A primeira pesquisa presidencial do Ibope do ano, contratada
pela CNI (Confederação Nacional da Indústria), confirma: Lula segue disparado
na frente, com 33% das intenções de voto, seguido por Jair Bolsonaro, com 15%,
Marina Silva, com 7%, Geraldo Alckmin, com 4%, e Ciro Gomes, com 4%; Lula, no
entanto, vem sendo mantido como preso político em Curitiba para não disputar
uma eleição que ele venceria com facilidade; todos os demais candidatos somados
têm 36%, o que indica claramente a chance de vitória do ex-presidente no
primeiro turno.
A pesquisa foi realizada entre 21 e 24 de junho com 2 mil
eleitores em 128 municípios. A margem de erro é de 2 pontos percentuais. Sem
Lula no cenário ofertado aos eleitores, as eleições tornam-se uma fraude:
brancos e nulos ganham com os mesmos 33% do ex-presidente.
Veja os cenários da pesquisa estimulada (quando são
apresentados os nomes dos candidatos):
O termo “assassinato de reputação” já se inseriu no
vocabulário corrente das disputas comerciais e políticas. Já “suicídio de
reputação” é um elemento novo e que fica nítido na atuação do Ministro Luiz
Edson Fachin, do STF (Supremo Tribunal Federal).
Por que um jurista, que passou a vida toda construindo uma
imagem social e garantista, dá uma guinada de 180 graus? E com um enorme
agravante: foi garantista quando o Poder (que o nomeou para o STF) valorizava
os garantistas; tornou-se punitivista feroz e parcial na hora em que o Poder
demanda punitivismo com um foco muito claro de impedimento da candidatura Lula
à presidência. Isso, depois de ter sido um eloquente defensor da candidatura
Dilma Rousseff em 2014.
Até o mais insensível dos personagens se daria conta do risco
de imagem contido nessa combinação. Fachin envolveu-se em uma guerra santa sem
limites, não apenas nos seus votos, mas apelando para todas as manobras
processuais, essa esperteza que é veneno na veia na imagem do Judiciário e do
próprio Supremo.
Quatro episódios mostram seu aggiornamento:
1. O voto de Rosa Weber sobre prisão após sentença em segunda
instância que julgava especificamente o caso Lula. Todos os juristas citados
eram familiares a Fachin, e nenhum anteriormente havia sido citado nos votos de
Weber.
2. A retirada de pauta do HC de Lula no julgamento da 2a
Turma, de forma canhestramente combinada com o TRF4.
3. A remessa do novo julgamento de HC de Lula para plenário,
evitando assim que entrasse na pauta da 2a Turma, quando tudo indicava que a
tese da libertação seria vitoriosa, e postergando ainda mais o julgamento.
3. Ontem, no julgamento de José Dirceu, o pedido de vista
depois que a libertação havia conquistado maioria.
4. Votou a favor da decisão absurda de um juiz de 1a
Instância, de ordenar busca e apreensão no apartamento funcional de uma
Senadora da República.
É evidente que há intenções políticas em jogo. Mas o que está
por trás dessa autofagia? Vamos a um jogo de alternativas:
[ ] Seu histórico em relação ao punitivismo.
Não bate. Fachin era advogado de movimentos sociais.
[ ] Deslumbramento midiático.
Ao contrário de seu colega Luís Roberto Barroso, Fachin não
se vale do cargo para satisfazer o próprio ego.
[ ] Indignação com a corrupção e com o PT.
Nem Celso de Mello, visceralmente contra o PT, ousou ir tão
longe.
[ ] Busca de contrapartidas espúrias.
Não há nenhuma evidência de que Fachin se conduza por
corrupção.
[ ] Emparedamento.
É a situação em que a pessoa faz algo contra sua vontade, por
alguma ameaça ostensiva ou sub-reptícia.
[ ] Medo
Medo, aquele sentimento irresistível que acomete a pessoa
quando se vê alvo da besta, a massa que invade as ruas com sangue nos olhos e
intimida os fracos.
O ponto vulnerável de Fachin pode ser seu escritório de
advocacia. Não que possa ter cometido algum crime. Mas, talvez, por algumas
ações moralmente indefensáveis. A suscetibilidade de um Ministro de STF é
infinitamente maior do que de cidadãos comuns atingidos por medidas suas.
De qualquer modo, tem-se uma certeza e uma incógnita. A
certeza é quanto ao suicídio de reputação perpetrado por Fachin; a incógnita é
quanto aos motivos.
Tecnicamente, o recurso apresentado pela defesa de José
Dirceu é, em tudo, igual ao que foi apresentado por Lula- e derrotado por 6 a 5
no plenário do Supremo Tribunal Federal – com a única e vital diferença de que
foi, como deveria ter sido o do ex-presidente, apreciado pela 2ª Turma, que
julgou o pedido do ex-ministro.
Só essa, nada mais.
E o foi porque Edson Fachin preferiu remetê-lo para o
plenário, por uma decisão política, tal como fez agora mesmo com o pedido de análise
do recurso extraordinário do ex-presidente, negado arbitrariamente pelo
Tribunal Regional da 4ª Região, depois de muitas manobras protelatórias.
Em condições normais, dificilmente Dirceu teria sido
libertado. Outras vezes, no STF, o ex-ministro experimentou decisões
impiedosas.
Portanto, o diagnóstico correto é que ao menos quatro
ministros do STF – além dos três que votaram na 2ª Turma (Dias Tófolli,
Gilmar Mendes e Ricardo Lewandowski), também Marco Aurélio Mello – já não
suportam os procedimentos cavilosos de Edson Fachin e Cármem Lúcia (com o
suporte barulhento de Luiz Roberto Barroso) para fazer o Supremo ser agente
político-eleitoral.
A mídia supreeendeu-se com a decisão e, pela primeira vez em
muitos dias, tirou a Copa da manchete de seus sites para escandalizar-se com
uma decisão que, afinal, nada tem de surpreendente, exceto o fato de que parte
de um tribunal acoelhado resolveu insurgir-se contra o ‘meganhismo’ de toga.
Não se pode falar que a 2ª Turma recusou uma decisão do
plenário, porque decisão de plenário não pode haver quando o placar de 6 a 5
se formou com uma ministra – Rosa Weber – diz que pensava o contrário, mas que,
por não estar se julgando a tese, mas um caso, não poderia dar um voto contra
uma maioria que, aliás, não integrou.
É possível que, amanhã, algum dos ministros peça, no
plenário, que Cármen Lúcia coloque em votação o que deve ser votado: a questão
constitucional da prisão antes do trânsito em julgado de sentenças,
sobre quando e como podem ou não podem ocorrer.
Repito o que disse ontem: o que torna insustentável a crise
interna do STF não é como se julga, mas o que se julga, quando se julga e quais
são os ministros que julgam.
E, claro, o fato de que os casos de maior repercussão
política, como estes, de Dirceu e Lula, estejam entregues a um micróbio
jurídico e moral como Luís Edson Fachin.
Não posso fechar o texto sem observar que, para um militante
como José Dirceu, muito mais importante que ter recuperado sua própria
liberdade, é ter aberto o caminho para a libertação de Lula.
José Dirceu antes de ir preso. Imagem: Lula Marques/Fotos
Públicas
José Dirceu deixará a prisão com a liminar concedida hoje
pela segunda turma do Supremo Tribunal Federal, em habeas corpus apresentado
pela defesa do ex-ministro. A turma decidiu que José Dirceu tem direito a
aguardar em liberdade o julgamento dos recursos nas cortes superiores — além do
STF, o Superior Tribunal de Justiça.
O advogado Roberto Podval apresentou reclamação à corte
argumentando que ele não poderia ficar preso já que sua condenação não tinha transitado
em julgado. Além disso, a detenção, ordenada pelo TRF-4 (Tribunal Regional
Federal da 4a Região), teria ocorrido baseada em uma súmula daquele tribunal
que diz que a prisão depois de condenação em segunda instância, como ocorre com
Dirceu, deve ser automática.
Os advogados afirmam que, ao contrário do que diz a súmula, a
prisão, mesmo depois de segundo grau, deve ser fundamentada, segundo nota
publicada na coluna Mônica
Bergamo, da Folha.
A maioria dos ministros concordou com os argumentos. De
acordo com entendimento da 2a Turma, a prisão só pode ocorrer nessa etapa se
houver fundamentos para isso.
É uma situação idêntica ao do ex-presidente Lula, que teria
hoje um recurso analisado pela segunda turma não fosse a manobra do ministro
Edson Fachin, que arquivou a ação.
Hoje, percebendo que Dirceu obteria o habeas corpus, Fachin
tentou uma nova manobra. Ele pediu vistas do processo — o que poderia prorrogar
a decisão indefinidamente.
O ministro Dias Toffoli, no entanto, concedeu a liminar. Foi
seguido por Ricardo Lewandowski e Gilmar Mendes.
No final de semana passado, o ministro Edson Fachin retirou
da pauta da segunda turma do Supremo Tribunal Federal o julgamento de um
recurso de Lula que poderia, entre outras opções, culminar na transferência do
petista para a prisão domiciliar. Fachin agiu para barrar uma eventual vitória
de Lula no STF, em tabelinha com o Tribunal Regional Federal da 4ª
Região.
A vice-presidência do TRF-4, a quem cabe analisar a
admissibilidade da apelação de Lula em tribunais superiores, rejeitou a larga
maioria dos argumentos inseridos pela defesa do ex-presidente no recurso
extraordinário ao Supremo. Isso foi feito faltando faltando 4 dias para a
análise na segunda turma.
Uma hora após a decisão no TRF-4, Fachin alegou que a
situação processual de Lula foi alterada e enterrou a análise da medida
cautelar que seria feita pela segunda turma na terça (26). Essa medida pedia,
em suma, que a pena de Lula fosse suspensa até o fim do julgamento dos recursos
ao caso triplex nas instâncias superiores ao TRF-4.
Na prática, o ex-presidente poderia ser solto e ficaria apto
a concorrer à Presidência. Com a decisão de Fachin, as chances de isso ocorrer
em um futuro próximo foram praticamente anuladas.
Abaixo os detalhes da decisão da vice-presidente do TRF-4,
Maria de Fátima Freitas Labarrère.
Ela rebateu 8 argumentos da defesa da seguinte forma:
1) MORO NÃO É O JUIZ NATURAL DO CASO TRIPLEX
A defesa de Lula alegou que o juiz natural da causa deveria
ser de São Paulo, onde os fatos relatados teriam supostamente ocorrido.
A vice-presidente do TRF-4 decidiu que "não merece
trânsito a pretensão recursal no que concerce à alegação de violação ao
princípio do Juiz natural, uma vez que tal exame depende da prévia análise das
normas infraconstitucionais". Ela citou decisão do STF que define: "O
Supremo Tribunal Federal já assentou, sob a sistemática da repercussão geral,
que suposta ofensa aos princípios do devido processo legal, da ampla defesa, do
contraditório e dos limites da coisa julgada, quando a violação é debatida sob
a ótica infraconstitucional, não apresenta repercussão geral, o que torna
inadmissível o recurso extraordinário."
2) TRIPLEX NÃO DEVERIA SER PROCESSO DA LAVA JATO
3) PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA DE LULA FOI VIOLADA
4) MORO É UM JUIZ PARCIAL
A defesa de Lula alegou que uma decisão assinada pelo próprio
juiz de Curitiba expõe a falta de elo entre o caso triplex e 3 contratos da
Petrobras citados na denúncia. Para condenar o ex-presidente, Moro usou não a
denúncia original do Ministério Público, mas uma delação premiada segundo a
qual a OAS tinha um caixa fictício de R$ 16 milhões em propinas a favor do PT.
A reforma do triplex - que foi paga com dinheiro da OAS Empreendimentos, que
tampouco tem relação comercial com a Petrobras - supostamente viria a ser abatida
desse caixa no futuro.
A vice-presidente do TRF-4 definiu que a "alegação de
excesso de acusação e imparcialidade do juiz igualmente não é de ser admitido o
recurso" pois "no que tange à suspeição do juiz, tem-se
que a ofensa aos dispositivos constitucionais invocados, ainda que fosse
reconhecida, afetaria os preceitos constitucionais somente de modo indireto ou
reflexo, cuja reparação é inviável em recurso extraordinário."
Além disso, "o acolhimento da teses levantadas pela
defesa demandaria o revolvimento do conjunto fático-probatório, o que é vedado
no âmbito do recurso extraordinário." A Súmula 279 do STF, na verdade,
diz: "Para simples reexame de prova não cabe recurso
extraordinário."
5) PROCURADORES NÃO FORAM SÉRIOS E IMPESSOAIS E USARAM CONVICÇÕES
NO LUGAR DE PROVAS
A defesa alegou que os procuradores atuaram no caso triplex
como inimigos públicos de Lula “não em razão de fatos típicos efetivamente
imputados, mas por causa da convicção desses agentes
institucionais."
A vice-presidente apontou que não entendeu a
"retórica" dos advogados contra os procuradores e citou passagem do
Supremo onde consta ser "inadmissível o recurso extraordinário, quando a
deficiência na sua fundamentação não permitir a exata compreensão da controvérsia."
6) AMPLA DEFESA E CONTRADITÓRIO FORAM VIOLADOS
Os advogados de Lula citaram vários atos praticados por Moro
durante o julgamento para impedir produção de provas ao passo em que era mais
permissivo com o Ministério Público.
Labarrère, mais uma vez, disse que a reclamação demanda
reexame de provas, o que não deve ser feito em recurso extraordinário. "A
sistemática dos recursos excepcionais impõe que o exame levado a efeito pelos
Tribunais Superiores fique adstrito às questões de direito, uma vez que os temas
de índole fático-probatória exaurem-se com o julgamento nas vias ordinárias.
Isto importa em dizer que o exame da matéria fática e das provas é efetivado
com profundidade e se esgota no segundo grau de jurisdição."
7) TRF-4 IGNOROU PROVAS APRESENTADAS APÓS SENTENÇA DE
MORO
8) LULA FOI CONDENADO SEM TIPIFICAÇÃO DE CRIMES E COM USO DE
DELAÇÕES, SENDO QUE A DOSIMETRIA DA PENA É QUESTIONÁVEL
Nestes dois tópicos, advogados manifestaram que a condenação
de Lula "pela prática de corrupção passiva e lavagem de dinheiro sem a
presença das elementares do tipo e com base na palavra de dois corréus
configura manifesta contrariedade" à Constituição. Também viola a ampla
defesa a atitude do TRF-4, que alegou fim de prazo para analisar provas novas e
além de confirmar a sentença de Moro, majoraram a pena apenas para evitar a
prescrição.
Nestes casos, a vice-presidente do TRF-4, mais uma vez,
reciclou a desculpa de que não é possível debater mais essa reclamação sem
entrar no mérito das provas, o que não cabe em recurso extraordinário.
Dessa maneira, ela rejeitou na íntegra a admissibilidade do
recurso de Lula ao STF.
RECURSO ESPECIAL
Quanto ao recurso especial ao Superior Tribunal de Justiça,
ela só acolheu uma reclamação: sobre Moro ter condenado Lula a reparar os R$ 16
milhões fictícios que a OAS disponibilizou ao PT, em vez de usar o valor do
triplex na ação, de R$ 3,7 milhões (construção e reforma em valores
atualizados).
Segundo informações do TRF-4, Lula tem direito de recorrer da
decisão interpondo "agravo no TRF4 (artigo 1042 do CPC), um para cada um
dos recursos negados [extraordinário e especial]. O Ministério Público Federal
deve ser intimado para apresentar contrarrazões. Os autos são submetidos à
vice-presidência e, não havendo a reconsideração, os recursos são enviados aos
tribunais superiores."
Ainda segundo o TRF-4, os recursos excepcionais –
extraordinário e especial – são submetidos a um duplo juízo de admissibilidade.
O tribunal de origem faz uma espécie de filtro, analisando o preenchimento dos
requisitos de admissibilidade. Nas Cortes Superiores é realizado novo exame de
admissibilidade.
Esta semana fui procurado por um jornalista inglês que veio ao Brasil com uma missão especial: investigar os motivos que levaram a Lava Jato a ignorar as operações da área internacional da Petrobras, poupando das investigações dois dos mais notórios corruptores corporativos do planeta: a Trafigura e a Glencore, tradings de comercialização de petróleo que negociam com a Petrobras.
É um trabalho ao qual dedicará seis meses. Já teve
acesso a documentos internos da Petrobras, nos quais se vê Jorge Zelada,
ex-diretor da área internacional defendendo propostas da Trafigura, e o
presidente José Gabrielli e Almir Barbassa negando.
Não apenas isso.
Sabia-se desde sempre que a área de comercialização
de petróleo e derivados é aquela onde corre mais dinheiro.
Na delacão de
Nestor Cerveró [2], ele fala dos negócios que aconteciam
na área de comercialização. Diz que as tradings de combustíveis
movimentavam valores muito maiores do que os afretamentos de navios. Ambas as
operações não necessitavam de aprovação prévia da diretoria. A Petrobras chegou
a negociar 300 mil barris de petróleo e 400 mil barris de diesel por dia.
Segundo ele, centavos nessa operação podem render milhões de dólares em propina
ao final do mês.
Na delação, ele aponta Mariano Marcondes Ferraz
como o intermediário das propinas da Trafigura. Na época Marcondes Ferraz fazia
parte do board internacional da empresa.
Em sua delação, Paulo Roberto
Costa, que recebeu mais de US$ 800 mil de Marcondes Ferraz, também
liga os valores à Trafigura. Informa que o procurou em nome da Trafigura,
pagando inicialmente US$ US$ 600 mil em propinas através de uma conta em nome
da off-shore OST Invest & Finance Inc., em um banco em Genebra, Suíça.
Também o operador
Fernando Soares [2], o Fernando Baiano, atribui à Trafigura o
controle da empresa de tancagem Decal, em Suape, beneficiada pelas propinas de
Marcondes Ferraz.
Na busca e apreensão realizada na residência de
Paulo Roberto Costa [3],
aparecem anotações “Trafigura – Aluguel do Terminal de Tancagem (Suape)”.
A prisão de Mariano ecoou nos principais jornais
econômicos do mundo, por jogar a Trafigura no centro da Lava Jato.
A própria Lava Jato sabia estar entrando em um novo
terreno “fértil de ilicitudes”.
Com a prisão preventiva do empresário Mariano
Ferraz, detido no aeroporto de Guarulhos nesta quarta-feira, 26, quando estava
prestes a embarcar para Londres, a força-tarefa da Lava Jato avança sobre uma
área ainda não investigada na Petrobrás: o setor de compra e venda
internacional de combustíveis e derivados que pode atingir, além do PT, o PMDB
e o PSDB.
Segundo a Lava Jato, o grupo internacional Trafigura,
do qual Ferraz é executivo, movimentou US$ 8,6 bilhões em compras e vendas de
derivados de petróleo com a Petrobrás entre 2003 e 2015. Não é a primeira vez
que a área de trading de combustíveis e derivados do petróleo, que é submetida
à Diretoria de Abastecimento, aparece na operação.
Em suas delações premiadas, o ex-diretor
Internacional da Petrobrás, Nestor Cerveró, e o ex-senador Delcídio Amaral
relataram que essa área era um “terreno fértil para ilicitudes”, pois os preços
poderiam variar artificialmente gerando uma “margem para propina”. O próprio
Cerveró disse que a a Trafigura era uma das principais empresas atuantes neste
setor na estatal e que as negociações diárias “podem render milhões de dólares
ao final do mês em propina”.
Essa mesma blindagem se observou na Suiça. As
primeiras investigações sobre a corrupção em Angola foram encerradas em 2004 pelo
Ministério Público suíço. Uma nova denúncia, em 2006, não levou à retomada das
investigações. Mesmo porque envolvia a União de Bancos Suíços (UBS).
"Eu posso confirmar que o Ministério Público
abriu uma investigação criminal sobre um funcionário da empresa que você
conhece", disse uma porta-voz em resposta enviada por e-mail para uma
consulta sobre relatórios de mídia de tal investigação sobre um ex-executivo
sênior da Trafigura. "Esta investigação faz parte do complexo de processos
da Petrobras".
Apesar da estreita colaboração entre Ministérios
Públicos brasileiros e suíços, desde então, nada mais se soube sobre as
investigações envolvendo a Trafigura. A última notícia que se tem é de 1º de fevereiro
de 2017, quando o MPF de Curitiba solicitou autorização para
prisão preventiva, bloqueio de bens e busca e apreensão de Jorge Antônio da
Silva Luz, Bruno Gonçalves e Apolo Vieira Santana, funcionários da Petrobras
que atuavam na área internacional.
É esse o mistério que o jornalista inglês pretende
desvendar.
Historicamente, o petróleo mundial foi explorado
pelas chamadas Sete Irmãs, as grandes petroleiras, as majors que dominaram o
setor até os anos 70 e operavam na exploração e na distribuição. A partir de
então, começam a crescer as empresas estatais dos países produtores do Oriente
Médio, África e América Latina.
As novas companhias não faziam a comercialização e,
por isso, passaram a recorrer a tradings. Duas se destacaram como os piores
exemplos da financeirização da economia global e do uso da corrupção em larga
escala: a Glencore, de cujas entranhas nasceu a Trafigura – montada por
ex-operadores da trading mãe.
Ambas deixaram um rastro de corrupção incomparável,
especialmente em suas negociações com África e América Latina. Ao
contrário da Petrobras, vítima de corrupção, nas duas tradings a corrupção
fazia parte de seu modelo de negócio.
Fundador da Glencore, Marc Rich conseguia que
ditadores vendessem óleo através da Glencore, pagando um “por fora” de 5 a 10
dólares por barril. Com isso, ocupou o espaço de majors, como a Shell, que não
pagavam comissão.
Até então, a negociação era feita com contratos de
longo prazo. Rich ajudou a formar o mercado à vista. Foi condenado a 300 anos
de prisão nos Estados Unidos por sonegação fiscal. Fugiu dos EUA, se escondeu
na Suíça. Como fugitivo, chegou a ser considerado um dos dez mais procurados do
planeta.
“seu mandado de captura internacional ficou
circulando até 20 de janeiro de 2001, último dia do mandato do Presidente Bill
Clinton, que lhe deu completo perdão criminal e fiscal, mandou encerrar todos
seus 65 processos. A decisão de Clinton foi legal, mas ele sofreu uma bateria
de críticas violentas, especialmente porque Rich e sua esposa Denise foram
grandes doadores de campanha para Bill Clinton”.
Hoje em dia, a Glencore negocia US$ 800 bilhões por
ano, atuando na área de petróleo e no setor de não ferrosos, através de sua
subsidiária Xstrata.
A Trafigura foi montada por um grupo de operadores
que havia trabalhado na Glencore, liderados por Claude Dauphin, falecido em
2015, e um corruptor à
altura de Rich. Foi condenado na Costa do Marfim por jogar lixo
tóxico no mar, passou seis meses na cadeia. Foi acusado de ter desviado
recursos de fundos humanitários da ONU.
O auge da corrupção foi a conquista da Angola. E
aqui se juntam os destinos da Trafigura e do ex-playboy Mariano Marcondes
Ferraz, que se tornou um dos meninos de ouro de Claude Dauphin.
Peça 3 – a disputa pelo petróleo em Angola
Descobertos os campos de petróleo de Angola,
imediatamente a UNCTAD enviou um grupo de consultores para preparar o país para
a nova realidade que se abria. Ensinaram a montar contratos com empresas
estrangeiras, cantaram as vantagens de trazer o capital internacional para
ajudar a desenvolver o país.
Nos anos seguintes, o que se assistiu foi o maior
processo de corrupção do planeta, conduzido pela Trafigura com o presidente
angolano. Foi uma corrupção praticada por majors e até pela estatal
norueguesa Statoil. Do lado de Angola, a intermediária de todos os
negócios era Isabel dos Santos, filha do presidente,
A vencedora foi a Trafigura. O instrumento de
corrupção da Trafigura em Angola foi a Puma Energy, proprietária da
distribuidora Pumangol, tendo como acionistas a estatal Sonangol (30%) e a
Chochan (15%), cujo diretor- executivo é o general Leopoldino Fragoso do
Nascimento 'Dino', consultor do general Hélder Vieira Dias
"Kopelipa", antigo ministro de Estado e chefe da Casa de Segurança do
ex-Presidente José Eduardo dos Santos.
Santos comandou por quarenta anos a política
angolana e montou vários esquemas de corrupção, o mais evidente dos quais foi o
de tentar reduzir o refino interno para poder importar todo combustível –
beneficiando obviamente as grandes comercializadoras. O Ministro dos
Petróleos, José Maria Botelho de Vasconellos, chegou a
contratar uma consultoria com a missão específica de elaborar um “estudo de
viabilidade técnico-económico de processamento de petróleo bruto angolano numa
refinaria fora do país”.
Quando o pré-sal de Angola foi descoberto, a
Petrobras estava em condições de ocupar um espaço privilegiado.
Conforme a
delação de Nestor Cerveró (1) a diplomacia brasileira havia
sido eficaz. O Brasil foi dos primeiros países a reconhecer a independência de
Angola, desde 1975 a Petrobras tinha representação no país, vários engenheiros
da estatal angolana Sonangol vieram ao brasil fazer cursos na Petrobras.
Em 2005 a Petrobras participou de leilão do pré-sal
angolano, investindo US$ 400 milhões.
Uma joint-venture formada pela Petrobras (50 por
cento), BTG Pactual E&P B.V. (40 por cento) e Helios Investment Partners
(10 por cento), montou a Petrobras Oil & Gas B.V. Provavelmente o ponto de
contato com Isabel Santos foi o BTG-Pactual.
Além de Angola, a empresa adquiriu dois blocos em
águas profundas de classe mundial na Nigéria, com início de produção previsto
para o fim deste ano.
Com a entrada de Pedro Parente, a Petrobras definiu
uma estratégia que caía como uma luva para as comercializadoras de petróleo e
derivados.
A Petrobras reduziu o refino, aumentou as
importações de derivados e está colocando suas refinarias à venda.
Obviamente esse desmonte e esses negócios não
teriam sido possíveis sem a participação ativa da Lava Jato, destruindo a
ofensiva da Petrobras na África, afastando os principais concorrentes da
Trafigura (Petrobras e empreiteiras brasileiras) e da mídia, com o fake News de que a empresa estaria quebrada.
Ambos, Parente e Moro, se tornaram comensais
constantes nos regabofes bancados pelos grandes centros de lobbies
internacionais, como a Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos, principado de
Mônaco etc.
Peça 5 – O caso Angolagate
As semelhanças entre Angola e o Brasil são óbvias e
humilhantes para nós, da venda do pré-sal à redução do refino e ao aumento das
importações de refinados. Mais ainda, na maneira como as receitas do petróleo
não chegaram à população, devido aos cortes dos gastos sociais.
Em 2016, o The New York Times produziu uma
reportagem acachapante sobre as riquezas de Angola e as condições de vida de
sua população.
Entre cenas chocantes de crianças morrendo,
subnutridas, doentes, a informação de que Angola é o país com maior índice de
mortalidade no planeta. A mortalidade infantil chega a 12,5 por cada 100
nasciturnos. E tudo isso em um país riquíssimo, com reservas bilionárias de
petróleo e diamante.
Na capital, há grandes hospitais modernos, porque
construir hospitais permite a cobrança de propinas, mas sem médicos e sem
atendimento. A reportagem informava que o governo havia cortado 30% das já
escassas verbas para saúde. E mostrava aldeias onde não se via a presença de
médicos.
Dizia mais. Só em carros de luxo, os governantes
gastam US$ 50 milhões por ano. “Aqui, os juízes conduzem Jaguares enquanto as
crianças morrem no ritmo mais acelerado do mundo”, diz o repórter.
Uma das entrevistas mostra uma angolana que perdeu
dez filhos para doenças e subnutrição e que usa gasolina para desinfetar a
boca. A reportagem acusa as companhias de petróleo ocidentais de terem “as mãos
sujas de sangue”.
As informações que chegaram ao mundo partiram de um
blogueiro independente, Rafael Marques de Morais, que está sendo processado
pelas autoridades angolanas.
Em um grau mais agudo de miserabilidade e
contrastes, lembra em muito o Brasil.
Em 2002, a ONG inglesa
Global Witness divulgou um trabalho devastador sobre a
corrupção das empresas petroleiras e dos traficantes de armas em Angola. Foi um
trabalho que durou dois anos e se concentrou no “Angolagate”, o escândalo com
venda de armas e exploração do petróleo nacional que atingiu assessores do
presidente francês François Miterrand e financiadores da campanha do então
presidente norte-americano George Bush Jr.
Nas anotações do trabalho você confere:
[2] Três
quartos da população vivem em pobreza absoluta. Apenas em 2001 foram desviados
mais US$ 1,4 bilhão em empréstimos bancários ruinosos para um PIB de US$ 5,1
bilhões. Naquele ano, Angola precisou de US$ 200 milhões para ajuda
internacional alimentar à sua população.
[3] Um
dos principais responsáveis pela corrupção em Angola foi também um dos
principais financiadores da campanha de George W. Bush. (Mas, como dizem
Barroso e Dallagnol, o Brasil é o país mais corrupto do planeta).
Todo o aparato convencional – Ministérios Públicos
e Judiciários nacionais, grupos de mídia – tratou de blindar a corrupção das
petroleiras e das comercializadoras de petróleo em Angola.
No Brasil, o tema passou ao largo da Lava Jato, da
Procuradoria Geral da República e da cobertura ostensiva da imprensa.
Internacionalmente, as denúncias foram levantadas
por ONGs e por sites independentes na Suíça e na Inglaterra. O mesmo ocorreu em
Angola, com o blogueiro Rafael Marques de Morais. O jornalista inglês, que veio
ao Brasil, foi atraído para o tema devido ao trabalho de blogs, dentre os quais
o GGN. E tudo isso foi possível devido aos sistemas de busca na Internet,
dentre os quais o Google.
Por aí se entende a estratégia do Atlantic Council
– que tem no seu conselho o ex-PGR Rodrigo Janot - em criar uma fantasia em
torno dos fake news, para lhe permitir monitorar as redes sociais, conforma
denunciamos na reportagem “Xadrez do Jogo
Político do Fake News”.
Quanto uma Trafigura, Glencore, Total, Statoil
pagariam para que, mediante uma mera indicação de uma agência de checagem, as
informações sobre suas atividades fossem excluídas das redes sociais e jogadas
no caldeirão dos fake news?
Hoje em dia está em jogo o papel central da
imprensa livre para enfrentar os grandes esquemas globais de corrupção. A
cooperação internacional envolvendo procuradores de vários países não chegou
perto da Trafigura e da Glencore. Mas a cooperação informal entre blogs e ONGs
independentes, sim.
Em 2010, quando Dilma Rousseff, apoiada por Lula, disputava a
presidência, Édson Fachin se pronunciou em nome de juristas brasileiros,
durante um ato de campanha.
Interesseiro
Como professor da Universidade Federal do Paraná, destacou as
conquistas democráticas no governo de Lula. “O governo que preservou as
instituições democráticas e jamais transigiu com o autoritarismo, um governo
que não tentou alterar, casuisticamente, a Constituição para buscar um novo
mandato. Um governo que sempre escolheu para chefe do Ministério Público
Federal o primeiro da lista tríplice elaborada pela categoria e não alguém de
seu convívio ou conivência. Um governo que reestruturou a polícia federal, a
defensoria pública, que apoiou a criação do importante Conselho Nacional de
Justiça e a ampliação das instituições judiciais.”
Confira abaixo o VÍDEO em que Fachin destaca conquistas
democráticas e respeito à Constituição no governo de Lula.
Perseguidor
Quem comandou todas
essas políticas foi Lula, que Fachin agora manobra para manter na cadeia.
Incrível. Como pode um ser humano mudar tanto ou, se ele sempre foi assim,
esconder durante tanto tempo sua verdadeira personalidade?
O Brasil foi ontem surpreendido com uma repentina guinada
processual no calvário imposto ao Presidente Lula por conta da quimera do
Guarujá. Estava, o tribunal regional federal da 4.ª Região, há mais de
cinquenta dias, a atrasar o juízo de admissibilidade sobre os recursos especial
e extraordinário, interpostos ao STJ e ao STF, respectivamente, do julgamento
fulminante da apelação em janeiro passado. Só com muita grita, o presidente
daquela corte resolveu, depois de mais de quarenta dias com a papelada
dormitando em seu disco virtual, abri-la ao ministério público para seu óbvio parecer,
pela recusa do seguimento dos recursos, é claro. E, agora, já pautado pedido
cautelar na 2.ª Turma do STF, para antecipar o longevo juízo de
admissibilidade, a vice-presidente do trf resolve acordar de seu longo sono de
bela-adormecida e, ainda bocejante, proferir sumário despacho de não admissão
do recurso extraordinário. O recurso especial, é verdade, foi admitido, pois,
no STJ, ao qual se destina, a mesma cautelar de antecipação do juízo de
admissibilidade havia sido já barrada monocraticamente pelo relator.
Mas aí que está a esperteza, o ardil desleal. Diferentemente
do que ocorreu no STJ, no STF, o relator, ainda que tenha negado a liminar para
conferir efeito suspensivo ao recurso extraordinário, submeteu o pedido à
Turma. O pedido cautelar estava para ser julgado na próxima terça feira, dia 26
de junho. Não há como deixar de constatar que o repentino despertar do tribunal
convenientemente dorminhoco do sul se deveu unicamente ao intento de frustrar o
julgamento da cautelar. É evidente que, para bloquear o caminho do pedido, que
se prendia ao prospectivo julgamento do recurso extraordinário, esse recurso
não foi admitido. Mais uma vez, a defesa do Presidente Lula é obrigada a
segurar na brocha, com a escada fechada em última hora pela matreira jurisdição.
Impressionam essas andanças do trf. Em janeiro, às carreiras,
em pleno recesso das cortes superiores que pudessem exercer alguma ação
disciplinadora, o tribunal resolve pautar a apelação da sentença condenatória,
proferida sem qualquer prova robusta, no já famigerado caso do Tríplex do
Guarujá. Passa o processo à frente de algumas dezenas de outros, sugerindo que
o interesse público demandaria fosse o feito julgado sem delonga. Acertados os
votos dos julgadores na turma – tão ajustados que, no dizer do jornalista Luís
Nassif, pareceriam jogral dos três sobrinhos do Pato Donald – agravou-se a pena
do Presidente Lula. Houve embargos. Houve pedidos às cortes superiores para
impedir a quase certa prisão. Houve ouvidos moucos. Ninguém queria ou ousava impedir
essa prisão, calcada numa agressão evidente à Constituição, que determina a
presunção de inocência até o esgotamento de todos os recursos. E, como era
prevista, a prisão se deu a toque de caixa, tão logo rejeitados os embargos e
antes mesmo de sua publicação. No melhor estilo bá-buf!
Depois… ah, depois! Depois veio o longo inverno. O Presidente
Lula, preso já há mais de sessenta dias, indicado candidato à Presidência da
República por seu partido e na “pole position” em todas as pesquisas
eleitorais, é impedido de se articular, dar entrevistas, participar de debates
com seus concorrentes, submetido à desvantagem compulsória por juízes
caprichosos. Atrás do palco, ouvem-se vozes jurisdicionais a ameaçarem-no com
inusitado indeferimento liminar do registro de sua candidatura se ousar querer
concorrer. E ninguém tem pressa agora. Não querem adentrar o mérito da
condenação engendrada antes das eleições. Sabem-no inocente, sabem que a
quimera do Guarujá não se sustenta à luz do quadro probatório, sabem que foi
julgado por um juiz tagarela, parcialíssimo, mas mantêm-no preso para não
participar das eleições.
O trf esticou a corda ao máximo. Segurou o juízo de
admissibilidade pelo tempo que pôde e só soltou a rapadura quando se abriu a
perspectiva de o STF tomar a si a competência. Aí, novamente, como menino
travesso, o tribunal a quo aumentou o ritmo para não levar bronca do
professor.
Enquanto isso, o dito professor tem se portado com espantosa
leniência. A presidente do STF não se fez de rogada e declarou, em convescote
empresarial, que não se podia dar ao Presidente Lula tratamento diferenciado.
Logo, não haveria qualquer consideração urgente de seu caso. Ora, ora!
Tratamento diferenciado é o que sempre lhe deram, com a imprensa no pescoço. O
interlúdio da pressa oportunista e do vagar maroto para impedir qualquer
atuação eficiente da defesa, as declarações públicas de juízes e procuradores
sobre seu caso, os pré-julgamentos lançados na mídia por alguns que ainda
poderão dizer sobre sua situação jurídica, tudo isso denota, sim, um tratamento
completamente fora do padrão. Mais ainda: a própria presidente do STF
esmerou-se à vista de todos em não pautar ações declaratórias de
constitucionalidade que pudessem reestabelecer o primado do princípio da
presunção de inocência. E o fez claramente para que o Presidente Lula não
pudesse se beneficiar de eventual reposicionamento jurisprudencial.
Quando anunciaram que a 2.ª Turma do STF poderia vir a
reexaminar a prisão do Presidente Lula ao julgar o pedido cautelar de antecipação
do efeito suspensivo do recurso extraordinário interposto, a maioria de
brasileiras e brasileiros com discernimento, leigos ou não, reagiram com muito
cuidado, com medo de demonstrar esperança, pois, num quadro em que o judiciário
se porta de forma tão tortuosa, a decepção era quase certa. E foi: em pouco
mais de quarenta minutos depois de vir a público o despacho da vice-presidente
do trf, negando admissão ao recurso extraordinário, solta-se despacho do
relator do pedido cautelar, julgando-o prejudicado e frustrando seu
conhecimento pela 2.ª Turma do STF, já pautado para terça feira próxima. Como
conseguem ser tão previsíveis nas suas manigâncias!
O timing do despacho que extingue o pedido cautelar
sugere que o jogo foi combinado. Afastaram dos ministros do STF um amargo
cálice. Na undécima hora, preservaram-nos de terem que decidir se soltassem o
Presidente Lula ou não. Ninguém disfarça. E, no entanto, a extinção do pedido
cautelar não é um corolário necessário da decisão que deixou de admitir o recurso
extraordinário. O próprio STF tem decidido que, proferido o juízo de
admissibilidade, positivo ou negativo, instaura-se a instância ad quem.
Diante da evidente manobra do trf, deveria o STF reagir e manter a pauta, pois
magistrados finórios não merecem ser homenageados com a retração da instância
que lhes pode colocar freios. E, para manter a pauta, bastava se socorrer do
princípio da fungibilidade dos meios recursais, prevalente em nosso processo
penal, e receber o pedido cautelar já como agravo de instrumento, para forçar a
subida do recurso extraordinário. Poderia dar prazo de até vinte e quatro horas
para a defesa se manifestar e garantir o julgamento na terça feira. É o mínimo
que se esperaria de um Tribunal Supremo a quem incumbe zelar pelo respeito aos
direitos fundamentais, notadamente o do devido processo legal, o do julgamento
justo e o da duração razoável do processo, pois, do contrário, ao se frustrar a
pauta, qualquer nova decisão sobre a admissibilidade ficará para agosto, depois
do recesso judicial. Até lá, prolongar-se-á o calvário do Presidente Lula,
preso em afronta à Constituição.
Ainda é tempo. Pode e deve a defesa pedir reconsideração para
manter a pauta, mas a pergunta que não quer calar é: o STF se dobrará à chicana
ou colocará ordem no processo para devolver a respeitabilidade à tão abalada
justiça brasileira? As próximas horas o dirão.
x.x.x.
EUGÊNIO JOSÉ GUILHERME DE ARAGÃO, ex-ministro da Justiça.
Redesenhou-se o STF com certo equilíbrio entre garantivistas
e punitivistas. No início, subordinando a lei à política, o Supremo aceitou
todos os abusos e desrespeitos às garantias individuais.
Agora, parte do grupo tenta domar o monstro que foi criado no
Paraná e que, agora, ameaça aliados. Mas, ao mesmo tempo, não pode permitir a
candidatura de Lula à presidência.
O jogo tem várias facetas.
No Superior Tribunal de Justiça (STJ) todos os processos
contra oposicionistas caem com o implacável Ministro Félix Fischer. Os demais
com Ministros mais razoáveis.
No caso do STF, formou-se maioria garantista na 2ª Turma, que
julga os processos da Lava Jato. Mas sendo lá, ou no pleno, sempre há uma
preparação para evitar surpresas e garantir a manutenção da prisão e do veto
político a Lula.
É o que explica o voto extraordinariamente confuso de Rosa
Weber, no julgamento da prisão em segunda instância. Foi esse voto que permitiu
a vários Ministros honrarem sua biografia e votarem contra a prisão, antes de
esgotados todos os recursos, sem risco de beneficiar Lula. Ficou nítido o jogo
na análise posterior do voto de Weber. Nunca mencionou antes nenhum dos
juristas citados em seu voto; e todos eles são familiares a Facchin.
O restante do jogo se dá com a manipulação dos procedimentos.
Ora Carmen Lúcia retira votações da pauta, ora Edson Fachin atua, como ocorreu
neste sexta-feira. Ora o Supremo atropela a lei e permite à Polícia Federal
fechar acordos de delação premiada um dia antes do notório desembargador João
Pedro Gebran Neto aprovar a delação de Antônio Palocci fechada com a Polícia
Federal. Criaram um pterodátilo, mesmo depois de expostos todos os abusos do
modelo paranaense de delação, com o caso Gleisi Hoffman.
Agora, a PF pode fechar a delação, mas antes tem que consultar
o Ministério Público Federal que é o titular da ação.
O MPF já tinha rejeitado a delação de Palocci. Agora, Palocci
fecha com a PF, tendo como advogado Adriano Bretas, do notório grupo de
advogados de delação. É uma delação suspeitíssima, que permitirá a Palocci
preservar R$ 30 milhões, dos R$ 60 milhões que acumulou.
Mais que isso. Já vazaram denúncias sobre a venda de
proteção, pagamento a advogados para que não incluam pessoas na delação.
É sabido que sua área de atuação sempre foi o mercado financeiro.
Tinha baixíssima ascendência sobre o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social) e a área do Planejamento. Sem conhecer a delação,
duvide-o-dó que inclua BTG Pactual e outros bancos com os quais atuava.
Pouco importa se a delação não vier acompanhado de provas.
Assim como no caso Gleisi Hoffman, o que interessa é o uso político das
denúncias. Mais à frente, se se mostrarem inconsistentes, o resultado político
já terá sido alcançado.
Aliás, a decisão de Fachin acaba de vez com a presunção de
que seu neo-punitivismo foi motivado pela indidnação contra a corrupção.É jogo
político raso, de quem não apenas mudou de lado, mas de convicções. É o típico
caráter da autoridade brasileira, tão bem representada por ele e seu colega
Luís Roberto Barroso.