terça-feira, 28 de março de 2017

Moro mantém Dirceu preso há quase dois anos em prisão preventiva, um abuso

José Dirceu, exclusivo: algumas observações sobre o método Moro
Em correspondência exclusiva para o Nocaute, da prisão de Curitiba José Dirceu aponta, um por um, os desmandos do juiz Sérgio Moro, que acaba de condenar o ex-ministro a onze anos e três meses de prisão. “Para me manter preso, Moro alega ameaça à ordem pública, de forma genérica, e que o produto do crime não foi recuperado, expondo mais uma de suas razões sem base nos fatos”, afirma Dirceu. E completa: “Estou sem renda há três anos. Todos os meus bens estão sequestrados, arrestados e — com exceção de dois — confiscados.”
Na sentença da minha recente condenação — processo Apolo-Petrobras, na qual me sentenciou, por corrupção e lavagem, a onze anos e três meses de reclusão —, Moro afirma “permanece preso”. Estou preso há vinte meses, embora condenado em Primeira Instância. Logo, com direito a responder em liberdade, até pela decisão do STF de trânsito em julgado em Segunda Instância para execução da pena.
Moro não cita, mas ele renova minha prisão de 27/7/15, executada em 3/8/15, quando da minha condenação em 19/5/16, pelas mesmas razões e motivos, no processo Engevix-Petrobras, em que me condenou a vinte anos e dez meses. Diz que a referida prisão cautelar é instrumental para aquela ação penal!
Apresenta seus argumentos, relata que o pedido de Habeas Corpus foi rejeitado e mantida a prisão na 4ª Região do TRF e no STJ. No STJ, diz que o ministro Teori indeferiu o pedido de liminar, mas, como sabemos, não entrou no mérito. Nós agravamos, e o ministro Fachin, substituto de Teori, negou o HC considerando ter havido supressão de instâncias, o que nos levou a agravar na Segunda Turma. Assim, meu pedido de liberdade, no HC, ainda será votado.
Como os ministros Fachin e Toffoli têm rejeitado as razões para as prisões preventivas de réus — como exemplo, os casos de Alexandrino Alencar, Fernando Moura e Paulo Bernardo —, e os ministros Marco Aurélio e Gilmar Mendes também têm se manifestado na mesma direção, Moro se antecipa e, na sentença, apresenta seus argumentos: os mesmos da prisão em 3/8/15 e da condenação em 19/5/16.
É importante frisar — porque essa é a base do meu argumento —, que se trata da mesma prisão. Portanto, meu pedido de HC não suprime instância e não tenho que recomeçar a cada “nova prisão” decretada por Moro. No TRF, porque seria uma “chicana” de autoridade coatora para me manter 20 meses preso sem culpa formada em última instância, uma negação da presunção da inocência.
Para manter minha prisão em 19/5/16, ele alegou: riscos à ordem pública, gravidade dos crimes, prevenir reiteração deletiva. Apresenta como fato, e prova, que durante julgamento da AP 470, que durou de agosto de 2006 a julho de 2014, “persistiu recebendo propina de esquema criminoso da Petrobras”. E finaliza afirmando que nem minha condenação na AP 470 serviu para me impedir de continuar … “recebendo propinas!”.
Ora, minha condenação no processo Engevix-Petrobras não transitou em julgado, logo tenho a presunção da inocência, não a culpabilidade. Ou Moro já a revogou? Mas Moro vai mais longe. Diz que “o produto do crime não foi recuperado, há outras investigações em andamento e ainda não foi determinada a extensão de minhas atividades”!!!
Então Moro já me condena sem sequer ter me investigado? Ousa ainda mais. Diz que tenho papel central nos contratos da Petrobras e era considerado responsável pela nomeação do ex-diretor Renato Duque. Moro não tem uma prova sequer de que eu tinha “papel central” na Petrobras. Não existe nenhum empresário ou diretor da Petrobras à época que o afirme; não há um fato, uma licitação, um gerente, um funcionário, que justifique ou comprove tal disparate.
Mesmo assim, eu não obstruí a instrução penal e estou cumprindo a pena. Logo, não ameaço a execução penal. Estou preso há três anos. Isso mesmo, três anos. Fui preso por Moro estando preso na AP 470, na qual já fui indultado pelo STF.
Para me manter preso, Moro alega ameaça à ordem pública, de forma genérica, e que o produto do crime não foi recuperado, expondo mais uma de suas razões sem base nos fatos. Estou sem renda há três anos e todos os meus bens estão sequestrados e arrestados e — com exceção de dois — confiscados.
A questão central é que não há base legal para a manutenção da minha prisão preventiva, a não ser para comprovar o ditado de que “os fins justificam os meios”, mesmo violando a Constituição. Por saber da fragilidade de suas razões — a única “prova” que Moro tem contra mim é a palavra dos delatores Milton Pascovich e Julio Delgado —, o juiz apela para pré-julgamentos e acusações genéricas de olho na opinião pública, como instrumento de pressão sobre o STF.
Vários ministros da Corte têm decidido que a prisão preventiva é uma exceção, só adotada em último caso, e têm destacado a alternativa do artigo 319 do Código do Processo Penal, a prisão domiciliar com tornozeleira eletrônica. Esses ministros não têm aceito razões genéricas sobre ameaça à ordem pública e econômica para a instrução e execução penal, sem fatos concretos, como argumento para manter as prisões preventivas. E muito menos o próprio crime e sua gravidade de que é acusado o investigado e/ou réu, razão para a pena e seus agravantes e não para a prisão preventiva. No meu caso, insisto, estou preso há vinte meses!
Todos os votos dos ministros são públicos e sinalizam como o “método Moro” traz um entendimento próprio e casuístico sobre a prisão preventiva. Para não falar inconstitucional. Daí o apelo do juiz “`a opinião pública”, seus artigos nos jornais, onde, na prática, ele confessa que as prisões visam as delações e são fundadas em razões, supostamente éticas, acima e fora da lei!

O Cafezinho e Nocaute

segunda-feira, 27 de março de 2017

O poder judiciário brasileiro está hipertrofiado, diz Flávio Dino

"Deslegitimada a política, o Legislativo encontra-se escanteado. Ao centro, hoje quem se impõe é o Poder Judiciário e as demais instituições do sistema repressivo e jurídico", diz o governador do Maranhão, Flávio Dino; "No entanto, é preciso estar sempre atento, pois nenhuma sociedade pode ser bem governada por pessoas que não respeitam qualquer regra jurídica, nem por pessoas que, em nome da suposta defesa das regras jurídicas, destroem empresas e empregos sem qualquer prudência"; leia sua análise na íntegra.
O governador do Maranhão, Flávio Dino, avalia que, meio as crises política e econômica brasileira, "o Legislativo encontra-se escanteado". Segundo ele, "ao centro, hoje quem se impõe é o Poder Judiciário e as demais instituições do sistema repressivo e jurídico". "Hoje, no imaginário coletivo, os tribunais são o principal, talvez o único, bastião de defesa dos direitos fundamentais". diz.
 Mas, de acordo com o governador, "é preciso estar sempre atento, pois nenhuma sociedade pode ser bem governada por pessoas que não respeitam qualquer regra jurídica, nem por pessoas que, em nome da suposta defesa das regras jurídicas, destroem empresas e empregos sem qualquer prudência".
"Assim como um hospital não funciona sem profissionais de saúde, nenhuma Nação pode funcionar sem políticos. E nesse terreno coletivo os danos sempre são irreparáveis ou de difícil reparação, pois colapsos de governança como estamos enfrentando no Brasil produzem problemas enormes, que demoram anos, talvez gerações, para serem superados. A hora nacional exige mais prudência e menos apego à Civilização do Espetáculo, onde o entretenimento se sobrepõe à ciência e ao interesse público".

Poder bom é poder limitado
Há uma lenda romana dando conta que os conquistadores do Império, ao voltarem de batalhas exitosas na conquista de novos territórios, eram recepcionados em desfiles pela capital. A seu lado na carruagem, seguia um sacerdote para lhe dizer ao ouvido, a cada 100 metros: “Tu és mortal”. O objetivo era que, mesmo naquele momento de glória suprema, o conquistador soubesse que não estava acima de ninguém. Verdadeira ou não, é uma metáfora sobre a importância que sempre teve a limitação do poder.
O poder está presente em todas as relações humanas, desde o núcleo mais elementar de sociabilidade, que é o lar, até a vivência na polis. A criação de pesos e contrapesos para que ele não se torne absoluto não está presente apenas na teologia ou na história antiga. Desde o século 17, esse princípio ganhou forma melhor delineada em instituições públicas. São nossas construções sociais como o Parlamento, o Judiciário e Executivo, que servem de contraponto para que não haja a sobreposição de uma vontade à outra. É como se as instituições fossem aquele sacerdote falando no ouvido da outra: “tu és mortal”.
Em Brasília, Niemeyer nos deu uma aula de Direito Constitucional ao projetar a Praça dos 3 Poderes. Em seu ideário, o prédio mais alto e imponente é o Congresso Nacional, instituição fruto do voto direto e a mais próxima da pluralidade de nossa sociedade. Niemeyer a colocou ao centro, equilibrando os Poderes Judiciário e Executivo.
O que vemos hoje no Brasil, no entanto, é uma distorção da Praça de Niemeyer, como num quadro de Dali. Deslegitimada a política, o Legislativo encontra-se escanteado. Ao centro, hoje quem se impõe é o Poder Judiciário e as demais instituições do sistema repressivo e jurídico. Em meados do século 20, após a trágica experiência do nazismo e do fascismo, os estados europeus fortaleceram seu Judiciário, se precavendo dos excessos da política. Peso e contrapeso. Aqui no Brasil, após a ditadura militar, materializada na primazia do Poder Executivo, nossa Assembleia Constituinte fortaleceu os tribunais. Hoje, no imaginário coletivo, os tribunais são o principal, talvez o único, bastião de defesa dos direitos fundamentais.
No entanto, é preciso estar sempre atento, pois nenhuma sociedade pode ser bem governada por pessoas que não respeitam qualquer regra jurídica, nem por pessoas que, em nome da suposta defesa das regras jurídicas, destroem empresas e empregos sem qualquer prudência. Especialmente em momentos de crise econômica e polarização social, a legalidade torna-se “flexível” aos olhos de muitos, quase um pequeno “detalhe” que é interpretado livremente sem considerar que cada lei contém trilhos sobre os quais deve transitar o exercício do poder, para ser legítimo.
É preciso enfrentar o debate das inovações jurídicas que estão sendo trazidas ao país. E discutir como enfrentar a corrupção nas empresas e na política sem paralisar a atividade econômica, como infelizmente estamos vendo em setores estratégicos: petróleo, indústria naval, construção civil e carnes. Por exemplo, os Estados Unidos investigaram e puniram as empresas que cometeram delitos na crise de 2008. No entanto, sem aumentar ainda mais o custo social da recessão, pois o aparato repressivo existe para proteger a sociedade, não para trazer-lhe prejuízos ainda maiores.

Precisamos priorizar diálogos na sociedade e nas instituições estatais. Tenho insistido nisso já há alguns anos. Assim como um hospital não funciona sem profissionais de saúde, nenhuma Nação pode funcionar sem políticos. E nesse terreno coletivo os danos sempre são irreparáveis ou de difícil reparação, pois colapsos de governança como estamos enfrentando no Brasil produzem problemas enormes, que demoram anos, talvez gerações, para serem superados. A hora nacional exige mais prudência e menos apego à Civilização do Espetáculo, onde o entretenimento se sobrepõe à ciência e ao interesse público.

Com informações do DCM

domingo, 26 de março de 2017

O heroísmo de Edu e a briga pela xepa do final da feira, por Eugênio Aragão

Imagem de Eugênio Aragão
Tem gente que conduz procedimentos investigatórios criminais e ações penais como se fossem um espetáculo de luta livre. Dão um péssimo exemplo para o país e provam o desprezo pelo Estado de Direito.
Um desses implacáveis lutadores livres togados mora em Curitiba e dispõe de vasta claque num auditório ensandecido que entra em êxtase ao ver sangue vermelho escorrer pela sarjeta da república. Desconhece limites. Tudo pode.
Os tribunais guardiões da ordem jurídica ora coonestam-no, ora se acumpliciam, ora se acovardam.
É verdade que hoje há magistrado de cúpula que troveja indignação com sua forma extravagante de jurisdicionar, mas o faz com cinismo seletivo: enquanto o brigão forense desferia suas voadoras nos políticos que não são de sua afinidade, silenciava ou chegava, até, a aplaudir e ovacionar; hoje, tendo o encrenqueiro resolvido dar caneladas nos de seu rebanho, deblatera midiaticamente.
Não falta blogueiro oportunista para dar razão ao seletivo magistrado de cúpula, quando, antes, era puxador do coro em favor dos zigue-zagues processuais do juiz de piso. Dançava com pomponzinhos de torcida americana feminina e gritava “give me an M, give me an O, give me an R, and give me an O…“, e, agora, passa às vaias e aos apupos sonoros contra o antigo herói.
No circo de torcidas celeradas, de quem joga saco de urina sobre a platéia de baixo, sobra pouco para a dignidade da Justiça.
Nossa cultura jurídica se assemelha cada vez mais à cultura da antiga “Geral” do Maracanã, onde a balbúrdia, o empurra-empurra e o baixo calão eram rotina.
Quando o obscurantismo passa a ser a cosmovisão dos poderosos, não se pode deixar de prestar homenagem aos que não se intimidam e continuam a nos brindar com sua corajosa voz:
“Pobre del cantor de nuestros días
que no arriesgue su cuerda
por no arriesgar su vida.
Pobre del cantor que nunca sepa
que fuimos la semilla y hoy somos esta vida.
Pobre del cantor que un día la historia 
lo borre sin la gloria de haber tocado espinas. 

Pobre del cantor que fue marcado 
para sufrir un poco y hoy está derrotado.
Pobre del cantor que a sus informes
les borren hasta el nombre con copias asesinas.
Pobre del cantor que no se alce
y siga hacia adelante con más canto y más vida.

Pobre del cantor que no halle el modo
de tener bien seguro su proceder con todos.
Pobre del cantor que no se imponga
con su canción de gloria, con embarres y lodos.
Pobre del cantor de nuestros días
que no arriesgue su cuerda por no arriesgar su vida.
Pobre del cantor que nunca sepa
que fuimos la semilla y hoy somos esta vida.”
(Pablo Milánez, Pobre del Cantor).

Um desses voceros é Eduardo Guimarães, ou Edu, para os muitos admiradores de seu caráter e personalidade. Seu jornalismo investigativo é apurado, cuidadoso e honesto sem ser piegas. É alguém como você e eu, “the man next door“.
Não almeja glória nem riqueza. Almeja respeito e reconhecimento por sua seriedade profissional.
Não se rebaixa ao mercenarismo vulgar de quem o chama de aventureiro. Não destila ódio sob encomenda.
Não tem vergonha de expressar seu ponto de vista, balizado por sólidas e testadas informações advindas de uma rede de fontes que cultiva com sincera amizade, fiel sem deixar de ser crítica.
Edu é um homem livre. E sua liberdade incomoda. Incomoda aos que se venderam aos interesses escusos e praticam uma comunicação suja, sem compromisso com os fatos, somente com as versões interesseiras.
Edu os desmente. Edu lhes mostra que há uma comunicação de escol, desprendida dos poderosos e endinheirados. Ele é o que os praticantes do jornalismo lacaio não conseguem ser. Vêem-no querido e admirado e sentem-se despeitados como a raposa de La Fontaine ao falar das uvas.
“Aventureiro”! Façam-me rir. Têm inveja de seu direito de ousar e vencer! Por isso “aventureiro”…
Edu é um Indiana Jones cercado de caçadores de tesouros nazistas. Caçadores de fama a todo custo, que usam seus podres poderes para dificultar a missão do honesto e desajeitado arqueólogo.
Mas, como sói ocorrer com Indiana Jones, suas virtudes acabam sempre vencendo os vícios de seus malfeitores.
É isso, talvez, que explique o imbroglio em que se meteu o processualista de Curitiba ao determinar, ao arrepio da constituição e de tratados de proteção de direitos humanos, o  varejo na residência de Edu, para tentar descobrir sua fonte de informação sobre a suposta iminência de diligências que teria ordenado contra Lula.
O possível furo do bravo jornalista talvez tenha “melado” o espetáculo que estava por acontecer e conferir mais fama ao brioso magistrado.
Ao determinar a medida coercitiva contra o jornalista, o juiz fez pouco caso da circunstância de já ostentar, ele próprio, relação contenciosa pessoal contra est’último; a contenda notória obviamente não recomendava que fosse, desse juiz, se legítima, qualquer iniciativa de busca e apreensão, por sugerir conflito de interesses e, consequentemente, sua suspeição.
Mas em tempos nos quais magistrados de cúpula podem mudar de público sua opinião de acordo com o alvo de seus juízos políticos; em tempos nos quais o candidato à vaga suprema aceita convite para agradável jantar num love boat, com seus inquisidores senatoriais às vésperas da sabatina constitucional; em tempos nos quais um ministro do STF chama publicamente seu colega de inimputável por decisão que este tomou e não lhe agradou… nesses tempos tudo é possível.
Não é uma busca violadora da prerrogativa profissional de um jornalista que vai causar escândalo. Brigas pela xepa são comuns em final de feira e não atraem indignação de ninguém.
Mas Edu venceu. Edu não foi desmentido em sua informação sobre o projeto de se alvejar Lula para fechar-lhe o caminho para as eleições de 2018. E isso apesar de ter seu computador devassado, sua agenda e seu celular violados.
Apesar de ter sido sequestrado da cama matrimonial às seis da manhã e mantido sem contato com seus advogados e familiares, em franca violação das mais comezinhas garantias processuais de qualquer arguido.
Venceu. Mostrou-nos a que ponto chega o complexo persecutório policial-judicial em nosso país para matar doentia curiosidade sobre quem teria sido a fonte de informação do jornalista, dado sagrado e protegido pela constituição como pressuposto básico do direito à comunicação.
Edu, que nem Indiana Jones, completou com sucesso sua missão e merece o Prêmio Pulitzer.
Já os brigões… ah os brigões! Além de obrigados a voltar atrás em sua senda inconstitucional para resguardar a face, passaram a merecer o prêmio da xepa de ouro, pelo deprimente “barraco” encenado para a sociedade cansada desses arroubos corporativos na contramão da cidadania.

Do Blogdacidadania, por Eugênio Aragão, ex-ministro da Justiça do governo de Dilma Rousseff, professor da Universidade de Brasília e advogado.

sexta-feira, 24 de março de 2017

Após golpe fatal da terceirização, nada mais resta aos trabalhadores senão a luta

A Câmara dos Deputados aprovou nesta quarta-feira o PL 4302, que trata da terceirização. Pior do que o PLC 30, esse projeto, que é de 1998, foi desengavetado em uma manobra golpista, típica do momento político que estamos vivendo.

A terceirização, como bem sabem os trabalhadores, é a possibilidade de a empresa, em lugar de contratar diretamente seus empregados, fazê-lo por intermédio de outra empresa, uma atravessadora. Duas ou mais empresas irão, nesse caso, se beneficiar do trabalho alheio. E para que seja economicamente vantajoso contratar através de outra empresa, em vez de diretamente, alguém tem que sair perdendo. Quem perde é o trabalhador.

Todos sabemos disso. Existem estudos que mostram que a terceirização promove perda de salário, de férias, aumento significativo do número de acidentes e doenças profissionais, além de impedir a organização coletiva dos trabalhadores. 

Pois bem, como não houve ambiente para a votação do PLC 30, que também regulamenta a terceirização, em grande medida pela atuação do Senado, o PL 4302 foi retirado da gaveta e submetido à votação em regime de urgência. Porque já estava aprovado pelo Senado, o projeto vai diretamente para a sanção presidencial. Alguém tem dúvida de que será sancionado? Evidentemente não. Regulamentar a terceirização é uma das bandeiras do atual (des)governo. O único compromisso real de quem hoje detém o poder político em razão, em larga medida, dos panelaços de uma classe média alienada e alheia ao que realmente está acontecendo com os trabalhadores brasileiros, é promover o desmanche dos direitos sociais trabalhistas e previdenciários.

Ao menos a reforma previdenciária está sendo contida, mas o número de projetos de lei desconfigurando completamente a legislação trabalhista não deixa dúvidas de que a investida liberal não arrefecerá. Esse é apenas o primeiro passo.

Passada a sensação de desespero e cansaço, resta fazer uma análise do momento histórico que estamos vivendo, inclusive para não desistir da luta secular pela fixação de parâmetros máximos de exploração do trabalho pelo capital.

Sejamos sinceros: a terceirização já ocorre, inclusive em atividade-fim (seja lá o que isso signifique). A responsabilidade já é subsidiária, por conta da nefasta redação da súmula 331 do TST, gestada e aplicada pela própria Justiça do trabalho. A figura do capital, ou do empregador, como apelida a CLT, já está desconfigurada por práticas, por vezes chanceladas em decisões judiciais, de pulverização entre personalidades jurídicas diversas.

Já existem decisões que limitam a responsabilidade ao período em que “tomado” o trabalho por intermédio de uma prestadora, ainda que, claramente, a prestadora só exista em razão das tomadoras que dela se utilizam como atravessadora de força de trabalho. Basta pensar em “empresas” de telemarketing, vigilância ou limpeza e conservação. Essas “empresas” não existem, senão como extensão de outras, para as quais prestam serviços. Por isso mesmo, via de regra, quando a(s) tomadora(s) cancelam o contrato, a prestadora deixa de existir.

O que afirmo com isso é que apesar do efeito simbólico extremamente negativo que a aprovação do PL 4302 terá, numa lógica de interpretação/aplicação do ordenamento jurídico em que costumamos ter mais atenção a um texto de lei do que à norma constitucional, o fato é que nada mudou. As relações de trabalho no Brasil já estão precarizadas há algum tempo. O que a lei vem chancelar já está ocorrendo.

Então, se quisermos, em uma tentativa dialética de compreensão do que estamos vivendo, extrair positividade da triste página da história que o Brasil hoje escreve, pensemos que as armas estão postas.

A lei que se extrairá desse PL 4302 é inconstitucional. Simples assim. Nega o direito fundamental à relação de trabalho. Nega a proteção insculpida no artigo sétimo do texto constitucional. Promove retrocesso social, vedado pelo artigo terceiro e pelo caput do artigo sétimo da Constituição.

A aprovação do PL 4302 nos dará argumentos para discutir, com a seriedade que o tema merece, o boicote que a terceirização promove ao projeto de sociedade contido na Constituição de 1988.

Já passou da hora de levarmos à sério a Constituição e seus fundamentos, dentre os quais estão os valores sociais do trabalho e a preservação da dignidade humana. De acordo com a unanimidade da doutrina constitucional, um dos efeitos básicos de um direito fundamental é negar legitimidade a toda norma (anterior ou posterior) que o negue. Pois bem, o PL 4302 nega todo o projeto de sociedade “livre, justa e solidária”, que garante “desenvolvimento nacional”, erradique a pobreza, reduza as desigualdades e promova “o bem de todos”.

De modo ainda mais direto, nega o direito fundamental à relação de emprego (artigo 7º, I), à irredutibilidade de salário (art. 7º, VI), às férias (art. 7º, XVII),  à redução dos riscos inerentes ao trabalho (art. 7º, XXII), apenas para citar os exemplos mais óbvios. A intermediação de força de trabalho permite que as prestadoras se sucedam em contratos de um ou dois anos, fazendo com que concretamente os trabalhadores jamais fruam férias e possam ter o salário reduzido, a cada “nova” contratação. Estimula a potencialização dos riscos, bastando citar o exemplo da supressão da exigibilidade de um técnico em segurança do trabalho, em face da redução do número de empregados (contratados na forma prevista na ordem constitucional vigente), promovida pela terceirização em diferentes setores da mesma empresa.

E se o argumento da inconstitucionalidade não animar, mantem-se a mesma possibilidade, hoje já existente, de exame do caso concreto, a fim de aferir se a opção administrativa de terceirizar, mesmo sendo lícita, não promove redução ou supressão de direitos fundamentais trabalhistas. Nesse caso, tal opção é nula, por força do que dispõe o artigo nono da CLT. Do mesmo modo, se verificada a caracterização da figura do empregador “dividido” de forma fictícia, entre prestador e tomador, basta invocar o artigo segundo da CLT, para justificar o reconhecimento do vínculo de emprego direto. Aliás, o próprio PL 4302 dispõe em seu artigo 22 que “presentes os elementos constitutivos da relação de emprego previstos na CLT” restará configurado o vínculo de emprego entre a tomadora e os trabalhadores. Bingo!

E para aqueles que preferem aplicar as regras da responsabilidade civil, o Código Civil estabelece a responsabilidade solidária e objetiva, pela assunção do risco, mesmo sendo o ato considerado lícito (art. 927, parágrafo único). O artigo 932 do Código Civil diz que o “comitente” é responsável “por seus empregados, serviçais e prepostos, no exercício do trabalho que lhes competir, ou em razão dele”.

Pois bem, regulamentada a terceirização, o que estamos fazendo é chancelar a possibilidade de que uma empresa atue como comitente, ou seja, repasse a outrem, mediante pagamento, a execução de certos atos em seu nome, sob sua direção e responsabilidade. Ora, a terceirização é isso. O tomador comete ao prestador a realização de atos em seu nome, sob sua direção e responsabilidade. Aliás, o PL 4302 diz expressamente isso: a tomadora detem poder diretivo. Se dirige a atividade que reverte em seu favor, em realidade, está cometendo o trabalho a um terceiro. E, como tal, responde pela escolha administrativa que fez. Sua responsabilidade é, por força de texto expresso de lei, solidária e objetiva (art. 942 do Código Civil).

Note-se: nenhum desses dispositivos será revogado pelo malfadado PL 4302. E no Direito do Trabalho, como nos ensina a unanimidade da doutrina trabalhista, vigora a regra de aplicação da norma mais favorável, por alguns denominada regra da hierarquia dinâmica das fontes formais. O aplicador da legislação trabalhista tem o dever de buscar a norma que mais preserve a proteção a quem trabalha, para aplicá-la no caso concreto.

Temos, portanto, armas (jurídicas) suficientes para conter os efeitos nocivos que o PL 4302 pretende alcançar ao chancelar a prática da precarização nas relações de trabalho.

A aprovação desse projeto de lei deve servir de estímulo à criação e ao desenvolvimento de uma racionalidade trabalhista comprometida com a história e a razão de ser do Direito do Trabalho, e evidentemente com os parâmetros constitucionais que estabelecemos em 1988.

A investida liberal passará. E como toda catástrofe, fará grandes estragos. Ainda assim, precisamos resistir. Quando a tempestade passar restará a responsabilidade de reconstrução dos limites mínimos de convivência entre capital e trabalho, a fim de evitar a barbárie. Compete a cada um de nós, que lidamos com o Direito do Trabalho, assumir o compromisso com as gerações que nos precederam e com aqueles que virão.

Não nos enganemos. O golpe que ontem a Câmara dos Deputados ajudou a desferir só implicará a morte do Direito do Trabalho se nós permitirmos. À luta, portanto.


Do GGN, por Valdete Souto Severo, Doutora em Direito do Trabalho pela USP/SP. Pesquisadora do Grupo de Pesquisa Trabalho e Capital (USP) e RENAPEDTS – Rede Nacional de Pesquisa e Estudos em Direito do Trabalho e Previdência Social. Professora, Coordenadora e Diretora da FEMARGS – Fundação Escola da Magistratura do Trabalho do RS. Juíza do trabalho no Tribunal Regional do Trabalho da Quarta Região.

quinta-feira, 23 de março de 2017

Moro chegou à fonte de Guimarães após quebra de sigilo telefônico, diz defesa

O juiz Sérgio Moro “voltou atrás” quanto à investigação da fonte do blogueiro Eduardo Guimarães, segundo despacho do magistrado divulgado hoje. Moro escreveu que foi em respeito ao direito dos jornalistas, garantido pela Constituição.


Porém, a defesa alega que Moro só chegou à fonte do blogueiro — a auditora da Receita Federal Rosicler Veigel — por conta da quebra do sigilo telefônico de Eduardo Guimarães, alguém exercendo atividades jornalísticas.


Lula manifestou-se através de sua assessoria, dizendo tratar-se de uma manobra que expõe a falta de provas contra o ex-presidente no processo a que responde em Curitiba. O deputado petista Paulo Pimenta disse o mesmo ao discursar na Câmara.


Segundo despacho do juiz, segue a investigação sobre se Lula foi beneficiado pelo vazamento de operação de busca e apreensão através do blogueiro.


Seguem as informações na íntegra:


NOTA DE ESCLARECIMENTO DA DEFESA DO JORNALISTA EDUARDO GUIMARÃES

Informamos que o juiz Sérgio Moro acabou de publicar uma decisão por meio da qual reconhece que Eduardo Guimarães é jornalista e, em tom de arrependimento, afirma ser “o caso de rever o posicionamento anterior e melhor delimitar o objeto do processo”.


Como consequência, determinou a exclusão de “qualquer elemento probatório relativo à identificação da fonte de informação”.


Dessa forma, o magistrado voltou atrás e reconheceu a tese alegada pela Defesa desde o início dessa investigação, admitindo ter tomado medidas ilegais.


Após o levantamento do sigilo dos autos, cumpre-nos informar fato extremamente grave.


Antes de ser conduzido coercitivamente, o jornalista Eduardo Guimarães teve o sigilo de suas ligações telefônicas violado.


O magistrado determinou que a operadora de celular informasse seu extrato telefônico, com o objetivo claro de identificar a fonte que teria passado a informação divulgada no blog.


É importante ressaltar que a fonte jornalística foi identificada mediante quebra de sigilo dos extratos telefônicos do Eduardo Guimarães.


Portanto, a decisão não corresponde à realidade ao afirmar que Eduardo “revelou, de pronto, ao ser indagado pela autoridade policial e sem qualquer espécie de coação, quem seria a sua fonte de informação”.


Basta perceber que o próprio juiz Sérgio Moro agora reconhece a ilegalidade das medidas tomadas visando à obtenção prévia da fonte de informação, para concluir que houve nítida coação ilegal no ato de seu depoimento.


Está devidamente comprovado que, na ocasião do depoimento, as autoridades já tinham conhecimento da sua fonte de informação, obtido mediante o emprego de meios que o próprio magistrado agora assume serem ilegais.


Não bastasse tamanha arbitrariedade, a autoridade policial sequer aguardou a chegada deste advogado para iniciar o depoimento.


Assim, é evidente a ilegalidade deste depoimento, cuja anulação será oportunamente requerida pela Defesa, bem como a restituição de todos os equipamentos eletrônicos ilegalmente apreendidos.


Caso se julgue necessário, estaremos à inteira disposição para prestar novos esclarecimentos, pois não há dúvida de que o jornalista Eduardo Guimarães agiu de acordo com a ética de sua profissão.


FERNANDO HIDEO I. LACERDA OAB/SP 305.684

PS do Viomundo: Por respeitar o direito ao sigilo de fonte dos jornalistas, Moro recuou no caso de Eduardo Guimarães. Não sem antes, porém, quebrar o sigilo telefônico do blogueiro! É como se você atropelasse alguém, fugisse da cena e voltasse depois — sabendo que a vítima estava morta — “para ajudar”.


Pimenta: “Prisão de blogueiro é estratégia de Moro para justificar falta de provas e fracasso da Lava Jato contra Lula”


O deputado federal Paulo Pimenta (PT-RS) denunciou, na tarde desta quinta-feira (23), mais uma tentativa do juiz Sérgio Moro de mobilizar a opinião pública contra o ex-Presidente Lula.

Sem ter uma prova sequer contra o líder petista, Moro está tentando criar uma versão para “justificar o fracasso da Lava Jato” contra Lula, acusou Pimenta.

O deputado explica que a condução coercitiva do blogueiro Eduardo Guimarães nesta semana, acusado pelo vazamento de informações, está sendo usada para criar a ideia de que a antecipação das informações veiculadas pelo blog da Cidadania serviram de alerta para que Lula ordenasse a destruição de provas.

Em fevereiro de 2016, Eduardo Guimarães divulgou informação jornalística de que Lula seria um dos alvos da 24ª Operação da Lava Jato.

Dias depois, o ex-presidente foi levado coercitivamente pela Polícia Federal para prestar depoimento.

Segundo Pimenta, o alvo de Sérgio Moro não é o blogueiro Eduardo Guimarães, mas o ex-presidente Lula.

“Não há nada sobre o tríplex, não há nada sobre o sítio de Atibaia, e as palestras estão devidamente comprovadas. Mas é preciso explicar a parafernália do power point de Deltan Dallagnol, as exibições de Sérgio Moro. Como resolver isso?”, questiona Pimenta.

O parlamentar prossegue: “Criando uma ideia de que, em função de um vazamento ilegal, as supostas provas que poderiam existir foram destruídas. E que, portanto, a tese do MPF, da Justiça e aquilo que os delegados da PF afirmaram não será possível de se realizar por que as provas foram destruídas”, denunciou Pimenta.

“Moro e o MPF estão diante de um grande problema: após 3 anos de investigação, não encontraram nada contra o ex-presidente”, sentenciou o parlamentar petista.







MAIS UMA ARMAÇÃO CONTRA LULA

A coerção exercida contra o blogueiro Eduardo Guimarães esta semana revela um movimento para tentar imputar, mais uma vez, ao ex-presidente Lula, condutas que ele jamais teve.


É falsa a notícia de que o blogueiro Eduardo Guimarães teria avisado a assessoria do ex-presidente Lula sobre a iminência de sua condução coercitiva e da execução de mandados de busca e apreensão, ocorridas em 4 de março de 2016.


Estes episódios surpreenderam não apenas o ex-presidente, mas o Brasil e o mundo, por sua violência e ilegalidade.


As informações que Eduardo Guimarães publicou no Blog da Cidadania, em 26 de fevereiro de 2016, diziam respeito exclusivamente à quebra de sigilo fiscal e bancário do Instituto Lula, do ex-presidente, filhos, amigos e colaboradores, incluindo empresas destas pessoas.


“Sessão judiciária do Paraná. 13a Vara Federal de Curitiba. Pedido de quebra de sigilo de dados bancários, fiscais e/ou telefônicos. Requerente: Ministério Público Federal. Acusado: Luiz Inácio Lula da Silva e seguem-se mais ou menos 40 nomes. A partir daí o juiz [Moro] passa a detalhar o pedido. Vou agora ao deferimento, que é o que interessa. Defiro o requerido e decreto a quebra do sigilo bancário e fiscal de: (seguem 43 nomes)” http://www.blogdacidadania.com.br/2016/02/confira-prova-de-que-lava-jato…


Foram exclusivamente estas as informações que Guimarães apresentou à assessoria do Instituto Lula.


Ele procurou a assessoria para confirmar se os nomes listados eram realmente de pessoas próximas ao ex-presidente.


Este procedimento é uma prática normal de repórteres e blogueiros.


A assessoria do Instituto Lula recebeu e ainda recebe inúmeras solicitações de jornalistas tentando confirmar informações sobre supostas ações da Lava Jato em relação ao ex-presidente.


A coerção exercida contra o blogueiro Eduardo Guimarães esta semana revela um movimento para tentar imputar, mais uma vez, ao ex-presidente Lula, condutas que ele jamais teve.


Revela também o desespero dos acusadores de Lula, que, após dois anos de investigações abusivas e até ilegais, não encontraram nenhuma prova contra ele e nem sequer um depoimento desabonador, depois que 73 testemunhas de defesa e acusação foram interrogadas pelo juiz Moro.

Com informações do Viomundo

Moro atentou contra liberdade de expressão, diz OEA

O relator especial para Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos (OEA), Edison Lanza, diz ser "grave" a condução coercitiva ordenada pelo juiz Sergio Moro contra Eduardo Guimarães, do Blog da Cidadania, e defende a importância da liberdade de imprensa no combate à corrupção; "Grave: juiz Moro submeteu e obrigou blogueiro a revelar fontes. Não se combate a corrupção sem liberdade de imprensa", diz Lanza em sua conta no Twitter; a ONG Repórteres Sem Fronteiras e a FENAJ também repudiaram a ação de Moro contra Guimarães.

O jornalista e advogado uruguaio Edison Lanza, relator especial para Liberdade de Expressão da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, órgão independente ligado à OEA (Organização dos Estados Americanos), criticou o juiz Sergio Moro pela condução coercitiva contra o blogueiro Eduardo Guimarães.

No Twitter, Lanza publicou nesta quarta-feira 22: "Grave: juiz Moro submeteu e obrigou blogueiro a revelar fontes. Não se combate a corrupção sem liberdade de imprensa". Na terça, a Polícia Federal foi à casa de Guimarães, que edita o Blog da Cidadania, apreendeu seu computador, celular e o celular de sua esposa e exigiu saber a autoria da fonte de um vazamento da Lava Jato.

Segundo Guimarães, a PF já sabia quem era a fonte quando ele chegou à sede da corporação em São Paulo. O motivo da condução coercitiva foi um vazamento feito por Guimarães em fevereiro do ano passado sobre uma condução coercitiva que ocorreria contra o ex-presidente Lula, deflagrada em março daquele ano.

A Constituição Federal, em seu Artigo 5º", parágrafo XIV, define que "é assegurado a todos o acesso à informação e resguardado o sigilo da fonte, quando necessário ao exercício profissional". Questionado sobre a autorização do mandado contra o blogueiro, o juiz Sergio Moro argumentou que ele não seria jornalista, atividade que não existe formação específica no Brasil.

ONG Repórteres Sem Fronteiras, uma das principais instituições globais em defesa do jornalismo, condenou a ação contra Guimarães. A Federação Nacional dos Jornalistas (Fenaj) também repudiou a ação de Moro contra Guimarães, ao afirmar que a PF ataca a liberdade de imprensa e abre um terrível precedente com a ação.

Do 247

quarta-feira, 22 de março de 2017

Repórteres Sem Fronteiras diz que sequestro de Eduardo Guimarães é grave atentado à liberdade de imprensa

O Ministério Público Federal (MPF), assinando cheque de seu autoritarismo golpista, tenta atacar o blog de Eduardo Guimarães dizendo que ele faz “propaganda político-partidária”. Ora, em primeiro lugar, se isso fosse crime, tinha que começar prendendo os jornalistas da grande mídia, que fazem propaganda político-partidária dia e noite. Aliás, só fazem isso. São promovidos por fazerem isso. E são demitidos quando não fazem.

Definir o que é “propaganda político-partidária” é uma interpretação subjetiva. Além disso, e se fizesse? Jornalistas podem fazer propaganda político-partidária. A gente que defende a democracia na mídia nunca reclamou que a grande imprensa fizesse propaganda político-partidária, e sim que ela fosse hipócrita e não admitisse isso e, sobretudo, criticamos o monopólio sobre concessões públicas, propriedade cruzada de meios de comunicação e falta de regulamentação do setor. O Merval Pereira pode continuar fazendo a “propaganda político-partidária” que ele quiser. Pode ser candidato do PSDB. Não defendemos que ele seja vítima de brutalidade judicial por causa disso.

Em segundo lugar, o MPF vai mais longe e cita o fato de Eduardo Guimarães ter sido candidato em 2016? O que tem isso? Carlos Lacerda, um grande jornalista de direita (golpista também, por sinal) também foi candidato. Isso o tornava menos jornalista?

Fernando Morais, grande escritor brasileiro, já foi candidato, isso o torna menos escritor?

João Ubaldo Ribeiro foi candidato, Graciliano Ramos foi secretário de Educação em Alagos, isso os tornavam menos escritores?

O MPF quer dizer o que? Que o cidadão brasileiro não tem mais direitos políticos? Sim, porque se o fato de ser candidato cassa, automaticamente, minhas liberdades, então o direito político também não existe.

A Repórteres Sem Fronteiras, principal organização internacional voltada para a defesa da liberdade de imprensa e expressão, já se manifestou, duramente, contra o sequestro do blogueiro Eduardo Guimarães. O representante dela no Brasil afirmou que a entidade irá soltar uma nota sobre o assunto.

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Condução coercitiva de blogueiro é grave atentado à liberdade de imprensa, diz Repórteres Sem Fronteiras
Por Daniela Fernandes
De Paris para a BBC Brasil
Sergio Moro despachou mandado de condução coercitiva de blogueiro na última terça-feira.

Para a ONG Repórteres sem Fronteiras (RSF), com sede em Paris, a “clara tentativa de quebra do sigilo da fonte” do blogueiro Eduardo Guimarães, do “Blog da Cidadania”, representa “um grave atentado à liberdade de imprensa e à Constituição brasileira, que garante esse direito”, afirmou à BBC Brasil Artur Romeo, coordenador de comunicação da organização no Brasil.

O blogueiro Eduardo Guimarães foi alvo, na terça-feira, de um mandado de condução coercitiva determinado pelo juiz Sergio Moro, da 13ª Vara Federal do Paraná.
Guimarães prestou depoimento na Superintendência da Polícia Federal em São Paulo. Moro também determinou a apreensão de documentos, aparelhos e arquivos eletrônicos do blogueiro.

A ação apura o suposto vazamento de informações da 24ª fase da operação Lava Jato, iniciada em março de 2016, que tinha como alvos o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, sua família e assessores.

“A condução coercitiva desse jornalista já é por si só um abuso, já que ele não havia sido convocado para depor nem se negado a fazê-lo”, afirma Romeo, da RSF. “É um recurso abrupto para forçar o depoimento”, ressalta.

O blogueiro, que já havia chamado Moro de “psicopata” em sua conta no Twitter, divulgou informações vazadas sobre a condução coercitiva de Lula, que ocorreu em março.

O Ministério Público Federal disse na época que a divulgação da informação teria prejudicado a operação.

A Repórteres sem Fronteiras diz que está investigando o caso do blogueiro e que ainda não conversou com Guimarães. Mas com base nos elementos obtidos até o momento, para a organização “está claro que houve tentativa de quebra do sigilo da fonte, agravada pela condução coercitiva”.

Isso, na avaliação da RSF, é “uma clara violação do direito de sigilo da fonte do jornalista, o que é preocupante”.

Blogueiro é acusado de vazar informações sobre condução coercitiva de Lula em 2016.
Em nota, a Justiça Federal do Paraná afirma que Guimarães “é um dos alvos de investigação de quebra de sigilo de investigação criminal no âmbito da Lava Jato, ocorrida antes mesmo de buscas e apreensões”.

“Pelas informações disponíveis, o Blog da Cidadania é veículo de propaganda política, ilustrado pela informação em destaque que o titular seria candidato a vereador pelo PC do B pela cidade de São Paulo”, diz a nota da Justiça do Paraná, acrescentando que Guimarães “não é jornalista, independentemente da questão do diploma”.

“Seu blog destina-se apenas a permitir o exercício de sua própria liberdade de expressão e a veicular propaganda político-partidária”, acrescenta ainda a nota da Justiça Federal do Paraná.

“Não é necessário diploma para ser jornalista, mas também não é suficiente ter um blog para sê-lo. A proteção constitucional ao sigilo de fonte protege apenas quem exerce a profissão de jornalista, com ou sem diploma. A investigação, por ora, segue em sigilo, a fim de melhor elucidar os fatos”, conclui a nota.

Para a RSF, “é extremamente preocupante um juiz emitir juízo de valor sobre a atuação de um jornalista ou de um blogueiro que edita há 12 anos um blog de opinião e de informações de interesse público”, diz Romeo.

A Repórteres sem Fronteiras ressalta que a profissão de jornalista vem evoluindo nos últimos anos e prefere não entrar na discussão se blogueiro é jornalista ou não ou se ele tem diploma.

“Há um entendimento amplo do trabalho de jornalista. Ele edita um blog, transmite informações de interesse público e, como são sigilosas, a Polícia Federal vai coagi-lo a revelar a fonte”, diz Romeo.

A RSF irá divulgar uma nota sobre a condução coercitiva de Guimarães.

Do Cafezinho, por Miguel do Rosário

segunda-feira, 20 de março de 2017

Moro passou a fazer política, diz Reinaldo Azevedo

Blogueiro de Veja comenta o vídeo em que o juiz agradece o apoio da população, na página criada por sua mulher na internet, "e sugere que, sem este, a história poderia ser outra"; "Todas essas ações têm nome. E o nome disso é política. É o que fazem os procuradores quando dão coletivas em off; é o que faz Moro quando apela diretamente à população", diz Reinaldo Azevedo; segundo ele, "os porras-loucas desses três entes — PF, MPF e Judiciário — decidiram exercer o controle da política e dos políticos" no Brasil.

O blogueiro de Veja Reinaldo Azevedo, que recentemente vem fazendo críticas a ações da Polícia Federal e do Ministério Público, afirma em post nesta segunda-feira 20 que o juiz Sergio Moro, de Curitiba, passou a fazer política. Ele comenta o vídeo em que Moro agradece apoio da população na página criada por sua mulher na internet.

Leia um trecho:
Na coletiva que concederam na sexta-feira, os procuradores Deltan Dallagnol e Carlos Fernando evidenciaram o desprezo que têm pelo Congresso, asseguraram que os senhores parlamentares querem é acabar com a Lava Jato, e um deles, Deltan, antecipou até a data do julgamento de Lula, que será feito pelo juiz Sergio Moro. A condenação veio sugerida nas entrelinhas. Na página-trocadilho criada por sua mulher — "Eu Moro com Ele" —, o juiz agradece o apoio da população e sugere que, sem este, a história poderia ser outra.

Todas essas ações têm nome. E o nome disso é política. É o que fazem os procuradores quando dão coletivas em off; é o que faz Moro quando apela diretamente à população; é o que faz a Polícia Federal quando, com impressionante irresponsabilidade, desfaçatez, ligeireza, falta de elementos e estupidez técnica, demoniza a carne brasileira, cuja excelência é reconhecida mundo afora.

"Há uma evidente sede de protagonismo dessas forças", continua Reinaldo, que prevê que, se entregarmos o Brasil "aos porras-loucas do MPF, da PF e do Judiciário", em dez anos "seremos um Haiti de dimensões continentais". Ele alerta ainda que a Operação Carne Fraca – um "espetáculo grotesco, deprimente e perigoso estrelado pela Polícia Federal" – tem antecedentes. "Não se chegou àquele descalabro do nada. Há muito está em curso a marcha da insensatez", diz.

Do GGN