Há dúvidas sobre quem foi Inácia
Vaz, a quem se atribui o início da povoação no espaço territorial que
hoje é a sede do Município de Buriti. Não se sabe se era branca, negra,
indígena, maranhense ou não, portuguesa ou brasileira. O que se diz é que ela
tinha um engenho de cana de açúcar, embora não se saiba em que ponto da cidade
fora instalado. Um enigma! Também não se
tem a certeza de que o dia 6 de dezembro
é a data inquestionável em que Buriti ganhou status de Unidade da Federação do Brasil, porque se oficializa na
invocação de uma LEI de 1938, quando o Poder Legislativo do Maranhão não estava
em funcionamento, por força da chamada “Ditadura Vargas” (Estado Novo), que
legislava por meio de “decreto-lei”, e não por lei, que é diferente na
compreensão dos juristas. Esses enigmas precisam ser desvendados.
Mas há uma certeza incontestável: Buriti tem um conjunto arquitetônico
constituído por casarões sólidos, que merecem tombamento, por seus significados históricos e culturais, ao menos para
as gerações dos anos 40 e 50 do século passado, ainda presentes. Para ilustrar
este enredo, o casarão da pensão do “Seu” João
Pio é um deles, porque guarda histórias e historietas contadas e
relembradas nas memórias dos que viveram naquela época e ainda vivem, em moradas
dispersas.
Era, ali, o ponto de chegada e de
partida de viajantes que vendiam tecidos, remédios e outras mercadorias para os
comerciantes locais; era, ali, a hospedagem provisória de autoridades
designadas para a Comarca: juízes, promotores, coletores (estadual e federal)
transferidos; era, ali, o terminal de ônibus de bancos toscos e desconfortáveis,
e de “jardineiras” inventivas (metade carroceria e metade de bancos) em
caminhões barulhentos, conduzidos pelo “chofer” Antero (chamado “Potinho”) e por outros; eram os meios de transportes
dos estudantes de cursos mais avançados nas cidades grandes; era a hospedagem
temporária dos advogados “provisionados” (rábulas) Sancler e José Maria de
Carvalho, de Brejo, patrocinando processos na Comarca; era o prédio
suntuoso avistado à distância, na única via urbana de acesso ao centro da
cidade, porque tinha ponte construída em
madeira sobre o riacho Tubi, que
tinha como referências a Casa Faria ou a residência de dona Angélica. O calçadão de altura incomum transformava-se
em palco de um teatro aberto, de cenas alegres e tristes, em que os atores
sorriam e choravam, em mistura de sentimentos justificados. Era, ali, antes da
praça de canteiros coloridos, que se iniciava o “largo da igreja”, das
“peladas” domingueiras da meninada risonha; era o espaço cativo por muitos
anos, onde se instalavam as “canoinhas” sem remos, atreladas por correntes nos suportes
em madeira, para os balanços cronometrados da criançada em lazer de temporada; era,
dali, naquele largo, que se construíam barracas de palhas em fileiras para a
venda de bugigangas pelos camelôs de ocasião; era, ali, de onde se ouvia o
barulho do carrossel do “seu João Queiroz”, ao lado da igreja, distraindo
crianças e adultos em giros controlados; era, ali, no mesmo calçadão, onde se acomodavam em “cadeiras
preguiçosas” os hóspedes e hospedeiros, nas noites de lua cheia ou não, sem
chuvas e trovões pavorosos; era, dali, que se ouviam os
sons badalados dos sinos sincronizados, no alto da torre da única igreja. Ouviam-se, de longe, as chamadas
sonoras para missas e novenários, ou anunciando óbitos
ocorridos, que se identificavam pela lentidão das batidas; era daquela
estrutura de pedra, cimento e areia, em concreto resistente, que se abriam
janelas de um lado e outro das duas vias privilegiadas, tal mirante
improvisado, a dar conta de quem passava. São memórias! É nostalgia pura, em
forma de registro necessário para as presentes e futuras gerações!
Sem dúvida, o casarão do “seu João Pio” é um monumento urbanístico, histórico e cultural, assim como outros ainda intocados,
na cidade alegre de filhos espalhados, Brasil a fora. Merece tombamento, antes que seja demolido por
urbanitas
apressados, sem vínculos com o passado
histórico, sem escrúpulos
nostálgicos e sem compromisso com a
história da urbe.
0 comments:
Postar um comentário