quinta-feira, 10 de maio de 2018

STF o poder constituinte e Barroso lidera o “populismo judicante, punitivista e demagógico”, Roberto Amaral

Dizem que a Constituição é ‘detalhista’. Foi a vacina encontrada para defender a ordem constitucional de um Poder Judiciário no qual não se confia.
Promulgação da Constituição de 1988: poucos textos poderão, como esse, dizer que nasceram da vontade popular.
A Constituição brasileira de 1988 – alquebrada, mas ainda vigente, não obstante o STF, é triste dizê-lo – é muito mais que um código de observância obrigatória.
Ela é, a um só tempo, símbolo e cristalização da opção política do povo brasileiro, que, nas ruas, exigiu uma Assembleia Constituinte para decretar, de uma vez por todas, o fim do ordenamento autoritário.
Poucos textos poderão, como esse, dizer que nasceram da vontade popular.
Vontade que se manifestou tanto na grande jornada pela convocação da Assembleia Constituinte, a que resistiam os militares, quanto no acompanhamento quotidiano da atividade constituinte, evitando que prevalecesse o Centrão, o núcleo duro da direita.
A chamada ‘Constituição cidadã’, segundo o batismo de Ulisses Guimarães, não é o texto de nossos sonhos – qual seria? –, mas é indiscutivelmente o que de melhor poderíamos costurar, nas circunstâncias.
E é, certamente, a mais representativa de quantas Cartas tivemos na República.
No entanto, ela está sendo dilacerada pelo Poder Judiciário, exatamente o único desvalido da soberania popular.
Na República, qual a praticamos, o poder supremo – fonte de todos os demais – pertence ao povo.
Na democracia representativa, a nossa, esse poder é exercido por meio de representantes, eleitos (art. 1º).
Não há, pois, legitimidade fora da representação, que se manifesta através do voto, em eleições periódicas.
Fora desta fonte, tudo o mais se afigura como esbulho.
À exceção das rupturas revolucionárias ou golpistas (quarteladas ou não), inexiste hipótese de legitimidade constitucional fora do voto, de que carecem os juízes, atrabiliários ou não, autoritários ou não, ensimesmados ou não, juízes de piso ensoberbados ou noviços alçados às alturas dos tribunais superiores.
Em nosso ordenamento, e exatamente em decorrência dessa limitação de fonte e origem, cabe ao Poder Judiciário, por intermédio do STF, como função precípua (adjetivo de escolha do constituinte), aquela que por sinal justifica sua existência, a ‘guarda da Constituição’, o zelo pelo seu cumprimento, a vigilância sobre sua integridade.
Jamais sua violação, no que incide corriqueiramente nossa Corte, outorgando a si mesma poder Constituinte de que carece, como acaba de fazer, ao alterar (‘emendar’ como gostaria o senhor Barroso) a regra que disciplina o processo e julgamento dos membros do Congresso Nacional (art. 102).
Antes, já esbofeteara a garantia constitucional da presunção da inocência, e revogara a necessidade do trânsito em julgado para o cumprimento de sentença penal condenatória, remetendo ao lixo a regra do art. 5º, LVII.
Ainda antes, com argumentos burocráticos e no ápice de chicanas operadas pela presidência da Corte na ordenação da pauta dos trabalhos do Pleno, denegara o pedido de habeas corpus impetrado pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, uma vez mais fraudando a Constituição, o que ficou exposto no luminar voto do ministro Celso de Melo, essa ave rara do liberalismo.
A incumbência outorgada ao juiz é a de reta aplicação da lei, não lhe cabendo seja emendá-la, seja criar regra nova, competência privativa dos titulares de mandato legislativo.
Desse papel, usurpado dos representantes do povo, se valeram o ‘Estado Novo’ e, mais recentemente, os militares.
Mas naquelas ocasiões vivíamos sob o império de ditaduras, que a consciência jurídica repugnava.
O ativismo judicial, a violação da separação dos Poderes, o avanço do Judiciário sobre o Legislativo e o Executivo, postos sob custódia, têm, dentre outras muitas motivações, a convicção, reacionária, alimentada e difundida pela cantilena dos meios de comunicação, de que a política (isto é, a política exercida pelos políticos…) é a fonte de nossos males, e como toda erva daninha deve ser extirpada.
O discurso da antipolítica, renovado metodicamente com os eventos da Lava Jato, já foi formulado em diversos momentos de nossa História, e todos sabemos o que nos foi imposto em seu rasto.
O assassinato é precedido pela desqualificação do político, anatematizado como corrupto pelo reacionarismo místico-religioso de procuradores, juízes de piso e ministros, ainda encantados pelas luzes da notoriedade.
Essa é a razão ideológica para a ‘emenda’ aplicada ao art. 102 (I, a) da Constituição, pois esse abuso foi o que praticou o STF – o colégio dos illuminati onde neste momento pontifica o ministro Barroso – ao eliminar o ‘foro privilegiado dos congressistas’.
A grande vítima deste ataque, todavia, é a soberania popular.
O foro privilegiado, no caso dos congressistas, não consiste em prerrogativa pessoal, do indivíduo, mas em instrumento de defesa do caráter e da essência da representação popular; a incolumidade do titular da soberania, que não pode ser ameaçado, limitado ou condicionado no exercício de seu mandato, nem exposto à sanha de eventuais adversários, de litigantes de má-fé, de juízes a serviço das oligarquias que dominam a política, principalmente no Brasil profundo.
O STF, todavia, e por razões óbvias, só viu porta aberta à impunidade – porque ele mesmo demora a julgar, alimentando a indústria da prescrição – quando os processos dizem respeito aos membros do Congresso Nacional.
Corre tudo como dantes quando o ‘privilégio’ se aplica aos seus próprios membros, ao Procurador-Geral da República, aos ministros de Estado, aos comandantes das Forças Armadas, aos membros dos Tribunais Superiores e do Tribunal de Contas da União e aos chefes de missão diplomática.
Ou seja, como dito acima, o projeto é ideológico, o alvo é a política e a vítima é a soberania popular.
O nano-ministro, líder do populismo judicante, penalista, punitivista, demagógico, não se afeiçoa com os fundamentos do Direito, nem cultiva as lições de seus construtores, pois sua fonte é um emaranhado de estatísticas não conferidas de processos, ações e julgados, que brande a cada julgamento, para em nome sempre de um alegado ‘excesso’ de demandas, justificar a supressão de um direito fundamental.
Diz, por exemplo, o senhor Barroso (nesse ponto alcovitado pelo ministro Fux), que o instituto do habeas corpus, que separa as democracias das tiranias, de tão requerido, está entulhando a Corte.
Mude pois o STF o texto constitucional, restringindo sua aplicação!
Não importa quantos direitos quedarão à míngua de proteção jurisdicional, mas os ministros ficarão mais aliviados em suas fainas.
São muitos os processos nos quais políticos figuram como acusados?
Casse-se, pois, o chamado ‘foro privilegiado’. Cassado está.
Mas os processos envolvendo parlamentares representam apenas 1% do total que tramita (sem andar) na Casa…
O nosso é um Tribunal que leva, em média, cinco anos para jugar uma ação direta de inconstitucionalidade, e menos de 5% de suas decisões se devem ao Plenário.
O grosso são decisões monocráticas.
E, assim, porque o STF, letárgico, não julga, revogam-se os direitos para reduzir a quantidade de processos, pacificando o ócio remunerado dos sábios sabidos, que pouco param em Brasília, viajando de Seca a Meca, em simpósios e palestras remuneradas (às vezes de patrocínio pouco ortodoxo), ou mesmo em outras atividades profissionais em dia e horário de expediente.
Não há limites para a audácia antidemocrática.
Para o antigo advogado do Itaú (segundo o colega Gilmar Mendes, porém, seu escritório de advocacia ainda está em pleno funcionamento, isso é disputa entre eles… ), a vida parlamentar é cara, donde o melhor é acabar com o Poder Legislativo: “Num habeas corpus preventivo contra aqueles que questionam a legitimidade da Corte para exercer um poder majoritário sem votos para tanto, Barroso argumentava que o acesso ao Congresso tem um custo financeiro alto, que obriga alianças com interesses particulares. Já os juízes, selecionados pela meritocracia (sic), representariam melhor a vontade da sociedade” (“Os atropelos da história empurrada”, Maria Cristina Fernandes. Valor, 4/5/2018).
Tivéssemos hoje um Congresso, meramente de pé – e não acocorado – já encontraríamos aí razões suficientes para requerer o impeachment do ministro.
Ora, se o ministro quer legislar, que se desfaça da toga que ainda não fez por merecer, e vá para as ruas disputar no voto uma vaga na Câmara ou no Senado, porque numa democracia razoavelmente respeitável as questões constitucionais só se resolvem pelo Poder Legislativo, cujos representantes são escolhidos mediante o voto.
A quem beneficiaria a desconstrução da política? Ao povo, certamente, não.
As agressões à ordem constitucional servem à alcateia que anseia pela retomada do autoritarismo, requerido, como sempre, pela casa-grande e seus despachantes, mas já alcançando camadas significativas de nossa população, como se vê dos seguidores do capitão fascista, circulando entre aeroportos e quartéis.
O STF, enfim, não é confiável, e isso traz insegurança tanto ao cidadão comum, o povo-massa, quanto às instituições.
Não só pela proteção de imoralidades corporativas como o auxílio-moradia (e outros penduricalhos como auxílio-viagem, diárias, semana de quatro dias, apartamento funcional, automóvel na porta, ano de sete meses etc.) de juízes, desembargadores, ministros, procuradores et caterva, mas porque julga com dois pesos e duas medidas.
O mesmo STF que impediu a posse de Lula como ministro de Dilma Rousseff – abrindo caminho ao golpe que vinha a cavalo – não enxergou desvio de finalidade na nomeação do inefável Wellington Moreira Franco para o ministério do locatário do Jaburu, embora seja o novo ministro das Minas e Energia, objeto de processos nos quais é acusado de corrupção passiva.
Dizem seus críticos, sem atinarem pelas razões, que nossa Constituição é ‘detalhista’. Ora, foi esta a vacina que o Constituinte encontrou para defender a ordem constitucional de um Poder Judiciário no qual não podia confiar.
E a História, lamentavelmente, lhe está dando razão.
O STF contra a democracia, por Roberto Amaral, em seu blog
*Roberto Amaral – é escritor e ex-ministro de Ciência e Tecnologia
Do Vi o Mundo

quarta-feira, 9 de maio de 2018

A REPUBLIQUETA de Curitiba e o CAUDILHISMO JUDICIAL, por Murilo Naves Amaral

No processo em que o ex presidente Lula é acusado de ter se beneficiado de uma reforma em um sítio no município de Atibaia, que supostamente seria de sua propriedade, presenciamos, recentemente, um fato bem interessante, no qual a Segunda Turma do Supremo Tribunal Federal determinou o encaminhamento das delações de ex executivos da construtora Odebrecht para a justiça federal de São Paulo, de modo a retira-las das mãos do juiz Sérgio Moro. Em um primeiro momento, parecia que na decisão emanada pelo STF estava sendo declarada a incompetência do juízo de Curitiba na condução geral do referido processo, a ponto que, quando o magistrado Sérgio Moro se negou a fazer a remessa do autos até a publicação do acordão proferido, muitos se indignaram, de maneira a acusa-lo de abusar de sua autoridade e de descumprir a ordem de uma instância superior.
Entretanto, a confusão que se fez sobre a decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal, talvez, não fosse tão confusa assim, posto que, o que pode ter ocorrido, é que tal fato apenas expôs mais um capítulo da banalização das regras processuais vigentes, que como bem lembrou a professora do curso de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV), Eloísa Machado, em artigo publicado na data de 03.05.2018 no Blog do Sakamoto, vem culminando nos danos que já são claramente perceptíveis, dentre os quais “a erosão da autoridade dos tribunais superiores, a justificação de cruzadas judiciais e garantias processuais sendo mandadas às favas ”.
Cabe lembrar, que o recuo do Supremo em relação a essa questão, trata-se de um recuo em relação a garantias processuais básicas, dentre as quais, as regras de competência, que além de serem imprescindíveis para o bom funcionamento do processo, devem ser vistas como um pilar do Estado de Direito, já que asseguram ao cidadão a possibilidade de se proteger contra o exercício desenfreado e sem limites de determinada autoridade. Nota-se que, a própria imprensa pressionou significativamente para que a decisão do Supremo tivesse uma releitura. Tanto é fato, que na data de 25 de abril de 2018, o colunista Merval Pereira, em matéria publicada no jornal “O Globo”, chegou a chamar de “precedente perigoso” a decisão da Segunda Turma do STF, com o claro intuito de fazer pressão para que houvesse uma adequação do entendimento sobre a matéria, de modo que a ação continuasse em trâmite na Justiça Federal de Curitiba.  
O desespero daqueles que querem ver Lula apodrecer na prisão e fora do jogo político eleitoral de 2018, surgiu a partir do momento em que se verificou a possibilidade de diante tal entendimento do Supremo, configurar a anulação do processo do triplex do Guarujá, em razão de Moro não ser o juiz natural para tê-lo julgado. Isso porque, já há tempos vem se questionando a competência do juízo de Curitiba de abarcar tantas ações, uma vez que, muitos dos supostos crimes apontados não teriam ocorridos no território do Paraná e tampouco teriam relações diretas com os casos da Petrobrás, de forma que, pelo menos em tese, tais demandas deveriam estar tramitando em outras subseções judiciárias, por questões estritamente técnicas e processuais.
Porém, ao contrário do que ensinam as faculdades de Direito, as regras de competência passaram a ser estabelecidas a partir da histeria da opinião pública fabricada pela mídia, sem qualquer observância as questões legais que deveriam servir de referência na hora de se estabelecer qual juízo irá processar a ação. Em outro artigo que escrevi e que foi publicado aqui no Blog do Nassif (https://jornalggn.com.br/noticia/quando-o-direito-se-torna-papo-de-boteq...), constatei que essa nova forma de condução do processo judicial, tornou o Direito em um verdadeiro papo de botequim, não no sentido de tornar acessível a linguagem jurídica, o que é extremamente positivo, mas no sentido da vulgarização que os meios de comunicação, buscando atender seus interesses, manipulam a linguagem e a técnica do procedimento judicial, principalmente a partir da espetacularização e do deslumbramento infantil das autoridades perante os holofotes.
Essa histeria propagada pela mídia, que favorece a banalização dos procedimentos judiciais, faz com o que, ao mesmo tempo, haja um retorno daquilo que estigmatizou profundamente a sociedade brasileira, que é a consagração do personalismo em volta de figuras que muitas vezes não possuem a qualidade natural de serem líderes, mas que se mantém como protagonistas, em razão de uma manipulação da sociedade pelos meios de comunicação. Na situação que vivenciamos hoje, esse personalismo vem sendo construído a partir de personagens da burocracia de luxo, sobretudo os juízes, que são glamourizados em suas funções. No caso de Sérgio Moro, o personalíssimo chega a tal ponto, que o referido magistrado é tratado quase que como um pop star ou um super herói pelos meios de comunicação, acima do bem e do mal ou de qualquer suspeita, de forma que, conforme também comentei no texto publicado no Nassif e intitulado “Quando o direito se torna papo de botequim”, a blindagem concedida a Moro “deveria soar como ofensa aos demais juízes, pois pelo que se retrata na imprensa, fica parecendo que somente o ilustre magistrado paranaense é que tem compromisso em julgar de maneira séria casos de corrupção.”
Como resultado desse fenômeno de exaltação da imagem de certas autoridades, o risco maior que se verifica é que essas mesmas autoridades passem a acreditar no pedestal em que são colocadas pela mídia, de maneira que, inclusive, passem a se insubordinarem contra instâncias superiores que deveriam se dirigirem. Um bom exemplo disso, foi o que narrou Eloísa Machado, no mesmo artigo acima mencionado e que foi publicado no Blog do Sakamoto, em que Moro já havia enfrentado instâncias superiores, de modo que foi censurado pelo Tribunal Regional da 1ª Região ao se negar a cumprir decisão que mandou suspender a extradição de um dos acusados da “lava jato”, a ponto que o Tribunal chegou a se manifestar  no sentido de que “não é minimamente razoável que um dos juízes arvore-se por competente e decida por si só, sem aguardar a decisão da Corte Superior […]. É inimaginável, num estado democrático de direito, que a Polícia Federal e o Ministério da Justiça sejam instados por um juiz ao descumprimento de decisão de um tribunal, sob o pálido argumento de sua própria autoridade.” Outro fato lembrado pela ilustre professora da Fundação Getúlio Vargas (FGV), foram os fatídicos áudios liberados por Moro, que, sem qualquer relevância jurídica, permitiram que fosse publicizada uma conversa entre os ex presidentes Lula e Dilma, apenas para expô-los perante a opinião pública, de forma que os riscos relativos a essa conduta, inclusive ao interesse nacional, foram totalmente menosprezados.
Tais acontecimentos demonstram por si só, que este personalismo construído pela imprensa, acaba gerando um senso de impunidade que se mostra evidente na manifestação de determinadas autoridades, que, por sua vez, cometem seus atos como se fossem verdadeiros déspotas, sem qualquer responsabilidade por aquilo que praticam. Tirando o fato que tal contexto, atualmente, se consagra pelo Judiciário, na verdade, o fenômeno de se criar figuras personalistas trata-se de algo que sempre esteve presente na realidade latino americana, seja nas ditaduras impostas aos países da região, seja no típico caudilhismo que marcou profundamente a história desses povos, a partir de lideranças autoritárias que buscaram se perpetuar de algum modo no poder.  Não seria demais dizer, que essas figuras judiciais que se autoproclamam salvadores do povo, seriam os caudilhos da contemporaneidade, que fingem estarem munidos de uma técnica jurídica processual, mas que ao final, estão, na realidade, praticando a pior política sob o disfarce da burocracia.
Destaca-se, no entanto, que a utilização da mídia para fins de manipulação de massas, como forma de exaltar lideranças ilegítimas, não se trata de um cenário tão recente, tendo em vista que esse método já era utilizado pelos nazistas, conforme muito bem ressaltou a Escola de Frankfurt ao narrar o funcionamento da Indústria Cultural a partir das teorias de Theodor Adorno e Max Horkheimer. Algo muito semelhante vem ocorrendo no Brasil, considerando que a indústria cultural não se limita a imprensa, posto que também se encontra presente na área do entretenimento para fins de propaganda do sistema. Não é à toa que recentemente estamos vendo tanto em um filme como em uma série de um serviço de streaming, a exaltação das autoridades em um suposto “combate à corrupção”.
Além do já exposto, um outro risco desse personalismo e dessa romantização da atividade judicial é a consagração de um processo de criminalização da política e desvalorização do voto popular, de tal modo que, como também testemunhamos recentemente, o Supremo Tribunal Federal, apesar dos apelos contrários de parte dos ministros, relativizou a prerrogativa de foro daqueles que possuem cargos eletivos, sem que incomodasse qualquer outra autoridade que possui o mesmo benefício, mas que está inserida na administração pública por meio de concurso ou nomeação vitalícia. Trata-se de um verdadeiro acinte a população, haja vista que fragiliza a prerrogativa de quem possui o voto popular, mas mantêm intocáveis aqueles que, sem a legitimidade do voto, atuam na esfera administrativa e judicial.
A medida que essa situação vai se concretizando, a segurança jurídica tanto da população em geral como também das empresas que estão presentes no país se torna cada vez mais vulnerável, já que na concepção daqueles que são exaltados na qualidade de justiceiros do Estado, as regras vigentes aprovadas pelo legislativo passam a ser um mero detalhe. Em outras palavras, é como se os juízes, em razão da força institucional que conseguiram, pudessem decidir com uma discricionariedade, cuja oportunidade e conveniência não estivessem mais na lei, mas sim na subjetividade ideológica de cada magistrado.
Deve-se salientar que a operação “lava jato” foi decisiva nesse contexto, uma vez que a aliança com a mídia proporcionou o fortalecimento de determinados setores judiciais, que, consequentemente, acabou por acarretar em um forte desequilíbrio institucional. Nesse sentido, com os frutos da operação “lava jato”, em que praticamente se criou um Estado paralelo com regras próprias e sem qualquer observância à Constituição, o agravamento da crise se perpetuou na realidade brasileira, pois, com o personalismo do magistrado que conduz as ações oriundas da justiça federal do Paraná (vinculada ao Tribunal Regional Federal da 4ª região), juntamente com seus soldados procuradores, apesar da aparência de modernidade dada pela imprensa, a república de Curitiba, como qualquer republiqueta latino americana, já pode ter um caudilho para chamar de seu.  
Murilo Naves Amaral - Advogado, com mestrado em Direito Público pela Universidade Federal de Uberlândia, professor universitário de cursos de graduação e pós graduação em Direito em São Paulo e Minas Gerais.
 GGN

terça-feira, 8 de maio de 2018

O lavajateiro CARLOS LIMA era CASADO COM FUNCIONÁRIA DO BANESTADO quando já atuava no caso

Quatro professores e doutores em Sociologia de universidades do Paraná divulgaram, em 2017, um artigo sobre os antecedentes (familiar, acadêmico e profissional) de membros estrelados da Lava Jato. Neste artigo consta uma informação que parece ter sido esquecida pela velha mídia: o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, um dos algozes de Lula em Curitiba, esteve casado com uma funcionária do Banestado quando já atuava na investigação sobre a evasão de 30 bilhões de dólares.
Boa parte do perfil de Santos Lima foi escrito a partir de uma reportagem de Amaury Ribeiro Jr para a IstoÉ, em setembro de 2003.
Foi a IstoÉ o veículo de imprensa a revelar que Santos Lima, que entrou no caso Banestado em 1997, era marido de Vera Márcia Ribas de Macedo dos Santos Lima. Esta, por sua vez, trabalhou no Banco entre 1995 e 2001, em dois cargos diferentes.
De 1995 a 1997, "quando ocorreu a maior parte das remessas irregulares para o Exterior, Vera Márcia, ainda casada com Santos Lima, trabalhava como escriturária no setor de abertura de contas da agência da Ponte da Amizade, em Foz de Iguaçu. A investigação da Polícia Federal sobre a evasão de divisas por intermédio do banco mostra que a maioria das contas de laranjas, usadas para mandar o dinheiro para o Exterior, foi aberta exatamente nessa agência."
Em 1997, Vera se mudou com o marido para Curitiba e passou a trabalhar, ainda de acordo com IstoÉ, "em um setor ainda mais estratégico da lavanderia: o Departamento de Operações Internacionais do Banestado, onde eram fechadas transações fraudulentas de câmbio."
Segundo delatores (não premiados) da época, "os funcionários desse setor recebiam comissão para recrutar doleiros e pessoas interessadas em enviar recursos para o Exterior. Ainda de acordo com sua ficha funcional, Vera Márcia trabalhou no local até 2001." 
Em 2002, Santos Lima e Vera se divorciaram.
No meio das investigações da CPI no Congresso, Santos Lima chegou a ser interrogado por parlamentares, ocasião em que omitiu que estivera casado com a então funcionária do Banestado enquanto atuava no caso. IstoÉ ouviu do então deputado do PT, Eduardo Valverde, que o procurador deveria ter se declarado impedido de atuar naquela investigação.
IstoÉ ainda revelou, naquela mesma reportagem, que senadores e deputados estavam "indignados" com Santos Lima por outro motivo: o procurador teria se recusado a receber documentos que os membros da CPI, da Polícia Federal e do Ministério Público foram buscar em Nova York. As mais de "300 caixas de papéis sobre a movimentação de dezenas de contas milionárias que receberam dinheiro sujo do esquema Banestado" teriam sido menosprezadas sob o argumento de que "o MP brasileiro não era obrigado a considerar provas ou conclusões" de CPIs.
DECLARAR SUSPEIÇÃO NÃO ERA SEU FORTE
A apuração de Amaury Jr. não parou por aí. Escreveu o jornalista, naquela edição de 2003, que outro episódio provava que declarar suspeição não era o forte de Santos Lima. A reportagem relatou que, em 2000, estourou no Paraná um escândalo envolvendo a venda irregular de ações de uma empresa de telefonia pública de Londrina para a companhia Paranaense de Energia. A transação usou um braço do Banestado e foi condenada pelo Tribunal de Contas do Estado.
O TCE também apontou outra irregularidade na negociação: o advogado contratado para dar respaldo legal à transação, por R$ 2 milhões, sem licitação, foi Cleverson Merlin, que era casado com a então chefe do Ministério Público Federal do Panará, Marcela Peixoto.
Marcela e Santos Lima nutriam laços de amizade desde 1990 e, ainda assim, ele não se declarou suspeito para atuar no caso. Ao contrário disso, avocou o processo que pertencia ao MP de Londrina para si. 
PGR POR SANTOS LIMA 
Para finalizar, contou a IstoÉ que o escândalo envolvendo Santos Lima mobilizou o então procurador-geral da República Cláudio Fonteles.  
Sobre o episódio da CPI, Fonteles disse que Santos Lima "agiu de forma 'perfeita' para resguardar a validade das provas e tentou minimizar o fato de que sua ex-mulher trabalhava no Banestado na época em que investigava o caso", algo que o PGR taxou de "sem importância", pois Vera seria uma mera "escriturária", sem nenhuma participação no esquema. 
Fonteles ainda destacou que Santos Lima era um procurador importante para o caso Banestado, e prova disso era que tinha protocolado, em agosto de 2003, denúncia contra várias pessoas suspeitas de atuar no esquema de levagem de dinheiro. 
"Santos Lima, no entanto, só começou a agir em março, depois de ISTOÉ denunciar o abandono das investigações e quando já havia sido a instaurada a CPI na Assembléia Legislativa", ressaltou o jornal. 
Por conta da série de reportagens de IstoÉ - que envolve também um processo contra o procurador por "uso ilegal do dinheiro das diárias" - Santos Lima anunciou que iria processar a revista. 
A reportagem completa pode ser acessada aqui. 
DE UMA FAMÍLIA DE "OLIGARCAS" 
Segundo o artigo dos professores do Paraná, Santos Lima graduou-se na Faculdade de Direito Curitiba. Entre 1978 e 1991 foi Escriturário do Banco do Brasil. Entre 1991 e 1995, promotor de Justiça do MP-PR. Depois, Procurador Regional da República. Foi membro da força-tarefa Banestado. Fez Mestrado na Cornell Law School entre 2008 e 2009. 
Santos Lima é filho do deputado estadual da ARENA Osvaldo dos Santos Lima, que foi promotor, vice-prefeito em Apucarana e presidente da Assembleia Legislativa do Paraná, em 1973, no auge da ditadura. 
O avô foi Luiz dos Santos Lima, comerciante e juiz em São Mateus do Sul, na época do coronelismo local. "A partir daí encontramos esta família na Genealogia Paranaense situada nas oligarquias da Lapa entre latifundiários escravistas, família aparentada ao Barão dos Campos Gerais e outros membros da classe dominante tradicional desta região", afirmam os autores do artigo.
Em 2015, o irmão Ovídio dos Santos Lima foi empossado como procurador do Ministério Público do Paraná. No dia da posse, foi lembrado que o pai de Lima e o irmão Luiz José também foram promotores de Justiça do MP-PR. 
No mesmo artigo, os professores do Paraná também abordam o histórico familiar de Deltan Dallagnol, Sergio Moro e Rosangela Wolff Moro, além de estender a pesquisa sobre o Ministério de Temer.
O artigo "Prosopografia familiar da operação Lava Jato e do Ministério Temer" foi escrito por Ricardo Costa de Oliveira, José Marciano Monteiro, Mônica Helena Harrich Silva Goulart e Ana Crhistina Vanali, e publicado na Revista NEP-UFPR (Núcleo de Estudos Paranaenses da Universidade Federal do Paraná). Leia a íntegra em anexo.
Arquivo
Do GGN

segunda-feira, 7 de maio de 2018

MAIO DE 1968 e o sentimento do inacabado, o CAPITALISMO RECICLOU-SE, por Concessa Vaz

Estudantes residentes na Maison du Brésil, Cité Universitaire 
Internationale, Paris XIVe. Maio de 1968.
Questionávamos nas ruas o trabalho alienado, o poder piramidal, o controle cotidiano da vida. Capitalismo reciclou-se — apenas para se tornar mais opressor. Mas a última palavra não foi dita.

“Métro, boulot, dodo” (metrô, trabalho e cama), resumia o dito popular, extraído de um verso de Pierre Béarn, de 1956, e repetido monotonamente pelos integrantes do movimento estudantil, que, tendo se iniciado na Universidade de Nanterre, naquele início do ano de 1968, se alastrou rapidamente por toda Paris, alcançando a Sorbonne, todo o Quartier Latin, a Cidade Universitária Internacional e, em poucas semanas, as principais províncias francesas.
“Que tipo de vida é essa?” bradava em eco um jovem operário mais adiante, acenando aos estudantes e trazendo para seu cortejo milhares de outros operários e profissionais de todas as áreas, compartilhando com aqueles suas angústias e aflições.
Era a própria ordem social que estava em jogo e com ela a alienação a que todos estavam submetidos — a falta de significado de uma sociedade capitalista burocratizada, onde a maioria dos cidadãos levava uma existência trivial, medíocre, repetitiva, repressiva e reprimida. Toda ordem social estava sendo questionada, o estilo de vida, o quotidiano estava sob suspeita. Recusavam-se, todos, e assim clamavam, a serem “treinados como cães policiais”, a se verem convertidos de homens em objetos.
Uma árdua luta foi travada contra os patrões e o Estado. “Ni Dieu, Ni Mâitre!” (“Nem Deus, Nem Senhor!”),  exclamavam os anarquistas, relembrando o lema de Auguste Blanqui, de finais do século XIX. “À Bas l’État Policier!” (“Abaixo o Estado Policial!”), gritavam outros rebeldes, selvagemente reprimidos pela força policial — a violência organizada e concentrada nas mãos do Estado, detentor do monopólio das armas.
O princípio da hierarquia, e da autoridade, prevalecente em todos as instâncias da sociedade era assim questionado – na fábrica, na família, na Universidade –, e a bandeira vermelha tremulava em todos os cantos, seguida da bandeira negra dos anarquistas, não poupando sequer o Teatro da Ópera e o fino cabaré Folies Bergères. As tricolores bandeiras francesas não estavam à vista, indicando claramente a natureza revolucionária do movimento em curso.
Os acontecimentos de maio de 1968 na França passam, para sua compreensão, pelo filtro do trabalho – a base material e econômica das ideias desenvolvidas e propagadas por seus protagonistas. Tamanho movimento, que irrompeu de forma inédita no centro de uma Europa capitalista altamente industrializada, no apogeu de um crescimento econômico por quase trinta anos ininterruptos (os “Trente Glorieuses”, segundo o economista Jean Fourastié), não pode ser reduzido a uma mera agitação da juventude, a uma contestação moral e cultural de estudantes privilegiados e “gatés” (mimados), embora tivessem sido eles, os estudantes universitários, o relâmpago que anunciava a tormenta por vir. A efervescência estudantil era antes a manifestação mais evidente ou o barômetro sensível de um descontentamento geral e de uma crise maior que já se anunciava a partir de dentro da sociedade francesa, cujas origens mais profundas pertencem ao processo geral de racionalização da produção instaurado na grande indústria capitalista em finais do século XVIII.
O período pós-1945 caracteriza-se por um forte crescimento econômico, impulsionado pelas necessidades de reconstrução de uma Europa, e de uma França em particular, mutilada por duas grandes guerras mundiais (1914-1918 e 1939-1945) e por uma grande crise econômica (1929), que resultou em falências, desemprego em massa e uma severa depressão de alcance mundial. Sob a dominação e financiamento dos Estados Unidos, e os estados nacionais lhes servindo de muleta, a reconstrução nacional opera-se e os capitalistas rebatizam seus impérios industriais. Abrem-se então os chamados “anos dourados”, anos de um crescimento sem precedentes e cujo combustível eram os ganhos de produtividade (produto por trabalhador) assentados no modelo taylorista-fordista de produção.
Em finais do século XIX, o engenheiro mecânico Frederic Taylor escreveu os “Princípios de Administração Científica“, um monumento a serviço da organização das empresas e da racionalização da produção e, particularmente, da administração industrial e os meios de torná-la mais eficiente. Taylor revelou os secretos requisitos educacionais/intelectuais que deviam ser exigidos dos trabalhadores para que as empresas fossem bem sucedidas competitivamente. Suas contribuições fundamentais podem ser resumidas em dois pontos, a saber: 1) as práticas de trabalho devem ser rigorosamente padronizadas a partir da análise do “melhor método” de produzir, cobrindo tanto as operações manuais quanto o tempo requerido para executá-las. Trata-se de um estudo dito científico dos “tempos e movimentos”; 2) o estabelecimento de uma rígida separação entre concepção e execução, a partir de uma escala hierárquica de ocupações rigorosamente planejada, incluindo diversos níveis de controle e supervisão do trabalho. Com Taylor, portanto, não apenas o relógio entrava na fábrica, mas o cronômetro, caracterizando uma militarização do trabalho, batizada eufemisticamente de “organização científica do trabalho”. Os tempos e movimentos, depois de analisados, eram impostos aos trabalhadores para serem cumpridos -e uma forte estrutura hierárquica de controle e supervisão se lhes sobrevinha para garantir a produção planejada.
O salto de qualidade foi dado por Henry Ford na indústria automobilística, redesenhada por ele a partir de Taylor. Ford incorporou os princípios tayloristas de divisão do trabalho já estabelecidos e elevou ao máximo a produtividade com a intensificação acelerada do trabalho, induzida e viabilizada pela tecnologia da linha de montagem — ou seja, pela incorporação dos procedimentos na própria máquina. Assim, o aumento de produtividade se produzia pelo trabalho coletivo, altamente potencializado. Através de uma linha de montagem progressiva, os produtos padronizados e entregues à cadência de um mecanismo artificial e exterior aos trabalhadores eram elaborados com um grau de precisão tal que dispensavam “ajustes”. O ritmo rápido e estável da linha de montagem garantia a vantagem competitiva do capitalista (e, portanto, a obtenção em um patamar mais elevado de mais-valia relativa).
Com essa tecnologia, que se estendeu rapidamente para outros setores muito além da indústria automobilística, a produção se fazia em massa e em larga escala, de modo a reduzir os custos unitários, dado o elevado investimento em capital fixo (máquinas, equipamentos, plantas industriais, etc.) exigido. O fordismo, como veio a ser denominado, foi, assim, um dos motores que permitiu o pleno emprego e um aumento do nível de vida dos trabalhadores, via redução dos preços das mercadorias necessárias à sua sobrevivência e reprodução. Foi este o sistema de produção que veio a reger todo o crescimento econômico francês no pós-guerra, com sua linha de montagem e os princípios de organização do trabalho taylorista. Com uma estrutura centralizada de produção, calcada no controle do tempo e dos movimentos do trabalhador na linha de montagem,  as fábricas absorviam uma massa gigantesca de operários especializados (OS), receptores de salário mínimo (SMIG), sujeitos a uma jornada semanal de trabalho de 45 horas, exercendo tarefas precisas, repetitivas, montando peças uniformizadas que desfilavam diante deles, repetindo ao infinito os mesmos gestos e se submetendo à cadência infernal da linha de montagem, embrutecidos e alienados. Sob tais condições de trabalho e vida, não iam a lugar algum com os salários que recebiam em troca, reproduzindo-se diariamente, tal como um pêndulo, diante de uma rotina cada vez menos suportável para cada cidadão-trabalhador parisiense: “métro, boulot, dodo”,
A produção em massa, ademais, deu origem a um consoante consumo de massa e transformou a sociedade, por sua vez, em um mundo de robôs, com modos de vida codificados e com rotinas rigidamente demarcadas – foi a uniformização da vida quotidiana (Henry Lefèbvre).
O mesmo princípio hierárquico da produção fordista refletia-se em universidades igualmente centralizadas, cujos reitores, tais como marionetes, deviam atender, prioritariamente, às necessidades tecnológicas do capitalismo francês, às exigências do sistema produtivo então implantado e disseminado. Não por acaso, os enfurecidos estudantes de Nanterre bradavam, já antes de Maio de 68 que não queriam ser “des chiens de garde de la bourgeoisie” (“cães de guarda da burguesia”).
O governo francês, por sua vez, estava nas mãos de um general – De Gaulle, que havia posto um fim à guerra contra a emancipação política da Argélia e comandava o país com similar austeridade, sem consultas e governando por decreto, além de exercer um enorme controle político através das mídias de então: a televisão e o rádio. Os limites de seu governo se expressavam claramente no “slogan” já trivial nas manifestações de maio: “Adieu, De Gaulle, dix ans, ça suffit” (“Adeus, De Gaulle, dez anos, basta!”).
Durante os 25 anos que se seguiram à Segunda Guerra Mundial, o sistema capitalista francês escondera-se atrás da embriaguez do progresso econômico. Mas a lógica do trabalho, decorrente do regime de produção taylorista-fordista então dominante, controlava toda a vida social e humana.
Em meados dos anos 1960, esse sistema de produção começou a perder eficácia. A produtividade desacelerou, os capitalistas tentaram compensar a queda reduzindo os salários reais, degradando ainda mais as condições de trabalho, promovendo o desemprego parcial e, funestamente, acelerando as já infernais cadências da linha de montagem. Os operários, em particular a massa de especializados, revoltaram-se contra o peso da crise que começo a recair sobre seus ombros, e o desequilíbrio instalou-se. Os operários decidiram juntar-se aos estudantes grevistas e recusaram-se ao jogo de “perdre sa vie à la gagner” (“perder a vida para ganhá-la”). Tal recusa apareceu também sob a forma de absenteísmo no trabalho — o chamado “turn-over”, a recusa do trabalho, ou sob a forma de sabotagem. Mas foram provavelmente as condições salariais dos trabalhadores especializados, a maioria absoluta dos trabalhadores fordistas, que levaram os trabalhadores à revolta e a se juntarem aos estudantes. Esta adesão ficou definitivamente gravada nas bandeirolas que tremulavam por toda parte com os dizeres: “étudiants, professeurs, ouvriers” (“estudantes, professores, operários”. Foi esta junção histórica entre o trabalho intelectual e o trabalho manual que fez do Maio de 1968 na França um evento particular e diferenciado em relação ao que ocorria no resto do mundo.
Somente no final da década seguinte a persistência dos sintomas depressivos exigiu reações e mudanças de modo a revigorar o crescimento econômico capitalista. A partir dos anos 1980, novas estratégias empresariais de competitividade e de produtividade começaram a ser desenhadas, alterando a organização do trabalho e as formas de gestão da produção. Um novo padrão instaurou-se, a assim chamada “produção flexível”. Mas como no taylorismo-fordismo, este sistema de produção nasceu igualmente ao processo geral de racionalização da produção instaurado pela grande indústria capitalista de finais do século XVIII. O objetivo continuava sendo o da acumulação de capital por meio do aumento da produtividade e da competitividade. Logo, numa perspectiva histórica e do ponto de vista da organização do trabalho, a recém-chegada “produção flexível”, longe de constituir uma novidade, foi antes de tudo uma norma, pois que o processo produtivo, com os seus trabalhadores aí inseridos, foi permanentemente reorganizado e/ou reestruturado ao longo do tempo em função da necessidade imperativa de crescimento do capital, que só se viabiliza através do aumento constante da produtividade do trabalho e, portanto, da mais-valia.
“A força com a qual a contestação estudantil e operária se afirmou na França, em Maio de 1968, confirma a virulência dos antagonismos no interior desta sociedade pretensamente estável e a incapacidade da burguesia de superá-los, ou seja, de conseguir a domesticação durável das classes exploradas” (cf. Daniel Bensaid). Os trabalhadores não demoraram a perceber, face à recessão que se abriu e se estendeu ao longo dos anos que se seguiram, que o capitalismo não se encontra ao abrigo de crises maiores, tendo como resultado um conjunto de reestruturações que prejudicam, inevitavelmente, suas condições de existência.
Como testemunha ocular dos acontecimentos de Maio de 1968 na França, quando eu era apenas uma entre milhares de outras estudantes, francesas e estrangeiras que aí faziam seus estudos, e no auge de meus 20 anos, termino este texto compartilhando o mesmo sentimento de Christian Laval, tão bem expresso em seu depoimento, quando dos 40 anos de Maio de 1968:
“(…) Este movimento, sem chefe, sem direção e sem programa é o nome daquilo que um dia fez medo e que precisou ser controlado, remetendo-o ao folclórico, ao anedótico ou ao banal…Este movimento, e sua força, permaneceu aberto às interpretações, às recuperações…68 é a afirmação gritante de uma recusa que continua a atemorizar… [é a afirmação] de que há outra coisa possível. Maio de 68 é o nome deste desejo…Nosso tempo passou e é preciso dar passagem. Nós fomos o elo provisório de um tempo igualmente provisório, (…) nós somos muitos a ter o sentimento do inacabado…”
GGN

domingo, 6 de maio de 2018

LULA PODE INVIABILIZAR DIREITA e construir 2º turno DENTRO DA FRENTE, por Ion de Andrade

A prisão de Lula, insustentável diante das imagens veiculadas pelo MTST é de tal brutalidade que tende a gerar um movimento natural de lealdade total a ele por parte de todos aqueles que o sabem injustiçado.
Essa lealdade vai além da pessoa de Lula, pois se funde com os valores da democracia participativa, do Estado Social, da prioridade aos mais pobres que são os dele e em nome dos quais muito foi feito no Brasil.
Portanto estamos diante de um fenômeno visceral que reverberará na história e na política brasileira por décadas.
O caráter visceral desse fenômeno, que é traço do quanto está vivo, poderia, no arco do curto prazo onde estão as eleições, desempenhar efeito instabilizador sobre o processo estratégico a que as forças democráticas estão convocadas que é o de fazer reemergir no Brasil, preferencialmente nas próximas eleições, a democracia e um pacto social mínimo para a governabilidade.
Na prática essa lealdade (e ela é legítima) poderia produzir um comportamento político sectário, pelo qual nenhum candidato, mesmo no campo democrático poderia ser suficientemente digno para substituir no pleito eleitoral o Lula preso injustamente. É compreensível do ponto de vista humano que muitos possam perceber uma alternativa qualquer a Lula, num cenário como o atual, como traição.
Agrega-se a isso o fato de que a candidatura de um Lula preso político tem um potencial politizador imenso para as maiorias, pois demonstra com clareza meridiana a que destino a sociedade excludente e autoritária do Brasil contemporâneo estão condenados aqueles que almejam construir, mesmo por meio do diálogo e do consenso, uma sociedade menos injusta e assimétrica no Brasil.
Portanto a razão cerebral e a razão visceral apontam para a necessidade histórica e política da candidatura Lula para a presidência da república em 2018 e me incluo entre os que concordam com essa necessidade.
Porém temos que considerar diversos elementos legais e políticos para contextualizar a candidatura Lula num cenário que, até aqui, dá à Extrema Direita a segunda posição. Essa força política, no entanto parece ter chegado ao seu teto e tenderia a ser derrotada por qualquer candidato que a ela se opusesse no segundo turno.
Isso significa que em circunstâncias normais, o Brasil não elegeria a Extrema Direita à Presidência da República.
Entretanto, a legislação eleitoral prevê que se o candidato vencedor da eleição tiver sua candidatura impugnada, os votos recebidos por ele serão computados como nulos e assumiria o segundo mais votado.
Esse risco real de vitória espúria da Extrema Direita; considerando que o Judiciário mantem Lula preso injustamente, e que esse Judiciário, apesar de sabê-lo inocente, não hesitará em cumprir com o seu papel, previsto na Profecia de São Jucá, impugnando a diplomação de Lula; exige um manejo extremamente responsável da sua candidatura que deve assumir em consciência de causa, de que em nenhuma hipótese permitirá ao Brasil o risco de que seja governado pela Extrema Direita.
A certeza disso é necessária e a sua explicitação permitirá à candidatura Lula crescer ainda mais, liberada que estará das preocupações de muitos eleitores, dentre os quais me incluo, de que como efeito colateral de sua vitória pudéssemos resvalar para o mais vil nazi-fascismo, cuja eleição impossível como primeiro lugar não o seria como diplomado em segundo, por impugnação de um Lula vitorioso.
Portanto uma das coisas que a candidatura deve antecipar é que não permitirá em nenhuma hipótese que o Brasil e o seu povo corram esse risco.
Ora, essa afirmação de princípio da candidatura Lula, a ser enunciada o quanto antes, poderia, por exemplo, produzir a desidratação da candidatura da Extrema direita, que talvez tenha enxergado essa janela espúria para chegar ao Poder e dela esteja se aproveitando. Definida em qualquer circunstância a sua inviabilidade, é previsível que a formação dos palanques lhe seja menos favorável. Sim Lula é o maior eleitor e pode com o peso gravitacional que tem, também impedir a chegada ao Poder da Extrema Direita.
Essa desidratação poderia redistribuir os votos para a eleição presidencial e por exemplo levar ao segundo turno outro candidato da Frente Democrática, recém criada, e que reúne o PT, o PDT, o PSB, o PC do B e o PSOL. Se isso ocorrer, a candidatura Lula poderá ir até o fim, pois ainda que venha a ser impugnada pelo TSE, não haveria nenhum risco à democracia.
Não nos esqueçamos que, para a esquerda, uma eleição não serve apenas para eleger os candidatos mais alinhados ao povo. As eleições servem também e sobretudo para difundir o seu projeto de sociedade e para ampliar as bases da sua influência política ajudando-a a construir a sua hegemonia.
Desvencilhada publicamente dos riscos a candidatura voará livre, leve e solta e quem sabe com a sua força de arrasto possa levar ao segundo turno outra candidatura de Frente Democrática.
Esse seria uma bela avenida para a recomposição da democracia nesse sofrido país.
Do GGN

sábado, 5 de maio de 2018

LER MARX continua sendo ESSENCIAL para entender O MUNDO, por Luis Felipe Miguel

O aniversariante de hoje continua incrivelmente atual, na flor de seus 200 anos. Não acertou várias de suas previsões, é bem verdade. Afinal, ele foi um pensador, não um vidente. Também não escapou de ser um homem de sua época, com sua fé no desenvolvimento científico, às vezes caindo até num certo determinismo. Mas ninguém foi tão preciso, tão certeiro, na compreensão e na interpretação da sociedade capitalista. Muita coisa mudou de sua época para cá.
Escrevi um esboço deste texto dentro de um avião, num tablet - aposto que ele iria curtir tanto um quanto o outro. Mas o domínio da forma mercadoria estrutura o nosso mundo ainda mais do que estruturava o dele. Exploração, alienação e fetichismo são o nosso dia a dia. Nossa história é movida pela luta entre os que dominam e os que são dominados. O que ele descreveu em suas obras, ensinando-nos a ir além das aparências para apreender o significado mais profundo dos fenômenos sociais, permanece presente, e por isso lê-las continua sendo essencial para entender o mundo. E também, como ele disse num aforismo famoso, para tentar transformá-lo.
O futuro com que ele sonhou (ou, para usar uma palavra que ele rejeitaria, a utopia que ele abraçou) parece inalcançável. Creio que poucos apostariam hoje na abolição do Estado, na superação definitiva de qualquer escassez, na harmonia perfeita entre indivíduo e coletividade. Mas os valores que organizam seu projeto - fim da exploração, ampliação da autonomia de todos e de cada um, humanização das relações sociais - continuam no centro de qualquer projeto emancipatório.
Marx foi a referência central de minha formação intelectual. Outras influências vieram depois, mas ele nunca deixou de estar presente. Em especial, sempre permaneceu como o ideal, inalcançável, de combinação entre rigor teórico, clareza de expressão, riqueza de estilo e erudição. A cada página de seus textos - na ironia feroz que dirige a seus adversários, nas referências literárias que encaixa sem nenhum artificialismo para ilustrar o que diz, na montanha de dados que incorpora a seus argumentos, na precisão cirúrgica com que vira de avesso o senso comum, na indignação que atravessa seu olhar sobre as iniquidades do mundo - se revela a paixão que dedicou a seu trabalho.
Há um aspecto da obra de Marx que é talvez o mais difícil de ser assumido hoje: sua confiança no futuro da humanidade, na capacidade de ação dos oprimidos. Creio que não devemos abandonar esse aspecto, por mais que nossas circunstâncias pareçam desoladoras. Não por algum determinismo, por uma visão teleológica qualquer de que “caminhamos” necessariamente para uma sociedade melhor. Mas por entender que o mundo social nunca “é”, sempre está se fazendo. As contradições da sociedade estão presentes, ativas; o trabalho de construção da passividade nunca está concluído e não é invulnerável. O sentimento de impossibilidade de transformação é também um produto da ideologia, ao qual devemos resistir.
Quem sabe, no terceiro centenário, comemoraremos a agudeza de seu diagnóstico sobre uma sociedade já morta.
Do GGN

sexta-feira, 4 de maio de 2018

Karl Marx e a Liberdade de Imprensa, por Urariano Mota

Karl Marx 
O Dia Mundial da Liberdade de Imprensa foi celebrado na mais recente quinta-feira.  Em muitos lugares se publicou que a data lembrava a defesa do jornalista e a independência da informação. Viva! Desde 1993, a Unesco estabelecera o dia 3 de maio como o Dia Mundial da Liberdade de Imprensa. Viva, mais uma vez.
O jornal O Globo, entre outros, destacou:
“Há 25 anos, a Assembleia Geral da ONU proclamou 3 de maio como Dia Mundial da Liberdade de Imprensa, em uma ação para conscientizar o mundo para a luta a favor do simples direito de informar — sistematicamente violado mundo afora, seja através de violência, intimidação, censura ou desinformação deliberada. Muito mudou desde então, principalmente com o ascensão irrefreável das mídias digitais. Mas fazer jornalismo com liberdade, adverte a entidade, ainda é um desafio um tanto difícil....”
Mas que interessante:  Jornal Nacional, Jornal das Dez, CBN.... Sobre as dificuldades do jornalismo, da censura e desinformação deliberada, não temos como discordar do parágrafo acima, a partir do que vemos no próprio grupo midiático Globo.  O certo é que no Dia Mundial da Imprensa o tom geral das notícias omitiu a defesa da liberdade de opinião, o justo exercício da inteligência e sensibilidade do jornalista. E vem a recordação que na imprensa jornalista não tem opinião. A sua sempre será a do patrão. Um processo de comunismo invertido: o empregado pensa que é o pensamento do dono do seu trabalho.
Então é hora de trazer as luzes de Marx sobre a liberdade de imprensa. Em um de seus textos de juventude, na Gazeta Renana, ele escrveu:
“A imprensa livre é o olhar onipotente do povo, a confiança personalizada do povo nele mesmo, o vínculo articulado que une o indivíduo ao Estado e ao mundo, a cultura incorporada que transforma lutas materiais em lutas intelectuais, e idealiza suas formas brutas. É a franca confissão do povo a si mesmo,  e sabemos que o poder da confissão é o de redimir. A imprensa livre é o espelho intelectual no qual o povo se vê, e a visão de si mesmo é a primeira condição da sabedoria”.    (Destaque meu)
O que vale dizer, o povo não pode ser analisado, sequer visto, pelo que se publica nos jornais, rádio e tevê. Ali, a condição não é livre. Na mídia, não lhe reconhecem sequer humanidade, como no recente noticiário da CBN sobre o desabamento do prédio em São Paulo. Ao tranquilizar os cidadãos, vale dizer, os que merecem o nome, a emissora esclareceu: ali, só moravam moradores de rua e drogados. Ah, bom, nem parecem gente. Mas não só nesse caso. Nas notícias de todos os dias, quando um jovem negro é assassinado – aliás, nem é jovem, essa categoria nobre, é marginal, traficante, o que vem a ser o mesmo: negro e morador de favela merec a sua justiça. Em outros casos, quando fazem caras e bocas,  vozes e expressões de piedade, de “humanos” enfim (alô, alô, construtores de robôs, olhem os modelos na tevê).  Semelhante representação ocorre  quando noticiam, por exemplo, uma desempregada que sonha em ter uma máquina de lavar e chora na imagem,  ou na notícia da criança imigrante com o corpinho morto na praia. Penso que assim como os ingleses têm, ou tinham, a sua hora do chá, o tea time, podemos dizer que nesses momentos os apresentadores possuem o seu hypocrisy time. Emoção também se vê aqui. 
E continua o jovem Marx na Gazeta Renana, como se escrevesse para o Brasil deste 2018:
“Na medida em que a imprensa elogia diariamente as criações da vontade do governo, na medida em que o próprio Deus manifestou-se na seguinte forma sobre a sua criação, no sexto dia: ‘Verdadeiramente, foi muito bom’, na medida em que um dia necessariamente contradiz o outro, a imprensa mente constantemente e deve rejeitar a consciência de que mente, escondendo assim a sua própria vergonha” (Destaque meu)
Ora, como não lembrar esse Marx nas explicações da imprensa nacional sobre o mais medíocre e entreguista governo do Brasil até hoje? Seria cômico, se não fosse essencialmente trágico. Fala o comentarista econômico suavizando uma desastrosa ascensão: “Ele sobe, sobe, mas depois cai”. Ele estava falando do dólar. E a edição que se faz da quantidade massacrante de desempregados com carteira assinada?  “É, mas se abrem novas atividades”. O que vale dizer: vendedores em luta fratricida  nas ruas, a disputar pontos de venda de churrasquinhos. Enquanto ganham centavos, todos estão trabalhando. Diante dos programas sociais  que são cortados e se esvaziam, os âncoras (de quê, meu Deus? Dos náufragos?) falam que o “governo passa um pente fino para retirar os fraudadores de benefícios”. A saber: débeis mentais, deficientes de toda ordem, miseráveis que podem e devem trabalhar porque, afinal, ainda estão vivos.
O Karl Marx mais maduro, quarenta anos adiante da Gazeta Renana, na sua crítica à cobertura da imprensa inglesa sobre a Guerra Civil norte-americana, é um escritor, historiador e jornalista ao mesmo tempo:
“A Inglaterra, cuja indústria está parcialmente ameaçada de ruína através da estagnação na exploração de algodão dos estados escravagistas, acompanha o desenvolvimento da Guerra Civil nos Estados Unidos com intensidade febril.  
Durante meses os semanários e diários principais da imprensa de Londres reiteraram a mesma ladainha sobre a Guerra Civil Americana. Enquanto insultam os estados livres do Norte, eles se defendem ansiosamente contra a suspeita de serem simpatizantes dos estados escravagistas do Sul....
A guerra entre o Norte e o Sul – assim é a primeira escusa da imprensa inglesa –é uma mera guerra tarifária, uma guerra entre um sistema de proteção e um sistema de mercado livre. O senhor de escravos deve usufruir o trabalho escravo em sua totalidade ou ser roubado em uma parte dele pelos protecionistas do Norte? Está e a questão que está em litígio nesta guerra segundo a imprensa londrina”.
Em que lugar teríamos um jornalista que flagra a história e lhe dá uma visão de análise que será insuperável 200 anos depois? Nem mesmo o privilegiado e brilhante John Reed conseguiu tamanha altitude ao testemunhar a revolução de 1917. Escreve Marx:
“Mas, defende a imprensa londrina, a guerra dos Estados Unidos não é nada mais do que uma guerra pela manutenção da União pela força. Os ianques não podem se decidir a eliminar quinze estrelas de sua bandeira. Eles querem parecer colossais no palco mundial. Sim, seria diferente, se a guerra fosse pela abolição da escravatura! A questão da escravatura, no entanto, como, entre outros, declara categoricamente The Saturday Review, não tem absolutamente nada a ver com esta guerra...
Outro matador do Sul, Senhor Spratt, gritou: ‘Para nós é uma questão da fundação  de uma grande república escravagista’. Se, portanto, foi de fato apenas em defesa da União que o Norte desembainhou a espada, já não tinha o Sul declarado que a continuação da escravatura não era mais compatível com a continuação da União? A eleição de Lincoln como presidente deu o sinal para a secessão. No dia 6 de novembro de 1860 Lincoln foi eleito. A 8 de novembro de 1860 veio um telegrama da Carolina do Sul: ‘A secessão é considerada aqui como um fato consumado’”.        
Voltemos ao jovem Karl Marx. Agora, não tenho o necessário tempo e competência para refletir a crítica que ele faz ao profissional da imprensa, quando escreveu:  
“Mas a imprensa será verdadeira de acordo com a sua natureza, atuará segundo a nobreza da sua natureza, será livre, se for degradada à categoria de ofício? O escritor, certamente, deve ganhar sua vida a fim de existir e de poder escrever, mas não deve de nenhuma maneira existir e escrever a fim de ganhar a vida....  A primeira liberdade da imprensa consiste em que ela não seja um ofício” 
E cita, no escrito dos primeiros anos de luta jornalística,  as palavras de dois espartanos a um governante persa:
“Você sabe o que é ser um vassalo, mas nunca provou a liberdade para saber se ela é doce ou não. Porque, se a tivesse provado, teria nos aconselhado a lutar por ela não apenas com lanças, mas também com machados”.       
Ou como ele escreveu um dia, na crítica permanente à censura que continua nas redações da mídia do capital: “A censura pune a liberdade como se fosse um abuso”.  Essa é a melhor razão para se publicar nos sítios onde se pensa livre.  
*As citações dos artigos de Marx vêm do livro “A liberdade de imprensa”,  L & PM Editores, 1980.
 Do GGN

quinta-feira, 3 de maio de 2018

CONTROLANDO O COFRE é que se faz o VERDADEIRO COMBATE à corrupção, por André Araújo

O combate à corrupção como guerra mediática punitiva não é o caminho de longo prazo para mudança de qualidade na gestão do dinheiro publico. É pelo caminho dos sistemas de controle que se diminui a corrupção, esse foi o método dos Estados Unidos, que já foi a democracia mais corrupta do mundo no começo do século XX.  As eleições estaduais e municipais americanas eram habitualmente compradas, sendo notórias as máquinas eleitorais de Nova York (Estado e cidade) dominada pelo grupo “Tammany Hall”, do Missouri (grupo Prendergast), de Chicago (família Daley), Lousiana (Huey Long), esquemas que chegaram em alguns casos até os anos 60, quando a votação de John Kennedy em Chicago foi considerada comprada, versão quase unânime nos cursos de ciência politica dos EUA.
A França foi o primeiro País do mundo a desenvolver um sofisticado sistema de controle do dinheiro publico. Lá foi inventado o “droit administratif”, o direito administrativo que regula as funções do Estado, há mais de duzentos anos. A Escola Nacional de Administração forma os “inspecteurs de finance”, funcionários qualificados que tem as ferramentas para promover a eficiência dos gastos dentro de regras racionais. Com uma administração estável a França manteve o funcionamento da máquina pública través de três regimes monárquicos,  cinco Repúblicas, duas guerras mundiais, um governo sob controle estrangeiro (Vichy)  e meia centena de chefias de governo em dois séculos. A máquina pública francesa manteve suas engrenagens mesmo sob as piores condições politicas. O que não quer dizer que não exista corrupção na França, mas há um sistema de administração sólido funcionando.
No grande movimento de combate à corrupção no Brasil iniciado em 2014 não se fala em novas regras de finanças públicas, apenas em inquéritos, delações e punições porque o objetivo da cruzada que move esse processo é politico, a corrupção é a matéria prima necessária, sem ela o movimento não existiria, assim como o médico oncologista precisa do câncer para ter clientes. Nas “dez medidas contra a corrupção” não há uma única ideia sequer que vise diminuir as oportunidades de corrupção através do aperfeiçoamento dos controles, do aperfeiçoamento de métodos e sistemas de aprovação de gastos e projetos.
Vejamos alguns exemplos possíveis de combate a corrupção pela mudança de regras.
FUNDOS DE PENSÃO DE PREFEITURAS
Uma área de enorme corrupção com perdas substanciais dos recursos dos funcionários de Estados e especialmente de Municípios que deveriam contar com esses fundos para se aposentarem. Esse novo sistema foi estabelecido sem qualquer cuidado pela gestão.
Jamais deveria ser permitido a PREFEITOS administrarem esses fundos. Não há capacidade operacional para essa gestão nas prefeituras e a tentação de praticar fraudes é imensa.
Há quadrilhas especializadas em vender títulos frios a esses fundos, dezenas de casos já foram descobertos, MAS NÃO SE COGITA MUDAR O SISTEMA, fonte contínua de corrupção.
SOLUÇÃO: Os fundos estaduais e municipais devem ser apenas uma conta dentro de um FUNDO GERAL gerido pelo Banco do Brasil ou pelo BNDES, o Prefeito não pode tocar no dinheiro arrecadado, vai direto do funcionário para A CUSTODIA DO  Banco  e lá fica até ele se aposentar, é o banco quem deve gerir o fundo e não o Prefeito
ROYALTIES DO PETRÓLEO
Bilhões de Reais foram entregues a Estados e Prefeituras para os Prefeitos e Governadores gastarem como bem entenderem. A dilapidação dos recursos foi total. O Estado do Rio de Janeiro recebeu em dez anos 24 bilhões de Reais de royalties que simplesmente desaparecerem. As Prefeituras do Estado do Rio, algumas pequenas, receberam centenas de milhões de Reais, prontamente dissipados. A campeã foi a Prefeitura de Campos dos Goytacazes, quem em um só ano recebeu R$ 800 milhões, Macaé recebeu mais de um bilhão, Maricá este ano deve receber um bilhão, TODO ESSE VOLUME DE DINHEIRO sem vinculação com projetos, pode ser gasto em custeio, folha, obras eleitorais, estádios, não há destinação  racional para esse mega volume de dinheiro descontrolado, muitas vezes superior ao orçamento normal desses municípios, é muita tentação para qualquer Prefeito liquidar com esse dinheiro que em nada vai beneficiar o povo.  Como não se pensou em amarrar em esse dinheiro extra com projetos de interesse público? O Brasil tem experiência no método.
SOLUÇÃO : Esse recurso extraordinário e finito deve ser VINCULADO e usado exclusivamente em projetos CONTROLADOS PELO Banco do Brasil ou BNDES em educação, saúde e saneamento que devem ser aprovados e supervisionados pelos bancos gestores, onde os recursos devem ser depositados com liberação exclusiva para esses projetos aprovados.
ALUGUEL E CONSTRUÇÃO DE PRÉDIOS
Um dos grandes ralos de corrupção na União, Estados e Municípios, as obras para prédios  são superfaturadas e os alugueis muito acima do mercado. Não é só o orçamento das obras que deve ser fiscalizado, mas especialmente sua necessidade.
Decisões sobre obras e novas locações são tomadas pelo titular do Ministério ou do órgão sem qualquer controle superior ou, parametragem de custos por m2, não há um órgão CENTRAL nas administrações para controlar esse tipo de gasto muitas vezes perdulário.
Há necessidade de uma aprovação acima não só sobre as condições econômicas do contrato de locação, mas especialmente sobre a CONVENIÊNCIA do imóvel. O Poder Público tem muitos imóveis vagos e que são desprezados por autoridades que na melhor das hipóteses querem instalações luxuosas que demonstram prestígio e poder. Em Brasília isso é especialmente real, cito o caso da Secretaria de Aviação Civil que estava bem acomodada no Centro Cultural Banco do Brasil e em plena crise orçamentaria alugou andares de uma ultra sofisticada torre do centro financeiro de Brasília, o Ministério do Esporte na gestão de um Ministro de curta passagem e nome curioso abandonou um prédio que tinha folga de espaço onde o Ministério estava muito bem acomodado para alugar outro maior e mais caro, sem uma explicação lógica. Milhões de reais jogados no ralo por vaidade ou corrupção pura, ocorreu em todos os poderes, sem que haja uma preocupação com esse desperdício óbvio de dinheiro público.
O esquema funciona por todo o Brasil, nos Estados e Municípios, alugueis acima do mercado, prédios luxuosos demais, não se buscam zonas de aluguel barato, o Estado de São Paulo tem 6  Secretarias na região cara da Av. Paulista ou Itaim, quando poderiam estar no centro de aluguel barato. Os prédios são alugados para prestigio e conforto dos burocratas e nada tem a ver com o interesse público. O Poder Judiciário de 2ª Instância em São Paulo multiplicou de maneira impressionante o número de prédios para gabinetes em São Paulo, o Ministério Público do Trabalho alugou enorme torre na área nobre do centro financeiro da Av. Paulista, maior do que o Ministério Público Federal, na mesma região e que é um órgão de muito maior atividade.
Não há explicação lógica para órgãos que cuidam da pobreza, dos carentes, estarem em zonas nobres do centro financeiro de qualquer cidade. É um gigantesco ralo de desperdício do dinheiro público e o “ajustismo” nem toca nesse desperdício, não há um controle superior dessas locações, cada autoridade aluga o que bem entender, os Tribunais de Conta vão verificar se o contrato de locação tem firma reconhecida em cartório, ai termina o controle inútil, NÃO SE FAZ UM CONTROLE PREVIO PARA EVITAR O GASTO de um prédio novo.
Há que haver um órgão que use parâmetros de necessidade e valor para essas locações, que precisam ser justificadas e medidas numa relação atividade X custo x beneficio.
CURSOS E VIAGENS
Outro grande ralo, há agências de turismo especializadas em montar cursos em lugares distantes e até em resorts de praia para vender pacotes de treinamento para órgãos públicos, em parceria com firmas de cursos. Raramente esses cursos tem alguma utilidade real, são centenas a cada ano, os funcionários adoram, todo mundo ganha, as agências, as linhas aéreas, os hotéis, quem perde é o contribuinte que sustenta esse circo de futilidades, é uma grande indústria em crescimento. O máximo da frivolidade  são “cursos de liderança” com estrelas aposentadas do esporte e do mundo do entretenimento. O setor é tão rendoso que há agências especializadas em  parlamentares, em tribunais, em funcionários de 2º escalão.
Na alta hierarquia dos três poderes outro tipo de agência inventa ou pesquisa “seminários” na Europa ou EUA para autoridades viajarem ganhando altas diárias para eventos inúteis, pretensamente importantes e QUE NÃO TEM NENHUMA UTILIDADE PARA O PAIS, são pretextos para fazer turismo com dinheiro público. O viajante pode também ser palestrante no evento para justificar a viagem. Uma palestrinha de uma hora serve de “cobertura” para uma viagem de dez dias com diárias altas e passagens aéreas, gastos que continuam em pleno regime do “ajustismo” quando se cortam bolsas família e auxilio desemprego, aposentadorias do FUNRURAL, auxílios doenças e outros tipos de despesas para pobres, pode-se até justificar mas como não há “ajuste” nos ralos  no 2º andar da Administração Publica? Continua tudo normal, inclusive lanches exóticos em palácios, ajuste onde?
Não existe na história das finanças públicas no mundo ajuste sem EXEMPLOS em cima.
No imediato pós Segunda Guerra a Inglaterra passou por cinco anos de cinto apertadíssimo, o pais quebrado pela guerra, estabeleceu-se racionamento de comestíveis, o primeiro a entrar no racionamento foi o Rei Jorge VI e família, um ovo por semana por pessoa, o Palácio de Buckingham de luz apagada para poupar energia, o Primeiro Ministro Attlee só andava de taxi, sem carro oficial. Até hoje esse espirito paira sobre o Reino Unido, a Rainha Elizabeth II faz viagens oficiais de avião comercial, a Monarquia vendeu o avião e o iate Britannia.
Coisa ainda pior são “cursos livres”, basta pagar para entrar, em universidades caras da Europa e EUA, cursos de seis meses ou um ano, TUDO A CUSTA DO DINHEIRO PÚBLICO, os clientes são altas autoridades que assim passam um ano no exterior, apreendendo matérias que rarissimamente tem alguma utilidade par o Estado, GANHANDO SALÁRIO INTEGRAL NESSE PERIODO DE FÉRIAS DISFARÇADAS, além do custo do curso, das passagens e estadia, tem altos funcionários dos três poderes “especializados” em cavar esses cursos, há casos de “profissionais de fazer curso” com dinheiro público que em 30 anos de carreira gastaram 20 fazendo cursos por todos os lugares do mundo, tudo pago pelo contribuinte e sem que haja qualque aferição do proveito do Estado nesse gasto. É uma forma de gasto público que tem o mesmo efeito econômico da corrupção, dinheiro público queimado na fogueira.
Há um candidato presidencial que se encaixa nessa categoria de “turismo de cursos no exterior", precisa ser especialista para “descolar” um curso atrás de outro sem gastar.
PROPAGANDA OFICIAL
Outra drenagem  dinheiro público, propagandas inúteis  e sem lógica de interesse real, publicidade cujo alvo final e elevar o capital politico da autoridade, “disfarçada” em campanhas para que o público esteja bem informado, a surrada desculpa que não se dão ao trabalho de variar, “precisamos informar o cidadão” dizem, como se estivessem minimamente preocupados com esclarecer o público sobre qualquer coisa.
São contratos volumosos, em nível Federal, Estadual e Municipal, tudo marketing de carreira e de currículo de Ministros, Governadores e Prefeitos, geralmente para calçar uma próxima eleição.
O Tribunal Superior Eleitoral gasta dinheiro público em publicidade, não é sua função correr atrás de eleitores, Tribunal por definição não faz propaganda, não é fábrica de biscoitos.
É muita vontade de torrar dinheiro público, são instituições de Estado, não tem que fazer marketing.  As estatais publicam balanços de varias paginas ou cadernos inteiros como a PETROBRAS, mais de 20 paginas no jornal VALOR. A pratica mundial é a publicação de resumos sumários de balanços, sem anexos, apenas os dados básicos em milhões, nenhuma grande empresa multinacional publica em jornais de grande circulação balanços com dez ou 20 paginas de detalhes de anexos, estatais de capital fechado como a COBAL publicam balanços com anexos de quatro ou seis paginas, para que, quem do grande publico vai ler varias paginas em letra miúda, é só gasto inútil , especialmente quando tudo isso pode ser colocado de graça na internet,  torrar dinheiro do contribuinte com espaços enormes e inúteis e antes de mais nada “pedágio” para comprar a boa vontade do jornal ou da revista, cadê o ajuste?
TRANSPARENCIA DOS GASTOS
O Poder Público deve informar a cada trimestre os gastos por grupo de despesas, em milhões de Reais e não com o ridículo preciosismo de colocar até o ultimo centavo. Os Ministérios americanos publicam listagem de gastos na internet todo mês EM MILHÕES DE DOLARES, não tem esse volúpia de colocar até o ultimo centavo, só para confundir, tabelas simples de olhar e entender, quanto se gastou nisso e naquilo, um simples quadro de números.
Quanto se gastou em passagens naquele trimestre? R$ 234 milhões de Reais e pronto, isso já é suficiente para o cidadão se informar, não precisa detalhar mais.
O caso das passagens aéreas é típico. A União gasta entre R$2,5 a 3 bilhões de Reais em passagens aéreas, é o maior comprador do País, MAS NÃO NEGOCIA EM BLOCO. Cada órgão compra suas passagens pelo preço cheio, de balcão, o mais caro que as linhas aéreas cobram.
As multinacionais americanas compram antecipadamente  bilhetes em BLOCO para o ano seguinte, conseguem descontos de até 70% no preço, o mesmo com diárias em rede de hotéis.
A compra é feita por previsão, não precisa marcar as passagens, apenas garantir aquele volume em cada linha aérea. Quase todas as grandes multinacionais do mundo fazem isso e ninguém chega perto do que o Governo do Brasil compra em passagens.
CONTROLANDO O GASTO FUTURO E NÃO O GASTO DO PASSADO
O Brasil gasta uma fabula com TRIBUNAIS DE CONTAS que fiscalizam carimbos e certidões, verificam  gastos já feitos, correm atrás do prejuízo irrecuperável, é pura perda de trabalho, dinheiro e tempo. O sistema dos EUA é CONTROLAR O QUE VAI SER GASTO, esse é o conceito do ESCRITORIO DE CONTAS DO CONGRESSO, o GAO- General Accountability Office.Não vão atrás de dinheiro de cafezinho na repartição, o GAO analisa o gasto futuro e pode vetar o que pretendia o valor orçado e ai que economiza dinheiro publico, não vai atrás de documentos, certidões, editais, carimbos, firmas reconhecidas, faz ANALISE ECONOMICA DE UTILIDADE.
Exemplo: Aparece um projeto par construir um hospital em determinada região, o GAO manda seus inspetores verificar se o hospital é REALMENTE necessário OU se não fica mais barato aumentar um hospital já existente OU se não existe  um prédio pronto que pode ser comprado e nele se fazer um hospital OU se não fica mais econômico fazer um convenio com um hospital particular na região. A função do GAO é ECONOMIZAR DINHEIRO PUBLICO que vai ser gasto e antes que ele seja gasto. O GAO cancelou 2 trilhões de dólares em gastos com armamentos que iriam ser gastos em PROJETOS RUINS, de baixa eficiência, provando que aquele projeto era desperdício, o mais famoso desafio foi o bombardeiro stealth (invisível para radar) LRS . O GAO arbitrou o contrato que tinha de um lado a Boeing e a Lockheed e de outro a Northrop, um negócio de US$80 bilhões, fez a analise custo beneficio e considerou mais conveniente a opção Northop, em meio a grande controvérsia com o Pentagono, prevalecendo a decisão do GAO sob sérios protestos da Boeing.  O alvo é sempre fazer o melhor negocio possível para o dinheiro publico em cada projeto.
 O GAO também fez um estudo para ver quantas bases militares já eram inúteis ao fim da Guerra Fria e mandou fechar 800 BASES PELO MUNDO, o Pentagono nunca fecharia por vontade própria, as bases já eram INUTEIS e consumiam uma vasta despesa por estarem abertas, mas existe o axioma de que a burocracia jamais corta na própria carne por vontade própria, a tendência é a expansão de pessoal, prédios e gastos porque isso aumenta o poder do burocrata, isso acontece nos EUA, no Brasil e em todo lugar.
O GAO tem 3.500 funcionários e custa 600 milhões de dólares por ano, para cuidar do País inteiro. O Tribunal de Contas do município de São Paulo tem 600 funcionários e custa 550 milhões de Reais por ano, tem 170 auxiliares de gabinete de livre nomeação, são apenas 5 Conselheiros,  desconhece-se quanto de economia conseguiu para o município, mas há milhares de processos tipo faltou uma certidão negativa do vidraceiro que  trocou uma janela. Além do município de São Paulo, o Rio de Janeiro também tem um Tribunal de Contas municipal, os 27 Estados e o Distrito Federal tem cada um seu tribunal de contas e o maior de todos, o da União, o sistema todo deve custar cinco ou seis  vezes mais do que o GAO americano, os TC brasileiros tem  eficiência REAL mínima, controlam a forma e não a essência do fasto, vão atrás de filigranas ou mandam parar obras de bilhões por erros de edital, causando um prejuízo muito maior que o erro porque não se guiam por parâmetros econômicos, apenas jurídico-burocráticos, esta havendo uma evolução nos TC por causa do corpo técnico mas o modelo com nomeação de “juízes” políticos e completamente furado, sem falar de outros e conhecidos problemas como os do Tribunal de Contas do Estado do Rio, onde todos os conselheiros foram presos por corrupção, para aprovar contas cobravam comissão dos fornecedores do Estado.
No campo da corrupção a cruzada moralista  tenta copiar os modelos judiciais americanos sem sequer cogitar de importar os MECANISMOS DE CONTROLE DE GASTOS PUBLICOS, algo muito mais importante do que correr atrás do prejuízo com inquéritos contra corruptos que já causaram  o prejuízo e gastaram o dinheiro  e vão custar mais ao Estado depois de presos.
Há, todavia, um problema. Implantar sistemas modernos de controle de gastos não rende mídia, não dá capa de VEJA, não levanta o ego. É só trabalho sem gerar capital politico.
Melhor é produzir escândalos diários, com GLOBONEWS divulgando “informações a que tivemos acesso com exclusividade”, prisões de empresários velhos na madrugada, escrachos, tudo sem mudar o sistema, só enxugando o gelo da corrupção sem limpar o terreno que aduba a corrupção, a corrupção é um sistema, para combate-la é preciso método e não algemas.
Do GGN