domingo, 18 de junho de 2017

Sebastião Nunes: Um dia na vida conturbada do urubu que tinha o rabo preso

O almoço chegara ao fim. Deliciado, o urubu-rei-do-planalto-central raspava os derradeiros fiapos da carniça que ele e seu bando devoravam. Era uma carniça enorme, fedorenta como ela só. Talvez a carniça da Previdência Social. Quem sabe a carniça da Educação Fundamental. Ou ainda a carniça dos Direitos dos Trabalhadores. Mas que era deliciosa, fosse a carniça que fosse, lá isso era.

Saciado, o urubu-rei-do-planalto-central arrotou. Bocejou. Abriu as longas asas escuras espreguiçando-se com prazer. Apoiou as patas no chão e, bico erguido, lançou-se no espaço azul da manhã que findava.

– Diacho! – resmungou ele, constatando que as asas lhe pesavam que nem chumbo. – Estarei ficando mais velho do que sou? Nunca me pesou tanto o corpo nem jamais tive tanta dificuldade para alçar voo. Alguma coisa está errada.

Virou o bico para trás e viu que, logo ali perto, voava o urubu-secretário-geral-do-planalto-central.

– Tudo bem, meu caro urubu-secretário-geral? Gostou do almoço?

– Adorei – ripostou o urubu-secretário-geral. – O diabo são essas asas pesando que nem chumbo. Tá difícil pra cacete voar assim.

 Olhou o urubu-rei-do-planalto-central para o traseiro do urubu-secretário-geral e viu saindo dali, do emplumadíssimo rabo, inumeráveis outros urubus, enorme montoeira de urubus, presos por correntes de ouro ao rabo do urubu-secretário-geral.

CORRENTES SEM FIM
– Engraçado isso – espantou-se o urubu-rei-do-planalto-central. – Não sabia que o urubu-secretário-geral tinha o rabo preso a tantos outros urubus. Deve ser isso que está tornando tão difícil seu voo. Será que ele não percebe?

– Meu caro urubu-secretário-geral – explicou o urubu-rei-do-planalto-central –, o que deve estar pesando suas asas é essa quantidade enorme de urubus pendurados no seu rabo por correntes de ouro.

– No meu rabo? – Espantou-se por sua vez o urubu-secretário-geral. – Não vejo nada pendurado no meu rabo. No rabo de vossa excelência, sim, vejo centenas ou milhares de urubus, presos por correntes de ouro.

O urubu-rei do-planalto-central posou com dificuldade num galho de eucalipto e se pôs a meditar em voz alta, como se interrogasse o urubu-secretário-geral.

– Será que os urubus pendurados no rabo do urubu-secretário-geral são visíveis pra mim, mas invisíveis pra ele? E será que, ao contrário, os urubus pendurados no meu rabo são visíveis pra ele e invisíveis pra mim?

Disposto a resolver a pendenga e olhando mais longe viu o urubu-chefe-da-casa-civil que voava com tremenda dificuldade.

– Meu caro urubu-chefe-da-casa-civil, tudo bem com você? – perguntou o urubu-rei-do-planalto-central ao urubu-chefe-da-casa-civil.

– Quase tudo – respondeu o urubu-chefe-da-casa-civil. – O diabo é que as asas me pesam como se de chumbo fossem. E não tenho nada me atrapalhando, depois do farto e delicioso almoço de finíssimas carniças, ao contrário do que vejo pendurado no rabo de vossa excelência e no rabo do urubu-secretário-geral.

– E o que vê em nosso rabo? – perguntou curioso o urubu-rei-do-planalto-central ao urubu-chefe-da-casa-civil.

– Vejo uma quantidade incrível de urubus presos com correntes de ouro nos rabos uns dos outros. Correntes de ouro no rabo de vossa excelência e correntes também de ouro no rabo do secretário-geral.

– Mas não vejo nada preso no meu rabo – respondeu o urubu-rei.

– Nem eu – respondeu o urubu-secretário-geral que ouvia atentamente ali perto. – Só vejo montes de urubus presos no rabo do urubu-rei-do-planalto-central e no rabo do urubu-chefe-da-casa-civil. No meu, não vejo nada.

DESVENDANDO O MISTÉRIO
Olhou para bem longe o urubu-rei-do-planalto-central. E viu que todos os urubus de seu séquito, que eram centenas, traziam inumeráveis urubus presos a seus rabos por correntes de ouro, de modo que havia milhares – e bota milhares nisso! – de urubus presos nos rabos uns dos outros. E todos presos por correntes de ouro!! Deviam valer uma fortuna fabulosa aquelas correntes de ouro!!!

Um lavrador, que passava por ali com sua enxada velha no ombro magro, olhou para o céu e estatelou-se admiradíssimo:

– Cruzes. Nunca vi tanto urubu junto!

De boca aberta, olhando para o alto, perguntou ao filho que o acompanhava:

– Olha lá no céu, filhote! Tá vendo aquela urubuzada?

O garoto olhou para cima e abriu a boca, mais espantado que o velho pai:

– Vixi Maria! Nunca vi tanto urubu junto! Só não escureceu porque tem uma montoeira de correntes brilhando quase que nem o sol!

– E ocê tá vendo que todos estão presos por essas correntes brilhantes nos rabos uns dos outros?

– Tô vendo, sim, pai. É uma urubuzada danada. E tudo agarradinho no rabo uns dos outros. Parece coisa do capeta.

– Não sei não, filhote – filosofou o lavrador. – Mas esse bando de urubus acorrentados uns nos rabos dos outros tá me parecendo aquele bando que tomou conta do governo do Brasil.

– Será deveras possível, pai? Urubu pode governar um país?

– No resto do mundo acho que não, filhote, mas aqui é bem possível. Ainda mais se estiverem presos uns nos rabos dos outros por correntes de ouro.

GGN

Nassif: As palestras de Dallagnol e os voos de Temer

Há algo em comum entre Michel Temer e Deltan Dallagnoll.

Divulgada a informação de que viajou para um encontro da LIDE em um avião da JBS, inicialmente Michel Temer admitiu a viagem – já que era para evento público -, mas negou o transporte. Disse que viajara em avião da FAB.

Informado de que a FAB desmentiria, admitiu o voo  em aeronave privada. Mas informou não saber o nome do proprietário.

Quando o proprietário deu inúmeros detalhes demonstrando que Temer sabia, nada mais disse. 

Divulgada a informação de que havia um site de eventos vendendo suas palestras a um custo entre R$ 30 mil a R$ 40 mil, o procurador Deltan Dallagnoll negou ter autorizado a venda. O site publicou uma nota se desculpando.

Mas não negou receber pelas palestras, porque eventos públicos, nem desmentiu os valores apregoados no site.

No seu perfil, no Facebook, a título de defesa, informou a destinação dos recursos:

(...) Em 2017, após descontado o valor de 10% para despesas pessoais e os tributos, os valores estão sendo destinados a um fundo que será empregado em despesas ou custos decorrentes da atuação de servidores públicos em operações de combate à corrupção, tal como a Operação Lava Jato, para o custeio de iniciativas contra a corrupção e a impunidade, ou ainda para iniciativas que objetivam promover, em geral, a cidadania e a ética.

Nunca divulguei isso antes para evitar que tal atitude fosse entendida como ato de promoção pessoal. Contudo, diante de ataques maldosos e mentirosos, reputo conveniente deixar isso claro para evitar qualquer dúvida de que o que me motiva é o senso de dever, como procurador e como cidadão.

Há alguns problemas nessa explicação.

Onde ele jogaria os recursos advindos das palestras?

Certamente Deltan não terá a menor dificuldade em explicar o caminho que os recursos de palestras percorreram para chegar ao setor público. Qualquer doação para o serviço público, “tal como a Operação Lava Jato”, só pode ser feita por pessoa jurídica de direito privado.

Assim como as delações da Lava Jato, sua confissão só terá valor se acompanhada de provas. No caso, o CNPJ da ONG criada para esse fim.

Se disser que os recursos estão em sua conta corrente, porque ainda não abriu a ONG, não terá cometido nenhum ilícito penal, porque o dinheiro é seu e fruto do largo investimento em autopromoção. Mas terá faltado com a verdade. E um super-herói não pode se permitir essa mácula da mentira em sua biografia.

GGN

sábado, 17 de junho de 2017

A crise do governo Temer e a esquerda, Rui Costa Pimenta

Análise Política da Semana, com Rui Costa Pimenta, presidente do PCO. Nesta Análise, crise do governo Temer e a posição da esquerda diante do caso, questão das "Diretas, Já!" e suas manifestações contra os partidos de esquerda, manifestação em Brasília pela Anulação do impeachment de Dilma Rousseff. Confira VÍDEO logo abaixo:


Do GGN

Xadrez de Janot na estrada de Damasco e o fundo do poço, por Luís Nassif

No Novo Testamento (Atos 9), quando Saulo (depois chamado Paulo) cai de seu cavalo na estrada para a cidade de Damasco e recebe a visita do próprio Jesus, se convertendo ao cristianismo.
Assim como na economia, todo processo politico caótico tem momentos de corte, uma espécie de fundo do poço, no qual há duas possibilidades subsequentes:

Alternativa A: todos os grupos majoritários se sentirem perdedores. Aí se começa a abrir o espaço para o diálogo; ou Alternativa B: novas rodadas radicalizantes, e movimentos oportunistas ou de esperneio dos grupos que serão expelidos do poder.

Há sinais no ar, tênues embora, de que possa se estar entrando na alternativa Alternativa A. Enfatizo: sinais tênues ainda.

Ainda se está a quilômetros de distância de um referencial mínimo, que aponte os novos rumos. Mas o ciclo da subversão constitucional aparentemente começa a se esgotar.

Nesse período terrível, aconteceu de tudo, com externalidades negativas em todos os setores, novos poderosos montando uma caçada ideológica no serviço público, procuradores desvairados entrando com ações contra escolas e reuniões políticas, movimentos de ultradireita saindo das profundezas e investindo contra avanços civilizatórios e a quase consumação do mais execrável pacto político da história: o que permitiria a uma organização criminosa apossar-se do Estado brasileiro e livrar-se da Justiça em troca de reformas radicais enfiadas goela abaixo da opinião pública.

Parecia que todos os filtros de uma sociedade civilizada haviam sido desativados, até os básicos, o olhar crítico sobre os puxa-sacos, a desconfiança contra os exibicionistas, o pudor em tratar com governantes notoriamente corruptos. 

A própria Lava Jato se tornou um centro escandaloso de vaidade e oportunismo, com procuradores se comportando como blogueiros teens (na expressão feliz de Nina Lemos), aproveitando a visibilidade dada pelo Ministério Público Federal para surfar no universo rentável das celebridades.

Figuras que deveriam estar atrás das grades, como Eliseu Padilha, Geddel Vieira Lima, Moreira Franco e o próprio Temer, e seus seguidores, como Laerte Rímoli, Elsinho Mouco, o submundo jornalístico que se manteve à tona graças a Eduardo Cunha, Aécio Neves, Michel Temer (https://goo.gl/E8Hsf3) comportavam-se como os conquistadores imbatíveis, como piratas do Caribe em cima dos destroços da Constituição.

As delações da JBS foram como uma bomba de nêutron, desmontando toda a armação política-midiática erigida nos últimos anos, o discurso pseudomoralista que derrubou uma presidente eleita e caiu a ficha de parte do golpe, da inviabilidade de um pacto político com uma organização criminosa para promover o desmonte das redes de proteção social brasileiras.

A delação da JBS se abateu sobre o Procurador Geral da República Rodrigo Janot como a luz que derrubou Paulo do cavalo, a caminho de Damasco, e lhe mostrou o rumo. Em uma tacada só, exibiu o amadorismo exibicionista da Lava Jato e suas fixações, reassumiu o protagonismo da operação, a ponto de deixar Dallagnoll com síndrome de abstinência, passando a opinar até sobre o caso JBS para não perder espaço para o PGR.

Nos últimos dias, o portal da PGR divulgou o questionamento de leis de municípios que vetaram material sobre ideologia de gêneros nas escolas, a criação de cotas para negros nos concursos do MPF, a PFDC (Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão) encaminha pedido de informações do Alto Comissariado das Nações Unidas para o Itamaraty, sobre a inconstitucionalidade de leis que proíbem discussões sobre gênero em escola.

Os próximos capítulos permitem um pouco de fé nos novos tempos:

Peça 1 – o desembarque do PSDB
Se não há motivos para manter presa Andrea Neves, existem motivos sólidos para a prisão de Aécio Neves. Solto, ele ficará articulando com colegas do Senado e com o Ministro Gilmar Mendes maneiras de impedir as investigações.

Além disso, a prisão terá um simbolismo especial.

Como era possível a uma sociedade que se pretendia civilizada conviver com a exposição pública de Aécio, flanando sobre a Justiça, mandando adversários para a cadeia – como o episódio do jornalista Jorge Carone -, com investigações paralisadas sobre aliados, sob suspeita de tráfico de cocaína? Como seria a democracia brasileira com a falta de limites de Aécio e seus amigos?

Sua provável prisão finalmente trará o PSDB para a realidade política, constatando a impossibilidade total de bancar uma organização presidida por Temer. Mais relevante: quebra o elo da possível parceria com o Judiciário e fecha a porta para o que parecia ser a saída planejada do impeachment.

Ao se inviabilizar politicamente, paradoxalmente, o PSDB se habilita para um passo mais maduro, em busca de entendimento. O duro é localizar no partido alguma liderança que, mesmo de longe, tenha a dimensão de um Mário Covas ou Franco Montoro.

De sobra, interrompe a articulação do chanceler Aloysio Nunes  com o governo Donald Trump, de abrir brechas para a invasão da Venezuela. A ideia fixa de Aloysio – vergastando Maduro diariamente, como se não houvesse outro tema no Itamarty - não é apenas falta de imaginação e conhecimento para outros temas diplomáticos: cumpre o roteiro do guru José Serra. Em vez da tradição diplomática pacifista brasileira, de buscar uma solução para um país que se desmancha, o papel de gendarme da volta do grande cacete norte-americano.

Aloysio e Serra se valem da perda total de substância ideológica do PSDB, da ausência de estudiosos internos, para montar suas jogadas pessoais com o Grande Irmão. São os últimos vagidos de políticos que perderam a dimensão de país.

Peça 2 - A denúncia de Michel Temer
Mal empossado presidente, Michel Temer levou para dentro do governo seus quatro operadores particulares: José Yunes, Sandro Mabel, José Felipelli e Rodrigo Loures.

A maneira como foi bajulado pelos grupos de mídia se constitui em um dos episódios mais vergonhosos da história do jornalismo, cujo ápice foi o Roda Viva com ele.
Poucos imaginavam seu nível de mediocridade e de falta de noção. E aí Deus mostrou, pelo menos uma vez, que ainda é brasileiro. Criou-se tal desorganização institucional com o golpe, que um político mais habilidoso e ousado – como o próprio Aécio - poderia ter conduzido o país ao estado de exceção amplo e se perpetuado no poder. Felizmente, se entregou a Temer a responsabilidade do pós-golpe.

A denúncia próxima da PGR contra Temer repõe nos eixos um mínimo de dignidade na política. Hoje em dia, é visível em qualquer cidadão, mesmo o menos politizado, o sentimento de vergonha de ver o país governado por uma pessoa da dimensão e do caráter de Temer e sua turma.

Para se acreditar em um país sério só faltaria o MPF investigar os negócios da FIFA-Globo, do IDP de GIlmar Mendes com o Tribunal de Justiça da Bahia e o enriquecimento de José Serra.

Peça 3 diretas-já ou Constituinte
A entrevista de Joesley Batista à revista Época é arrasadora. Com todas as ressalvas que se possa fazer, expõe de maneira ampla o apodrecimento final do modelo político.

Com a saída do PSDB do jogo de apoio a Temer, resta saber qual será o tamanho do centrão para resistir ao Supremo Tribunal Federal e à denúncia contra Temer e ao clamor das ruas.

Entra-se, agora, nos momentos cruciais que definirão a travessia para o novo ciclo político.

Há na mesa as seguintes alternativas:

1.     Eleições indiretas com Rodrigo Maia. Será uma tentativa de dar continuidade à quadrilha de Temer, mas com alguns acenos para setores de oposição. E eleições em 2018.

2.     Eleições indiretas com Tasso Jereissatti. A delação da JBS destruiu essa ponte.

3.     Eleições diretas-já.

Qual a resultante das eleições diretas, não se sabe. Entra-se em um daqueles momentos em que Deus joga dados e tudo pode ocorrer.

Às forças democráticas resta o desafio de construir uma alternativa política e econômica viável, os estudiosos trazendo seus diagnósticos, as lideranças conversando e definindo os contornos de um novo pacto. Ou então, o caos.

Do GGN

Ruas: Atos por eleições diretas mobilizam população na próxima terça-feira


O coordenador da Frente Brasil Popular e CMP (Raimundo Bonfim) afirma que luta contra as reformas trabalhista e da Previdência, ‘fora, Temer’ e Diretas Já são bandeiras da mobilização marcada para a praça da Sé na terça-feira.

As centrais sindicais e as frentes Brasil Popular e Povo Sem Medo realizam, na próxima terça-feira (20), um ato na Praça da Sé, em São Paulo, a partir das 16 horas. A manifestação faz parte do Dia Nacional de Mobilização, da agenda dos movimentos sociais e sindical contra as reformas trabalhista e da Previdência, pela saída de Michel Temer da presidência da República e em prol da convocação de eleições diretas.

“O dia 20 é importante como mais um dia de mobilização. Apesar do total desgaste do governo, do envolvimento em corrupção e na iminência do oferecimento da denúncia pela Procuradoria-Geral da República, o governo continua com a pauta das reformas na Câmara e no Senado”, diz Raimundo Bonfim, coordenador da Frente Brasil Popular e Central de Movimentos Populares (CMP). “É importante a população se manter mobilizada. Além da luta contra as reformas, o ‘fora, Temer’ e Diretas Já também são bandeiras da mobilização. Uma coisa está associada à outra: precisa derrubar o Temer para travar as reformas.”

Segundo o dirigente, o ato unificado terá o apoio de militantes em São Paulo e da região metropolitana. Em relação a cidades em um raio de até cerca de 150 km, a proposta é fortalecer a atividade da Sé.  Em municípios mais distantes, também serão realizadas manifestações. Haverá atos em outras capitais do país.

A previsão é de que a reforma trabalhista seja votada na Comissão de Assuntos Sociais do Senado no mesmo dia 20 e, no dia 28, no plenário. As centrais sindicais e os movimentos sociais de Brasília e Goiás têm a tarefa de fazer mobilizações na capital do país, por conta da agenda do Congresso Nacional.

Raimundo Bonfim endossa a avaliação de que a decisão do PSDB de permanecer no governo Temer indica que, para os tucanos, o principal no momento, independentemente inclusive da continuidade ou não de Temer, é a aprovação das reformas trabalhista e da Previdência. “É a sinalização que eles dão para o mercado. Querem passar confiança, querem dizer ao mercado que são confiáveis”, diz.

Na segunda-feira (12), o PSDB decidiu ficar no governo Temer. Segundo o cientista político da Universidade de Brasília Ricardo Caldas, provisoriamente. “Entendo que o partido vai ficar no governo apenas enquanto estiver sendo votada a reforma trabalhista e, talvez, tente avançar a reforma previdenciária", disse.

FHC
A posição do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso tem sido cada vez mais ambígua. Em nota ao jornal O Globo nesta quinta (15), ele afirmou: “A ordem vigente é legal e constitucional (daí o ter mencionado como ‘golpe’ uma antecipação eleitoral) mas não havendo aceitação generalizada de sua validade, ou há um gesto de grandeza por parte de quem legalmente detém o poder pedindo antecipação de eleições gerais, ou o poder se erode de tal forma que as ruas pedirão a ruptura da regra vigente exigindo antecipação do voto”.

FHC não participou da reunião do partido que definiu a permanência na base do governo Temer.

A manifestação do ex-presidente provocou reações na mídia tradicional. A colunista Cristiana Lôbo, do próprio O Globo, por exemplo, publicou uma nota intitulada “A guinada de FHC” em que diz: “O ex-presidente Fernando Henrique Cardoso fez uma brusca inflexão ao defender, nesta quinta-feira (15), a realização de eleições diretas por iniciativa do presidente Michel Temer que, na avaliação de FHC, perdeu a legitimidade para continuar no cargo”.

GGN

Fernando Horta: Críticas, temperança e o Brasil de hoje

No final da década de 70 e início da de 80, existia uma série chamada “Ilha da Fantasia”. Ricardo Montalban fazia o papel do “senhor Roarke”, o anfritrião de uma ilha-resort que tinha seus encantos e uma boa dose de filosofia. Auxiliando o Sr. Roarke, Hervé Villechaize fazia o papel de Tatoo, um simpático faz-tudo que, normalmente, trazia a história para a realidade.

Enquanto Roarke era o pensamento mágico das coisas que aconteciam sem explicação, mas sempre com uma finalidade, Tatoo era o fechamento materialista. Como um condutor dos indivíduos novamente à sua realidade. Desta viagem, os diversos indivíduos que se submetiam, levavam como prêmio apenas o conhecimento, que era desvelado em algum diálogo próximo do fim.

Na Academia somos treinados para vivermos uma eterna viagem à Ilha da Fantasia. A partir de uma determinada base de conhecimento teórico, deixamos o pensamento alçar voo para, em seguida, tentar captura-lo dentro da realidade objetiva, a qual nos cabe viver e conviver. Nas últimas horas eu publiquei quatro textos sobre o mesmo tema. Minha posição é que os EUA não são o “cérebro” articulador por trás das vicissitudes brasileiras desde 2013. Veja que não digo que não colaborou, não digo que não tenha se beneficiado, não digo que não tenha efetivamente participado de alguma forma, não digo. Apenas questiono uma linha de interpretação histórica que remonta à Guerra Fria. No primeiro texto (http://jornalggn.com.br/blog/blogfernando/nao-foram-as-listras-nem-as-estrelas) apresento uma série de argumentos teóricos que fazem parte das críticas que a própria ciência Histórica vem fazendo sobre si mesma. No segundo texto (http://jornalggn.com.br/blog/blogfernando/texto-2-o-velho-senhor-do-pijama-listrado) apresento uma série de argumentos mais empíricos voltados especificamente contra o senso comum.

Neste debate, apresentei um terceiro texto (http://jornalggn.com.br/blog/blogfernando/texto-1-a-culpa-e-das-estrelas), com o qual não concordo, sinalizando por meio de um quarto texto (http://jornalggn.com.br/blog/blogfernando/sal) que haveria uma escolha a ser feita. Os argumentos centrais dos dois textos são excludentes e eu fiz, de propósito, a apresentação dos dois juntos, para verificar a posição dos leitores. O texto “A culpa é das estrelas” é recheado de afirmações de senso comum, sem dados concretos e termina com a apresentação de um argumento de autoridade (do historiador Moniz Bandeira). Este tipo de texto não seria aceito na Academia, pois ele se utiliza de tudo o que a boa prática científica condena e que ensinamos os alunos e não fazerem. Moniz Bandeira é um dos grandes historiadores brasileiros, mas ninguém deve ser usado como argumento de autoridade.

Hoje, uma outra colunista, competente e muito criteriosa, também publica texto no sentido de acusar os EUA de “estarem por trás” (seja lá o que isto quer dizer) das nossas mazelas. Apresenta como evidências um email da embaixadora Ayalde (quando ainda no Paraguai) recusando-se a emprestar reconhecimento democrático a Fernando Lugo, e um curso partícipe do projeto norte-americano “Pontes”, que Moro compareceu no Rio de Janeiro como palestrante. O documento, desvelado pelo Wikileaks (https://wikileaks.org/plusd/cables/09BRASILIA1282_a.html) sequer é marcado como “restrito” ou “secreto”. As duas evidências apresentadas são tremendamente fracas. Vários diplomatas de vários países negaram-se a emprestar a Temer qualquer legitimidade democrática e não se tem notícia de que estejam planejando golpes contra o Brasil. Vários presidentes, incluindo dois dos EUA, também se recusaram a aparecer ao lado de Temer, isto significam que estão preparando golpes? Não, apenas mostram que por motivos seus não concordam que Temer seja legítimo. A evidência sobre o “curso” de Moro é ainda mais fraca. O próprio documento mostra que a duração do encontro foi de cinco dias. Se em cinco minutos me convencem a trair minha esposa, é provável que a vontade de trair fosse anteriormente minha.

A verdade é que estamos nos tornando especialistas em julgar sem provas. Estamos nos tornando experts em montar narrativas com mínimos (quando existentes) pontos de apoio empíricos e verificáveis. Tudo fica no campo do “pode ser”, “eu acho”, “não tem como ser diferente”, “li em algum lugar” e por aí vai. A seguir por esta senda, em alguns dias estaremos nos preparando para a invasão Anunnaki ao planeta Terra, que deve ocorrer em setembro. Se chancelamos este tipo de raciocínio, estamos dando força a Moro. Das inúmeras inverdades que já levantaram contra ele (que seria filiado ao PSDB, que seu pai seria fundador do PSDB em Maringá, que seria um agente norte-americano) nenhuma é minimamente palpável e acabam por enfraquecer as reais objeções que temos a ele: de que é parcial, de que não se atém à constituição e às leis e que faz de sua formação conservadora e de um anticomunismo atávico uma bandeira de luta contra a esquerda.

Ademais, o mesmo raciocínio que leva alguém a pegar um curso de cinco dias no RJ que ele compareceu para dizer que é “agente americano”, faz com que ele considere dois pedalinhos, caixas escritas “praia” e “campo” e um contrato sem assinatura como “provas” contra Lula. Percebam que é exatamente o mesmo caminho epistemológico. Com provas fraquíssimas entram em campo nossas convicções. “Dalhanholmente” provadas. A Lava a Jato tem inúmeras inconsistências, apontadas por pessoas muito mais qualificadas no Direito do que eu, mas não é por cursos (como diz Moniz Bandeira) frequentados por um juiz, entre mais de 17 mil no Brasil, que vamos “provar” que os EUA estão coordenando uma força de mais de 500 pessoas (entre policiais, promotores, jornalistas, políticos, juízes e etc.), em diversas instituições, para destruir o país.

O que me impressiona não é que estejamos neste ponto. A esquerda tem sofrido demais, o ar está irrespirável no Brasil. Todo dia temos desprotegidos mortos e assassinados, direitos sendo retirados, privilégios escorchantes criados ou mantidos. Todo dia o fascismo tem avançado. Estamos à “flor da pele”, respondendo mais do que pensando. O que me impressiona é que estamos fazendo exatamente o que a direita faz. Esta direita que acusamos de inculta, paranoica, ignorante e burra.

Se é verdade que sem o Senhor Roarke e toda sua capacidade imaginativa não somos humanos, é preciso reconhecer que sem Tatoo também não. Temos que manter os pés no chão e aguentar a tempestade. Muitas vezes, defender um ponto de vista contra a multidão parece insólito, mas é o que pretendo fazer, sempre que acreditar que tenho base para isto. E defendo o seu direito de não concordar. Fico chateado, confesso, por ter virado um “lacaio do capitalismo americano” como chegaram a me chamar, mas ultimamente no Brasil, tenho tido companhias ilustres como condenados digitais. Precisamos respirar, precisamos voltar a ser o que nos distinguia politicamente: um coletivo racional de cidadãos capazes de pensar antes de agir e que defende um Brasil menos desigual, mais próspero e justo.

Por via das dúvidas, estoquem água e comida. Alguns dizem que os Anunnakis chegarão em setembro deste ano.

Do GGN

Kiko Nogueira: Joesley queimou a narrativa do juiz Moro e o cérebro da extrema direita. “Temer é o chefe da ORCRIM”

“Quem é o chefe da ORCRIM?”

 A senha foi dada por Augusto Nunes, colunista da Veja por enquanto (toda a turma dele foi mandada embora, de Felipe Moura Brasil a Reinaldo Azevedo).

“O que falta é mais gente decidida a avisar nas ruas, aos berros, que o Brasil decente não se deixará intimidar pelos poderosos patifes que teimam em obstruir os caminhos da Lava Jato. Refiro-me à verdadeira Lava Jato, representada por Sérgio Moro, não à caricatura parida em Brasília por Rodrigo Janot”, escreveu.

Joesley Batista está terminando de enterrar a narrativa segundo a qual Lula comandava a chamada ORCRIM, organização criminosa, “o maior esquema de corrupção desde as pirâmides do Egito” e por aí vai.

Essa versão alimentou gerações de indigentes mentais que alimentavam outros indigentes mentais num ciclo que parecia infinito — e agora eles estão perdidos como alcoólatras sem o uisquinho da manhã.

Marcello Reis, o zumbi dos Revoltados Online, está batendo pino nas redes sociais. “Então, quem é Lula? Joesley diz que Temer é o chefe da quadrilha. Quem acredita em Joesley?”

Marcello, um picareta fanático — e vice versa — se sente enganado. Joesley só estaria dizendo a verdade se apontasse o dedo para Lula.

O dono da JBS falou o seguinte à Época:

O Temer é o chefe da Orcrim da Câmara. Temer, Eduardo, Geddel, Henrique, Padilha e Moreira. É o grupo deles. Quem não está preso está hoje no Planalto. Essa turma é muita perigosa. Não pode brigar com eles. Nunca tive coragem de brigar com eles. Por outro lado, se você baixar a guarda, eles não têm limites. Então meu convívio com eles foi sempre mantendo à meia distância: nem deixando eles aproximarem demais nem deixando eles longe demais. Para não armar alguma coisa contra mim. A realidade é que esse grupo é o de mais difícil convívio que já tive na minha vida. Daquele sujeito que nunca tive coragem de romper, mas também morria de medo de me abraçar com ele.

O time de Moro perdeu o controle sobre a história que queria contar. Isso começou em maio de 2016, com o vazamento das conversas de Sergio Machado.

Logo que os áudios vieram a público de sua conversas, sendo a mais famosa a de Jucá narrando o “grande acordo nacional com o Supremo, com tudo”, o primeiro a se manifestar foi o delegado Igor Romário de Paula.

“O que nos preocupa somente é que isso (o grampo) venha a público dessa forma, sem que uma apuração efetiva tenha sido feita antes”, afirmou ele.

Igor estava dizendo que há vazamentos bons e ruins. Os primeiros são os que são feitos pela força tarefa de Curitiba e que desembocam sempre no “Barba”.

O que resta, agora, é o pessoal pegar uma carona em Janot. Na semana passada, Deltan Dallgnol pediu a prisão de Aécio Neves.

Deltan teve a oportunidade de investigar o esquema de Aécio quando o doleiro Alberto Yousseff, há três anos, contou que a irmã do senador recolhia propina na empresa Bauruense, por contratos em Furnas.

Não o fez porque, assim como Augusto Nunes, Sergio Moro, Marcello Reis, Diogo Mainardi e tantos outros, dependem de Lula para viver. Lula garante o leitinho das crianças.

Joesley jogou água no chope e deu um curto circuito no powerpoint e no cérebro da extrema direita.

DCM

Temer é chefe da organização criminosa do PMDB, Joesley

Joesley, na Época, chama Temer de chefe da organização criminosa do PMDB

É explosiva a entrevista de Joesley Batista à Época.

Vou reproduzi-la, mas destaco, antes, alguns trechos:

[Michel Temer]Não é um cara cerimonioso com dinheiro.

Ele dizia: ‘Joesley, essa parte financeira toca com o Eduardo e se acerta com o Eduardo [Cunha]’.

O mais relevante foi quando Eduardo tomou a Câmara. Aí virou CPI para cá, achaque para lá. Tinha de tudo. Eduardo sempre deixava claro que o fortalecimento dele era o fortalecimento do grupo da Câmara e do próprio Michel.

O Temer é o chefe da Orcrim [organização criminosa] da Câmara. Temer, Eduardo, Geddel, Henrique, Padilha e Moreira. É o grupo deles. Quem não está preso está hoje no Planalto. Essa turma é muita perigosa. Não pode brigar com eles. Nunca tive coragem de brigar com eles. Por outro lado, se você baixar a guarda, eles não têm limites.

A entrevista de Joesley fixa um ponto principal: Temer era o chefe e Eduardo Cunha seu agente.

ÉPOCA – Quando o senhor conheceu Temer?

Joesley Batista – Conheci Temer através do ministro Wagner Rossi, em 2009, 2010. Logo no segundo encontro ele já me deu o celular dele. Daí em diante passamos a falar. Eu mandava mensagem para ele, ele mandava para mim. De 2010 em diante. Sempre tive relação direta. Fui várias vezes no escritório da praça Pan-americana, fui várias vezes no escritório no Itaim, fui várias vezes na casa dele em São Paulo, fui alguma vezes no no Jaburu, ele já esteve aqui em casa, ele foi no meu casamento. Foi inaugurar a fábrica da Eldorado.

ÉPOCA – Qual, afinal, a natureza da relação do senhor com o presidente Temer?

Joesley – Nunca foi uma relação pessoal, de amizade. Sempre foi uma relação institucional, de um empresário que precisava resolver problemas e via nele a condição de resolver problemas. Acho que ele me via como um empresário que poderia financiar as campanhas dele – e fazer esquemas que renderiam propina. Toda vida tive total acesso a ele. Ele por vezes me ligava para conversar, me chamava, eu ia lá.

ÉPOCA – Conversar sobre política?

Joesley – Ele sempre tinha um assunto específico. Nunca me chamou lá para bater papo. Sempre que ele me chamava eu sabia que ele ia me pedir alguma coisa ou ele queria alguma informação.

ÉPOCA – Segundo a colaboração, Temer pediu dinheiro ao senhor já em 2010. É isso?
Joesley – Isso. Logo no início. Conheci Temer e esse negócio de dinheiro para campanha, aconteceu logo no iniciozinho. O Temer não tem muita cerimônia para tratar desse assunto. Não é um cara cerimonioso com dinheiro.

ÉPOCA – Ele sempre pediu sem algo em troca?

Joesley – Sempre estava ligado a alguma coisa, ou a algum favor. Raras vezes não. Uma delas foi quando ele pediu os R$ 300 mil para fazer campanha na internet antes do impeachment, preocupado com a imagem dele. Fazia pequenos pedidos. Quando o Wagner saiu, Temer pediu um dinheiro para ele se manter. Também pediu para um tal de Ortolon, que está lá na nossa colaboração. Um sujeito que é ligado a ele. Pediu para nós fazermos um mensalinho. Fizemos. Ele volta e meia fazia pedidos assim. Uma vez ele me chamou para apresentar o Yunes. Disse que o Yunes era amigo dele e para ver se dava para ajudar o Yunes.

ÉPOCA – E ajudou?

Joesley – Não chegamos a contratar. Teve uma vez também que ele me pediu para ver se eu pagava o aluguel do escritório dele na praça (Panamericana, em São Paulo). Eu desconversei, fiz de conta que não entendi, não ouvi. Ele nunca mais me cobrou.

ÉPOCA – Ele explicava a razão desses pedidos? Por que o senhor deveria pagar?

Joesley – O Temer tem esse jeito calmo, esse jeito dócil de tratar e coisa. Não falava.

ÉPOCA – Ele não deu nenhuma razão?

Joesley – Não, não ele. Tem políticos que acreditam que, pelo simples fato do cargo que ele está ocupando, já o habilita a você ficar devendo favores a ele. Já o habilita a pedir algo a você de maneira que seja quase uma obrigação você fazer. Temer é assim.
ÉPOCA – O empréstimo do jatinho da JBS ao presidente também ocorreu dessa maneira?

Joesley – Não lembro direito. Mas é dentro desse contexto: “Eu preciso viajar, você tem um avião, me empresta aí”. Acha que o cargo já o habilita. Sempre pedindo dinheiro. Pediu para o Chalita em 2012, pediu para o grupo dele em 2014.

ÉPOCA – Houve uma briga por dinheiro dentro do PMDB na campanha de 2014, segundo o lobista Ricardo Saud, que está na colaboração da JBS.

Joesley – Ricardinho falava direto com Temer, além de mim. O PT mandou dar um dinheiro para os senadores do PMDB. Acho que R$ 35 milhões. O Temer e o Eduardo descobriram e deu uma briga danada. Pediram R$ 15 milhões, o Temer reclamou conosco. Demos o dinheiro. Foi aí que Temer voltou à Presidência do PMDB, da qual ele havia se ausentado. O Eduardo também participou ativamente disso.

ÉPOCA – Como era a relação entre Temer e Eduardo Cunha?

Joesley – A pessoa a qual o Eduardo se referia como seu superior hierárquico sempre foi o Temer. Sempre falando em nome do Temer. Tudo que o Eduardo conseguia resolver sozinho, ele resolvia. Quando ficava difícil, levava para o Temer. Essa era a hierarquia. Funcionava assim: primeiro vinha o Lúcio. O que ele não consegui resolver ele pedia para o Eduardo. Se o Eduardo não conseguia resolver, envolvia o Michel.

ÉPOCA – Segundo as provas da delação da JBS e de outras investigações, o senhor pagava constantemente tanto Eduardo Cunha quanto Lúcio Funaro, seja por acertos na Câmara, seja por acertos na Caixa, entre outros. Quem ficava com o dinheiro?

Joesley – Em grande parte do período que convivemos meu acerto era direto com o Lúcio. Eu não sei como era o acerto do Lúcio do Eduardo tampouco do Eduardo com o Michel. Eu não sei como era a distribuição entre eles. Eu evitava falar de dinheiro de um com o outro. Não sabia como era o acerto entre eles. Depois, comecei a tratar uns negócios direto com o Eduardo. Em 2015, 2016, quando ele assumiu a Presidência da Câmara. Não sei também o quanto desses acertos iam para o Michel. E com o Michel mesmo eu também tratei várias doações. Quando eu ia falar de esquema mais estrutural com Michel, ele sempre pedia para falar com o Eduardo. ‘Presidente, o negócio do Ministério da Agricultura, o negócio dos acertos…’. Ele dizia: ‘Joesley, essa parte financeira toca com o Eduardo e se acerta com o Eduardo’. Ele se envolvia somente nos pequenos favores pessoais ou em disputas internas, como a de 2014.

ÉPOCA – O senhor realmente precisava tanto assim desse grupo de Eduardo Cunha, Lúcio Funaro e Temer?

Joesley – Eles foram crescendo no FI-FGTS, na Caixa, na Agricultura – todos órgãos onde tínhamos interesses. Eu morria de medo de eles encamparem o Ministério da Agricultura. Eu sabia que o achaque ia ser grande. Eles tentaram. Graças a Deus mudou o governo e eles saíram. O mais relevante foi quando Eduardo tomou a Câmara. Aí virou CPI para cá, achaque para lá. Tinha de tudo. Eduardo sempre deixava claro que o fortalecimento dele era o fortalecimento do grupo da Câmara e do próprio Michel. Aquele grupo tem o estilo de entrar na sua vida sem ser convidado.

ÉPOCA – Pode dar um exemplo?

Joesley – O Eduardo, quando já era presidente da Câmara, um dia me disse assim: ‘Joesley, tão querendo abrir uma CPI contra a JBS para investigar BNDES. É o seguinte: você me dá cinco milhões que eu acabo com a CPI.’ Falei: Eduardo, pode abrir, não tem problema. Como não tem problema? Investigar o BNDES, vocês. Falei: Não, não tem problema. Você tá louco? Depois de tanto insistir, ele virou bem sério: é sério que não tem problema? Eu: é sério. Ele: não vai te prejudicar em nada? Não, Eduardo. Ele imediatamente falou assim: seu concorrente me paga cinco milhões para abrir essa CPI. Se não vai te prejudicar, se não tem problema… Eu acho que eles me dão os 5 milhões. Uai, Eduardo, vai sua consciência. Faz o que você achar melhor’.Esse é o Eduardo. Não paguei e não abriu. Não sei se ele foi atrás. Esse é o exemplo mais bem acabado da lógica dessa Orcrim.

ÉPOCA – Algum outro?

Joesley – Lúcio fazia a mesma coisa. Virava para mim e dizia: tem um requerimento numa CPI para te convocar. Me dá um milhão que eu barro. Mas a gente ia ver e descobria que era algum deputado a mando dele que estava fazendo. É uma coisa de louco.

ÉPOCA – O senhor não pagou?

Joesley – Nesse tipo de coisa, não. Tinha alguns limites. Tinha que tomar cuidado. Essa é a maior e mais perigosa organização criminosa desse país. Liderada pelo presidente.

ÉPOCA – O chefe é o presidente Temer?

Joesley – O Temer é o chefe da Orcrim da Câmara. Temer, Eduardo, Geddel, Henrique, Padilha e Moreira. É o grupo deles. Quem não está preso está hoje no Planalto. Essa turma é muita perigosa. Não pode brigar com eles. Nunca tive coragem de brigar com eles. Por outro lado, se você baixar a guarda, eles não têm limites. Então meu convívio com eles foi sempre mantendo à meia distância: nem deixando eles aproximarem demais nem deixando eles longe demais. Para não armar alguma coisa contra mim. A realidade é que esse grupo é o de mais difícil convívio que já tive na minha vida. Daquele sujeito que nunca tive coragem de romper, mas também morria de medo de me abraçar com ele.

ÉPOCA – No decorrer de 2016, o senhor, segundo admite e as provas corroboram, estava pagando pelo silêncio de Eduardo Cunha e Lúcio Funaro, ambos já presos na Lava Jato, com quem o senhor tivera acertos na Caixa e na Câmara. O custo de manter esse silêncio ficou alto demais? Muito arriscado?

Joesley – Virei refém de dois presidiários. Combinei quando já estava claro que eles seriam presos, no ano passado. O Eduardo me pediu 5 milhões. Disse que eu devia a ele. Não devia, mas como ia brigar com ele? Dez dias depois ele foi preso. Eu tinha perguntado para ele: “Se você for preso, quem é a pessoa que posso considerar seu mensageiro?”. Ele disse: ‘O Altair procura vocês. Qualquer outra pessoa não atenda’. Passou um mês, veio o Altair. Meu deus, como vou dar esse dinheiro para o cara que está preso? Aí o Altair disse que a família do Eduardo precisava e que ele estaria solto logo, logo. E que o dinheiro duraria até março deste ano. Fui pagando, em dinheiro vivo, ao longo de 2016. E eu sabia que, quando ele não saísse da cadeia, ia mandar recados.

ÉPOCA – E o Lúcio Funaro?

Joesley – Foi parecido. Perguntei para ele quem seria o mensageiro se ele fosse preso. Ele disse que seria um irmão dele, o Dante. Depois virou a irmã. Fomos pagando mesada. O Eduardo sempre dizia: “Joesley, estamos juntos, estamos juntos. Não te delato nunca. Eu confio em você. Sei que nunca vai me deixar na mão, vai cuidar da minha família’. Lúcio era a mesma coisa: “‘Confio em você, eu posso ir preso porque eu sei que você não vai deixar minha família mal. Não te delato’”.

ÉPOCA – E eles cumpriram o acerto, não?

Joesley – Sim. Sempre me mandando recados: “Você está cumprindo tudo direitinho. Não vão te delatar. Podem delatar todo mundo menos você’”. Mas não era sustentável. Não tinha fim. E toda hora o mensageiro do presidente me procurando para garantir que eu estava mantendo esse sistema.

ÉPOCA – Quem era o mensageiro?

Joesley – Geddel. De 15 em 15 dias era uma agonia terrível. Sempre querendo saber se estava tudo certo, se ia ter delação, se eu estava cuidando dos dois. O presidente estava preocupado. Quem estava incumbido de manter Eduardo e Lúcio calmos era eu.

ÉPOCA – O ministro Geddel falava em nome do presidente Temer?

Joesley – Sem dúvida. Depois que o Eduardo foi preso, mantive a interlocução desses assuntos via Geddel. O presidente sabia de tudo. Eu informava o presidente por meio do Geddel. E ele sabia que eu estava pagando o Lúcio e o Eduardo. Quando o Geddel caiu, deixei de ter interlocução com o Planalto por um tempo. Até por precaução.


A a entrevista no original, o retrato de um bandido desenhado por outro bandido: Joesley Batista: “Temer é o chefe da quadrilha mais perigosa do Brasil”

Tijolaço