração para garimpar na TI Kayabi, abertos em 2008 e 2012.
Mas a investigação sobre os garimpos terminou em tragédia. A Operação Eldorado deixou como saldo acusações de tortura, dezenas de baleados e machucados, crianças desaparecidas, barcos e outros bens destruídos.
No dia seguinte à operação, Adenilson Kirixi Munduruku foi encontrado boiando no rio Teles Pires, com três tiros nas pernas e um, mortal, na cabeça. Para o MPF, o delegado federal Antônio Carlos Moriel Sanchez o executou, à queima-roupa.
A Justiça Federal de Itaituba (PA) o absolveu, mas o MPF recorre. Em fevereiro passado ocorreram turbulentas audiências sobre o caso, ainda sem decisão definitiva, como relatado pelo portal Amazônia Real.
GGN