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quinta-feira, 18 de janeiro de 2018

Um desembargador sério não chancelaria sentença tão fraca, diz Rogério Dultra

Doutor em Ciência Política e professor de Direito da Universidade Federal Fluminense, Rogério Dultra disse em entrevista ao GGN, na tarde desta quarta (17), que "qualquer pessoa com bom senso olha a sentença [do caso triplex] e não acredita que algum desembargador sério, correto, vá chancelar uma condenação tão fraca, mal feita e desprovida de qualidade jurídica." 
"Alguém sério aprovar um negócio desse, aliás, é a prova de que não é sério", disparou. 
Apesar de ter tido acesso à íntegra da sentença e analisar que o correto seria o Tribunal Regional Federal da 4ª Região (TRF-4) anular a condenação imposta a Lula por Sergio Moro, Dultra avaliou que "o mais provável é que a decisão seja chancelada porque a Justiça, neste caso, está funcionando de maneira política." 
"Não tenho dúvidas de que é um processo político, eivado de ilegalidades e deve ser anulado. Mas acho que isso não vai ocorrer, porque essa faixa do Judiciário não está operando sobre critérios jurídicos, mas políticos." 
O GGN publicou hoje uma reportagem resumindo em 4 tópicos os principais problemas na sentença de Sergio Moro que deveriam ser enfrentados pelo TRF-4, no próximo dia 24, e que vão além da discussão sobre Lula não ser, no papel, o proprietário do triplex. 
Dultra opinou que o primeiro dos tópicos abordados - o fato de que Lula foi denunciado por um suposto crime A, narrado pelo Ministério Público, e acabou condenado por um suposto crime B, definido por Moro - é uma afronta ao Código de Processo Penal. 
JUIZ ACUSADOR 
"Não cabe ao juiz iniciar um processo de ofício e ele também não pode inventar o crime ou ser o sujeito ativo a determinar a acusação, porque o nosso processo penal separa a figura do juiz e do acusador. Quando ele [Moro] amplia o escopo da denúncia do Ministério Público para falar dos R$ 16 milhões, ele deixa de atuar como um juiz e passa a atuar como um acusador." 
Os procuradores da Lava Jato denunciaram Lula por ter recebido vantagem indevida a partir de 3 contratos entra a OAS e a Petrobras, que teriam gerado R$ 87 milhões me propina. Parte dos recursos teriam bancado o armazenamento do acervo presidencial do petista e a reforma no apartamento que a empreiteira construiu no Guajurá. 
Porém, na sentença, Moro alterou a denúncia e condenou Lula com base em uma delação premiada de um executivo da OAS que afirmou que a empresa tinha um "caixa virtual" com o PT, com R$ 16 milhões. Segundo a tese do juiz, a OAS custeou a reforma para Lula e abateu a despesa desse suposto fundo para o PT. O resto do dinheiro, disse Moro, a Lava Jato não achou porque possivelmente abasteceu campanhas do partido. 
"Isso [de dizer que a falta de prova é a prova do crime] não existe. Ele tem que provar que há culpa. Isto foi feito ao arrepio do Código Penal", disse Dultra, para quem o papel do Ministério Público era justamente o de encontrar alguma evidência, qualquer rastro de que esse caixa existiu e financiou o PT e Lula.  
POSSE
Quanto ao fato de que o triplex está em nome da OAS e, inclusive, foi penhorado para pagar dívida da empreiteira junto a fornecedores, Dultra afirmou que "o direito civil brasileiro é muito tradicional, não tem nenhuma inovação. Para que um imóvel seja dado como propriedade de um sujeito, ele tem que ter o documento em seu nome, registrado em cartório, e provar uso, dormir lá. Não foi o caso." 
"Há a evidente incapacidade técnica do Ministério Público e do Juízo em produzir provas consistentes." 
Dultra ainda apontou que a força-tarefa não fez uma investigação correta e ainda pecou pelo uso exclusivo de delações problemáticas, feitas por réus e outros investigadores que estavam submetidos ao controle do Ministério Público. 
Caso de Léo Pinheiro (que estava desesperado por um acordo de delação), Delcidio do Amaral (que não entregou provas de nada do que disso, segundo o próprio Ministério Público Federal, em Brasília) e Pedro Corrêa (que, àquela altura, não teve o acordo homologado pela Justiça). 
A JUSTIÇA POLÍTICA 
Para Dultra, a Lava Jato não é nenhum "ponto fora da curva" quando o assunto é produto de um Judiciário politizado. Ele apontou que, no Brasil, a tradição é o Ministério Público levar à cadeia, sem provas, os réus sem condições de pagar uma boa defesa. É daí que nasce o problema nacional de superlotação em presídios. 
Quanto à turma de Curitiba, especificamente, ele lembrou que na trajetória acadêmica do Sergio Moro fica claro que ele tem uma interpretação muito subjetiva do que é Justiça. "(...) 
ele sempre afirmou que a interpretação do juiz prevalece sobre o que está escrito nas leis." 
"A concepção dele de democracia também é complicada. Democracia para ele não é todo poder de decisão ao povo, é o que a opinião pública, expressa nos meios de massa, que são manipuladores, determina." 
A faceta política do próprio TRF-4 também é motivo de lamentação, disse. 
Para o professor, a nota em que o TRF-4 antecipa que Lula, se condenado, não será preso imediatamente, e a declaração do presidente Thompson Flores que acabou acelerando o processo, são pequenos "avisos" aos demais tribunais sobre a preocupação com o calendário eleitoral. 
"É triste um juiz [Thompson Flores] que não cumpre o princípio básico da magistratura, que é falar exclusivamente nos autos. É lamentável de assistir." 
GGN

segunda-feira, 11 de setembro de 2017

Operação dita lava jato e Teatro, por Marcelo Ribeiro Uchôa

A operação Lava Jato é uma peça teatral com juiz acumulando papéis de investigador, acusador e magistrado; procurador como assistente inquisitorial; e uma plateia à frente, a opinião pública, hipnotizada por informações que lhes são seletivamente vazadas, via conluio de veículos de imprensa interessados em estimular a demonização e a condenação antecipada deste ou daquele réu (inimigo). Esta estratégia de destruição midiática do oposto tem sido utilizada de reverso na heroicização dos protagonistas, transformando o juiz em super magistrado, com poder de impor sua vontade tanto às varas de todo país, como aos tribunais acima de sua jurisdição. Nos demais papéis, nenhum mistério: alguns réus em pontas secundárias e um antagonista encarnando o papel de vilão-mor a ser execrado publicamente.
Foi assim que, num episódio de indisfarçável apelo midiático, reproduzido em TVs de todo país, entre clichês e datashow, meia dúzia de tecnocratas do ministério público federal, absorta em interesses políticos, “sem provas, mas com convicção”, tomando como base indícios frágeis e delações premiadas (que, além de viciadas, nem diretamente comprometiam o réu) e apelando juridicamente a suposições e ao domínio do fato, apresentou denúncia frágil, que, doravante, repercutiu na mais que previsível condenação de primeiro grau ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Previsível não por ser justa ou devida, mas por ter sido julgada pelo mesmo personagem que o investigou e o acusou.
A mesma pessoa que, mesmo antes do ex-presidente se tornar réu na ação que ora responde, já lhe havia determinado uma violenta e injustificada condução coercitiva para prestação de depoimento, nas primeiras horas da manhã, sob forte escolta policial, com transmissão ao vivo pelas lentes de TVs de todo país, resultando em horas de detenção ilegal. O mesmo super magistrado que lhe determinou a quebra do sigilo telefônico e que condescendeu com o vazamento para a imprensa de áudios íntimos seus e de sua família, determinando, sem autorização do STF, a escuta telefônica da então presidenta da República Dilma Vana Rousseff, conversa que também foi vazada. Trata-se do juiz Sérgio Fernando Moro.
Não foram as primeiras e, certamente, não serão as últimas violações de prerrogativas individuais, liberdades fundamentais, do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, seus familiares e correspondentes advogados que o juiz Sérgio Moro patrocinará no âmbito da farsa chamada Lava Jato. Os fatos são de tal natureza graves que estão denunciados no Comitê de Direitos Humanos da ONU. “O Lula não está acima da lei, mas também não está abaixo dela”, tem dito em palestras a advogada do ex-presidente, Valeska Teixeira Zanin Martins. O ex-mandatário só precisa de um juízo imparcial para provar sua inocência, o que já conseguiu demonstrar, por exemplo, no processo que lhe foi aberto no juízo federal de Brasília, relacionado à delação premiada do ex-senador Delcídio do Amaral. Ali, o ministério público federal não relutou em requerer a absolvição do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na acusação de tentativa de obstrução dos trabalhos da Lava Jato através da compra de silêncio do delator Nestor Cerveró, ex diretor da estatal e um dos principais pivôs do escândalo de corrupção objeto de toda operação investigativa.
Há nítida utilização de lawfare contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na ação criminal que responde perante o juízo paranaense. Mal fora sentenciado e o presidente da Corte que irá julgá-lo em segunda instância reverberou para a grande mídia nacional escandalosa saudação ao juiz Sérgio Moro, venerando de forma parcial a sentença que, segundo sua compreensão, de tão irretocável, produto de um trabalho minucioso, tecnicamente irrepreensível, entrará para a história do país. Menos mal que o desvairado dirigente do TRF admitiu, também, na ocasião, não haver lido o processo, sequer ter tido acesso às provas, ou seja, deixando claro sua falta de isenção para figurar como Estado-juiz no caso, nem mesmo para que sua opinião fosse levada a sério, com um mínimo de respeito.
No ritmo da tragicomédia em curso, estreou no país, recentemente, o filme “Operação Lava Jato – A lei é Para Todos”, com direito a PT na expressão final e tudo mais. Na avant-première, em Curitiba, um sorridente Moro, acompanhado de sua não menos jubilosa esposa, empanturrava-se com um saco vermelho de pipoca em meio ao público. Sobre isso, com a breve observação de que os patrocinadores da trama (não se sabe por que) preferem manter-se no anonimato, vale a transcrição de comentário do juiz da Vara de Execução Penal do Tribunal de Justiça do Amazonas, Doutor em Direito Penal pela Universidade de São Paulo, Dr. Luís Carlos Valois, postado em sua página no facebook: “Se o filme fosse sobre algum processo que eu já tive em minhas mãos, ninguém iria sorrir, nem eu, nem ninguém. Talvez fosse um filme de drama, talvez um de suspense, podia até ser um de terror, mas nenhum com a capacidade de se fazer sorrir comendo pipoca. Poderia fazer chorar, fazer virar a cara, dar nojo e até dar vontade de sair do cinema, mas nunca fazer sorrir. A justiça penal verdadeira não devia ser local, motivo, de alegria, mas de tristeza sempre, porque, quando age, age demonstrando o quanto falhamos como sociedade. Não importa se a atuação da justiça penal pode ser transformada em algo plasticamente belo, o que já é uma deturpação da verdade, a justiça penal é triste, deve ser triste, para o bem da sociedade e da possibilidade de se manter são. Eu não vi esse filme, mas se ele é sobre justiça penal, polícia e prisão, e causa essa alegria toda, eu não vou ver...”.
As palavras do magistrado amazonense levantam uma preocupação fundamental que se encontra com as pretensões do presente texto. A inquietação da postagem nem é propriamente com a operação Lava Jato, nem com a inocência ou culpabilidade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, é, fundamentalmente, a teatralização que vem substituindo à vital ação de “fazer justiça” no Brasil. Nesse sentido, as ansiedades lá e cá se tocam.
Há que se dar fim a muitos abusos do sistema judicial brasileiro. A Lava Jato reflete uma crise institucional complexa, que requer um reexame aprofundado que perpassa à compatibilidade do Judiciário com o caráter que a Constituição lhe confere (no equilíbrio entre o papel contramajoritário e a politização da atividade jurisdicional, nos vícios orgânicos, etc.) ao enveredamento nos demais Poderes. De todo modo, há lições elementares sobre direito e justiça que parecem não ser do conhecimento dos protagonistas que estão por trás da operação e que precisam ser ditas, por exemplo:
Que no exercício das funções públicas que exercem não agem em nome próprio, a partir de suas emoções. Eles são o Estado no exercício da jurisdição, são o Estado aplicando a justiça. Por isso mesmo, gozam de prerrogativas constitucionais e legais. Não para menosprezarem a ordem constitucional, ignorarem os princípios gerais que regem as nações democráticas e resolverem conflitos unicamente segundo seus desígnios morais e volitivos. Ao contrário, para honrarem a Constituição da república e atuarem de forma isenta, independente e imparcial. Noutro sentido, eles não podem, de nenhum modo, menosprezar, espezinhar, desfrutar de prazer, orgulho ou sadismo ao determinar uma condenação ou fixar uma pena. Também não deveriam se sentir mais importantes por figurarem em jornais ou capas de revistas se ali estão por meras razões informativas. Se a hipótese é o apelo midiático-especulativo, sequer deveriam aparecer. Não deveriam se encantar ao serem venerados como heróis por movimentos fascistas, se envaidecer com homenagens em festas black tie ou se render ao charme de palestrar em eventos patrocinados por pessoas e empresas que eles sabem que poderão ser as próximas vítimas dos crimes que analisam. É o mínimo.
A propósito, não seria demasiado pedir duas coisas ao juiz Fernando Moro: a primeira, que movesse esforços no sentido de esclarecer para o povo brasileiro quem são os patrocinadores do filme “Operação Lava Jato – A lei é Para Todos”. Afinal, logo ele, o super juiz brasileiro em pessoa, prestigiou a avant-première, e não lhe caem bem, na condição de magistrado, ambiguidades sobre eventuais interesses político-partidários. A segunda é que seja convincente na explicação da grave denúncia que lhe foi feita sobre o advogado Carlos Zucolotto Junior, segundo consta, personagem de sua intimidade, com quem sua esposa já manteve parcerias profissionais, de que cobrara aproximadamente 1/3 de valores “por fora” do foragido da justiça Rodrigo Tacla Duran para negociar redução de pena e ampliação de benefícios em delação premiada realizada na jurisdição federal de sua alçada, com participação de procuradores da república, possivelmente Deltan Dallagnol.
Marcelo Ribeiro Uchôa, Advogado e Professor Doutor de Direito da Universidade de Fortaleza

GGN