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terça-feira, 1 de agosto de 2017

Luis Nassif do Jornal GGN: Mídia golpista usa estilo lava jato para condenar a lava jato

Folha, demonstra a nova forma de desqualificação dos trabalhos da lava jato. Trata-se do pente fino da Polícia Federal sobre as inconsistências das denúncias do MPF e das delações premiadas.

O que garantia a blindagem da lava jato, até agora, era o forte espírito corporativo do Ministério Público Federal, a coesão do grupo de Curitiba e o apoio incondicional da mídia, enquanto os alvos fossem adversários políticos.

A forte blindagem da opinião pública, o espírito de manada, inibia todas as críticas. As avaliações sobre a falta de experiência da banda brasiliense da lava jato, sobre os exageros da quantidade de delatores de Curitiba, tudo isso ficava entre quatro paredes. No máximo, eram sussurradas críticas do Ministro Teori Zavascki sobre a inconsistência técnica de muitas das denúncias, o estilo panfletário substituindo a apresentação escassa de provas documentais.

Não que não houvessem provas. O problema é que se criou um vício circular. Numa ponta, o poder e a ânsia de bater recordes por parte dos procuradores, de fazer da operação a maior da história, a maior do planeta. De outro, a extrema facilidade em transformar qualquer frase em manchete condenatória, por parte de uma mídia que terceirizou a editoria de lava jato para a força tarefa. E, através da mídia, inibiam a atuação dos tribunais superiores.

Obter mais de cem delações de uma mesma empresa é uma bobagem ciclópica. Informações não circulam livremente. Há um grupo restrito na cúpula que controla as informações e as ações. E, na base, pessoas que assistem os movimentos sem ter noção completa do todo.

Por isso mesmo, incluí-los nas delações significa abrir uma enorme guarda para a exploração de conflitos de interpretação pelos advogados de defesa e, agora, pela mídia, em sua investida para esvaziar a lava jato.

O carnaval da Folha de hoje, contra a lava jato, é em cima de um factoide – da mesma natureza dos factoides plantados pela Lava Jato. A maneira como um delator relatou o mesmo episódio para o MPF e para a PF é significativa para se entender como é o jogo de indução na delação, mas, mais do que isso, como é o jogo de interpretações pela mídia.

Objetivamente, o delator Cláudio Mello Filho disse que procurou o senador Renan Calheiros para apresentar pleitos da Odebrecht. Na conversa, Renan teria solicitado contribuições para sua campanha. Não houve nenhum condicionamento explícito de apoio às medidas em troca das contribuições de campanha.

O trecho da delação é o seguinte:
“Em determinado momento da conversa, ele me disse que seu filho seria candidato ao governo de Alagoas e me pediu expressamente, que eu verificasse se a empresa poderia contribuir. Acredito que o pedido de pagamento de campanha a seu filho ao governo do Estado de Alagoas, justamente no momento em que se apresentavam os aspectos técnicos relevantes, era uma contrapartida para o forte apoio dado à renovação dos contratos de energia, inclusive publicamente, e que culminou na edição da MP n. 677/15. Entendi, na oportunidade, que esses pagamentos, caso não fossem realizados, poderiam vir a prejudicar a empresa de alguma forma.

(...) Soube posteriormente que foram doados oficialmente R$ 320 mil a pretexto de campanha, sendo R$ 200 mil para a candidatura direta e R$ 120 mil através do diretório estadual do PMDB/AL e depois repassado para a campanha da candidatura, conforme tabela abaixo”.

(...) Minha ação foi de transmitir e apoiar internamente o pedido feito pelo Senador Renan Calheiros, porque era do meu interesse atendê-lo, tendo em vista que a minha empresa tinha agenda institucional permanente no Senado Federal”.
Ou seja, Mello não tinha sequer o controle sobre as doações, já que tinha que defende-las perante o Departamento de Operações Estruturadas da Odebrecht. Se fosse propina – isto é, pagamento de dinheiro amarrado a uma contrapartida – o dinheiro seria carimbado.

No depoimento no inquérito da PF:
"Que para o declarante a doação foi realmente uma doação eleitoral e não pagamento de propina"; "Que Renan não condicionou a sua atuação política à retribuição financeira da Braskem".

A rigor, não há nenhuma contradição entre o depoimento ao MPF e à PF. A rigor, também não há uma informação objetiva que justificasse a abertura do inquérito. Mas o PGR e o MPF tinham suas preferências políticas e sua pretensão de bater recordes mundiais. É esse o teor do questionamento da PF. Qual a razão para abrir o inquérito, desperdiçando recursos e dispersando as investigações?

O MPF está provando, agora, do veneno que criou com os jogos midiáticos. Como passou a falar para o tribunal da mídia, está sendo condenado agora, pela PF, se valendo do mesmo tribunal. E será assim, daqui por diante. Do mesmo modo da opinião da delegada que defendeu a não concessão de benefícios a Sérgio Machado, por sua delação. Pode até ter razão, mas delegada questionar delação do MPF é da mesma natureza que procuradores de Curitiba questionarem o Ministro da Justiça. Provam do próprio veneno.

Na fase inicial, os jacobinos de Curitiba chegaram a denunciar delegados da PF que apuravam a autoria das gravações clandestinas colocadas em celas da delegacia. Os abusos não poupavam ninguém, jornalistas, delegados ou advogados, que também tiveram seus telefones grampeados.

Por outro lado, o excesso de protagonismo dos procuradores provocou ciumeira da corporação da PF. E o desmonte do grupo de trabalho da PF completou a obra. Não existem mais delegados da lava jato, mas delegados da PF investigando denúncias apuradas pela lava jato.

Agora, todos os abusos que serviram para derrubar Dilma, crucificar o PT e condenar Lula serão utilizados como provas para evitar a condenação de José Serra, a prisão de Aécio Neves e a queda de Temer.

Simples assim.

Do GGN

terça-feira, 18 de julho de 2017

Fernando Horta: Com Supremo, com tudo

Em março de 2016 vazava uma conversa entre o ex-presidente Lula e a presidenta Dilma Rousseff em que Lula dizia, em alto e bom som, que temos uma “suprema corte totalmente acovardada”. Não vamos rediscutir a ilegalidade do vazamento, a falta de punição aos agentes públicos que vazaram o áudio ou ao fato de que os governos de Lula e Dilma terem indicado quase todos os ministros desta corte. De fato, se Dilma tivesse continuado seu governo e a PEC da Bengala não tivesse sido aprovada, Lula e Dilma teriam indicado 10 dos onze ministros do STF. Apenas Gilmar Mendes seria a exceção.
Este cenário também deve ser levado em conta para entender a inércia da corte quanto ao golpe.

Mas para quê, afinal, serve o STF?

Existem estimativas de que o STF custe R$ 1,7 milhão de reais por dia ao povo brasileiro. Um tribunal caro para um judiciário que está entre os mais caros do mundo, chegando ao valor anual de quase 80 bilhões de reais, o que representa algo como 1,3% do PIB. Segundo números do judiciário, ele próprio arrecadou apenas R$ 45 bilhões, sendo deficitário, portanto.

Não são todos os países do mundo que tem um Superior Tribunal de Justiça como uma última instância do judiciário em linha normal e, acima dele, um Supremo Tribunal Federal. Algo um pouco além do que a mera justiça. Algo diferente. É o reconhecimento, feito por nossos legisladores, de que o judiciário, por si só, não faz justiça. Pode fazer numa demanda entre o indivíduo A e o B, ou entre a empresa A e o indivíduo C, mas nada substitui a política. Esta aliás, foi uma das lições tiradas das discussões no século XVIII, quando da formação dos EUA. Os “pais fundadores” de lá reconheciam o caráter subjetivo da lei e mais ainda da aplicação desta lei, e sempre criaram formas de o executivo não ficar escravo do judiciário. A própria Suprema Corte norte-americana exerce-se com um comedimento imenso, evitando se intrometer onde a política deve prevalecer. Quando houve um aumento da atividade jurídica dela por sobre a política por lá (durante o governo Obama) a própria Hillary Clinton falou abertamente que os senadores estavam “chocados” com o assanhamento da suprema corte. A palavra “assanhamento” é minha, não de Hillary Clinton.

No Brasil, há algum tempo, o STF vem se assanhando. Legislando nas brechas do congresso, mudando a constituição quando lhe convém (e tem ocorrido bastante esta conveniência), definido os espaços de atuação da Democracia ou permitindo e retirando atores do jogo político sem uma regra clara. Apenas a título de curiosidade o mesmo Gilmar Mendes que afrontou a tudo e a todos dando liminar contra a nomeação de Lula para ministro, deu liminar para que o senador Cássio Cunha Lima do PSDB fosse empossado por cima da lei da ficha limpa. Nos últimos tempos o STF se tornou tudo o que um tribunal não deveria ser: o centro das atenções.

Entretanto, todos os efeitos ruins deste tribunal seriam bem aceitos se ele estivesse contribuindo com o país. É preciso entender que o STF não foi pensado para ser última instância de processos de polos enriquecidos que conseguem, com boa retórica, transformar qualquer coisa em “questão constitucional”. As funções jurídicas do STF têm se alargado imensamente nos últimos tempos. E a corte tem deixado de lado suas originais funções.

Não vou me deter nas funções jurídicas do STF, tem gente muito mais qualificada para isto no cenário nacional. E que está já fazendo esta crítica. Vou me deter nas funções políticas dele. O STF foi pensado, em primeiro lugar, para ser um amortecedor da imensa liberdade que foi dado aos juízes de piso no nosso sistema. Liberdade, diga-se de passagem, sem o contraponto da prestação de contas à sociedade. Na prática, nossos juízes podem olhar para o céu e decretar que estão vendo ele verde com bolinhas rosas. Sentenciar assim e ponto final. O segundo grau foi organizado ser uma primeira barreira contra estes abusos, mas, com o passar do tempo, a segunda instância virou meramente burocrática, para a imensa maioria dos processos. Pesquisas atuais mostram que o grau de deliberação da segunda instância é pífio e só existe quando há interesse político ou financeiro em algum dos lados da demanda. O STF deveria, pois, conter o próprio judiciário.

A segunda função do STF é ser um dos “freios e contrapesos” entre os poderes. Desde Montesquieu, a ideia de poderes independentes e de mesma envergadura precisa ser pensada na prática. Como só um poder limita outro, ficou estabelecido que os poderes teriam mecanismos para se conterem mutuamente. Nos EUA, por exemplo, o impeachment é usado contra juízes de primeiro grau. No Brasil, uma das únicas formas do executivo agir sobre o judiciário é o STF. Algumas vozes têm defendido uma mudança na escolha do STF. Não sei se por ignorância ou má fé falam em “concursos” ou “indicação legislativa”, retirando o poder atual do executivo. A indicação de um ministro da suprema corta deveria ser algo de extrema importância. De novo, voltando aos EUA, por lá são feitos meses de entrevistas com os candidatos, análises das suas últimas decisões, de sua produção na vida e etc. Os governos progressistas no Brasil acreditaram que deveriam ser “republicanos” indicando ministros com critérios insondáveis. Estamos onde estamos.

A terceira função política do STF é evitar a conflagração social. Alguns nomeiam de “Poder Moderador”, lembrando o tempo do império. Uma palavra que deveria se basear na lei e moderar a vida do país quando em situação de risco. Este poder moderador serviria sempre como apaziguador, mas teria que ser ativo. Teria que se pronunciar e não se calar omitindo-se, como faz o atual STF. Não sei se a experiência do regime militar (quando três ministros não aceitaram o golpe e foram trocados pelos militares sem que a corte tomasse qualquer atitude) ainda é presente, mas desde então o STF se tornou um carimbador de pequenos, médios e grandes golpes. A corte procura se eximir da sua função de moderação. Protegem seu status pessoais sem incorrer em muitos riscos. É sempre providencial o pedido de vista indefinida, com que os ministros evitam até que o assunto seja debatido em plenário. Qualquer tentativa de reverter este descalabro encontra a voz corporativa da “independência do judiciário”. Defendem o direito de engavetarem decisões pelo tempo que interessar a eles individualmente. E dizem que isto é “independência” do poder que – em princípio – a teoria apontava que deveria ser como uma segurança para a sociedade, e não para os próprios membros.

Agora, se o STF se furta de ser um amortecedor do judiciário, quase sempre em função do corporativismo. Se se furta decidir em momentos-chave para evitar conflagrações sociais e se o executivo o livrou de ser um dos freios e contrapesos (porque indicou com base em critérios não definidos), então este STF não serve ao país. Não serve para mais nada. Esta situação ocorreu sim, em parte, por inação do executivo. Entretanto, outra significativa parte ocorre porque sim, temos uma suprema corte acovardada. Uma suprema corte em que o único que ruge como um leão no plenário e na frente das câmeras fala como um gatinho ao telefone com senadores de determinado partido. Lula estava certo em seu julgamento. É um escárnio terem votado o processo do Collor quase 20 anos depois do impeachment. E é um escárnio que os processos de Dilma Rousseff caminhem a mesma senda. Uma corte que só grita para defender os seus.

O país não precisa se onze supremas autoridades, protegidas social e politicamente, regiamente pagas, nobiliarquicamente tratadas, artisticamente filmadas em sessões para que eles deixem, por conveniência, a “história seguir seu curso”. É muito caro ter um STF que engaveta o que de mais importante existe para o país, enquanto põe em pauta um recurso da empresa X contra fulano de tal e passa horas debatendo sobre uma questão minúscula com ares de importância magistral enquanto o país se liquefaz.

Do GGN

terça-feira, 11 de julho de 2017

Sérgio Moro é acusado por desembargadores de usar acordos de delação para amarrar instâncias superiores

O juiz Sergio Moro tem tentado amarrar as instâncias superiores às suas decisões ao fazer acordos com delatores da operação “lava jato”.

De acordo com os desembargadores da 8ª Turma do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, em pelo menos duas oportunidades Moro determinou como seria o cumprimento da pena de réus condenados com apelações pendentes de julgamento pela corte. Por unanimidade, os integrantes da turma decidiram oficiar Moro para que ele pare de oferecer benefícios em processos sobre os quais não tem competência.

A discussão aconteceu quando o colegiado julgava a apelação que resultou na absolvição de João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, e na manutenção de uma condenação a 20 anos de prisão a Renato Duque, ex-diretor da Petrobras. O relator da apelação, João Paulo Gebran Neto, levantou questão de ordem porque, no dia anterior, Moro havia concedido benefícios a Duque em outro processo, mas vinculando o cumprimento da pena que seria definida naquele caso.

Na sentença em que Duque foi condenado mais uma vez, Moro decidiu “admitir a progressão de regime de cumprimento de pena depois do cumprimento de cinco anos no regime fechado, isso independentemente do total de pena somada, o que exigiria mais tempo de cumprimento de pena”. Isso porque o executivo fez acordo de delação premiada. “O benefício deverá ser estendido, pelo juízo de execução, às penas unificadas nos demais processos julgados por este juízo e fica condicionado à continuidade da colaboração.”

“O juiz de primeiro grau julgou o processo dele, tomou deliberações acerca de outros processos, e vinculou não apenas o tribunal, mas o juiz da execução”, reclamou Gebran, durante o julgamento. “Ao bem de conceder um benefício a um réu aqui condenado por nós, o juiz de primeiro grau acabou por invadir a nossa competência.”

A preocupação de Gebran é com a parte que assina esse tipo de acordo com o Ministério Público e vê os benefícios serem concedidos pelo juiz de primeiro grau, mesmo tendo um recurso pendente de julgamento. Na verdade, apontou o relator, quem faz isso assina um acordo nulo, porque o primeiro grau não vincula outras instâncias.

Naquele dia, o desembargador Victor Laus levava seu voto-vista em que acompanharia a divergência aberta pelo desembargador Lenadro Paulsen, presidente da 8ª Turma. Antes de começar a votar, Laus lembrou que não era a primeira vez que Moro fazia isso, e que o problema já é discutido praticamente desde o primeiro dia da “lava jato” no TRF-4.

Segundo Laus, quando a 8ª Turma julgou um caso relacionado à empresa Dunel, a primeira apelação da “lava jato” discutida pela corte, o problema já fora apontado. “Já víamos, naquela ocasião, o juízo de alguma forma querendo fazer prevalecer a sua competência sobre outros juízes. E nós já alertávamos, naquela oportunidade para esse fato, ou seja, esgotado o momento da sentença, quando o magistrado exaure a sua jurisdição, nova autoridade judiciária, dali para a frente, assume a causa.”

Publicado no Conjur.

Do DCM

segunda-feira, 10 de julho de 2017

Aldo Fornazieri: A dinâmica parlamentar da crise e a omissão da esquerda

A dinâmica parlamentar da crise e a omissão da esquerda

Em termos políticos, o Brasil é um dos países mais esquisitos do mundo. Ocupa uma das primeiras posições no ranking das desigualdades sociais e, contudo, essa ignominiosa condição não se traduz em indignação, em ação em luta política. Nunca fomos capazes de fazer uma revolução social e nem uma revolução política. Somos uma sociedade acostumada ao mando. Primeiro, ao mando dos colonizadores, dos senhores de engenho; depois, ao mando dos coronéis das oligarquias estaduais, enfim, ao mando de um rosário de chefes, delegados, empresários, empreiteiros, prefeitos, paramentares, padres, pastores, doutores etc. Uma visceral disposição para mandar de alguns e de obedecer dos muitos.
As lutas sindicais, com uma exceção aqui outra acolá, terminam em bom convívio entre o trabalho e o capital. No campo, em que pese toda a violência, prevalece o mando do senhor das terras. Quando os representantes dos trabalhadores chegam ao poder, verifica-se o bom convívio, os bons modos, a conciliação.

No Brasil, o Estado sempre foi tudo: criou, serviu e serve o capital; mais dele do que das lutas sociais descenderam alguns parcos direitos e políticas sociais; fez banqueiros, empreiteiros e os grandes conglomerados da agroindústria (vide a JBS); salvou os cafeicultores, os usineiros e os trambiqueiros em geral. Grosso modo,  o dinheiro tem uma via única: sai do suor dos trabalhadores e dos pobres, vai para o Estado e daí para os ricos.

Em que pese as brutais desigualdades e tragédias sociais, os principais conflitos políticos se situam no teatro do Estado e nas suas instituições. Lá é o espaço onde os interesses sociais e econômicos são decididos e onde as decisões são descendidas para um povo acostumado ao mando  e resignado à obediência. O teatro do Estado expressa a aparência da tragédia real e, ao mesmo tempo, é o real que a constitui. No Brasil, a política é autônoma quase que no sentido estrito do termo. Lá os partidos representam a si mesmos, não têm lastro social, ou representam quadrilhas. Servem os diversos grupos do capital, destinam migalhas aos mais pobres. Lá indivíduos e grupos criam sublegendas dentro dos partidos, bancadas específicas que atravessam vários partidos e surgem políticos que representam a si mesmos. 

No Brasil não tivemos a impetuosidade de uma revolução burguesa, não tivemos a êxtase da fúria destruidora do jacobinismo, não tivemos uma revolta camponesa, uma rebelião de escravos, uma guerra da independência, uma revolução republicana. Não tivemos nem a fantasia e nem a poesia da emancipação proletária. Tivemos golpes, presidentes que não terminam os seus manados e quase nenhuma resistência popular.

A dinâmica parlamentar da crise e a segunda derrota das esquerdas 

Talvez a autonomia do teatro do Estado e esta tipologia do par mando/obediência expliquem, ao menos em parte, a conduta das esquerdas e das forças progressistas no processo do golpe-impeachment. Note-se, antes de tudo, que o capital ficaria com Dilma se esta tivesse mostrado capacidade de articular a governabilidade com o Congresso e se tivesse feito um ajuste fiscal que fosse satisfatório para os seus interesses. Desembarcou do governo Dilma e embarcou no governo Temer que, para se viabilizar, prometeu reformas retrógradas. Agora, pode desembarcar do governo Temer para embarcar no governo de Rodrigo Maia ou de outro qualquer, desde que haja uma continuidade da política econômica. Este mesmo capital que financiou quase todos os partidos extraindo recursos do Estado.

A dinâmica do golpe teve um elevado grau de autonomia em relação a esses interesses. Por um lado, foi articulado pelos caprichos individuais de Aécio Neves que queria "encher o saco do PT". Por outro, foi ardilosamente construído pela quadrilha do PMDB, liderada por Temer, que queria tomar o poder para continuar cometendo crimes e para garantir o foro privilegiado para alguns de seus membros.

Tudo isto se articulou, com acordos e desacordos, com o Partido do Estado, que também tem seus grupos específicos internos. O Partido do Estado é constituído pelo Ministério Público, pela PGR, pela PF, pelo STF e outros setores do Judiciário. O Partido do Estado sempre se articula quando o sistema político entra em colapso pela via da ingovernabilidade e da corrupção. Em vários momentos, o Partido do Estado foi representado pelas Forças Armadas, que agora ficaram à margem da crise.

Desde o início do processo do golpe as esquerdas e as forças progressistas ficaram na defensiva, seja por incompreensão da conjuntura, por arrogância, por incompetência ou por covardia. Perderam as ruas e, sem forças sociais organizadas e mobilizadas, o governo Dilma foi derrubado. Naquele momento, a decisão política combinou mobilização de rua e agregação de força paramentar em favor do golpe.

Consumado o golpe e com o governo ilegítimo caminhando para um isolamento social crescente, as oposições não tiveram capacidade para impor uma dinâmica das ruas para protagonizar um evento de mudança política. A partir disso, a política brasileira voltou ao seu leito tradicional, ao teatro do Estado.

O governo foi sendo sustentado pelo Congresso, aceito pelo mercado, mas acossado pelo Partido do Estado confrontado pela quadrilha de Temer, determinada a esvaziar a Lava Jato. As ruas passaram a ficar de fora desse processo, sem protagonismo, e as esquerdas, sem força congressual,  tornaram-se expectadoras das lutas e dissensões alheias. Sem as ruas, a demanda pelas diretas já está inviabilizada e FHC tornou-se quase o principal defensor dessa consigna. Se as reformas forem freadas não será pela forças das ruas, mas pelas conveniências eleitorais dos partidos e dos políticos que derrubaram Dilma. Isto fica evidente nos movimentos de Renan Calheiros, que é uma espécie de líder informal das oposições.

Independentemente de qual for o desfecho de Temer, as oposições saem derrotadas. Se Temer permanecer no governo, será a continuidade da derrota do golpe. Se Temer sair, será algo decidido sem a participação das oposições e sua substituição não passará de um rearranjo de nomes para dar continuidade à mesma política, ao mesmo bloco de poder, cada um visando se posicionar em relação a 2018.

No Brasil não há nenhuma revolução à vista, nenhuma transformação social profunda no futuro próximo, nenhum caminho promissor de justiça e de igualdade. Não temos heróis para ressuscitar para que possam glorificar novas lutas, não há fantasias para exagerar, nem espectro da revolução e menos seu espírito. O que há é uma contínua comédia política para acobertar a normalidade trágica da realidade. Normalidade trágica porque naturalizamos a tragédia social do país e seu modo violento de ser. Parece que os nossos políticos se sentem mais confortáveis com a máscara da comédia política  para dançar no baile brasiliense, fruição prazerosa que esconde o mal-estar da sociedade. E nós, que estamos nas planícies, nos entretemos, nos distraímos, com as danças cínicas dos planaltos.

Para encontrar um caminho promissor de mudanças, precisamos criticarmo-nos constantemente a nós mesmos, interrompendo esta paralisia, esta marcha para o retrocesso, este olhar fixo num passado inglório. Precisamos encarar com sobriedade e responsabilidade o fracasso das forças progressistas na história do Brasil. Fracasso que se traduz nesta desigualdade inaceitável, nos precários direitos, nos poucos avanços e nas muitas derrotas.

GGN, Aldo Fornazieri - Professor da Escola de Sociologia e Política (FESPSP

domingo, 9 de julho de 2017

Luís Nassif: A procuradora Raquel Dodge futura PGR e os aloprados da Polícia Federal

Um dos grandes dilemas dos modernos sistemas de controle do crime organizado, é a estrutura de comando, as maneiras de coordenar uma corrente que tem como elos principais o Judiciário, o Ministério Público Federal e a Polícia e na qual as relações hierárquicas não são suficientemente claras.

São conhecidos os arrufos periódicos entre MPF e PF acerca das atribuições de cada um. O MP questiona o monopólio da investigação pela PF que, por sua vez, rebela-se contra o controle externo da PF, a ser exercido pelo MP. É um conflito que se estende também aos MPs estaduais.

Trata-se de convivência complicada, cheia de resistências de lado a lado.

A opinião pública sempre deu status maior ao procurador que ao delegado – embora ambos tenham sido aprovados em concursos igualmente exigentes. O delegado sempre é confundido com o policial de porta de cadeia, mesmo a PF sendo dotada de áreas técnicas e de um enorme corpo de funcionários com curso superior.

Na Lava Jato, no entanto, métodos científicos foram deixados de lado, as investigações minuciosas – que consagraram a PF na última década – abandonadas em favor dos absurdos mais renitentes. Ou então do exibicionismo desenfreado, de policiais vestidos para a guerra, com uniforme de Swats, armados até o pescoço, cumprindo missões arriscadíssimas de... invadir residências de pessoas desarmadas.

Nos últimos anos, a imprensa colocou um poder sem paralelo nas mãos de delegados e procuradores em missões com desdobramentos político-partidários.

Peguem jovens delegados malhados, sentindo-se os próprios Rambos, com salários iniciais altíssimos, com o status de autoridade e coloquem sobre eles os holofotes da mídia. Dá nisso.

Deslumbrados e despreparados, julgaram que A Força jamais os abandonaria. Não se deram conta de que, depois de entregue o trabalho que a mídia almejava, seriam descartados como carne fraca ao mar. E, pior, não se deram contas de que representavam a própria corporação que os acolheu.

O crime do colarinho branco não implica em riscos físicos para os investigadores, da mesma maneira que as investigações sobre o tráfico. Exigem menos músculos, e mais inteligência. Os delegados da Lava Jato decidiram usar apenas os músculos em uma operação que exigia cérebro.

Agora, se aproxima a hora da verdade.

O repórter Marcelo Auler (https://goo.gl/Aj73oE) vem denunciando sistematicamente os abusos cometidos por esses garotões deslumbrados. Primeiro, os grampos ilegais colocados em celas de investigados. Depois, uma investigação fajuta, visando esconder a autoria dos grampos. Finalmente, em conluio com os procuradores da Lava Jato, a perseguição implacável aos colegas que resolveram levar as investigações a sério.

Se o legalismo da procuradora Raquel Dodge for mantido intacto, não haverá como não cuidar de dois desafios complicados:

1.     Apurar os crimes cometidos por esses irresponsáveis e processá-los de acordo com a lei.

2.     Impedir que o desvendamento dos crimes comprometa investigações da Lava Jato.

Sua pena maior, no entanto, será quando a corporação da Polícia Federal se der conta dos males que esse exibicionismo desenfreado causou à corporação, aos policiais eficientes que vestem a camisa, correm riscos de vida e não são propensos ao exibicionismo.

A atuação aloprada da Polícia Federal do Paraná, na Operação Lava Jato, abriu espaço para que o MPF reforce seu papel de controle externo da PF. E esse prejuízo será debitado na conta dos aloprados do Paraná.

GGN

sábado, 8 de julho de 2017

Lava jato: desmonte como autoproteção, por Marcelo Auler

O diretor-geral do DPF, Leandro Daiello, que ganhou o manto protetor costurado pela Força Tarefa da Lava Jato, agora faz o desmonte da mesma até para evitar punições.
Só os mais ingênuos é que estranharam o anúncio feito pelo Departamento de Polícia Federal (DPF) do desmonte do que restou da Força tarefa da Lava Jato na Superintendência Regional do DPF no Paraná (SR/DPF/PR). O desmonte, por um governo golpista repleto de investigados não só da Lava Jato, mas de outras operações policiais, era mais do que esperado. Lembremos que todos os que defenderam e lutaram pelo golpe que derrubou a presidente legitimamente eleita, Dilma Rousseff, entre outras causas para retirá-la alegavam que ela faria isso. Em 30 de maio de 2016, quando Eugenio Aragão assumiu o ministério da Justiça, na postagem Fantástico: Michel Temer coloca a raposa para cuidar do galinheiro, chegamos a republicar um trecho do artigo de Miriam Leitão com este tipo de acusação, oportunidade que a rebatemos:

“Minha colega e ex-chefe, Miriam Leitão, por exemplo, escreveu a coluna “O homem amigo“, em O Globo, acusando o então novo ministro de “buscar um pretexto para intervir na equipe da Lava-Jato. Mesmo sem ter tido sequer cheiro de vazamento, ele continuou. Circulam rumores de que ele tem uma lista das cabeças que cortará. O “Valor” ontem falou de duas dessas cabeças: Rosalvo Ferreira, superintendente da Polícia Federal no Paraná, e Igor Romário de Paula, diretor de combate ao crime organizado no Paraná. Além, claro, do diretor-geral da Polícia Federal, Leandro Daiello”.

O que as pessoas não percebem, mas é comentário solto no DPF em Brasília, é que o desmonte da Força Tarefa tem outros objetivos além de arrefecer as investigações no momento em que elas resvalam e tendem a descambar em “não Petistas”, o alvo maior da chamada República de Curitiba. Em sua coluna neste sábado (07/07) na Folha de S. Paulo, André Singer toca nesse ponto:

“E o que desejam os parlamentares, entre eles o próprio Maia, um investigado? Que a Lava Jato pare. Desde esse ponto de vista, não poderia ser mais conveniente a informação, também em todos os jornais, de que a Polícia Federal encerrou as atividades do grupo dedicado à operação em Curitiba. Convém lembrar, igualmente, que diversos processos foram tirados do juiz Sergio Moro nas últimas semanas.

Em outras palavras, pela primeira vez há sinais de arrefecimento do núcleo paranaense que lidera as investigações desde 2014, o que deve soar como música aos ouvidos dos congressistas”.

Leandro Daiello, o diretor-geral cujo futuro é desconhecido, ao desmantelar o grupo, na verdade tem um segundo – principal??? – objetivo: protegê-lo e proteger a si mesmo. Quer dificultar ao máximo que alguém – a nova Procuradora-geral da República, Raquel Dodge, por exemplo, que seria adepta de o MPF exercer mais fortemente o controle externo das atividades policiais  – caia na tentação de apurar as muitas irregularidades cometidas em nome do combate à corrupção.

Tais ilegalidades, na verdade, aconteceram com o objetivo maior de caça aos petistas, com a tentativa de acobertamento dos erros e crimes de tucanos, peemedebistas e de políticos de outros partidos, como o possível presidente interino, Rodrigo Maia (DEM-RJ).

Tanto o desmonte, como a não apuração – para evitar punição e, quem sabe, questionamentos e anulações em tribunais superiores de muito do que se fez – já ocorrem há algum tempo. A equipe da Força Tarefa começou a ser desfeita com a transferência de duas cabeças do grupo dentro da SR/DPF/PR: a delegada Érika Mialik, que em dezembro foi “promovida” e transferida para Santa Catarina; e Marcio Adriano Ancelmo, em fevereiro empossado como Corregedor do DPF do Espírito Santo, apesar das muitas suspeitas de, no mínimo, irregularidades que cometeu.

A “proteção” vem sendo armada na medida do possível. Um exemplo é o caso da  delegada Daniele Gossenheimer Rodrigues, chefe do Núcleo de Inteligência Policial (NIP), que respondeu a um Processo Administrativo Disciplinar (PAD) após uma sindicância refeita confirmar que ela ordenou a instalação de um grampo no fumódromo da Superintendência, sem autorização judicial. Queria bisbilhotar  quem criticava o trabalho da Força Tarefa, comandada por seu marido Igor de Paulo Romário, coordenador da Delegacia Regional do Combate ao Crime Organizado (DRCOR).

Porém, mesmo sendo considerada culpada de um suposto crime, sua punição limitou-se a uma “suspensão” que não gerou nem mesmo a perda do cargo de chefia, tal como narramos em: Para o DPF, grampo ilegal na Superintendência do PR é transgressão disciplinar.

GGN

quinta-feira, 6 de julho de 2017

PF deixa a força-tarefa de Curitiba

A Polícia Federal confirmou, nesta quinta (6), que encerrou o grupo exclusivo que atuava em Curitiba por conta da Operação Lava Jato. Em nota, a direção da PF admitiu que os grupos de trabalho dedicados à Lava Jato e à Carne Fraca serão dissolvidos e passarão a integrar a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (Delecor).

A informação foi disseminada na imprensa após a revista Época antecipar o fim do GT e afirmar que procuradores de Curitiba avaliaram a medida como uma tentativa de "asfixiar" as investigações.

"Não há dúvida entre os investigadores de que a produção de provas em processos altamente relevantes – como os dos ex-presidentes Lula e Dilma Rousseff, entre dezenas de outros – será severamente prejudicada. O mesmo vale para novas frentes de investigação sigilosas, envolvendo, entre outros, operadores e políticos do PMDB e do PSDB. Diante da escassez de recursos e pessoal, novas fases da operação podem nem sequer ser deflagradas, de acordo com procuradores da República e uma fonte no GT da polícia. 'É uma asfixia', diz um dos investigadores", disse o portal da Revista.

Abaixo, a nota completa da PF:

1.   Tendo em vista que cada delegado do Grupo de Trabalho da Lava Jato possuía cerca de vinte inquéritos cada um, essa equipe, juntamente com o Grupo de Trabalho da Operação Carne Fraca, passou a integrar a Delegacia de Combate à Corrupção e Desvio de Verbas Públicas (DELECOR);
2.   A medida visa priorizar ainda mais as investigações de maior potencial de dano ao erário, uma vez que permite o aumento do efetivo especializado no combate à corrupção e lavagem de dinheiro e facilita o intercâmbio de informações;

3.   Com a nova sistemática de trabalho, nenhum dos delegados atuantes na Lava Jato terá aumento de carga de trabalho, mas, ao contrário, ela será reduzida em função da incorporação de novas autoridades policiais;

4.   O número de policiais dedicados a essas investigações chega a 70;

5.   A iniciativa da integração coube ao Delegado Regional de Combate ao Crime Organizado do Paraná, delegado Igor Romário de Paula, coordenador da Operação Lava Jato no estado, e foi corroborada pelo Superintendente Regional, delegado Rosalvo Franco;

6.   O modelo é o mesmo adotado nas demais superintendências da PF com resultados altamente satisfatórios, como são exemplos as operações oriundas da Lava Jato deflagradas pelas unidades do Rio de Janeiro, Distrito Federal e São Paulo, entre outros;

7.   Também foi firmado o apoio de policiais da Superintendência do Espírito Santo, incluindo os delegados Márcio Anselmo e Luciano Flores, ex-integrantes da Operação Lava Jato;

8.   O atual efetivo na Superintendência Regional no Paraná está adequado à demanda e será reforçado em caso de necessidade;

9.   Conforme nota divulgada no dia 21/05/2017, deve-se ressaltar que as investigações decorrentes da Operação Lava Jato não se concentram somente em Curitiba, mas compreendem o Distrito Federal e outros dezesseis estados;

10.  Desde o início, a Polícia Federal, de forma republicana e sem partidarismos, trabalha arduamente para o êxito das investigações, garantindo toda a estrutura e logística necessária para o esclarecimento dos crimes investigados.

GGN

quarta-feira, 5 de julho de 2017

A Polícia Federal na era das tecnologias de rede, Nassif

A física do crime organizado
Algumas conclusões importantes, na entrevista com o delegado Bruno Requião.

Formado em física, com mestrado pela Unicamp e em conclusão do doutorado na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Bruno trabalha em uma das áreas científicas da Polícia Federal: os estudos sobre Teoria de Redes e Sistemas Complexos, novo ramo da ciência que está sendo aplicado em vários campos, como biologia, física, ciências sociais.

Seu trabalho consiste em analisar grandes bancos de dados visando tirar conclusões e linhas de investigação.

Trabalhou por anos com repressão a entorpecentes e inteligência policial em regiões de fronteira.

Mais recentemente vem trabalhando com crimes cibernéticos na Delegacia de Defesa Institucional na Superintendência da Polícia Federal no Rio Grande do Sul, onde, em especial, se destacaram em 2014 e 2016 a Operação Darknet fases I e II de combate à pedofilia virtual na Deepweb.

Da entrevista concedida ao GGN, destacam-se as seguintes informações.

Os sistemas complexos
A pesquisa consiste em trabalhar grandes bancos de dados e levantar as conexões entre as pessoas. Primeiro, as vezes que se comunicam entre si. Depois, incluem-se aspectos qualitativos: afinidades familiares, sociais, profissionais, etárias etc.

Um dos pontos centrais da pesquisa é a identificação das peças-chaves em cada organização, e que quase nunca é o cappo. Suponha-se uma pessoa que faça o meio de campo entre o PCC e o Comando Vermelho. Do ponto de vista de teoria de redes o mais relevante é a pessoa que faz o meio campo entre ambas as organizações.

Os conselheiros da máfia, os contadores, os planejadores, são mais relevantes para a organização do que os chefes, pois elas podem se reorganizar rapidamente em caso de desmantelamento da chefia. Geralmente são funções especializadas, que não são facilmente substituíveis.

Aqui, um exemplo de como são as pesquisas na área:

O empreendedorismo no tráfico
Aproveitei a descrição dele para especular sobre um ponto que levantei aqui, meses atrás, por ocasião dos massacres nos presídios do Norte.

Imaginando o tráfico como um ambiente econômico, ele é constituído de diversas especialidades independentes entre si:

·       A plantação da coca

A especialidade consiste no acesso aos plantadores.

·       O refino

Exige o acesso à coca e a produtos químicos.

·       A logística

O transporte da planta para o refino, do refino para os grandes atacadistas

·       A venda no atacado

Não basta ter o meio de transporte. Tem que ter os canais de venda aos atacadistas.

·       O controle do varejo em cada ponta

A distribuição aos vendedores finais, que podem estar ligados as grandes organizações criminosas, como PCC e CV, ou a grupos menores locais.

·       O acesso aos investidores

Toda essa operação exige investidores. Quem faz o meio campo entre os investidores e as demais pontas são os doleiros.

Têm-se aí, um ambiente econômico que permite um empreendedorismo dinâmico, com competências estabelecidas, possibilidade de terceirização e perspectivas de ganhos astronômicos. Essa possibilidade aumenta as suspeitas sobre helicocas e assemelhados. Ou seja, entradas e saídas rápidas do mercado, para vendas de oportunidade.

Lembrem-se que, com os avanços da Internet, em pouco tempo Telexfree conseguiu mobilizar uma cadeia nacional de estelionatários.

Bruno lembrou que na Holanda os investigadores se deram conta de que, bastava desbaratar uma quadrilha para outra surgir rapidamente ocupando o espaço. E se deram conta de que nasciam justamente dessa soma de competências. Como a maconha, por lá, é cultivada em estufa, a rede se recompunha com especialistas em eletricidade e funções correlatas.

Por aqui, se avança pouco pela incapacidade da Justiça, Polícia Civil e Ministério Pùblico de avançar além das mulas. Fingem que combatem o tráfico, pescando lambaris e deixando soltos os tubarões.

As dificuldades brasileiras
Há dois grandes problemas na repressão ao narcotráfico. O primeiro, é a pouca disposição de juízes e procuradores de alcançarem os cabeças, em muitos casos pessoas influentes, com expressão na economia formal. Contentam-se com os bagrinhos. Toda ação contra redes criminosas, se feita de maneira aleatória, não tem efeito algum.

O segundo problema é a burocracia. Façam modelos de gestão que agilizem as colaborações entre instituições. Qualquer pedido de colaboração dura uma eternidade.

Sobre os especialistas em bancos de dados
As pesquisas em bancos de dados e as analises de rede são o primeiro passo para a investigação. Nada substitui o trabalho de campo, a busca de provas. No entanto, por falta de pessoal e excesso de demanda, muitas investigações se limitam apenas  a essa primeira parte do trabalho, muitas vezes insuficiente para a investigações.

Observação minha: é o caso típico da Lava Jato, cujas investigações parecem se basear exclusivamente na indução na delação premiada, na analise de bancos de dados e nas correlações enfiadas a martelo nos inquéritos.

A probabilidade na acusação
Teorias probabilísticas são relevantes para conferir foco às investigações. Mas quando se utiliza a teoria da probabilidade para condenar réus? Essa inovação consta da última peça da Lava Jato visando condenar Lula no caso do triplex.

Indaguei em tese ao Bruno.

Ele se considera um cientista. E, como tal, busca a verdade objetiva. Ele se diz não especialista em direito. Mas valer-se de teorias probabilísticas para apontar culpados, em sua opinião, é desvirtuar completamente.

GGN

segunda-feira, 3 de julho de 2017

PF prende Geddel Vieira Lima peça-chave no golpe

O ex-ministro Geddel Vieira Lima, um dos principais assessores de Michel Temer, foi preso nesta segunda-feira 3 pela Polícia Federal, na Bahia.

Decisão é do juiz Vallisney de Souza, titular da 10ª Vara Federal de Brasília, tomada no âmbito da Operação Cui Bono, deflagrada em janeiro deste ano, e que investiga fraudes em créditos da Caixa Econômica Federal, onde ele ocupava o cargo de vice-presidente.

De acordo com o Ministério Público Federal, Geddel "valeu-se de seu cargo na Caixa para, de forma orquestrada, beneficiar empresas com liberações de créditos dentro de sua área de alçada e fornecer informações privilegiadas para outros membros da quadrilha composta, ainda, por Eduardo Cunha" e outros.

O suposto esquema de fraudes na liberação de créditos da Caixa ocorreu entre 2011 e 2013. 

O mandado contra Geddel é de prisão preventiva, portanto, não há prazo para a soltura. A prisão foi baseada nos depoimentos do operador Lucio Funaro, que também atuava na Caixa Econômica, e do empresário da JBS Joesley Batista no âmbito da Cui Bono.

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domingo, 2 de julho de 2017

No Brasil de hoje, o crime compensa? Por Ribamar Fonseca

Será que deu a louca no Supremo Tribunal Federal às vésperas do recesso? Além do “sorteio” dos ministros Gilmar Mendes e Alexandre de Moraes para relatores dos processos de Michel Temer e Aécio Neves, o ministro Marco Aurélio Mello devolveu ao senador mineiro o mandato do qual estava afastado, e o ministro Edson Fachin libertou o ex-deputado Rocha Loures, o homem da mala com R$ 500 mil, que estava preso na carceragem da Policia Federal. Detalhe: os dois ministros revogaram decisão da própria Corte, o que nos leva a acreditar que os homens de toga estão meio perdidos na análise dos processos ou, então, algo muito estranho está acontecendo na mais alta Corte de Justiça do país. Por conta dessas últimas decisões, rumores que circulam em Brasilia já dão conta de que haveria um amplo “acordão” para salvar tucanos e peemedebistas, aqui incluído o próprio presidente ilegítimo Michel Temer e seus ministros. Se isso for verdade e considerando-se as graves acusações e provas contra sobretudo Temer e Aécio, não é difícil concluir-se que no Brasil de hoje o crime de colarinho branco compensa.

No seu despacho, revogando a decisão do seu colega Edson Fachin quanto ao mandato de Aécio Neves, o ministro Marco Aurélio Mello pela primeira vez deixa cair sua capa e expõe, em toda a sua pujança, as suas penas tucanas, que vinha conseguindo esconder com habilidade ao longo do tempo. Isso ficou muito claro quando ele diz, no despacho, que Aécio “é brasileiro nato, chefe de família, com carreira política elogiável – deputado federal por quatro vezes, ex-presidente da Câmara dos Deputados, governador de Minas Gerais em dois mandatos consecutivos, o segundo colocado nas eleições à Presidência da República de 2014 – ditas fraudadas –, com 34.897.211 votos em primeiro turno e 51.041.155 no segundo, e hoje continua sendo, em que pese a liminar implementada, senador da República, encontrando-se licenciado da Presidência de um dos maiores partidos, o Partido da Social Democracia Brasileira". 

No seu despacho, revogando a decisão do seu colega Edson Fachin quanto ao mandato de Aécio Neves, o ministro Marco Aurélio Mello pela primeira vez deixa cair sua capa e expõe, em toda a sua pujança, as suas penas tucanas, que vinha conseguindo esconder com habilidade ao longo do tempo. Isso ficou muito claro quando ele diz, no despacho, que Aécio “é brasileiro nato, chefe de família, com carreira política elogiável – deputado federal por quatro vezes, ex-presidente da Câmara dos Deputados, governador de Minas Gerais em dois mandatos consecutivos, o segundo colocado nas eleições à Presidência da República de 2014 – ditas fraudadas –, com 34.897.211 votos em primeiro turno e 51.041.155 no segundo, e hoje continua sendo, em que pese a liminar implementada, senador da República, encontrando-se licenciado da Presidência de um dos maiores partidos, o Partido da Social Democracia Brasileira". 

O magistrado diz ainda, no seu despacho, como justificativa para devolver o mandato a Aécio, que ele “é brasileiro nato e chefe de família”. Ora, Delcídio do Amaral também é, assim como tantos outros presos pela Lava-Jato que não tiveram o mesmo benefício. João Vaccary também e, no entanto, continua preso mesmo absolvido pelo TRF-4. E Lula, que vive caçado como um criminoso sem ter cometido nenhum crime? Ele igualmente é brasileiro nato e chefe de família, tendo perdido a esposa justamente pelas pressões injustas contra a sua família. Afinal, o que está acontecendo com o Supremo? Será que é tudo encenação para iludir os que ainda acreditam em Justiça? A libertação de Rocha Loures, uma decisão estranha do mesmo ministro que dias antes havia determinado a sua prisão – Edson Fachin – teria o objetivo de impedir a sua delação, que poderia agravar mais ainda a situação de Temer? O homem flagrado com uma mala contendo R$ 500 mil, supostamente endereçada a Temer, provavelmente foi beneficiado também por ser brasileiro nato e chefe de família, o que, pelo visto, é suficiente para anular o crime de que é acusado.

Os tucanos, que representam a elite do país e participaram do golpe que destituiu Dilma Roussef da Presidência da República, parece que estão imunizados contra qualquer acusação, inclusive na Lava-Jato, onde não se tem conhecimento de nenhum deles investigado ou preso, apesar de incluídos em delações. Os integrantes da força-tarefa, como o procurador Carlos Fernandes Lima, por exemplo, perderam o pudor e não mais escondem suas simpatias pelos tucanos, que se esforçam para preservar, ao mesmo tempo em que fazem carga contra os petistas. O empresário e doleiro Adir Assad, que foi preso pela Operação Dragão da Policia Federal e está encarcerado em Curitiba, acusado de chefiar um esquema de empresas de fachada responsáveis pela emissão de notas frias para lavagem de dinheiro de propinas de empreiteiras, nos governos tucanos de São Paulo, vem tentando negociar sem sucesso uma “colaboração premiada” em que promete contar com detalhes, inclusive apresentando provas, o esquema criminoso na estatal paulista Dersa (Desenvolvimento Rodoviário S/A), estatal responsável pelas obras viárias. O esquema rendeu mais de R$ 1 bilhão em contratos fictícios, segundo Assad, no governo José Serra, mas o Ministério Público considerou a delação “frágil” e, por isso, não a aceitou.

Conclui-se que com essa Justiça o Brasil dificilmente retomará os trilhos da democracia e, consequentemente, do desenvolvimento, porque a escandalosa parcialidade continuará selecionando os réus. E as injustiças prosseguirão flagrantes. Portanto, diante disso, pelo visto quem quiser cometer deslizes, impunemente, com os dinheiros públicos, bastará tucanar ou manifestar seu apoio a Michel Temer. Estará imunizado contra qualquer tentativa de punição, em qualquer instância do Judiciário.

Uma vergonha!

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