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segunda-feira, 10 de junho de 2019

XADREZ DO INQUÉRITO DO STF E O THE INTERCEPT, POR LUIS NASSIF


Xadrez da investigação do STF e do dossiê do Intercept. Vamos montar um Xadrez bastante delicado.
Lance 1 – o volume de informações do dossiê Lava Jato
Pelas informações do The Intercept, o volume de dados do dossiê Lava Jato é superior ao do próprio caso Snowden.
Alguns dos diálogos divulgados, além disso, mostram que foram captadas conversas até entre duas pessoas – no caso, Sérgio Moro e Deltan Dallagnoll. O que comprovaria, em tese, que o vazamento não se deu a partir de uma pessoa infiltrada nos grupos de discussão, mas de hackeamento de vários celulares.
Lance 2 – o inquérito do STF
Houve a investigação de arapongas da Receita nas contas de Gilmar Mendes e Dias Toffoli e esposas, e vazamento posterior para a mídia. O fiscal envolvido já tinha participado das investigações da Lava Jato. O sentimento de impunidade seguiu os mesmos procedimentos de abusos anteriores:
1. Moro alegou engano ao vazar conversas de Dilma Rousseff e Lula grampeadas depois do final do prazo para o grampo autorizado. Foi desculpado.
2. No grampo ao escritório de advogados de Lula, alegou engano, que a intenção era grampear apenas a empresa de palestras de Lula. Novamente, foi desculpado.
3. No vazamento das investigações da Receita, alegou-se que o fiscal enviou o e-mail com os dados por engano para algumas pessoas.
Com seus métodos e falta de limites, a Lava Jato tornou-se uma ameaça, inclusive para o Supremo, que sabia estar enfrentando uma organização poderosa, armada de poder do Estado e com liberdade ampla para grampear, levantar informações e assassinar reputações, vazando para a imprensa. Com Sérgio Moro na Justiça, comandando a Polícia Federal, procurando influenciar a COAF, havia o risco concreto de criação de um estado de terror.
Em 14/03/2019, o presidente do STF, Dias Toffoli, anunciou a abertura de investigações contra a proliferação de fake news, especificamente contra ameaças a Ministros do STF.
Aproveitou críticas ao Supremo, da parte do procurador Diogo Castor, da Lava Jato, para estender as investigações aos procuradores.
O relator indicado foi o Ministro Alexandre de Moraes, ex-Secretário de Segurança de São Paulo e ex-Ministro da Justiça do governo Temer. Moraes colocou à frente da investigação delegados de confiança, tirando o poder de manipulação do Ministro da Justiça Sérgio Moro, a quem a Polícia Federal está subordinado.
Quatro dias depois, em 18/03/2018, na visita de Jair Bolsonaro aos Estados Unidos, em pleno vôo, Moro decidiu visitar a CIA e o FBI, um encontro fora da agenda.
Segundo o porta voz, o encontro não foi divulgado antes porque foi decidido durante o voo de Brasília a Washington, “embora nós já estivéssemos efetuando os contatos”.
Em 24/04/2019, o ex-procurador geral da República, Rodrigo Janot, divulgou a suspeita de que poderia ter sido grampeado.
Lance 3 – o inquérito do STF
Nada se sabe ainda dos resultados das investigações do STF. Apesar de claramente inconstitucional, teve apenas uma reação contrária de Raquel Dodge, Procuradora Geral da República, mas tudo ficou no esperneio. Afinal, depois de todos os abusos da Lava Jato, sustentados e apoiados por Ministros do STF, como Luiz Edson Fachin, Luis Roberto Barroso, estimulados por PGRs, como Janot, não questionados pela própria Dodge, quem teria moral para rebater as inconstitucionalidade do Supremo?
Ocorre que o inquérito do STF tinha como objeto os fake news e ameaças recentes. Tudo o que fosse levantado, além disso, não estaria no escopo do inquérito e não poderia ser utilizado.
Coincidentemente, é o material que The Intercept apregoa ter recebido.
Na única vez que conversei com Janot sobre vazamentos, especificamente o que gerou a capa da Veja, que quase decide as eleições, ele deu de ombros.
– Não podemos fazer nada porque quem vazou, provavelmente, foi o advogado do Yousseff.
Foi alguém do STF que planejou isso? Claro que não.
Certamente ocorreu o mesmo que nos vazamentos da Lava Jato. Deve ter sido um vazador comum, o mesmo que vazou a delação de Alberto Yousseff para Veja, as sucessivas delações de Antonio Palocci para a Globo, as de Léo Pinheiro para o Estadão.
Mas, certamente, o lance jogado foi xeque mortal: acertaram  a cabeça da jararaca.
Do GGN

quarta-feira, 22 de maio de 2019

PGR SUÍÇO É ACUSADO DE CONLUIO COM A LAVA JATO, POR LUIS NASSIF

As acusações são de ter participado de reuniões informais e não documentadas relacionadas à Lava Jato.
Procurador Geral da Suiça Michael Lauber está sendo acusado de cumplicidade com os colegas brasileiros da Operação Lava Jato. A informação foi divulgada pelo jornal NZZ e repercutida pelo Suwissinfo.
As acusações são de ter participado de reuniões informais e não documentadas relacionadas à Lava Jato.
Rolf Schuler, advogado de Zurique que representa um réu da Lava Jato, afirmou que Lauber, junto com outros membros do MP suíço, participou de runiões não documentadas na Suiça e no Brasil com o objetivo de iniciar um processo de lavagem de dinheiro. Mas não apresentou provas de tal reunião.
Um pouco antes, Lauber foi acusado de irregularidades, também por reuniões sigilosas no caso FIFA. A corregedoria do MP suíço abriu uma investigação disciplinar para apurar essas reuniões entre Lauber e o presidente da  FIFA, Gianni Infantino. Lauber admitiu as reuniões e alegou que visavam ajudar no avanço das investigações.
Em relação à Petrobras, argumentou que as investigações não poderiam ser tocadas de modo eficiente sem as conversas informais.
Com as denúncias, Lauber corre o risco de não ser reconduzido ao cargo.
O procurador que virou advogado
Antes desse episódio, as suspeitas de reuniões informais com a Lava Jato provocaram a demissão do procurador suíço Stefan Lenz. O procurador abriu um escritório de advocacia, está oferecendo serviços a clientes brasileiros, e há rumores de que tendo como parceiro brasileiro parente de personagem influente na Lava Jato.
No site do escritório, ao lado de páginas em que repete o mesmo discurso anticorrupção de seus colegas da Lava Jato, Lenz oferece seus serviços para os suspeitos de corrupção.
Para particulares prejudicados ou acusados
Nós somos altamente especializados na área do direito penal financeiro e da cooperação jurídica internacional e nos aprimoramos cada vez mais nessa área.
a condição de ex-persecutores penais nós sabemos o que realmente importa para uma exitosa defesa penal ou representação dos prejudicados.
Nós temos boas relações na área do direito penal financeiro e da cooperação jurídica internacional.
Nós temos experiência com a solução consensual de persecuções penais, no sentido de um “Deal”, desde que haja previsão legal e seja possível.
Para particulares
Para empresas
Para Estados ou empresas estatais
Os seus direitos na Suíça
Porque um advogado suíço
Vantagens para Estados ou empresas estatais
Para empresas prejudicadas ou acusadas
Nós lhe auxiliamos em investigações internas, prestamos consultoria e representamos perante autoridades e tribunais. Nós conduzimos investigações internas, chamamos, se preciso for, os especialistas que se fizerem necessários, realizamos tomadas de depoimento e análises de fluxo de dinheiro e reunimos os fatos juridicamente relevantes num relatório de investigação. 
Do GGN

terça-feira, 30 de abril de 2019

A INDÚSTRIA DO COMPLIANCE COMO NOVO FOCO DE CORRUPÇÃO, POR LUÍS NASSIF

Como nasceu a Lava Jato? Qual o papel do Departamento de Justiça dos Estados Unidos na formação da força-tarefa? Como a indústria de compliance surgiu a partir da operação na Petrobras?
No GGN publiquei um “Xadrez” sobre a maneira como o Departamento de Justiça dos EUA passou a tratar a questão da corrupção política e como que preparou a Lava Jato, procuradores e juízes brasileiros.
Isso começa no começo dos anos 2000 com a criação da Seção de Integridade Pública do DOJ, incumbido de investigar crimes políticos, crimes que envolviam a administração pública de uma maneira geral.
Pra evitar pressão política, foi dada cobertura total a esse departamento. Blindagem total. Um grupo de 36 pessoas, procuradores e outros, que passara a investigar os grandes escândalos corporativos e políticos.
Leia mais: 
Um dos primeiros episódios foi o da Enron e da Andersen Consulting, que era a empresa de auditoria da Enron.
Ali, pela primeira vez, foi testada uma “tecnologia” de atropelar direitos, que depois foi incorporada pela Lava Jato.
Então no artigo eu mostro um conjunto de fatores, o fato de esconderem provas das defesas, o fato de usar o acesso às provas para impor narrativas aos réus e testemunhas para aceitarem delação premiada.
E depois, como lá tem um sistema jurídico que chega, em certo momento, a dar um cabo nesses abusos, quando chegavam nas instâncias superiores e se percebiam os abusos, muitos procuradores saiam e iam trabalhar em grandes escritórios de advocacia.
Por aí a gente vê esse knowhow importado para o Brasil, essa ligação entre procuradores e grandes escritórios de advocacia e compliance.
Compliance se trata de um conjunto de regras e tudo visando blindar uma empresa contra corrupção. Não tem mistério. É só você mapear todos os processos de decisão da empresa que geram os contratos, que geram a saída de dinheiro, identificar e definir valores e tudo, e definir atribuições, estabelecer instâncias de decisão. Tal valor tem que tais e tais diretorias envolvidas… A partir de tal valor… O Banco do Brasil tem isso estupendamente, tanto que não teve rolo nenhum dele nesse período. O BNDES tem esse mesmo processo, o que aconteceu com ele foi arbitrariedade da Lava Jato do Rio.
Então, agora, o compliance é o seguinte: os mais velhos se lembram da bolha de tecnologia que houve no começo dos anos 2000. Quando você tem essas bolhas, essas bolhas impedem uma precificação do projeto. O projeto, quanto que vale? As bolhas extrapolam esses valores.
Então você teve muito de dinheiro lavado através de projetos de tecnologia.
Você montava um projeto, fazia uma start-up, entrava o dinheiro… Têm filhas de políticos aqui que ficaram ricos por conta disso.
Com o compliance ocorre o mesmo. Você tem um quadro novo, que são procuradores sem limites avançando sobre empresas, destruindo empresas. Nos Estados Unidos, destruíram a Enron, a Andersen Consulting.
Depois de anos, que se percebeu, em vez de criminalizar, digamos, pessoas que cometeram atos, eles criminalizaram a própria empresa. Quebraram a empresa, como foi feito aqui com a Petrobras pela Lava Jato.
Então você espalha o terror. Tem casos aí, que nem aqui no Brasil, do sujeito ser mantido preso durante um tempo, até abrir o bico.
As delações premiadas serem de acordo com o que procurador queria. Então você espalha o medo nas empresas. A partir daí entram as empresas de compliance.
No caso brasileiro, o que houve aqui com Petrobras, Eletrobras, com Ellen Grace, isso vai dar uma CPI em algum momento.
Não tinha nada para justificar 200 milhões de dólares para fazer compliance na Petrobras, sendo que já tinham grandes escritórios paulistas contratados para fazer esse trabalho.
A mesma coisa com a Eletrobras. No caso do acordo que houve nos EUA, a class-action, um acordo da Petrobras com todos os chutes aí… Eles calculavam a propina da Petrobras em 900 milhões de dólares. Um chute, um chute.
A propina saia da margem de lucro da empresa. E você vê: se a Petrobras era vítima, as multas das empreiteiras tinham que reverter para a Petrobras. Em vez disso, a Petrobras assina o contrato nos EUA, com o Departamento de Justiça, e com a participação dos procuradores brasileiros, em que ela se compromete a pagar 3 bilhões de dólares em indenização. E daí, 2 milhões e meio de reais vem para administração da Lava Jato.
Todos esses procuradores, e ninguém para defender o Brasil lá. Uma empresa pública, um patrimônio nacional.
Então essa questão do compliance é a chave para entender tudo que está ocorrendo aí. É um jogo milionário, sem limites. Sem limites. Quanto mais o terror implantado aqui do lado dos procuradores, mais as empresas vão estar dispostas a pagar. E pagar é compra de proteção, porque compliance, qualquer pessoa medianamente, qualquer sistema de RP, tudo, você implanta compliance em uma empresa. ‘Mas aqui você vai fazer com tais e tais escritórios de advocacia’, porque eles têm ligações com o DOJ e vendem uma proteção.
Por aí se entende muito desse jogo da indústria da delação anticorrupção, que acabou fazendo com que a corrupção mudasse de lado.
A venda de defesa, através desses contratos de compliance, faz com que as empresas sangrem muito mais do que com a corrupção que existia antes. Até mais.
GGN

sexta-feira, 26 de abril de 2019

“É O LULA DE SEMPRE. ELE TEM FÚRIA”, DIZ FLORESTAN FERNANDES

Lula: "O que me mantém vivo, e é isso que eles têm que saber, eu tenho um compromisso com este país, com este povo".
“Suas mãos tremem um pouco quando começa a ler. Seu rosto fica vermelho olhando para o texto que traz um rosário de críticas contra seus julgadores. ‘Sei muito bem qual lugar que a história me reserva. E sei também quem estará na lixeira.’ Lula critica o ex-juiz Sergio Moro, responsável pela sua condenação, a operação Lava Jato, e o procurador da Deltan Dallagnol. ‘Reafirmo minha inocência, comprovada em diversas ações’. O silêncio é absoluto, apesar da presença de delegados da Polícia Federal e de três oficiais armados, todos a serviço da PF, que está sob o guarda-chuva do Ministério da Justiça, conduzido por Sergio Moro.”
Esse é o primeiro parágrafo da reportagem de Florestan Fernandes, ao El País Brasil, com a entrevista do ex-presidente Lula, após uma batalha jurídica, na manhã desta sexta-feira (26). A narrativa de Florestan é desde as palavras e gestos de Lula, mas também a partir de perspectiva pessoal do jornalista nos fatos que rodeavam aquele momento: “Lula está engasgado e sabe que esta entrevista é a oportunidade para falar depois de um ano silenciado pela prisão em abril de 2018”, continuou.
“É o Lula de sempre. Ele está igual. Quem esperava vê-lo envelhecido ou derrotado, se frustra. Ele tem fúria”, descreve o jornalista.
Foi ao comentar a morte de seu neto, Arthur Araújo Lula da Silva, de 7 anos, que Lula desabafou: “Eu às vezes penso que seria tão mais fácil que eu tivesse morrido. Porque eu já vivi 73 anos, eu poderia morrer e deixar meu neto viver.”
E ao narrar as motivações que o mantêm firme, mesmo ainda dentro da prisão, Lula criticou o “messianismo ignorante” daqueles que o condenaram, que “forjaram uma história”. “Eu tenho muitos momentos de tristeza aqui. Mas o que me mantém vivo, e é isso que eles têm que saber, eu tenho um compromisso com este país, com este povo”, declarou.
 
Leia aqui a primeira matéria de Florestan Fernandes, uma introdução da sequência de outros trechos da entrevista de Lula aos jornalistas, que serão publicadas ao longo do dia pelo jornal. Nessa primeira parte, Florestan assegura: “É o Lula de sempre. Ele está igual”.
Acompanhe também alguns trechos da entrevista: Não vou descansar enquanto não desmascarar Moro, Dallagnol e sua turma, diz Lula 
GGN

quinta-feira, 25 de abril de 2019

“TENHO DÚVIDA SERÍSSIMA QUANTO AOS DOIS CRIMES”, DIZ MARCO AURÉLIO SOBRE CONDENAÇÃO DE LULA

"Teria havido procedimento do presidente visando dar, ao que ele recebe 'via corrupção', a aparência de algo legítimo? A lavagem pressupõe [isso]”, afirmou.
Foto: Agência Brasil
O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal, afirmou nesta quarta-feira (24), segundo informações do portal Jota, que a Corte terá que discutir se na condenação de Lula no caso tríplex estão configurados os crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.

quarta-feira, 17 de abril de 2019

XADREZ DA ENTREGA DO BRASIL AO CRIME ORGANIZADO, POR LUIS NASSIF

Enquanto isto, continuam sendo destruídas as últimas redes de segurança social que mantem um resto de coesão social no país.
Peça 1 – o Brasil legal e o criminoso
No momento, vive-se o maior desafio da história do Brasil.
Têm-se, de um lado, o desmanche do Estado brasileiro, das redes de proteção social, do direito ao trabalho e outros instrumentos básicos de cidadania. De outro, um avanço das organizações não estatais no amparo aos órfãos de Estado.
Há dois tipos de organização. Um deles, os movimentos sociais – como o MST (Movimento dos Sem Terra), MTST (Movimentos dos Trabalhadores Sem Teto), MAB (Movimentos dos Atingidos por Barragens) – organizando os desassistidos, dentro de um processo de inclusão democrática. Em geral, são reprimidos e tratados como criminosos, apesar de sua luta ser dentro dos limites legais.
O outro, organizações criminosas que controlam parte relevante do território nas maiores metrópoles, substituindo o Estado na segurança, na oferta de justiça, no apoio social, no amparo às famílias de presidiários, na atividade econômica clandestina, com uma diferença de estratégia. O PCC, em São Paulo, investindo na adesão das populações dos territórios controlados, e as milícias no Rio, com a estratégia de tomada do poder político local e estadual. Depois de acordos com o MDB do Rio de Janeiro, as milícias montaram seu próprio partido político e conseguiram emplacar aliados na presidência da República e no governo do Rio de Janeiro.
Enquanto isto, continuam sendo destruídas as últimas redes de segurança social que mantem um resto de coesão social no país.
Peça 2 – o direito penal do inimigo
Peça central no desmonte do Estado foi a desmoralização da Justiça, com a consolidação do direito penal do inimigo.
Quando o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu atropelar a Constituição, trabalho pertinaz de Luis Roberto Barroso, Luiz Fux, Dias Toffoli, Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Luiz Edson Fachin, estava aberto o caminho para a selvageria generalizada.
A morte absolveu Teori Zavascki, o Ministro que tolerou os abusos iniciais da Lava Jato e abriu as portas para o arbítrio mais ostensivo, desde a não tomada de posição em relação ao vazamento dos diálogos de uma presidente da República (reagindo com uma mera advertência), até a decisão inconsequente de autorizar a prisão de um Senador da República, com base em um grampo armado.
Criada a onda, nada mais segurou o oportunismo, a sede de sangue, o atropelo de qualquer ordem jurídica ou política, o desrespeito aos direitos individuais e a instauração sem disfarces do direito penal do inimigo.
O garantismo – a defesa dos direitos individuais – passou a ser tratado como leniência para com o crime, e seus defensores apontados como e cúmplices da criminalidade. Nesses período, todos os abusos foram cometidos: juízes atuando como agentes da acusação, condução coercitiva de testemunhas com ampla publicidade na imprensa, antes que se recusassem a depor, condenações com base em delações negociadas. No Supremo, Ministros endossando, por oportunismo, os abusos e, no Twitter, as milícias digitais sendo insufladas por procuradores. Irresponsáveis!
Agora se está em outro momento de corte, quando os grupos que se aliaram no impeachment passam a disputar espaço político.
Alvo de medidas arbitrárias, a direita do Ministério Público invoca, agora, as garantias individuais, abominando qualquer forma de prática do direito penal do inimigo. Defende o juiz natural, critica os juízes que atuam como acusadores e juízes ao mesmo tempo, propõe habeas corpus coletivo – eles mesmos, que condenaram até o HC coletivo que pretendia mudar para prisão domiciliar penas de presidiárias com filhos recém-nascidos, em um capítulo em que a crueldade institucional rompeu com todos os limites de humanidade.
É esse o teor do Tweet  da diretora da Associação Nacional dos Procuradores da República (ANPR), exigindo apoio dos “garantistas” através do expediente da provocação. É a isso que foi reduzido o sistema judicial.  Doutrina, princípios, textos legais, tudo é instrumentalizado de acordo com a vontade política do agente público em cada momento, a partir dos exemplos emanados da Suprema Corte. Criou-se uma comunidade dos sem-noção.
E, hoje, há mais um avanço do arbítrio, com a decisão do Ministro da Justiça Sérgio Moro de convocar a Força Nacional para policiar a Praça dos Três Poderes, sem uma justificativa plausível.
Peça 3 – o país legal caótico e o ilegal organizado
Tem-se, então, esse paradoxo. O país institucional se desmoralizando a cada dia.  A Lava Jato mantendo a prática de vazamentos, com amplo apoio das milícias digitais e de veículos associados, e avançando na campanha contra Ministros do STF, e agora fortalecidos por ter um dos seus no Ministério da Justiça. O Ministro Alexandre Moraes propondo censura aos veículos adversários e invasão de domicílios. A Procuradora Geral da República Raquel Dodge desautorizando decisões do STF, ainda que estapafúrdias. No Senado, tentativas de CPI contra o Supremo. No Planalto, Bolsonaro desvirtuando o BNDES e ordenando a abertura de linhas de financiamento para despesas operacionais de caminhoneiros.
Funeral do reitor Cancilier, da UFSC
O punitivismo cego está sendo utilizado para desmontar toda a estrutura política, social e de regulação do país. Quer acabar com um órgão? Anuncie uma devassa em suas contas e criminalize qualquer problema administrativo. Dentro de pouco tempo, a CGU (Controladoria Geral da República), junto com TCU (Tribunal de Contas da União) e Ministérios Públicos retomarão as ofensivas contra as universidades públicas
Enquanto isto, nos territórios ocupados, o PCC continua oferecendo segurança, um sistema de justiça mais eficiente que o sistema legal (amplo direito de defesa as partes, mas incluindo a pena de morte nas penas), uma economia informal pujante, na forma de projetos imobiliários clandestinos, transporte de passageiros em vans.
O combate ao crime organizado não se trata apenas de um fenômeno criminal. Se desalojar o PCC das áreas ocupadas, haverá a substituição do crime organizado pelo crime desorganizado, pois cada vez menos o Estado terá condições de substituir os serviços ofertados pelo crime.
Peça 4 – os desmontes irreversíveis
Mais cedo ou mais tarde Jair Bolsonaro cai. Ele e os quatro filhos tornaram-se uma espécie de Hidra de Lerna do jogo político brasileiro, enquanto Hamilton Mourão está se tornando o barqueiro da Barca de Caronte.
Mas, enquanto a racionalidade não é restabelecida, está ocorrendo um desmonte irreversível do Estado brasileiro. Acabou-se com a Embraer desconsiderando toda a malha de fornecedores que orbitavam no seu entorno. Parte-se agora, para o desmonte da Eletrobrás, abrindo mão de setores estratégicos, como a geração de energia e a transmissão. A privatização significará um novo salto nas tarifas de energia, comprometendo a competitividade da economia.
O incêndio de Roma, quadro de Hubert Robert
Já se liquidou a indústria naval em pleno processo de avanços na curva de aprendizado. Matou-se a engenharia nacional, com a liquidação das empreiteiras. Desmonta-se a mais tradicional instituição brasileira, o Itamarati. Aparelha-se a Apex (Agência de Promoção das Exportações), IBAMA (Instituto Brasileiro de Meio Ambiente), Anvisa (Agência de Vigilância Sanitária). E, a cada dia, liquida-se com cada avanço na área dos direitos sociais. E cada espaço aberto pelo país legal é imediatamente ocupado pelas organizações criminosas.
Resta saber quanto tempo de destruição será necessário, ainda, para promover uma pactuação em defesa do país.
Muito mais importante que as manifestações sem rumo da PGR, os coordenadores e membros titulares das Câmaras de Coordenação e Revisão do Ministério Publico Federal e a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão, divulgaram ontem uma Nota Pública relevante em defesa dos direitos sociais, contra o decreto de Bolsonaro extinguindo os conselhos e comitês de participação popular na definição de políticas públicas. Confira a nota do MPF e PFDC na íntegra AQUI.
Do GGN

sábado, 16 de março de 2019

DELEGADA ÉRIKA MARENA, DO COAF, PARTICIPOU DE OPERAÇÃO POLICIAL IRREGULAR NOS EUA A MANDO DE MORO

 Moro e a delegada Érika Marena
A delegada federal Érika Marena, indicada pelo ministro da Justiça, Sergio Moro, para chefiar o Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras), participou de uma ação in loco nos Estados Unidos para prender um cidadão brasileiro por meio de um flagrante forjado, mostram documentos obtidos pelo DCM.
O expediente do flagrante forjado consiste em criar uma situação fantasiosa para induzir um suspeito a tentar cometer um crime, efetuando sua prisão logo em seguida. Permitido nos EUA, esta manobra policial é expressamente proibida pela lei brasileira (leia mais abaixo).
Apesar disso, foi autorizada integralmente por Sergio Moro, que não apenas enviou a delegada Érika Marena ao exterior para auxiliar na operação como também, para viabilizar o plano norte-americano, determinou que fossem criados nomes, números de CPF e uma conta bancária falsa no Brasil, para onde foram destinados depósitos ilegais de R$ 100 mil.
O valor foi sacado, com autorização de Moro, pelo delegado federal Algacir Mikalovski (que hoje em dia é representante sindical dos delgados), que teria a incumbência de entregar o valor às autoridades norte-americanas. Mikalovski é o mesmo delegado que recentemente defendeu Jair Bolsonaro em suas redes sociais e que pediu que o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva fosse transferido para um presídio militar.
Sergio Moro conduziu a maioria dos passos da operação feita em conjunto com os norte-americanos sem antes consultar o Ministério Público Federal na maioria das diligências efetuadas. O órgão é, por lei, quem deve fiscalizar e trabalhar em conjunto com a autoridade policial em ações deste tipo. Apesar disso, o procurador federal que respondia pelo caso em nome do MPF não fez qualquer reclamação.
Seu nome: Deltan Dallagnol.
Assim, se constata que figuras que vieram a ocupar postos chaves na Operação Lava Jato já atuavam conjuntamente e em parceria com autoridades norte-americanas desde, pelo menos, sete anos antes da criação da força-tarefa do MPF-PR.
Essas informações, parte delas trazidas à luz em reportagem dos Jornalistas Livres de junho de 2017, constam nos autos do processo nº. 2007.70.00.011914-0, que correu sob a fiscalização do Tribunal Regional Federal da 4ª Região até 2008, quando a competência da investigação foi transferida para a PF, o MPF e a Justiça no Rio de Janeiro.
Na realidade, ali deveriam ter começado, já que nunca houve nenhum suspeito residente no Paraná envolvido no caso. Até hoje, permanece um mistério o motivo que levou as autoridades dos Estados Unidos a buscar na vara de Sergio Moro a autorização que queriam.
Em 2011, o caso inteiro foi arquivado no Brasil, visto que instâncias superiores da Justiça brasileira não encontraram motivos para que a operação tivesse se dado por meio da Polícia Federal no Paraná, além de ter apontado uma série de irregularidades durante a condução da investigação policial.
Quando Moro autorizou o flagrante forjado do qual Érika Marena tomou parte, alegou que a investigação serviria para desbaratar uma organização criminosa de lavagem de capitais que atuava por meio de empresas e operadores brasileiros. Com as irregularidades identificadas no processo, tudo foi arquivado e ninguém foi preso no Brasil.
A ação integrada com os EUA, em solo brasileiro, sob a lei americana
A ação ocorreu em 2007. No dia 14 de março daquele ano, autoridades do DHS (Department of Homeland Security) procuraram a Polícia Federal no Paraná (sem nenhuma indicação do motivo que levou à escolha específica desta superintendência estadual), na pessoa do delegado Algacir Mikalovski, solicitando ajuda para prender um cidadão brasileiro suspeito de evasão de divisas nos EUA.
Ao receber o pedido, o delegado federal foi direto a Sergio Moro, que autorizou o envio de dados sigilosos do suspeito brasileiros à autoridades policiais norte-americanas que o investigavam por remessa ilegal de dinheiro ao Brasil, e estavam preparando um flagrante.
Delegado da PF vai direto a Sérgio Moro, sem passar perlo MPF, pedir para o juiz solicitar à Receita Federal a emissão de um CPF para ajudar autoridades norte-americanas a prender um brasileiro
Sem informar autoridades do governo federal brasileiro, o juiz paranaense foi, na sequência, atendendo a todos os pedidos estrangeiros, determinando ainda que fossem criados no Brasil um CPF e uma conta bancária falsa para uso da polícia dos Estados Unidos.
O Ministério Público Federal só tomou ciência do caso mais de dois meses após o juiz ter deferido integralmente as solicitações da polícia norte-americana. O próprio juiz Moro admite que deixou de informar o MPF no tempo devido. Quando o fez, registrou que entregou os documentos diretamente ao procurador federal “DD”, querendo dizer Deltan Dallagnol. 
O plano norte-americano era o seguinte: eles suspeitavam que um cidadão brasileiro residente nos EUA estava realizando remessas ilegais de dinheiro para o Brasil. Pelas investigações conduzidas naquele país, o suspeito oferecia seus serviços de remessa ilegal de divisas utilizando uma rede de empresas laranjas para por fim depositar o dinheiro a ser evadido na conta determinada pelo cliente do crime.
Assim, visando forjar um flagrante e prender o suspeito, os norte-americanos montaram um plano:
  • Um agente infiltrado entraria em contato com o suspeito dizendo querer transferir um valor correspondente a R$ 100 mil para o Brasil. O dinheiro seria fornecido pelo DHS.
  • A Justiça brasileira providenciaria um CPF, um cartão de banco e uma conta bancária falsos ao agente norte-americano. Eles seriam fornecidos ao suspeito, para que este realizasse a remessa ilegal e fosse preso.
  • Um delegado federal de Curitiba iria até o banco, sacaria o dinheiro e devolveria às autoridades norte-americanas.

Sem consultar o Ministério Público ou qualquer autoridade brasileira, Moro atendeu a todos os pedidos dos norte-americanos. Enviou, ainda, a delegada Érika Marena para participar das diligências nos Estados Unidos. Enquanto esteve lá, ela prestou contas diretamente ao juiz Sérgio Moro sobre o andamento das operações, como se vê no exemplo abaixo, em correspondência diretamente enviada ao magistrado, e constante no processo ao qual o DCM teve acesso.
“Senhor Juiz,
Serve o presente para encaminhar o relatório COMPLETO dos últimos três períodos dos monitoramentos levados a cabo, incluindo o resumo das conversas em inglês numa tradução livre feita pela signatária (delegada da PF do Brasil).”
“A signatária foi informada pelo Agente Especial do DHS/ICE/Atlanta que a operação para a prisão do alvo XXXXX ocorrerá no próximo dia XXXX, incluindo busca e bloqueio de contas. Já há autorização para o compartilhamento dos dados com esse Juízo”.
“A signatária esteve na cidade de Atlanta-Geórgia no mês de agosto, por convite do governo americano, e acompanhou várias diligências relacionadas a tal operação conjunta com o DHS/SAC/Atlanta.”
A ação que Moro permitiu é prevista pela legislação norte-americana, trata-se da figura do agente provocador: o policial que instiga um suspeito a cometer um delito, a fim de elucidar ilícitos maiores praticados por quadrilhas ou bandos criminosos.
No caso em questão, o agente norte-americano, munido de uma conta falsa no Brasil, induziu o investigado nos EUA a cometer uma operação de câmbio irregular (envio de remessa de divisas ao Brasil sem pagamento dos devidos tributos).
Ocorre, porém, que o Direito Brasileiro não permite que um agente do Estado promova a prática de um crime, mesmo que seja para elucidar outros maiores. O máximo que prevê a legislação brasileira é a chamada “Ação controlada”, quando se permite que o agente policial acompanhe a ação criminosa sem tentar detê-la, a fim de obter provas irrefutáveis do delito.
Não tem nada a ver com o que foi feito. Sobre isso, a Súmula 145 do STF é taxativa sobre o assunto:
“Não há crime quando a preparação do flagrante pela polícia torna impossível a sua consumação.”
Ou seja, quando aquele que tenta praticar um delito não tem a chance de se locupletar por seus atos, caindo apenas em uma armadilha da polícia, o crime não se consuma.
É o que explica o advogado criminalista André Lozano Andrade, coordenador do IBCCRIM (Instituto Brasileiro de Ciências Criminais): o agente infiltrado não deve ser um agente provocador do crime, ou seja, não pode incentivar outros a cometer crimes.
“Ao procurar uma pessoa para fazer o ingresso de dinheiro de forma irregular no Brasil, o agente está provocando um crime. É muito parecido com o que ocorre com o flagrante preparado (expressamente ilegal), em que agentes estatais preparam uma cena para induzir uma pessoa a cometer um crime e, assim, prendê-la. Quando isso é revelado, as provas obtidas nesse tipo de ação são anuladas, e o suspeito é solto”, expõe Lozano.
Se a lei brasileira não prevê, Moro usa a dos Estados Unidos
Ciente de que não havia como justificar pela lei brasileira os atos que perpetrava a Polícia Federal sob sua anuência, o então juiz Sérgio Moro fez uso da jurisprudência norte-americana para sustentar sua decisão:
A manobra de Moro serviu para que ele mesmo aprovasse as ações da PF brasileira nos EUA, mas não para que o processo prosperasse até o final. A prática de sistematicamente conduzir a investigação alijando o titular da ação penal (O MPF) do processo, não passou despercebida pela Defesa de um dos acusados no processo, que fez constar nos autos, chamando a procuradoria no Paraná de “marido traído”:
Chama a atenção nos autos que o advogado em questão, já em 2007, antes que sequer se aventasse a hipótese de criação da Operação Lava Jato, já identificava os métodos pouco ortodoxos de trabalho em conjunto e pouco atento às leis que praticavam Sérgio Moro e Deltan Dallagnol. O advogado, por fim, afirma o que muitos depois dele vieram a afirmar ao longo dos anos seguintes: que Sérgio Moro agia não como um juiz de Direito, mas como um “homologador automático de toda a qualquer pretensão o MPF ou da Polícia”.
Assim, pelo menos toda esta operação conduzida por Moro e sua equipe, terminou arquivada, porque ilegal. Se o mesmo vai ocorrer com a Lava Jato, só o tempo dirá.
Por ora, o que se sabe é que o agora Ministro da Justiça Sérgio Moro acaba de autorizar nova ida de Érika Marena aos Estados Unidos, para “visitas institucionais em Washington e em Nova York”. Pelo jeito, as ações do grupo paranaense com seus colegas norte-americanos estão longe de acabar.
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O DCM entrou em contato por telefone com o Ministério da Justiça para que Sérgio Moro pudesse comentar o assunto abordado nesta reportagem.
A assessoria do órgão solicitou que as perguntas fossem enviadas por email, o que foi feito no mesmo dia, com os questionamentos abaixo:
Em relação ao processo nº. 2007.70.00.011914-0:
– Qual a sustentação legal para a solicitação do juiz Sérgio Moro para que a Receita Federal criasse CPF e identidade falsa para um agente policial dos Estados Unidos abrir uma conta bancária no Brasil em nome de pessoa física inexistente?
– Por que o juiz Moro atendeu ao pleito citado acima, originário da Polícia Federal, sem submetê-lo, primeiramente, à apreciação do Ministério Público Federal, conforme determina o ordenamento em vigor no país?
– Por que o juiz Moro não levou ao conhecimento do Ministério da Justiça os procedimentos que autorizou, conforme também prevê a legislação vigente?
– Por que a escolha da delegada Érika Marena para o Coaf? Por que a indicação de uma policial para um órgão de natureza burocrática? Por que a transferência do Coaf para o Ministério da Justiça, quando sempre esteve subordinado a pasta que cuida da fazenda? 
Até a publicação desta reportagem, não houve qualquer resposta.
Playvolume00:00/00:40Diário do Centro do MundoTruvidfullScreen
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DCM

sexta-feira, 15 de março de 2019

XADREZ DO GRANDE NEGÓCIO DO COMBATE À CORRUPÇÃO, POR LUIS NASSIF

O grande pacto nacional terá que se dar em cima da reconstrução das instituições, especialmente dos tribunais superiores e da Procuradoria Geral da República.
Os últimos dias foram históricos, de afirmação das instituições nacionais em relação a dois poderes paralelos.
Em Brasília, finalmente a Procuradora Geral da República Raquel Dodge assumiu plenamente o cargo e enquadrou o grupo da Lava Jato – que junta procuradores, juízes de direito no que se convencionou chamar de “a República do Paraná”.
Como previmos, a história da criação de uma fundação de direito privado, com controle dos procuradores da Lava Jato, visando administrar a soma inacreditável de R$ 2,5 bilhões, foi o ponto de inflexão na saga da operação. Trincou o cristal permitindo, nos próximos meses, um levantamento amplo do que ocorreu nesses anos de exercício do poder absoluto.
O segundo poder a ser enquadrado foi o das milícias, com a operação que resultou na prisão dos dois assassinos da ex-vereadora Marielle Franco.
Lava Jato e milícias, cada qual na sua área, recorriam às mesmas ferramentas de amedrontamento dos adversários, uma com vazamentos e assassinatos de reputação, outra com assassinatos físicos, mas ambas se valendo da mesma base de apoio político das milícias digitais, dentro da mesma lógica de disputa de poder. E ambas intrinsicamente ligadas ao fenômeno e ao governo de Jair Bolsonaro, pacto consolidado na assunção de Sérgio Moro como Ministro da Justiça.
Os próximos meses serão relevantes para se levantar a enorme indústria que se montou em torno do combate à corrupção e o preço pago pelo país. Por trás, desse jogo, uma  indústria que se montou mundialmente em torno do combate à corrupção.
Em maio de 2018, alertávamos aqui e também aqui sobre as grandes tacadas em andamento. Antes disso, em junho de 2017 as jogadas já eram claras.
Peça 1 – a cadeia improdutiva do combate à corrupção
Os dois elementos centrais na criação da cadeia de valor da luta anticorrupção foram os acordos de cooperação internacional e a legislação anticorrupção emplacada pelos Estados Unidos no âmbito da OCDE. Por ela, qualquer ato de corrupção envolvendo o dólar será colocado sob jurisdição norte-americana.
Com base na nova legislação, o Departamento de Justiça (DoJ) e o Departamento de Estado montaram estratégias geopolíticas, enquadrando empresas de outros países de interesse estratégico norte-americano.
O enquadramento obedece ao seguinte roteiro:
Denúncia criminal nos Estados Unidos.
Acordo de leniência impondo multas elevadas e termos de ajustamento de conduta (TACs).
Parceria com Ministérios Públicos dos países de origem das empresas.
Os TACs foram terceirizados para grandes escritórios de advocacia, com ampla influência no DoJ, que se especializaram em normas de compliance.
Em cima dessa estrutura se montou a indústria improdutiva do combate à corrupção:
Contratação dos escritórios por somas milionárias.
No caso do Ministério Público Federal brasileiro, disponibilidade de provas e testemunhas contra as estatais brasileiras, visando instruir grandes ações de indenização, bancadas pelos chamados fundos abutres.
Desmonte das empresas investigadas, visando facilitar a venda de ativos.
As grandes operações da Lava Jato abriram espaço para três escritórios de advocacia norte-americanos: a Baker McKenzie, o Hogan Lovells e o Gibson, Dunn & Crutcher.
Os três se tornaram multinacionais poderosas trabalhando as normas de conformidade da legislação norte-americana.
Peça 2 – o caso Petrobras
O total das propinas na Petrobras até hoje não foi calculado porque se faz dupla, tripla e quintupla contagem. Mas não deve ter chegado a um bilhão de reais.
O custo direto da Lava Jato à empresa, sem contar o desmonte da engenharia nacional:
* Multa no DoJ (Departamento de Justiça dos EUA): US$868 milhões;
* Indenização aos acionistas minoritários US$2,9 bilhões;
* Honorários advocatícios, mais de US$300 milhões;
* como consequência da Lava Jato já foram vendidos US$23 bilhões de ativos, desintegrando a empresa, que agora vale muito menos.
Há muitas estatais de petróleo envolvidas em corrupção. Mas nenhum grande país fez campanha contra sua própria estatal, incluindo a Pemex, o Sonangol, a Ecopetrol, a Sonatrach, a Sinopec, a Iraq National Petroleum. Nenhum Ministério Público desses países foi a Washington para acusar sua empresa de petróleo, entregando documentos e testemunhas contra ela.
Com os últimos fatos divulgados, fica claro o acerto entre a Lava Jato e Pedro Parente, presidente da Petrobras.
Parente fechou um acordo com acionistas norte-americanos que surpreendeu até grandes escritórios de advocacia instalados no Brasil. Os advogados da ação julgavam que o máximo que conseguiriam seria um acordo de US$ 1 bilhão. A Petrobras aceitou pagar US$ 2,9 bilhões para encerrar a ação, um evidente escândalo, mas que passou batido pelos templários da Lava Jato.
Ao mesmo tempo em que fechava negócios ruinosos, a Petrobras firmava um acordo com autoridades norte-americanas destinando R$ 2,5 bilhões para gestão da República do Paraná.
Peça 3 – o papel de Ellen Gracie
A Hogan chegou à Petrobras em 2012, quando o diretor jurídico da Petrobrás Venezuela S.A., Diógenes Bermudez, saiu da empresa e foi para a Hogan Lovells.
Bermudez é formado pela Universidade Central da Venezuela e com especialização na Georgetown University. Antes de ir para a Petrobras Venezuela trabalhava na PDVSA como diretor jurídico da sua subsidiária Lagoven. Quando foi para a Hogan Lovells levou junto a conta da Petrobras Venezuela e a partir de Washington, sua base hoje comanda a conta da cliente Petrobras global, um mega cliente.
Não é o único supernegócio de escritórios de advocacia com a Petrobras. Na ação junto ao Departamento de Justiça a Petrobras contratou o Baker Mackenzie, também caríssimo e outro escritório de monitoramento, de confiança do Departamento de Justiça, que fica dentro da própria empresa.
Foi contratado também o escritório de Ellen Gracie, ex-Ministra do STF (Supremo Tribunal Federal) para supervisionar os serviços de compliance.
Peça 4 – o caso Embraer-Bombardier
O mesmo escritório Baker McKenzie foi contratado pela Embraer para resolver suas pendências com a Justiça norte-americana. Em 2016 fechou acordo pelo qual se comprometeu a pagar US$ 206 milhões e confessar os crimes cometidos em quatro países
Como resultado do TAC, a empresa passou a conviver com um interventor e obrigada a informar as autoridades norte-americanas sobre cada passo estratégico.
Paralelamente, assinou um TAC com a Procuradoria da República no Rio. Um dos procuradores que participou do TAC foi Marcelo Miller que, tempos depois, seria contratado pela Trench Rossi, o escritório brasileiro sócio da Baker McKenzie.
Ao mesmo tempo em que trabalhava para a Embraer, a Baker McKenzie era a consultora da Boeing e sua lobista junto ao Congresso norte-americano. Foi nessa condição que assessorou a Boeing no processo de aquisição da Embraer.
Peça 5 – o caso Eletrobras
Em 2016, a Lava Jato foi até os Estados Unidos, uma equipe chefiada pelo então Procurador Geral da República Rodrigo Janot. Lá, Janot recebeu pessoalmente de uma advogada do Departamento de Justiças as denúncias contra a Eletronorte, braço da Eletrobras que cuidava da energia nuclear.
Foi o álibi para uma intervenção ampla na Eletrobras. Para supervisionar a implementação do compliance, foi contratado o escritório de Ellen Gracie por R$ 4 milhões da Eletrobras, sem licitação. Provavelmente coube a Gracie levar o Hogan Lovells para a Eletrobras. A supervisora não definiu um contrato com começo, meio e fim, mas um contrato por horas trabalhadas. Ampliou o escopo do trabalho aumentando em cinco vezes seu valor.
Por conta desse processo, hoje em dia há um olheiro do DoJ acompanhando todos os passos da empresa, inclusive a área nuclear.
Peça 6 – o enorme pesadelo
Todo esse pesadelo se deveu à destruição das instituições brasileiras. A Lava Jato viu-se dotada de um poder absoluto. Milícias digitais, blogs de ultra direita difundiram denúncias contra Ministros do STF, inibindo sua atuação. Ao mesmo tempo, insuflavam as redes contra o STF e o Superior Tribunal de Justiça.
O STJ é um tribunal polêmico, o STF igualmente. Existem Ministros polêmicos, sim. Mas a maior ameaça ao país, o quadro que levou à barbárie e ao fenômeno Bolsonaro, foram os poderes amplos conferidos à Lava Jato, a insubordinação de juízes e procuradores de primeira instância, cada qual criando seu território de poder particular.
O grande pacto nacional terá que se dar em cima da reconstrução das instituições, especialmente dos tribunais superiores e da Procuradoria Geral da República. Será a única maneira de impedir que o país se transforme definitivamente em um grande México, sob domínio político das milícias.
GGN