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sábado, 3 de março de 2018

História do Golpe: Para entender o xadrez da política - 3, por Luis Nassif


Vamos a uma atualização do nosso cenário político.
01 de fevereiro de 2013: Sobre o xadrez na política - Notas 2
Esses jogos de guerra, famosos desde os anos 70, são interessantes por possibilitar identificar poderes, correlações entre eles, fatores relevantes para a vitória etc.
Vamos tentar montar essa lógica para nosso Jogo das Guerras Políticas.
O objetivo é impedir que o outro jogador consiga desestabilizar politicamente o país. Competir e vencer ou perder eleições é questão dos partidos políticos e cabe em outro tipo de jogo. Nesse, a maior ou menos possibilidade de reeleição só interessa como fator deflagador ou mitigador de crises políticas.
Os últimos meses foram relativamente calmos. Mas não se deve perder de vista o clima de ebulição que tomou conta do país por ocasião do julgamento do “mensalão”. Não se deve afastar a possibilidade de criação de novas catarses.
As duas frentes de batalha: Congresso e Judiciário
As batalhas se desenvolvem em duas frentes: Congresso e Judiciário.
O Congresso tem o poder de decretar impeachments de presidentes. Lá, o desafio consiste em manter a base aliada consolidada. Já o STF (Supremo Tribunal Federal) tem o poder de intervir, também. E, como se observou no julgamento do “mensalão”, o chamado “clamor da opinião publicada” tem enorme influência sobre o plenário.
O fator deflagrador de crises é o chamado Clamor da Mídia.
O contraponto central é a expectativa de Reeleição do presidente.
Reeleição mantém a base unida, esvazia as tentativas de reeditar movimentos de Clamor da Mídia e dilui intenções golpistas de membros do STF. E aí depende fundamentalmente do fator econômico.
A frente econômica
Hoje em dia, nos temas econômicos a guerra midiática se dá em duas frentes.
A primeira é a macroeconomia, em torno do binômio (muitas vezes conflitante) de Inflação e Crescimento. No momento, são pontos relativamente pacificados, mas com algumas incertezas no ar. De qualquer modo, é fora de dúvida de que para o governo a estabilidade econômica é fator maior.
A segunda é o da gestão pública, especialmente em torno de três frentes: as obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento), os problemas da Petrobras/PréSal e o ritmo emperrado dos ministérios.
Um bom desempenho da economia esvaziaria completamente o Clamor da Mídia
Estratégia – A presidente mudar o estilo e descentralizar um pouco que seja a gestão de governo; voltar a fortalecer a Petrobras; e interromper a ansiedade de uma medida pontual por semana na área econômica. 
Os fatores que criam Clamor da Mídia
Hoje em dia, o Clamor da Mídia é influenciado por dois fatores principais:
Guerra Fria.
Escandalizações.
Guerra Fria não pega. 
O tema da ameaça subversiva poderia ganhar alguma relevância se as centrais sindicais se curvassem às provocações – ou à ameaça de processo contra Lula – e saíssem às ruas, hipótese, por enquanto, pouco provável. Fica no ar o desfecho da análise das denúncias de Marcos Valério, pelo Ministério Público Federal de Minas Gerais, agora que o episódio Renan Calheiros comprovou, para os que ainda não acreditavam, o forte ativismo político do Procurador Geral Roberto Gurgel.
Estratégia – Evitar manifestações de rua e não ceder às provocações.
Já escandalizações continuam eficientes, especialmente após a cobertura intensiva do “mensalão”.
Há dois pontos vulneráveis no governo, podendo gerar escândalos ou escandalizações. O regime do RDC (Regime Diferenciado de Contratação), estendido para todas as grandes contratações públicas, que pode dar margem a jogadas; e os megafinanciamentos do BNDES (Banco Nacional do Desenvolvimento Econômico e Social) aos chamados campeões nacionais, principalmente se alguns deles começarem a fazer água obrigando o banco a saídas pouco ortodoxas.  A repetição de episódios como a Marfrig e LAEP seria desastroso.
Estratégia – o BNDES proceder a um pente fino em todos os megafinanciamentos e, identificando vulnerabilidades nos tomadores, tratar de se antecipar, buscando soluções de mercado.
Ações pontuais junto à base aliada
Fora esses grandes eixos, há ações pontuais que poderia reduzir ainda mais o risco de desestabilização.
É nítido que Dilma Rousseff não tem a mínima vontade de tratar de questões políticas. Então, tem que se azeitar outros canais.
Lula faz um meio de campo eficaz. A grande manobra dos adversários têm sido a tentativa de envenenar as relações dele com Dilma - acenando com o fantasma da reeleição.  Nos últimos tempos, pessoas de segundo escalão – ligados aos dois - ajudaram na montagem da rede de intrigas. O desmentido cabal, por parte de Lula, desobstruiu esse canal. 
Estratégia – melhorar a Secretaria de Relações Institucionais. A senadora Ideli Salvatti tem inúmeras qualidades, mas não a de interlocução com o meio político – trabalho que foi feito com grande competência por seus antecessores, José Mucio e Alexandre Padilha.
Ações junto ao Sistema Judiciário
A decisão sobre os vetos parlamentares às Medidas Provisórias  mostrou alguns pontos relevantes.
Como se recorda, o estado do Rio de Janeiro entrou com um pedido de liminar para impedir que o Congresso derrubasse os vetos da presidência à lei dos royalties. O  Ministro Luiz Fux – que concedeu a liminar – praticamente paralisou os trabalhos do Congresso, ao obrigar que todos os vetos fossem votados em ordem cronológica. Depois, alegou que não tinha ido informado dessas consequências – comprovando a mesma leviandade de quando votou às cegas com o relator do “mensalão” Joaquim Barbosa e condenou até um réu absolvido pelo relator, passando a impressão de que não se aprofunda nos seus votos.
Desdobramentos desse caso:
Na entrevista aos correspondentes estrangeiros, Joaquim Barbosa criticou expressamente a insensibilidade do voto de Fux. Endossou a posição de bom senso dos Ministros que julgaram que a ordem cronológica deveria ser respeitada daqui para frente; não, retroativamente. Mais do que demonstração de bom senso, a posição de Barbosa confirmou o que fontes próximas a ele já haviam percebido: caiu sua ficha em relação ao inacreditável Fux, seu ponto de apoio para a radicalização do julgamento do mensalão.
Celso de Mello, Marco Aurélio de Mello e Luiz Fux votaram pela decisão mais drástica, de manter o confronto com o Congresso na questão dos royalties. Gilmar Mendes votou contra, mas não por nenhum assomo de bom senso: a manutenção da lei dos royalties (sem os vetos da presidente) aumentará exponencialmente os royalties que Mato Grosso (seu estado natal e sua base política).
A superexposição dos Ministros teve esse subproduto positivo para a sociedade, ao demonstrar didaticamente a prevalência das convicções partidárias ou pessoais sobre o espírito das leis e da razoabilidade.  Forma-se o grupo dos cinco em temas em que sobressaia o ativismo do Judiciário. Nos demais temas, especialmente em ações de impacto político, a atuação é do grupo dos quatro - os dois Mello, Gilmar e Fux - respeitados os interesses pessoais em cada matéria votada. As posições de Joaquim Barbosa podem coincidir apenas topicamente com a do grupos dos 4, mas não há alinhamento automático.
O recente confronto de três associações de juízes com Joaquim Barbosa expõe outro ponto importante do STF.
Embora parte majoritária do Judiciário não tenha maiores simpatias pelo PT, a atuação dos cinco do Supremo no julgamento do mensalão foi recebida com espanto por muitos setores da magistratura. O show midiático das novas celebridades chocou um setor em que a maioria dos juízes comporta-se com discrição. Não passaram em branco as grosserias inomináveis de Barbosa contra Ricardo Levandovski, os arroubos adolescente de Celso de Mello, comparando partidos políticos ao PCC - e com essa declaração, explicitando uma posição partidária incompatível com quem estava julgando uma ação penal.
Até agora, o modelo hierárquico do Judiciário segurou as manifestações de desagrado do setor. A falta de cerimônia de Joaquim Barbosa, na entrevistas aos correspondentes estrangeiros, provocou esse primeiro movimento público de protesto contra a síndrome de Deus que acometeu Barbosa e seus pares.
Estratégia – não errar na indicação dos novos Ministros do STF. Terão que ser legalistas até a medula e competentes. Não se pode incorrer mais em enganos, como o de Luiz Fux, ou em indicações de Ministros pouco preparados, como José Toffoli. E torcer para que Gilmar, Marco Aurélio, Fux e Barbosa continuem se expondo à mídia como têm feito.
Conclusão
O Crisômetro, o termômetro da crise, está bastante acomodado neste final de ano. Apenas um mega-escândalo, ou um inquérito continuado - e seus vazamentos - alimentando um noticiário diário poderia elevar a temperatura.
A substituiçãodo PGR, nos próximos meses, deverá tapar um dos principais canais de vazamento de inquéritos.
GGN (Artigo publicado originalmente em 04/03/2013).

segunda-feira, 17 de julho de 2017

Araújo: A monumental fraude do plano econômico Globo-Itaú

Foto: Antonio Cruz/EBC
Cemitério sem inflação - o completo fracasso de um plano econômico 

Um plano econômico que não poderia dar certo ameaça levar ao Brasil a uma depressão inédita, um dos países de economia historicamente mais dinâmica do planeta caindo nas profundezas de uma depressão gerada pela política econômica equivocada, sem lógica, sem nexo e sem ciência, manejada pelo sistema financeiro em seu próprio benefício.

O DEBATE DA POLÍTICA ECONOMICA

Nos anos 40, 50, 60 e 70, foi intenso no Brasil o debate na academia, na imprensa, nas associações empresariais sobre política econômica, sobre linhas doutrinárias, propostas, alternativas, custos e vantagens de cada variante da governança da economia do País.
Como dizia Keynes, a história da humanidade é a história do pensamento econômico e pouca coisa além disso. Discutir a política econômica de um grande País é tema central dos cidadãos.

Hoje se verifica um DESERTO completo nessa discussão, a imprensa pelos grandes jornais e noticiários de TV toma como ÚNICO o caminho apontado pelos “economistas de mercado”.

Nunca há um rumo único na política econômica, é uma política e, como tal, permite opções.

Uma safra de economistas robotizados que nasceu na esteira do Plano Real e que conhece um só  tipo de política econômica, o que é uma fraude, os caminhos podem ser muitos, a ciência econômica é  sempre plural, desde que existe a partir de Colbert no Século XVIII, o estudo da economia permite um cenário de amplas discussões sobre custos e benefícios avaliados no contraponto de alternativas, não há uma ciência econômica una e exclusiva, os modelos das duas maiores economias do planeta, EUA e China, são completamente diferentes e funcionam cada qual no seu contexto social e político, economia não é uma equação matemática.

No entanto essa imprensa desprovida de conhecimentos louva como uma divindade  uma “equipe econômica” como se, sem ela, o País não sobrevivesse. Um delírio, meia dúzia de mentes esquemáticas, sem brilho, tocadores de realejos concebidos fora do Brasil e carentes de formulações mais elaboradas, uma política medíocre e sem criatividade quando uma coisa é certa: política econômica tem que ser pensada dentro das condições de cada País, não há uma ciência econômica universal baseada em fórmulas matemáticas idênticas.

A mídia brasileira se recusa a participar de debates contraditórios sobre a política econômica, endossando em branco fórmulas como se fossem verdade divina revelada. Abstém-se a mídia, por exemplo,  de debater clivagens cruciais. Cito apenas  duas:

O catecismo religioso do plano assegura que, com a queda da inflação, devem cair as taxas de juros para a economia real. Tal não vem acontecendo desde 2015, as taxas não só não caem, como sobem, mesmo as que se mantém nominalmente iguais representam JUROS REAIS muito mais altos porque a inflação descontada agora é menor do que em 2015, do que resultam JUROS REAIS muito maiores e não menores, como reza a lógica anunciada da política econômica. Cai a inflação, deveriam cair os juros como consequência, não é essa a equação apresentada ao público?

MAS não caíram, os juros reais de hoje são muito maiores do  em 2015,  tanto na taxa Selic como nas operações com os tomadores privados, apesar da queda da inflação, DESMONTA-SE A LÓGICA DO PLANO.

O Banco  Central, dominado pelo sistema financeiro, abriu mão, pela Circular 3.691 de 2013, da FISCALIZAÇÃO E CONTROLE DE C MBIO, o Sistema FIRCE, cujas raízes têm mais de 80 anos. Agora os bancos se auto controlam, o que significa uma selva  no mercado de câmbio, nem em paraísos fiscais o câmbio é tão desprovido de controle.

Em consequência montou-se um “cartel do câmbio” que está sugando bilhões de Reais daqueles que precisam comprar ou vender moeda estrangeira, sob o olhar inexistente do Banco Central, que abriu mão do controle. A Associação Brasileira de Comércio Exterior está processando junto ao CADE esse “cartel de câmbio” onde os bancos fixam entre eles taxas de compra e venda com spreads enormes, muito acima da média internacional, auferindo espantosos lucros com a manipulação das taxas de câmbio. A ABCE pede um ressarcimento de R$70 bilhões extorquidos pelo “cartel do câmbio livre”, livre de qualquer controle, operam como em Cayman ou Mônaco.

Veja-se que a Associação dos Exportadores NÃO está reclamando no Banco Central e sim no CADE porque evidentemente não confia na isenção do Banco Central.

A imprensa brasileira, Globo, Estadão, Folha, Valor, se isentam de dar destaque a esses dois MEGA FUROS do plano econômico, só possível pelo domínio completo pelos bancos sobre a Autoridade Monetária, que não existe mais como mecanismo de governança em nome do País, o Banco Central é dos bancos e de mais ninguém.

TODOS os diretores do Banco Central que integram o COPOM são aprovados pelo ”mercado”, não há nenhum de centros de pensamento econômico alternativo, totalmente ao contrário da diretoria do Federal Reserve, onde cada um dos sete titulares vem de ESCOLAS DE ECONOMIA diversas, exatamente para haver debate.

O ATUAL PLANO ECONÔMICO

Como poderíamos denominar esse plano?

Plano econômico Globo-Itaú? O Itaú, como maior força do mercado, indicou o presidente do BC, mentor principal do plano e fanático das METAS DE INFLAÇÃO, modelo que justifica as mais altas taxas de juros básicas e na ponta do tomador entre qualquer das grandes economias. Taxas de juros que fizeram do Banco Itaú um dos vinte maiores do mundo em valor de mercado, R$225 bilhões de Reais, o dobro do que vale o DEUTSCHE BANK, maior banco da Europa e com 200 anos de história.

A GLOBO, pela alucinada defesa que o maior grupo de comunicação do País faz desta política,  O Plano Depressão do Brasil.

Plano econômico BOLETIM FOCUS? Nome que se justifica por esse questionário que consiste em perguntar toda semana ao agiota quanto ele quer de juros para ficar contente e a partir da resposta o Tesouro paga o que mercado quer de juros, por isso mesmo os mais altos do mundo, o Boletim FOCUS é a confissão de submissão do Banco Central ao mercado.

Enquanto nos EUA o mercado espera ansioso o que o FED vai resolver sobre juros, aqui não é preciso adivinhar: o mercado já sabe quanto o Tesouro vai pagar porque é ele quem decidiu.

Na realidade, é um plano gestado nos departamentos de economia dos grandes bancos privados para atender seus interesses e objetivos dentro da economia, não é um Plano Econômico para a população brasileira, suas necessidades e seu futuro.

Miremos no exemplo dos EUA, o grupo de sete pessoas que administra o banco central americano, o Board do Federal Reserve System, NÃO tem vinculação com o sistema financeiro, são professores de economia de alta reputação,  independentes e sempre foi assim, não se aceita banqueiros para gerir o Banco Central. Mais ainda, esses professores que compõem o Board do Federal Reserve são DE ESCOLAS DE ECONOMIA VARIADAS para não viciar a direção do FED com uma só linha de pensamento econômico.  Porque é assim?

Porque banqueiros vão formular um plano em benefício dos bancos, por isso o sistema não tem banqueiros na direção do FED, política monetária não pode ficar na mão de banqueiros.

O último grande banqueiro que geriu a economia americana foi Andrew Mellon,  Secretário do Tesouro de 1921 a 1932, Mellon por uma política restritiva e ultraconservadora levou os Estados Unidos à crise de 1929, é o pai da Grande Depressão, saiu execrado da vida pública, símbolo do capitalismo gerindo ele mesmo sem interesse pela população.

Assumindo a Presidência, Roosevelt reverteu política de Mellon, assim como demitiu seu chairman do FED, Eugene Meyer, no meio do mandato. Mellon e Meyer estavam aprofundando a recessão de 1929, que virou a Grande Depressão, faziam uma política muito similar ao do atual Plano Meirelles, pensavam em reduzir gastos e não em sair da recessão.

O ESCANDALO DOS JUROS REAIS MAIS ALTOS DO MUNDO

Juros reais altíssimos no  MEIO DA RECESSÃO, uma irracionalidade completa, a economia afunda, a inadimplência atinge 61 milhões de brasileiros com o nome sujo, dezenas de milhares de lojas fechadas pelo País a cada mês, a arrecadação federal, estadual e municipal caindo mês a mês, para espanto dos arautos desse plano que se “surpreendem” com a queda de arrecadação provocada por eles mesmos e já sugerem novos impostos para compensar, o que irá aumentar o rumo negativo da economia. Como alguém pode se surpreender com a queda da arrecadação, se isso é uma consequência natural da imposição da política recessiva?

O PLANO ECONÔMICO COMO CAUSA DA RECESSÃO

O atual plano econômico METAS DE INFLAÇÃO COM JUROS ALTOS EM PLENA RECESSÃO vai levar o Brasil a uma depressão profunda. Convoque-se dez Prêmios Nobel de Economia e nenhum endossará esse atentado contra a racionalidade e a ciência econômica.

PARA SAIR DA RECESSÃO É PRECISO ESTÍMULO MONETÁRIO, mais dinheiro na rua e não menos, como faz o plano recessivo, valorizando o  Real ao preço de operações que, só no primeiro semestre do ano passado, custaram R$ 207 bilhões de prejuízos ao Banco Central, cobrados do Tesouro, em nome de desvalorizar o dólar para atingir a sacrossanta meta de inflação, ÚNICO EIXO DA POLÍTICA ECONÔMICA, não há nenhum outro, não há meta de emprego, meta de crescimento, meta de investimentos públicos, só o controle de inflação.

Não se trata de escolas econômicas divergentes, é consensual em todas as escolas de economia,  ortodoxas, heterodoxas, do velho e do novo pensamento econômico.

Não se bloqueia dinheiro em plena recessão, agravando a crise e aprofundando o desastre.

Quem formula e  vende ao comando político um plano que agrava profundamente  a crise econômica e social demonstra não ter categoria de economista político, função que visa ajustar a economia com o menor sacrifício possível e levando em conta SEMPRE o conjunto da situação política do País, como fez Keynes em 1933, não só ele, outros grandes economistas souberam casar a realidade com a ciência para diminuir o sofrimento, do mesmo modo que faz a medicina que evoluiu do martelo para a anestesia para diminuir e não para agravar o sofrimento dos doentes.

Os inventores dessa política econômica que  identifica a cura com sofrimento estão desligados da realidade social do País, operam em cima do boletim FOCUS, excrescência que pergunta ao carrasco como ele quer manejar a lâmina, pergunta a quem deve ser regulado quanto ele quer ganhar, quando a função do Banco Central é liderar o mercado e não ser por ele liderado, o Banco Central não faz perguntas, o Banco Central dá a direção ao mercado.

Toda a lógica da política econômica do plano Meirelles é equivocada, centra como maior problema do País a inflação, quando o maior problema é o emprego que permitiria a sobrevivência da grande massa de desempregados e subempregados que não tem renda alguma. Nesse contexto do mal menor, a meta de inflação a níveis que chegam à depressão é um objetivo que significa menor valor para essa população do que ter emprego e renda.

A moeda supervalorizada é ótima para rentistas e nada significa para desempregados.

OS FUROS DO PLANO ECONÔMICO

A DESPESA maior do orçamento federal é a CONTA DE JUROS, que considera não só o Pagamento dos juros da dívida em títulos, mas também o carregamento das operações compromissadas do BC e dos swaps cambiais, todas despesas incorridas com um mesmo objetivo: atingir a META DE INFLAÇÃO. 

O conjunto das despesas chega a R$650 bilhões por ano, MUITO MAIS que qualquer outra despesa do orçamento federal, incluindo a previdência, é MUITO SUPERIOR ao déficit orçamentário federal que é a OBSESSÃO dos Mansuetos e Samueis. Só no primeiro semestre de 2016, o BC teve prejuízo de R$207 bilhões por causa dessas operações, custo repassado ao Tesouro, NENHUMA citação desse custo pela equipe econômica, mas citam incessantes despesas muito menores com benefícios sociais como se fossem o grande problema e não os juros pagos pelo Tesouro.

Para ajustar o orçamento federal pode-se seguir dois caminhos: cortar cada vez mais, inclusive despesas essenciais e obrigatórias  como ameaça Mansueto de Almeida OU pode-se aumentar a arrecadação federal através da recuperação da atividade econômica, processo mais racional do que a estupidez do corte linear.

A equipe Meirelles-Goldfajn ideologicamente prefere matar o País com corte de despesas e não aumentar a arrecadação pela reativação da economia.

Essa opção é ideológica, esse tipo de ECONOMISTA identifica como boa política econômica aquela que exige SACRIFÍCIOS, se não houver SACRIFÍCIO  a política não é virtuosa, aí existe um conteúdo religioso do SACRIFÍCIO como redenção dos pecados. 

Os economistas ortodoxos da Grande Depressão pensavam a mesma coisa, é preciso PURIFICAR os pecados, punir os ímpios pelo sacrifício, pela pobreza,  pela miséria, só assim  se pune os malefícios dos gastadores, dos que usufruem de bolsa família e seguro desemprego sem trabalhar. 

A PURGAÇÃO PELO SACRIFÍCIO

A reativação da economia por ESTÍMULOS MONETÁRIOS faz elevar a arrecadação e com isso reequilibrar as contas, mas isso não serve para os ECONOMISTAS DO SACRIFÍCIO, se não houver punição pelos gastos sociais que pagam a vagabundagem dos pobres, a política de ajuste não vale moralmente, é preciso que o povo sinta na pele a dor do sacrifício porque foram parceiros dos gastos dissipadores da Bolsa Família, da saúde gratuita dos SUS, das merendas nas escolas, tudo isso foi IRRESPONSÁVEL, segundo a visão ortodoxa, é preciso oficiar para expiar o mal da PURGAÇÃO no altar do neoliberalismo de mercado para  que eles, os punidos pela crise sejam sacrificados em nome dos financistas ricos no altar das oferendas em honra da AUSTERIDADE FISCAL, de preferência à moda grega, o mesmo programa que levou países europeus a grande desemprego e gerou crises sociais e políticas profundas.

A ironia é que aqueles países não tinham recursos, precisam importar comida e petróleo, enquanto o Brasil tem alimento e energia em abundância, não depende do exterior para sobreviver, como a Grécia, que sem crédito não consegue comer e gerar energia.

Não há maior algoz de pobre do que outro pobre, nada existe de mais patético do que POBRE DE DIREITA, um coitado que defende os privilegiados e os rentistas por convicção.

O atual PLANO ECONÔMICO é um desastre ideológico, nada justifica paralisar um País rico de recursos naturais em função de uma referência estatística que atende pelo nome ridículo de METAS DE INFLAÇÃO, um País jogado no abismo em benefício de uma estatística de frações de um por cento, coisa de mentes miúdas, de gente pequena, medíocre, canhestra, pedestre, pigmeus intelectuais, anões de cultura e de conhecimento do pensamento econômico renovado de nossos dias, a “política de ajuste” que eles pregam está FORA DE MODA até no Fundo Monetário Internacional, hoje com  uma visão crítica do ajuste grego e já sensível à renovação do pensamento econômico pós-2008 que atingiu até a outrora catedral do monetarismo, a Universidade de Chicago, onde um plano como esse não seria aprovado por calouros, tal a insensatez e insanidade de propor ações pró-recessão em um dos pais mais ricos do mundo em recursos naturais, agrícolas e energéticos.

KEYNES E A RECESSÃO

Na obra que o consagrou, a “Teoria Geral”,  Lord Keynes demonstra que em ciclos de profunda recessão o mercado não tem a capacidade de auto-ajuste, o mercado não tem essa ferramenta de reverter um ciclo continuado de queda da atividade econômica.

Nesta situação, só o Estado pode aumentar a demanda agregada que justifique novos investimentos em produção. Keynes especificamente apontou que a noção de que com a baixa da inflação e dos salários consequente ao desemprego, isso levaria a um estímulo para os empresários investirem, exatamente o que apregoam os “economistas de mercado” que sustentam o plano Meirelles. Keynes  demonstrou como isso é falso, que os empresários não vão investir se não há demanda para seus produtos. É exatamente o ponto onde se encontra o Brasil hoje. A equipe econômica aparentemente não leu e não aprendeu as lições de Keynes, operam com noções de uma economia ortodoxa desmentida pela Grande Depressão, tudo o que estão fazendo e pregando NÃO vai levar os empresários investirem e não vai tirar o País da recessão, esses cérebros são economistas pré-keynesianos, não sabem ou não aprenderam a lição da História econômica de crises recessivas anteriores da história do capitalismo.

O pano de fundo intelectual e ideológico desse plano de AJUSTE COM JUROS ALTOS E METAS DE INFLAÇÃO não é da formulação do Ministro da Fazenda, ele não tem bagagem para formular um plano econômico, é apenas um executivo de banco mediano, a formulação vem de outras cabeças, um pequeno círculo de economistas anacrônicos, fora do tempo e do espaço, formados muito antes da crise de 2008, com um pensamento monetarista démodé superado por outras reflexões sobre como lidar com economias em crise.

OS ERROS DO GOVERNO DILMA

A moeda de troca oferecida por esse pequeno grupo é reverter os erros da assim intitulada “Nova Matriz Econômica” do governo Dilma, algo que nunca existiu como política econômica consistente, não havia nenhuma política econômica, só uma série de improvisos ao sabor da conjuntura, essa “Nova Matriz” não era uma política construída e sim uma soma de medidas não articuladas. Os  desacertos do governo Dilma foram reais MAS não foram eles a causa principal  da longa recessão  estrutural que se projeta agora para mais de CINCO ANOS.

O conjunto desses erros poderia ser revertido a curto prazo, não teriam o poder de prolongar por tanto tempo a recessão a eles atribuída. Política de preços de combustíveis e de energia pode e já foi revertida e nem por isso a recessão se abateu, o déficit orçamentário de Dilma continua no governo sucessor, sem que se possa colar nele a recessão. A maioria dos governos do mundo, a começar pelo dos EUA, têm déficits por anos seguidos sem por isso entrar em recessão. O que faz e alimenta a recessão é a POLÍTICA MONETÁRIA do Banco Central.

A CAUSA REAL DA RECESSÃO

A causa estrutural da recessão é a DOMINÂNCIA do conjunto da política econômica pelos interesses exclusivos do mercado financeiro, centrado na imposição CONTRA A LÓGICA ECONÔMICA MAIS ELEMENTAR, de juros reais CINCO VEZES a média internacional, não só em relação a juros pagos por países ricos mas também em relação a JUROS PAGOS POR PAÍSES EMERGENTES, menores e com menos reservas cambiais em relação ao PIB do que o Brasil.

O Peru, por exemplo, paga juros reais em sua dívida pública que são MUITO ABAIXO do Brasil, assim como a Colômbia,  México, Índia, Paquistão, o Brasil está fora do passo em relação a maioria dos países emergentes, com relação aos países ricos o Brasil está pagando juros reais de QUATRO A CINCO vezes maiores, sem explicação à luz da teoria econômica.

Uma das consequências da dominância do mercado financeiro sobre o governo foi a extraordinária mudança de posição dos bancos privados em relação aos bancos públicos.

Nas três décadas nas quais o Brasil teve o maior crescimento econômico do planeta, de 1945 a 1975, o Banco do Brasil era maior que os dez maiores bancos privados somados.

Os grandes Estados tinham cada um seu banco estadual para financiar a produção regional, São Paulo tinha o poderoso BANESPA, de expressão internacional, Minas Gerais tinha três bancos públicos, a Guanabara tinha o riquíssimo BEG, que tinha tantos depósitos que não conseguia aplicar no Rio de Janeiro, outros Estados tinham seus bancos públicos.

Na histeria privatista do Plano Real quase todos os bancos estaduais foram vendidos, a maioria para o Itaú, alguns com o preço inferior ao crédito tributário que carregavam, todos sob o pretexto falso de que estavam quebrados, o valor da rede de agências não estava no balanço.

Hoje o BANCO ITAÚ vale no mercado R$225 bilhões e o Banco do Brasil um terço disso, R$75 bilhões, uma extraordinária transferência de capital bancário público para banqueiros privados, resultado óbvio do domínio do mercado sobre o Estado.

Esse processo levou à cartelização do sistema bancário privado, o Brasil tinha 600 bancos em 1975 e hoje basicamente três bancos dominam o mercado privado. Com esse processo esterilizou-se o crédito, caro e seletivo, os bancos se voltam para o mercado “exclusivo” para a classe média alta, afastando-se cada vez mais da economia real.

A DOMIN NCIA FINANCEIRA SOBRE A POLÍTICA ECONÔMICA

Ora, não há no mundo dos grandes países nenhum governo tão dominado pelo dito “mercado” na escala em que se encontra o Brasil. O “mercado” tem interesses específicos, que não são os da população como um todo. Nos EUA, a dominância excessiva do mercado levou à crise de 2008, salva pelo Estado e não pelo mercado, hoje o mercado perdeu peso, prestígio e importância no sistema de governança dos EUA, a eleição de Trump é uma resultante disso.

No Reino Unido, o “mercado” jamais optaria pela saída da União Europeia, isso prejudicaria extraordinariamente os negócios financeiros de Londres. Mas a população pensou de outra maneira e o “mercado” não foi atendido, o BREXIT foi contra o mercado.

O Brasil é hoje um caso único entre os grandes países do G-20, nenhum outro tem sua política econômica de tal forma dominada pelo “mercado”, que não fala pela população, fala apenas pelos rentistas e especuladores, pelos “gestores” de fortuna e banqueiros.

Essa dominância é INEXPLICÁVEL para um País com as dimensões do Brasil. O “mercado” não está preocupado com o desemprego, a desindustrialização, a perda da independência econômica, a miséria e o crime nas periferias das grandes e médias cidades, a precariedade dos serviços  de saúde e saneamento, a fragilidade da educação fundamental, a falta de oportunidade para toda uma geração de jovens entre 14 e 24 anos, onde o desemprego é de 30%, o dobro da já alta média nacional de 15%.

Nada disso diz respeito ao mercado, mas é ele que hoje rege a economia do País.

É inexplicável que um Estado poderoso como o brasileiro se deixe dominar pelo “mercado” de forma tão submissa, levando o País a uma recessão inédita na sua História, nem a crise de 1929, que abalou o mundo,  atingiu de forma tão profunda a economia brasileira da época.

NOVAMENTE OS ERROS DO GOVERNO DILMA COMO JUSTIFICATIVA

Para o diagnóstico correto da atual recessão é fundamental encontrar sua raiz, a nascente de onde parte o impulso negativo que leva a economia a andar para trás. É encontrando sua fonte que o remédio pode ser receitado, essa análise é necessária para a cura.

Não se use a desculpa que a recessão de hoje é ainda resultado dos erros do governo Dilma.

Os equívocos do governo Dilma são a explicação POLITICAMENTE conveniente da atual recessão, que se agravou após a queda de Dilma com mais 2,5 milhões de desempregados, mas esses erros foram conjunturais, os problemas estruturais da economia brasileira vem de muito mais longe, o tumor é mais profundo do que erros pontuais e o déficit público que já existe há décadas na economia brasileira, déficit que também existia em anos de grande crescimento,

NÃO é a causa da atual recessão, ao contrário, o déficit existe porque a arrecadação vem caindo e a maior parte das despesas são fixas e irredutíveis com a atual Constituição.

O maior de todos os déficits vem da conta de juros, que faz parte da atual política e essa conta é considerada intocável pela equipe econômica atrelada a essa política.

A raiz da recessão é mais profunda, vem da política monetária já praticada no governo anterior, recessiva por causa de juros reais muito acima do necessário e mais do que a economia pode suportar, juros praticados por um Banco Central descolado da economia real e capturado pelo mercado financeiro no seu âmago, o BC nunca esteve a serviço do conjunto da economia e sim a serviço do sistema financeiro, processo que vem desde o Plano Real.

O governo Dilma não teve uma política econômica firme e com objetivos racionais, foi uma política hesitante e oscilante, com medo ancestral do mercado, a  política já era a de METAS DE INFLAÇÃO, a mesma política que agora foi RADICALIZADA por fanáticos da deflação como ideologia e modus operandi, como crença e porque não sabem operar a economia de maneira mais racional e criativa, é mais confortável atender ao mercado do que enfrentá-lo.

A dominância da política econômica pelo “mercado” se consolidou no primeiro Governo Lula, com a entrega sem condições do Banco Central ao “mercado” na pessoa de Henrique Meirelles, essencialmente um delegado do mercado e não um formulador econômico.

 Foi o maior erro do Governo Lula e a causa do desastre final da política econômica nos doze anos do PT. O ovo da serpente da recessão de hoje estava sendo chocado com esse arrendamento do BC ao Boletim Focus como práxis e ideologia, o ponto de partida foi a gestão Armínio Fraga no BC, quando se inicia o Boletim Focus e a dominância do mercado.

Lula tinha capital eleitoral para seguir uma política muito mais independente, mas preferiu o comodismo de entregar por completo a política monetária e a política cambial ao arbítrio exclusivo do mercado sem reserva de poderes para contraditar a gestão do BC ou influir na política econômica. Deu certo no início porque as expectativas eram muito piores para seu governo e pelo favorecimento do ciclo de explosão de preços das commodities.

No Governo FHC até a gestão Armínio não havia essa dominância, tanto que a política cambial foi mudada por completo quatro vezes sem ser determinada pelo mercado, era o Governo que decidia o câmbio e não o mercado. Parece coisa simples, mas não é, o Governo FHC usava o mercado mas não era dominado por ele, o Governo se reservava o poder de decisão sobre o câmbio, isso começou a mudar com a gestão Armínio e o acordo com o FMI.

O Governo Lula, seguido pelo Governo Dilma, entregou POR COMPLETO E SEM RESTRIÇÕES, o Banco Central ao mercado, Meirelles jamais foi um estrategista como Gustavo Franco ou Armínio Fraga, apenas delegado do mercado no BC para atender o sistema financeiro daqui e de fora, seu papel é o de “representante” do mercado no BC.  Ele é produto do mercado.

No governo Dilma trocou-se o presidente do BC, mas manteve-se o modelo com uma diretoria  afinada com o mercado. Quando Dilma quis intervir na política de juros, caiu o mundo e ela teve que voltar atrás, já não tinha mais poder de enfrentar o mercado. Não foi a queda de juros reais imposta por Dilma que deu início à recessão, mas sim o retorno às taxas de juros reais várias vezes acima da média internacional. Essa baixa e volta à alta foi um desastre de percepção nos rumos da economia, somado a erros evidentes no tabelamento dos combustíveis e no desmonte do setor energético, atos irracionais sob qualquer ponto de vista.

A nomeação de Joaquim Levy no Ministério da Fazenda, nome indicado pelo mercado, agravou rapidamente o erro de ida e volta na política de juros e nessa gestão começa o ajuste fiscal improvisado, cujo único alvo foram as despesas mais essenciais de funcionamento do governo e os investimentos públicos, uma vez que as despesas com pessoal ativo e inativo são fixas.

Enquanto houver essa dominância pelo mercado da política monetária que necessariamente se atrela a política cambial, o Brasil não sairá da recessão, para o sistema financeiro cartelizado a depressão é ótimo negocio, baixa o preço dos ativos e o juro real sobe.

A ALTA CONTINUADA DOS JUROS REAIS E O NAUFRÁGIO DO PLANO MEIRELLES

Hoje os JUROS REAIS NO BRASIL são muito mais altos do que em 2015 e 2016, ao contrário do que dizem as Miriams e os Sardenbergs, os JUROS ESTÃO SUBINDO DESDE QUE COMEÇOU A RECESSÃO, tanto na taxa básica Selic como para tomadores privados.

O pior é que a leitura que se faz no Brasil sobre os rumos da economia mundial está defasada.

A economia mundial pós-2008 não é a mesma de antes, mas no Brasil se opera como se fosse.

A globalização financeira está sendo contestada por novos ativismos políticos que resultaram no BREXIT, na eleição de Trump, na revisão dos conceitos de ajuste fiscal pelo FMI e no nascimento de um novo pensamento econômico a partir da crise de 2008, que diminui a importância e o peso político do mercado financeiro sobre as economias e faz revisões contínuas de conceitos como o do “ajuste fiscal linear” que deu errado na Grécia.

Essas novas correntes de pensamento mudaram o foco e as teses das escolas de economia mais influentes, como a de Chicago e de Stanford e se cristalizaram em um novo e influente think-tank, o Instituto para o Novo Pensamento Econômico de Nova York. Nada disso afetou a cabeça dos “economistas de mercado” brasileiros, formados nos anos 90 e que não evoluíram em conhecimento de novas linhas econômicas, continuam atrelados fanaticamente ao velho monetarismo de Friedman, que já evoluiu na sua matriz intelectual, a Universidade de Chicago.

Políticas monetárias e orçamentárias mais flexíveis, como em Portugal, deram mais certo do que o brutal ajuste grego, que é o mesmo que se anuncia praticar no Brasil.

A preguiça mental e acomodação intelectual  dos economistas brasileiros da linha PUC Rio, Insper, FGV, todos atrelados ao “mercado” via consultorias e empregos e por reflexo pelo espaço que a GLOBO dá a essa ideologia “mercado-dominante” através da formidável massa de publicidade de bancos e gestoras financeiras, não apresenta nenhuma proposta que não seja mais ajuste, mais juros altos e mais Real valorizado, mais fanatismo na perseguição a uma meta abaixo de 3% mesmo que disso aumente os escombros da economia real.

Os “padrinhos da recessão”  estão em descompasso com o mundo, nossa política econômica virou uma jabuticaba rara, uma fruta genuinamente nacional, daquele tipo que só tem no Brasil, marchamos fora da partitura do mundo caminhando para o cadafalso da Grande Depressão, versão brasileira pela Globonews.

Um desafio lançado: que o Governo promova no Brasil um SEMINÁRIO INTERNACIONAL DE POLÍTICA ECONÔMICA, convide nomes consagrados, alguns Prêmio Nobel de Economia com boa mescla de nomes de várias tendências, linhas e escolas, e proponha a eles sugestões sobre a economia brasileira. Muitos Bancos Centrais fazem isso continuamente, faz parte das funções de um banco central, que não pode ser caudatário de uma só visão de economia.

O próprio Prêmio Nobel de Economia é uma criação patrocinada pelo Banco Central da Suécia, gente que não tem medo de ouvir críticas e sugestões e não se consideram sábios inatacáveis.

Do GGN, André Araújo

quinta-feira, 6 de julho de 2017

O dia em que André Lara descobriu os cabeças de planilha, por Luis Nassif

Finalmente, no livro "Juros, moeda e ortodoxia: Teorias monetárias e controvérsias políticas -  André Lara Rezende - um dos dois pais do Real - descobriu os cabeças de planilha, a imensa legião de economistas que, armados de slogans e planilhas, sem conhecimento de história, de política, até dos princípios fundamentais de uma economia liberalado.

Ao seu conhecimento e criatividade na política monetária - que resultou na fórmula engenhosa do Real -, o companheiro André inclui agora condimentos de história econômica, preocupações com os impactos políticos das medidas monetárias e outros elementos essenciais nas formulações econômicas, deixando de lado os bordões simplistas com os quais eles, os economistas do Real, conquistaram o jornalismo econômico, abandonado veleidades de análise de realidades complexas.

Não é à toa as expressões de surpresa de Mirian Leitão, na entrevista feita na Globonews. André só faltou falar em problemas estruturais da economia (bordão dos desenvolvimentistas), ao lado dos problemas institucionais (bordão dos liberais), para um certo pensamento econômico que só sabe seguir o manual de frases feitas: se a inflação sobe, é porque os juros estão altos; se o dólar cai, é porque a reforma da Previdência vai ser aprovada; se sobe, é porque não se sabe se a reforma da Previdência será aprovada.

Quando juntar as duas pontas, se terá, finalmente, um diagnóstico preciso de país, por enquanto nublado por uma polarização fundamentalmente emburrecedora. E André poderá ser alçado ao restrito panteão dos grandes pensadores econômicos, ocupado hoje exclusivamente por Delfim Neto.

Há uma lógica no livro.

Inicialmente, aceita as principais críticas feitas às extravagâncias desse modelo, implantado no Real e aprofundado com as metas inflacionárias introduzidas em 2002.

Essas críticas estão sintetizadas no capítulo “Juros”, do meu livro “O Jornalismo dos Anos 90”, e em “Os Cabeças de Planilha”. Neles, coloco os principais artigos que escrevi nos pós-Real, incluindo a polêmica que travei com o próprio André em 1995.

As principais críticas são justamente sobre a incapacidade de olhar a realidade, de analisar as correlações na economia, as relações básicas de causa e efeito, ou de custo-benefício.

Depois, tenta definir uma nova linha retórica de defesa do que ele chama de “liberalismo ilustrado”, em contraposição ao liberalismo iletrado que dominou o discurso do mercado e da mídia nas últimas décadas.

No fundo, André tenta livrar o neoliberalismo matematizado das principais críticas sofridas e formular uma nova crítica ao desenvolvimentismo, em bases um pouco mais complexas.

Neste artigo, vou analisar os dois primeiros capítulos do livro de André: a Introdução e o capítulo em que analisa a disputa Roberto Simonsen x Eduardo Gudin, pegando as principais conclusões que ele apresenta e remontar as peças em um novo quebra-cabeças.

(As Posições, a que me refiro no artigo, são aquelas que constam na leitura do livro pelo Kindle, da Amazon).

Peça 1 – o custo excessivo de políticas anti-inflacionárias monetárias

O ponto central de sua tese é uma análise custo-benefício banal, mas que foi escondida essas décadas todas por uma cobertura midiática primária e de curto prazo: a de que os custos de uma política de estabilização, baseada em juros, foi imensamente superior aos benefícios de uma inflação controlada.

Mais do que os custos fiscais, econômicos e sociais de curto prazo, André aponta para o custo político do longo prazo, a desmoralização das teses neoliberais pelos estragos cometidos.

A raiz dos equívocos das políticas monetárias, segundo ele, está no que ele chama de "apego à materialidade da moeda", a ideia de que a moeda sempre deverá estar lastreada e conversível a algum que tivesse valor intrínseco, como o ouro, em outras épocas.

Na Introdução, na Posição 112, André endossa a maior crítica feita aos cabeças-de-planilha:

"A excessiva pretensão de mimetizar as ciências exatas levou-a a um beco sem saída, a uma excessiva formalização estéril, deixando os policy-makers, sobretudo os Bancos Centrais que nunca tiveram tanto poder e tanta responsabilidade, sem mapas conceituais".

Só foi possível chegar a essas conclusões quando abandonou o padrão fim-da-história do mercado e mergulhou na histórica econômica brasileira.

Peça 2 - os limites políticos das políticas econômicas

Mostra como a política econômica tem que sempre considerar os limites impostos pela realidade, sob pena de fazer naufragar o próprio governo.

Primeiro, recorre ao marketing do mercado, informando que, no governo Café Filho, Eugênio Gudin montou um “dream team” na Economia, composto pelo presidente da Sumoc (Superintendência de Moeda e Crédito) Octávio Gouvêa de Bulhões e pelo banqueiro Clemente Mariani na presidência do Banco do Brasil.

Depois, admite que o “dream team” marcou um belíssimo gol contra, ao implantar uma política monetária tão restritiva que provocou uma crise bancária e um festival de inadimplência, praticamente inviabilizando o governo Café Filho e comprometendo por década e meia o discurso monetarista-liberal.

Aliás, foi essa falta de jeito de Bulhões com o mundo real que levou à quebra do Banco Nacional Imobiliário de Roxo Loureiro, que tinha o velho Otávio Frias de Oliveira como sócio minoritário.

Nesse ponto, André quase chega ao cerne da questão.

Não se pode analisar teorias econômicas despregadas da realidade política. Se determinada política é inviável politicamente, ou seja, provoca tal tipo de reação que inviabiliza o próprio governo que a implementou, obviamente está errada. Durante muito tempo, os cabeças de planilha se esconderam no álibi de que a realidade é que estava errada.

Anote bem esta peça, que é central para demonstrar o que André ainda não descobriu: o que define o resultado político não é apenas a maior ou menor gradação dos sacrifícios impostos ao país, mas o conjunto de forças que sustenta o projeto.

Peça 3 – o modelo de desenvolvimento de Gudin

Diz que, ao contrário do que se propaga, Gudin concordava com Simonsen na importância do desenvolvimento, do combate à miséria, da industrialização. Apenas discordava da maneira de se proceder a isso.

Seu receituário era:

A modernização institucional

O modelo de Gudin contemplava um conjunto reformas.

“Sustentava que o crescimento econômico advinha do ganho de produtividade, que requereria investimento em capital, em tecnologia e na educação da força de trabalho, num processo que só era capaz de se renovar e de se sustentar numa economia aberta, onde há competição”.

A poupança interna

Na Posição 216, sustenta que Simonsen desconsiderava integralmente a questão das fontes internas de poupança. Contava apenas com empréstimos oficiais de governo a governo.

Na Posição 221, garante que

"substituiu-se a necessidade de criação de poupança interna por um ingênuo e irreal otimismo quanto à viabilidade de utilização de créditos externos, que viriam a provocar crises recorrentes de balanço de pagamentos na segunda metade do século XX”.

Na Posição 223 garante que

"a dependência da poupança externa e os persistentes déficits com o exterior não eram, entretanto, o que preocupava Simonsen, quando sugeria também barreiras alfandegárias. Estas, eufemisticamente chamadas de normas de política comercial, eram necessárias para “assegurar o êxito dos cometimentos previstos”, ou seja, impedir que a competição externa inviabilizasse o esforço de industrialização estatal.

Segundo André:

“(Gudin) argumenta que não há como crescer sem investir e que para investir é preciso criar poupança, mas que, por sua vez, a geração de poupança esbarra na pobreza e no baixíssimo nível de consumo da grande maioria da população, criando assim um círculo vicioso. Para que esse círculo fosse rompido, seria preciso contar com a poupança e com o investimento estrangeiros, que requereriam a garantia legal e institucional de um tratamento não discriminatório”.

O Estado necessário

Segundo André, Gudin nunca foi a favor do Estado mínimo, mas do Estado necessário. Ou seja, um Estado institucionalmente forte que regulasse o mercado, criando condições de competição que jamais seriam alcançadas se se deixasse tudo ao sabor do livre mercado.

Sem dúvida. O que o diferencia fundamentalmente dos ortodoxos do período dos cabeças de planilha atuais.

Diz ele, na Posição 255, que Gudin

“Demonstrava compreender que o mercado competitivo é uma concepção abstrata e artificial, um ideal-tipo, que deveria ser utilizado para pautar a legislação e as instituições. Recomendava que se criassem instituições para evitar todo tipo de abuso econômico que pudesse afastar a economia do ideal competitivo”.

E sempre apostou no papel exclusivo da iniciativa privada para o crescimento do país, com o Estado limitando-se ao seu papel institucional

 “Onde, porém, a divergência deixa de ser em parte terminológica para atingir os fundamentos de política econômica, é quando o ilustre relator proclama a impossibilidade de acelerar a expansão da renda nacional com a simples iniciativa privada”.

A industrialização e a produtividade
André explica que Gudin era a favor, sim, da industrialização. Não considerava que o país tivesse riquezas naturais suficientes, como a Argentina, para abrir mão da indústria.

Na Posição 364, cita trechos de Gudin, em que admite que

“Na resposta à réplica de Simonsen, Gudin é ainda mais direto: “Eu não faço nem nunca fiz guerra à indústria nacional. Num país montanhoso, com terras pobres de húmus e ricas de erosão, seria um contrassenso não nos industrializarmos”. Não é possível ser mais claro”.

O ponto central do pensamento de Gudin era a importância da produtividade. Por isso, a industrialização e o crescimento exigiam a criação das condições básicas para o aumento do investimento e da produtividade.

Indústria que não tivesse, de pronto, índices competitivos de produtividade, não poderia se instalar.

A crítica ao ponto central

Diz André

Infelizmente, tanto para ele como para o país, Gudin não sabia que a teoria monetária com que trabalhava era profundamente inadequada aos processos inflacionários crônicos, como já era o caso da inflação no Brasil no início dos anos 1950.

Ou seja. Gudin era a favor da industrialização, do combate à miséria, do crescimento, da imortalidade da alma, das virtudes da economia, do combate aos vícios. Mas a pedra angular de sua estratégia estava errada.

Peça 4 – o que faltou nas análises de André

A questão política

Voltemos ao receituário de Gudin. Ele propunha políticas de estímulo ao capital nacional, mudanças institucionais para investimento em inovação, educação e outros instrumentos de criação de mercados modernos e regulados.

Tudo isso demandava políticas públicas e, é claro, disputas sobre o orçamento público, o grande locus de disputa entre mercado e Nação, cujos recursos eram avidamente disputados pelos grupos hegemônicos – fundamentalmente a cafeicultura paulista e os grupos cariocas aliados comerciais de grupos estrangeiros.

Como entrar nessa guerra, sem dispor dos grupos aliados com suficiente musculatura?

Nos Estados Unidos, durante um bom período do século 19 os industriais da costa do Atlântico ganharam massa crítica e lograram uma política industrialista que garantiu o salto da economia norte-americana. Lutavam contra os interesses do sul rural e dos financistas ingleses aliados dos financistas norte-americanos. O mesmo ocorreu na Alemanha, França, Japão e o próprio Estados Unidos, na 2a revolução industrial.

A grande dificuldade na industrialização alemã foi, durante muito tempo, o fato dos interesses britânicos serem muito mais influentes, internamente, do que os da indústria alemã. Cooptavam intelectuais, economistas, advogados.

Cria-se um círculo vicioso, o velho paradoxo do ovo e da galinha: só se consegue criar um ambiente interno adequado ao desenvolvimento industrial quando se tem uma indústria capaz de influenciar na criação do ambiente interno. E sem uma indústria capaz de influenciar na criação do ambiente interno, a política econômica sempre será capturada por outros interesses hegemônicos, fundamentalmente os setores primários e os grandes capitais. E não será o poder da vontade de um grupo de iluminados que processará a mudança.

Essas mudanças ocorrem em momentos raros na história de um país, quase sempre impulsionadas pelo Sr. Crise, emérito estadista, sobre quem falaremos mais adiante.

A defesa da industrialização

Gudin e Roberto Campos tinham propostas, sim, de compensar a falta de competitividade da economia brasileira. Mas, ou André não aprofundou ainda seus estudos da história econômica do período, ou não quis investir mais ainda sobre os dogmas consagrados dos liberais iletrados.

A proposta defendida era substituir o sistema de taxas múltiplas de câmbio (criadas por Oswaldo Aranha para controlar as importações) por uma unificação do câmbio e por um sistema de tarifas de importação. Mas, com as mudanças acompanhadas por uma grande desvalorização cambial.

Campos percebeu no início dos anos 50 que a Coreia iria se transformar em uma potência industrial, puxada pela desvalorização da sua moeda. Essa desvalorização abriria espaço para as exportações e, à medida que se consolidasse o novo setor, ele seria o agente das mudanças, dos investimentos em educação, inovação.

E, depois, no interregno Café Filho e no governo JK. Assessorados por técnicos do calibre de Bulhões, Casemiro Dias Ribeiro e Roberto Campos, e por especialistas internacionais, tentaram a unificação cambial acompanhada de uma desvalorização.

Em ambos os casos não conseguiram justamente porque não havia massa crítica, na indústria de máquinas e equipamentos, para avalizar a proposta. Café e JK refugaram com medo que a inflação acelerasse e foram pressionados por industriais que dependiam da importação de máquinas e equipamentos.

Posteriormente, no governo Jânio Quadros, Bulhões desconsiderou novamente as limitações políticas e conseguiu emplacar a Instrução 204 da Sumoc liberalizando o câmbio. Foi um dos fatores da perda de popularidade de Jânio e de sua posterior renúncia.

O livre fluxo de capitais

Outro dos dogmas não abordados por André é a questão do livre fluxo de capitais.

O Brasil já tinha um amplo histórico dos estragos promovidos pela abertura indiscriminada ao capital estrangeiro, na semi-estagnação do início do século 20. A cada movimento de apreciação do cruzeiro, havia uma devastação no parque industrial incipiente.

Na era Gudin-Bulhões-Campos o país estava suficientemente escaldado. É só conferir a posição do Ministro Souza Costa nas discussões que precederam o Tratado de Bretton Woods, radicalmente a favor de modelos que controlassem os fluxos internacionais de capital.

A livre circulação faz com que os capitais busquem os países que ofereçam melhor rentabilidade. E analisem oportunidades imediatas. No início do século, a entrada e saída de libras provocava verdadeiros terremotos no tecido econômico, matando empresas.

Sem condições iniciais de competitividade com os países centrais, havia a necessidade de remunerar o capital (mesmo o produtivo) com taxas irrealmente elevadas, arrebentando com as contas públicas - da mesma maneira que as políticas monetárias recentes, alvos do livro de André.

André enfatiza em vários momentos a análise fria da competitividade como balizamento das políticas econômicas. Como analisaria a diferença rotunda de rentabilidade dos investimentos ingleses em ferrovias na Europa e no Brasil?

A remuneração do capital inglês nas ferrovias brasileiras era imensamente superior ao custo de oportunidade na Inglaterra ou na Europa. E simplesmente porque, em parceria com capitais paulistas, tinha enorme influência na definição das políticas públicas do Império.

Por isso, o país só conseguia avançar em períodos de crise. A industrialização dos anos 30 deu-se pela moratória que Vargas teve que enfrentar no início da década. Sem alternativas, foi obrigado a impedir o livre fluxo de capitais. E foi isso que obrigou o capital-gafanhoto a descer à terra, ajudando no financiamento inicial do parque industrial paulista e criando alguma massa crítica para as bandeiras de industrialização.

O Estado e as fontes internas de financiamento

Como se viu, Gudin, apud André, criticava o modelo brasileiro de buscar financiamento em instituições multilaterais e países, ao invés de incentivar a poupança interna. E critica o fato do Estado brasileiro ter entrado de cabeça na economia.

Diz ele, na Posição 385:
 “A participação do Estado afugenta o capital privado, pelo justo receio da forçosa preponderância que o Estado exercerá na administração da empresa e na escolha de seus dirigentes, feita, em regra, sob critérios políticos”.

Vamos conferir o que acontecia no mundo real.

O maior investimento estatal do período foi a criação da Petrobras.

Já está no prelo a biografia que escrevi sobre o maior capitalista brasileiro do período, Walther Moreira Salles, o banqueiro que melhor sabia arregimentar capitais internos para projetos nacionais.

No período em que convivi com ele, início dos anos 90, o economista Paulo Guedes soltou a máxima: o Brasil se estrepou quando criou a Petrobras com capitais públicos e não privados. Indaguei do embaixador o que achava disso. E ele:

- Bobagem! Não havia capital privado suficiente na época.

Ora, Vargas tinha seus capitalistas, os Kablin, os Matarazzo, Moreira Salles, os Jafet. Havia uma simbiose política ampla, a ponto dos Klabin terem entrado na indústria de base graças às contrapartidas que Vargas conseguiu dos Estados Unidos, em um dos acordos firmados com financiamentos governo a governo (condenado por Gudin).

Se houvesse capital suficiente para bancar a criação da Petrobras, teriam batalhado por isso.

No entanto, a capitalização da Petrobras exigiu um enorme malabarismo fiscal, em uma noite em Petrópolis, com a participação de vários desses industriais, como Wolf Klabin. Venceu a proposta de Glycon de Paiva – intimamente ligado ao grupo da ortodoxia econômica - de instituir uma contribuição a ser paga por todas as prefeituras do país. Simplesmente porque não havia capital privado suficiente para bancar a aventura.

Ou seja, a própria linha de frente da indústria brasileira da época entendeu a necessidade de o Estado entrar na economia.

Na época, as tentativas de criar siderurgia privada fracassaram, como foi o caso da siderúrgica de Ricardo Jafet.

Não se minimizem os problemas decorrentes da subordinação de estatais a interesses políticos. Mas não lhes tire a importância central na alavancagem da economia brasileira.

O financiamento e o investimento externos

Voltemos ao primado da política e da economia e às propostas de Gudin de estímulo total aos investimentos externos.

Uma das razões da crise do balanço de pagamentos do início dos anos 50 foi justamente o tratamento escandalosamente brando dado ao capital estrangeiro no período Dutra, quando o “dream team” se aquecia para entrar em campo.

A agenda inicial do governo Dutra propunha (https://goo.gl/XBBwMQ)

(1) restringir os “lucros extraordinários” que, alegava-se, industriais locais gozavam com a inflação às custas de consumidores e sob proteção estatal; ao mesmo tempo, (2) forçá-los a modernizar-se para atender o mercado interno, em condições de menor escassez de divisas e maior concorrência e e (3) o controle do financiamento externo pelo Estado, canalizado de governo a governo, afastaria os capitais privados estrangeiros receosos de rígidos controles sobre suas atividades,

O que aconteceu na prática:

Permitiu-se às empresas estrangeiras remeter dinheiro para a matriz com base no seu balanço. Elas tomavam empréstimos no Banco do Brasil, em cruzeiros, aumentavam artificialmente seu capital e, com base no capital ampliado, aumentavam as transferências de dólares para as matrizes. E tudo isso porque ficaram politicamente influentes no governo ultraliberal de Dutra.

Deu para entender as ligações entre poder econômico, poder político e política econômica?

O Estado deu ampla liberdade às multinacionais. Com essa ampla liberdade, elas criaram redes de relações políticas e econômicas. Com o novo poder que passaram a dispor geraram distorções de monta que jogaram a economia em crise obrigando o Estado, por falta de alternativas, a restringir novamente seu poder.

Os empréstimos governo a governo garantiram a criação de grupos nacionais relevantes, como os Klabin. A abertura indiscriminada da economia garantiu uma baita crise cambial. Como André explica esse paradoxo no pensamento de Gudin?

Ora, a grande razão para a política comercial e cambial restritiva, especialmente após o governo “liberal” de Dutra dizimar as reservas cambiais brasileiras, era o estrangulamento das contas externas. A proteção à indústria nacional foi subproduto.

O crescimento demandava importações. As importações pressionavam as contas externas, que eram sangradas pela remessa de lucros e dividendos, exigindo que o país recorresse a sucessivas renegociações da dívida externa. Era a falta de indústria que promovia os desequilíbrios externos, não o excesso de proteção.

Os empréstimos institucionais (FMI, Eximbank dos EUA) eram decorrentes das necessidades brasileiras de fechar as contas, não de opção estratégica. E foram muito importantes para suprir as fontes privadas. Até o segundo governo Vargas, o financiamento externo era fundamentalmente comercial, bancado pelas empresas exportadores norte-americanas e europeias.

Gudin e o Estado necessário
O ambiente econômico proposto por Gudin pressupunha competição, tanto interna quanto externa. Criticava o excessivo protecionismo alfandegário e o subsídio a empresas ineficientes.

André não consegue se desvencilhar do paradoxo do ovo e da galinha. Como ter uma economia aberta, com competição, antes de se ter uma economia competitiva? Como ter uma economia competitiva abrindo-se a economia antes das empresas nacionais terem condições de competir com as estrangeiras?

É tudo uma questão de gradação. Há a necessidade de proteção inteligente às empresas infantes. Antes de se ter um ambiente economicamente competitivo, a defesa contra as importações foi relevante para atrair multinacionais a instalar suas fábricas por aqui.

Evidentemente há o risco da proteção excessiva.

Mas André, que pretende exorcizar as simplificações econômicas, a dicotomia simplória entre esquerda e direita, é incapaz de navegar nesses mares da relatividade. Quais os limites dessa proteção? Quais as ferramentas institucionais para impedir a perpetuação dos benefícios?

E, passando a ser um defensor da subordinação da teoria à realidade, não consegue explicar como Campos, o mais ardente defensor da iniciativa privada, foi peça central em duas intervenções essenciais do Estado brasileiro: a criação do BNDES e a estatização da Light, quando percebeu, nos anos 70, que não a empresa era estrategicamente relevante, não havia interesse dos controladores estrangeiros em investir nem capacidade do capital nacional de assumir.

A impossibilidade de crescer com inflação
Na Posição 297 André destaca a afirmação de Gudin sobre a impossibilidade de crescer com inflação:

A estabilidade da moeda é questão integralmente desconsiderada na proposta de Simonsen, mas condição essencial para o crescimento segundo Gudin, para quem “não há plano econômico possível no regime de desordenada inflação, em que vimos, há tanto tempo, incidindo”.

Ignácio Rangel, um dos mais inovadores economistas brasileiros, com sólido conhecimento sobre a realidade econômica – desenvolvido como técnico do BNDES – enxergou na inflação a maneira dos setores mais dinâmicos da economia se capitalizarem, em detrimento dos setores mais atrasados.

Os desenvolvimentistas cometeram enormes erros de avaliação. Mas nunca viram a inflação como vantagem para fortalecer o Estado. No máximo, viam como uma gambiarra para contornar problemas fiscais.

Rangel, além disso, via a inflação como instrumento de crescimento dos grupos financeiros, quando entendeu que o capitalismo entrava na era da financeirização e o Brasil ainda não possuía bancos com fôlego para se internacionalizarem.

Consagrado, hoje em dia, como um plano vitorioso, o Plano de Metas, de JK, se deu em ambiente inflacionário e, mais do que isso, em desconsideração com princípios comezinhos da responsabilidade fiscal.

Não se vá defender a inflação como instrumento de política econômica. Ela ocorre quando impasses políticos não são resolvidos.  Mas vale o registro, para ver como a economia tem razões que muitas vezes a teoria econômica desconhece.

Ironias à parte, o livro de André é politicamente importante por ajudar a quebrar as barreiras que um ideologismo rasteiro impôs à discussão econômica. E vindo do pensador mais respeitado pelos cabeças de planilha do mercado e da mídia.

André não abre mão do discurso de torcedor, ao caricaturizar posições dos desenvolvimentistas, usando os métodos das caricaturas aos liberais, que ele critica em seu livro. Faz parte: ele escreve para um público de torcedores, intelectualmente limitados como todos os torcedores.

Abre espaço para um movimento oposto: o da crítica aos erros do desenvolvimentismo para poder se chegar a uma síntese que, despidas as simplificações ideológicas, permita se montar um diagnóstico seguro para uma realidade complexa como a brasileira.

GGN