GUERRA AOS SAQUEADORES
Manifestações sinalizam que órgãos controladores e investigativos não estão sós no combate à roubalheira de dinheiro público.
Decreto presidencial e decisão normativa do Tribunal de Contas do Maranhão também ajudam a 'fechar o cerco' à corrupção.
Este 2011 ainda não acabou, mas já se pode dizer que está sendo o ano em que a sociedade civil organizada brasileira decidiu reagir contra a corrupção e a impunidade que campeiam em vários setores da vida pública do país – particularmente no mundo político. O povo definitivamente foi às ruas, 'acuando' os corruptos e sinalizando que instituições como a Controladoria Geral da União (CGU), o Tribunal de Contas da União (TCU), a Polícia Federal (PF) e o Ministério Público Federal (MPF) não estão sós no combate à roubalheira de dinheiro público.
Diferentemente das ocasiões em que grandes escândalos, como os 'mensalões' do governo Lula e do DEM do Distrito Federal, não provocaram reação à altura dos cidadãos, agora parece que brasileiros inconformados estão dispostos a sair às ruas para mostrar sua insatisfação em relação aos corruptos.
A sociedade indignada já se fez presente em várias ocasiões.
Na recente comemoração da data nacional do país – o Sete de Setembro –, dezenas de manifestações pipocaram Brasil afora. Os protestos ocorreram uma semana depois de a deputada distrital Jaqueline Roriz (PMN-DF) – que apareceu num vídeo de 2006 recebendo dinheiro (R$ 50 mil) do delator do 'mensalão' do DEM, Durval Barbosa – ter sido absolvida pela Câmara dos Deputados no processo que pedia a cassação de seu mandato.
Coro anti-Sarney – Num coro em baixo calão, mais de 100 mil jovens também gritaram sua revolta em dois shows do Rock in Rio (Capital Inicial, em 24 de setembro, e Detonautas, no último dia 2), 'homenageando' o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP).
O senador virou uma espécie de emblema da corrupção depois de ser denunciado por contratar parentes e aliados por meio de atos secretos, em 2009, e ter todas as 11 denúncias contra ele arquivadas pela Comissão de Ética da Casa.
Também maculam a biografia de Sarney fatos que envolvem seu filho, o empresário Fernando Sarney. Ele obteve na Justiça a censura ao jornal O Estado de S. Paulo (que já dura 800 dias), proibido de divulgar informações sobre a Operação Boi Barrica (rebatizada Faktor), da Polícia Federal, que investigou o empresário por crimes financeiros diversos.
A Justiça anulou, recentemente, todas as provas obtidas pela PF contra Fernando por meio de 'grampos' telefônicos e interceptações de e-mails.
Grande marcha – No Maranhão, na última sexta-feira, perto de 3.500 pessoas tomaram as ruas de São Luís na '3ª Marcha do povo contra a corrupção e pela vida', organizada pelos fóruns e redes de cidadania do estado e pela Cáritas Brasileira. Tamanha multidão num ato político não se via em São Luís desde as manifestações das 'Diretas já!', em meados da década de 80.
A caminhada terminou com uma audiência pública, na qual foram revelados casos de desvios de recursos públicos, apurados por auditorias populares, em 10 municípios maranhenses: Anajatuba, Belágua, Jatobá, Lago dos Rodrigues, Monção, Presidente Vargas, Santa Luzia, São Benedito do Rio Preto, São João do Caru e Vargem Grande. Um dossiê com o detalhamento dos casos será entregue ao MPF, à PF e à CGU.
Novidade interessante no combate à corrupção, as auditorias populares somam-se aos órgãos controladores oficiais nas ações contra os saqueadores dos cofres públicos.
Também dão subsídio importante ao trabalho da Polícia Federal de combate aos gestores municipais que desviam recursos da União.
No Maranhão, desde dezembro de 2007, quando foi desencadeada a Operação Rapina 1, contra desvios de dinheiro público, a PF já prendeu 14 prefeitos e 5 ex-gestores municipais. Nesse período de três anos e 10 meses, cerca de 165 pessoas foram detidas pela PF – entre políticos, secretários municipais, empresários, contadores etc., nas seis operações 'Rapina' (dez/2007; abr/2008; mar/2009; abr/2009; mar/2010; mar/2010), na 'Orthoptera' (nov/2009) e na 'Astiages' (fev/2011).
Todos já estão soltos. Mas, devido à publicidade negativa propiciada pelas prisões e à reação da cidadania, são poucos os que planejam se candidatar nas próximas eleições municipais, no ano que vem.
Decreto presidencial e decisão normativa do TCE-MA 'fecham cerco' à corrupção
Também colaboram para 'fechar o cerco' aos corruptos duas normatizações legais publicadas este ano: um decreto presidencial e uma decisão do Tribunal de Contas do Estado do Maranhão (TCE-MA).
O decreto nº 7.507, assinado pela presidente Dilma Rousseff em 27 de junho de 2011, disciplina a movimentação financeira dos recursos transferidos por órgãos e entidades da administração pública federal aos estados, Distrito Federal e municípios.
Estabelece que '(...) os recursos transferidos pela União, no âmbito do Plano Especial de Recuperação da Rede Física Escolar Pública, e aqueles transferidos aos Municípios e ao Distrito Federal com a finalidade de prestar apoio financeiro à manutenção de novos estabelecimentos públicos de educação infantil (...) serão depositados e mantidos em conta específica aberta para este fim em instituições financeiras oficiais federais' e que 'a movimentação dos recursos será realizada exclusivamente por meio eletrônico, mediante crédito em conta corrente de titularidade dos fornecedores e prestadores de serviços devidamente identificados'.
Também regulamenta que 'excepcionalmente, mediante justificativa circunstanciada, poderão ser realizados saques para pagamento em dinheiro a pessoas físicas que não possuam conta bancária ou saques para atender a despesas de pequeno vulto, adotando-se, em ambas as hipóteses, mecanismos que permitam a identificação do beneficiário final, devendo as informações sobre tais pagamentos constar em item específico da prestação de contas'.
O decreto presidencial foi corroborado pela Resolução nº 44 do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE), de 25 de agosto de 2011.
Já a decisão normativa nº 11 do Tribunal de Contas do Maranhão (TCE-MA), de 11 de maio de 2011, 'dispõe sobre a obrigatoriedade de obediência aos critérios estabelecidos no Manual de Contabilidade Aplicado ao Setor Público (...), relativos à execução da despesa pública, em especial na fase do pagamento'.
A normatização estabelece, entre outros procedimentos, que 'o pagamento da despesa ao credor será feito por meio de cheque nominativo, ordem de pagamento ou crédito em conta (...) e só poderá ser efetuado quando ordenado, (...) após sua plena liquidação'.
Tanto o decreto presidencial como a decisão normativa do TCE-MA atendem aos anseios da ampla maioria de técnicos e auditores das controladorias do poder público que zelam pela probidade administrativa. É o caso do contador Raimundo Nonato Araújo da Costa – ex-controlador geral adjunto do Município de São Luís e atualmente auditor interno da Controladoria municipal.
Já num artigo publicado no Jornal Pequeno em 10 de abril de 2008, intitulado 'Desvio de dinheiro público' (veja reprodução nesta página), Raimundo Nonato cobrava medidas eficazes por parte dos órgãos fiscalizadores, objetivando inibir práticas de improbidade na gestão da coisa pública.
O artigo foi encaminhado à Ouvidoria do TCU, que respondeu: 'Recebemos sua manifestação e cientificamos-lhe que sua informação foi encaminhada às unidades técnicas competentes deste Tribunal, para fins de subsídio a eventuais propostas de alterações de caráter normativo e de metodologia de trabalho'.
POR OSWALDO VIVIANI - JP