quinta-feira, 13 de julho de 2017

Lenio Streck e o analfabetismo jurídico de Sergio Moro, por Miguel do Rosário

A referência ao analfabetismo de Sergio Moro é minha, não de Lênio Streck.

Mas é o que se depreende de seu texto.

Sergio Moro é um caso extremo, irreversível, absoluto, de analfabetismo jurídico.

Ou então é muito pior que isso.
***
No Conjur
SENSO INCOMUM
Livre apreciação da prova é melhor do que dar veneno ao pintinho?

Depois de ver que aqui em Pindorama estão querendo, a fórceps, enfiar o bayesianismo e o explanacionismo para “dentro” da teoria da prova (ver aqui), algumas questões devem ser postas aos leitores. Penso que teorias como bayesionismo e explanacionismo podem ser úteis em determinados aspectos da filosofia e áreas ligadas à economia e gestão. Trata-se da discussão de probabilidades, “calculadas” a partir da lógica, na busca de caminhos para uma (melhor) tomada de decisão. Bayesianismo, explanacionsimo e outras teorias quetais podem ser úteis para análises econômicas envolvendo risco nas decisões. E há autores que trabalham com essas teorias na Análise Econômica do Direito (AED).

Mas, atenção: isso não quer dizer “decisão jurídica” e tampouco que se possa condenar alguém com base em cálculos de probabilidades. Usam análises para aferir eficiência de (e entre) fins e meios. O erro nas teorias desse tipo é o de pensar que o único critério de controle da ação seria o de analisar como que se “relacionam” fins (vazios) e meios (indeterminados) em busca de um resultado eficiente. Como o Direito, mormente o Penal e Processual Penal, trata de direitos fundamentais à liberdade e integridade, parece-me que tais teorias não podem ser aplicadas aqui, sob pena de estarmos criando uma espécie contemporânea de ordálias ou “prova do demônio”: atirem o réu às probabilidades! Direito e democracia não combinam com qualquer forma de teoria cética ou não cognitivista moral (uso aqui o conceito de Arthur Ferreira Neto em seu livro Metaética e a fundamentação do direito). Teorias céticas constituem um problema, porque, nelas, há uma crença de que a verdade, com um mínimo grau de objetividade, não importa. Quer dizer: paradoxalmente, para essas teorias “é verdade que não existe verdade”. Com isso, o Direito — e a teoria prova — são transformados em uma katchanga (real ou não).

Queria ver, por exemplo, alguma sentença que usasse, efetivamente, a fórmula do Teorema de Bayes. A relação do bayesianismo com a AED é, para mim, absolutamente temerária. O próprio criador da AED (Ronald Coase) não o fez. Aproveito para dizer que: a) quem aposta na AED adere a um tipo de ceticismo externo ou interno (ver aqui o belo texto de Marcos Marrafon sobre isso); b) a AED foi uma reação ao positivismo (formalismo), sendo uma versão 2.0 do realismo jurídico, cujo resultado pode ser visto no cotidiano do irracionalismo das decisões do judiciário brasileiro; c) AED? Você gosta? Então veja este exemplo, advindo de um dos corifeus da AED, R. Posner – que, aliás, custou uma enorme dor de cabeça, quando falou da venda de crianças. (ver aqui).

Aliás, defender a AED no Brasil é um grande e barulhento tiro no pé, porque, por ela, muitas operações da Justiça-MPF-PF podem ser severamente criticadas — mormente a operação carne fraca, assim como a divulgação das gravações do presidente Temer com Joesley (nesse dia, a bolsa perdeu 200 bilhões), porque mais causam prejuízo que felicidade (no sentido utilitarista — que, como se sabe, está por detrás da AED) — sem considerar os altos custos em diárias e logística das operações.

Bom, só para avisar, eu não sou adepto da AED. Logo, essas contradições não são problema meu nem são problemas que atrapalham minha análise. Ah: e também não sou contra a lava jato – sou contra os desmandos e autoritarismos que a operação institucionaliza.

Minha oposição a qualquer teoria ceticista (emotivista, não-cognitivista moral e/ou pragmaticista, todos parentes entre si) está assentada na CHD – Crítica Hermenêutica do Direito – tendo por suporte a ideia de que existem padrões objetivos que sustentam “o certo e o errado”. Meu Dicionário de Hermenêutica e o livro Diálogos com Lenio Streck mostram isso à saciedade. Direito sem teoria da decisão vira irracionalidade na veia. Estamos cheios de profetas sobre o passado. No Brasil existem até realistas (retrôs) que sustentam que precedentes são fonte primária de direito. Aceita-se, no atacado, que, primeiro se decide e, só depois, busca-se a fundamentação. Ou seja: atravessam a ponte, chegam do outro lado e depois voltam para construir…a ponte pela qual passaram. Aporias em cima de aporias. Processualismo…sem processo. Bingo.

O que quero dizer é que, para uma teoria da prova, não se pode jogar com probabilidades, intuições, deduções e subjetivismos tipo “busco a verdade real”. No fundo, isso dá tudo no mesmo, porque há um desprezo por critérios substantivos e uma ode à ficcionalização das respostas. Na verdade, teorias como essas querem dar respostas antes das perguntas. Fazem “deduções” porque constroem, artificialmente, as premissas.

Porque a “teoria do pintinho envenenado” é melhor!

Para quem aposta em teses intuitivas, emotivistas, probabilísticas e quer trazer isto para a seara dos direitos e garantias de liberdade (processo penal), sugiro algo mais “seguro”, como o “Teorema do Pinto” (o apelido é dado por mim), “praticado” pela Tribo Azende, da África central. Sem intuicionismo e sem deduções, a tribo, para construir a prova e “buscar a verdade”, lança mão do que chamo de “fator benge”, que consiste em dar para um pintinho um veneno previamente preparado (há um ritual para isso) e, se o pinto morrer, o réu é considerado culpado. Se o pinto sobreviver, é absolvido[1].

Pergunto: Qual é a diferença da “teoria do pintinho benge” e a inversão do ônus da prova que ainda é aplicado pelos tribunais da pátria? Qual é a diferença da teoria do pintinho e a tese bayesianista pela qual Pr(A) e Pr(B) são as probabilidades a priori de A e B Pr(B|A)? Ou que Pr(A|B) são as probabilidades a posteriori de B condicional a A e de A condicional a B respectivamente? Ou que o réu Tício deve ser condenado porque a hipótese fática H foi tomada como verdadeira por Caio porque é a que melhor explica a evidência E? Ou que, pela AED, Tício… O leitor pode complementar.

Falemos sério. O Brasil tem um precário ensino jurídico. E práticas judiciárias que não possuem racionalidade. Em São Paulo, um grupo estrangeiro comprou um conjunto de faculdades e despediu mais de duas centenas de professores, trocou o currículo e esticou o percentual de aulas em EAD (que não deixa de ser resultado de uma “análise econômica”, se me permitem a ironia). Como se o direito fosse mero instrumento. Ora, fala-se em bayesianismo e quejandos e, pelo país afora, nas salas de aula ainda se ensina que Kelsen é um positivista exegético, que cumprir a letra da lei é uma atitude positivista, que princípios são valores, que o juiz deve decidir conforme sua consciência, etc. E o professor posta no Facebook a sua maior conquista — a de ver aprovado um artigo seu no Conpedi.

Erros e epistem(olog)ias fakes que se refletem na operacionalidade do direito nos fóruns e tribunais. Por que há tanta insegurança e falta de previsibilidade? Simples: Porque não há critérios. Porque não há preocupação com um mínimo grau de objetividade e respeito à coerência e à integridade do direito (aliás, isso é obrigação legal – artigo 926 do CPC). Porque sequer se cumpre a objetividade mínima do texto como ponto de partida limitador de um processo hermenêutico. Pergunto: O que são a livre apreciação da prova e o livre convencimento se não argumentos emotivistas (ou coisa desse gênero)? Por isso, envenenar o pinto pode ser mais eficiente. Um relógio parado também acerta hora duas vezes ao dia.

Deixemos o bayesianismo na (e para a) filosofia moral e a lógica. Quero no direito a preservação de garantias. Quem tem de provar robustamente a culpa do réu é o Estado. Isso não pode vir de presunções. E nem de probabilidades. E duvido alguém provar a existência de um fato a partir do Teorema de Bayes.

Além de tudo, determinadas teorias, analisadas no plano filosófico, constituem-se em um paradoxo: se estiverem certas, estão erradas, isto é, se estiverem certas, a filosofia e seus dois mil anos não serviram para nada. Matemos os filósofos. Matem o cantor e chamem o garçom, diria Fausto Wolff.

Para encerrar, conto uma historinha bem ao gosto dos realistas retrôs brasileiros (que são, todos, não cognitivistas morais), com uma advertência – A anedota abaixo é uma carapuça – ponha-a quem quiser. Quem a conta é o professor Arthur Ferreira Neto:

“Um professor alemão, responsável pela disciplina Niilismo, que se enquadra em qualquer dos não cognitivismos acima, foi indagado por um aluno acerca do significado de um conceito complexo e um tanto obscuro que estaria ele apresentando em aula. Respondeu o professor: – não sei a resposta agora; mas, não se preocupe, porque até amanhã inventarei uma”.

Bingo! Bem assim se faz na cotidianidade das práticas jurídicas e nas salas de aula de Pindorama. Como diz a mãe de um amigo meu, nem tudo que parece, é. Mas se é, parece.

Para quem conseguiu chegar até aqui: Escrevi esta coluna para falar das mistificações que começam a ser feitas a partir do uso de teorias exóticas para dentro da teoria da prova no processo penal brasileiro. Já teve até decisão em que se disse que não havia prova, mas a doutrina que tratava do assunto autorizava a condenação (e citava Malatesta). Que se use teses sofisticadas como o bayesianismo onde se quiser. Mas não na teoria da prova. Por favor, não vamos conspurcar a já combalida teoria da prova. Temos 350 mil presos cautelarmente que teriam melhor destino se, para os seus processos, fosse utilizada a teoria do pintinho envenenado… A chance de cada réu seria maior. Ou estou exagerando?

Salvemos, pois, a professorinha, com seu toco de giz. Salvemos as teorias da verdade. Não desistamos da (busca da) verdade!

Post scriptum: lendo a sentença condenatória do ex-Presidente Lula prolatada pelo Juiz Sérgio Moro, deu-me a nítida impressão que o réu teria mais chance de ser absolvido se tivesse sido usado o “Teorema do Pintinho Envenenado”, que faz sucesso na tribo Azende, da Africa Central.

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Lenio Luiz Streck é doutor em Direito (UFSC), pós-doutor em Direito (FDUL), professor titular da Unisinos e Unesa, membro catedrático da Academia Brasileira de Direito Constitucional, ex-procurador de Justiça do Rio Grande do Sul e advogado.

Do Cafezinho

“Por que querem me condenar”: o artigo de Lula citado em seu discurso sobre a sentença de Moro

Eis o artigo citado por Lula em sua coletiva sobre a condenação

Por que querem me condenar
Em mais de 40 anos de atuação pública, minha vida pessoal foi permanentemente vasculhada -pelos órgãos de segurança, pelos adversários políticos, pela imprensa. Por lutar pela liberdade de organização dos trabalhadores, cheguei a ser preso, condenado como subversivo pela infame Lei de Segurança Nacional da ditadura. Mas jamais encontraram um ato desonesto de minha parte.

Juristas condenam sentença sem provas de moro contra Lula

Diversos representantes da comunidade jurídica criticaram a sentença do juiz Sérgio Moro, que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 9 anos e meio de prisão pela posse de um apartamento triplex no Guarujá que jamais ficou provada; o professor de Direito Penal e Processual Penal, Fernando Hideo Lacerda, comentou que a decisão de condenar Lula, que sucedeu a aprovação do texto da reforma trabalhista na terça-feira (11).

Lacerda diz que a condenação caracteriza claro objetivo político: “não é apenas simbólico, mas desenhado com todas as letras: aqui quem manda é mercado, quem dá as cartas é o poder econômico”; professor de Direito Constitucional na PUC-SP, Pedro Estevam Serrano, considera que o processo contém vícios evidentes; doutor e mestre em Ciências Criminais, Salah H. Khaled Jr , considera que Sérgio Moro sustenta, mais uma vez, a reputação de juiz justiceiro sob forte apelo midiático.

Nesta quarta-feira (12), o juiz Sérgio Moro condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 9 anos e 6 meses de prisão, sob a acusação de ter recebido um apartamento triplex no Guarujá como contraprestação de corrupção em contratos firmados entre a Petrobrás e a construtora OAS.

A acusação, que não apontou qualquer documento de registro de imóvel, como também não conseguiu uma única testemunha que ratificasse o que foi posto na denúncia – as 73 testemunhas, das quais 27 da acusação, negaram o fato ou disseram desconhecê-lo – conseguiu êxito com o Juiz de Direito. Moro utilizou a delação de Léo Pinheiro, ex-presidente da OAS, como única fonte de prova para a condenação, ressaltando-se que o seu primeiro acordo foi recusado, no qual Lula era inocentado. O ex-presidente somente foi apontado na segunda delação.

A condenação repercutiu avidamente pelas redes sociais e levantou debates acerca do Estado Democrático de Direito e o forte apelo midiático que envolve a Operação Lava Jato desde seu início. O professor de Direito Penal e Processual Penal, Fernando Hideo Lacerda, comentou que a decisão de condenar Lula, que sucedeu a aprovação do texto da reforma trabalhista na terça-feira (11), caracteriza claro objetivo político: “não é apenas simbólico, mas desenhado com todas as letras: aqui quem manda é mercado, quem dá as cartas é o poder econômico”.

O professor de Direito Constitucional na PUC-SP, Pedro Estevam Serrano, considera que o processo contém vícios evidentes:

"Um absurdo essa decisão. Processo penal de exceção com vícios evidentes, que caracterizam objetivo político e não a aplicação da ordem jurídica. Os direitos fundamentais e a democracia vão ladeira abaixo."

O doutor e mestre em Ciências Criminais, Salah H. Khaled Jr , considera que Sérgio Moro sustenta, mais uma vez, a reputação de juiz justiceiro sob forte apelo midiático: “o investimento foi grande demais. Não interessa que a propriedade do tríplex soe como mera conjectura. A montanha não poderia parir um rato. Condenando Lula, Moro assegura que sua reputação permanecerá intacta. Se o resultado for revertido em segunda instância, em nada o afetará. Pelo contrário: pode fazer com que sua imagem de salvador da pátria saia ainda mais fortalecida”.

Já para o professor de Direito Constitucional, Bruno Galindo, a atuação de Moro “ocasionaria seu afastamento por suspeição em qualquer sistema judiciário sério do mundo (…) por muito menos do que Moro fez por aqui, o célebre Juiz Baltasar Garzón foi afastado por 11 anos da magistratura espanhola”. Sobre a decisão de condenar o ex-presidente, o professor afirmou que “essa Sentença publicada hoje era mais do que previsível, pois quem se posicionou reiteradamente como oponente do réu não teria como decidir diferente, o que é triste, pois vê-se que jogamos às favas no sistema judicial brasileiro a garantia constitucional da imparcialidade do julgador”.

Outro lado
Por meio da sua página no Facebook, o ex-presidente divulgou uma nota assinada por seus advogados, Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins em que afirmam: “Este julgamento politicamente motivado ataca o Estado de Direito do Brasil, a democracia e os direitos humanos básicos de Lula.”

Vale lembrar que a Lei da Ficha Limpa determina que somente será inelegível quem for condenado por um órgão colegiado, isto é, por um conjunto de juízes. No caso em questão, Lula foi condenado pela primeira instância por apenas um juiz e para que ele fique inelegível é indispensável uma eventual condenação pelo órgão colegiado, que no presente processo é a Câmara de Desembargadores Federais do Tribunal Regional Federal da 4ª Região.

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Moro usou delação desacreditada pelo MPF para condenar Lula

Na ausência de provas que justificassem a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva a 9 anos e meio de prisão no caso do triplex do Guarujá, o juiz federal se baseou em uma série de "indícios", incluindo na sentença até uma citação à delação do ex-senador Delcídio do Amaral.

São fantasiosas, as declarações de Delcídio foram desacreditadas até pelo Ministério Público Federal, que interpretou que o ex-senador citou Lula apenas para conseguir mais vantagens em seu acordo de delação premiada; defesa de Lula afirmou que "o juiz Moro deixou seu viés e sua motivação política claros desde o início até o fim deste processo".

Além das motivações políticas, a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva também teve aberrações jurídicas.

Advogados do petista já encontraram uma série de problemas na sentença, como, por exemplo, a citação da delação de Delcídio do Amaral.

A fala do ex-senador foi desacreditada na terça pelo procurador Ivan Marx, do Ministério Público Federal. Ao pedir o arquivamento de outra investigação contra Lula, Marx alegou que o ex-presidente só foi mencionado porque Delcídio queria benefícios fechar o acordo de colaboração com a Justiça.

Mesmo assim, as declarações fantasiosas de Delcídio constam na decisão de Moro, que condenou Lula a 9 anos e meio de prisão. 

As informações são da coluna Painel da Folha de S.Paulo.

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quarta-feira, 12 de julho de 2017

Joaquim de Carvalho: Ao condenar Lula sem prova, Moro escreve o último capítulo de uma farsa

Lula quando prestou depoimento a Moro: o senhor tem que achar um jeito de me condenar. Se não, será execrado. Moro preferiu agradar a seus seguidores a respeitar a Constituição. A execração dele será no meio jurídico.

A condenação de Lula por Sérgio Moro parece uma notícia velha.

Ou a antinotícia.

Na definição clássica, notícia é quando o homem morde o cachorro. Quando o cachorro morde o homem, não é notícia.

Moro condenar Lula é algo equivalente ao cachorro morder o homem – é o normal.

Surpreendente seria a absolvição do ex-presidente na Vara de Curitiba.

É que Moro se colocou como parte nesse processo e foi visto assim por seguidores, por adversários e pela mídia.

Formalmente, era juiz. Mas, na prática, se comportou como acusador.

Portanto, ao condenar Lula, Moro só entrega o último capítulo de um roteiro que começou a ser escrito em 2006, quando, por manobra judicial, ele se vinculou a um inquérito que investigava o doleiro Alberto Youssef.

A sentença tem 216 páginas e, em muitos pontos, pode ser vista como uma peça de defesa do próprio juiz.

Logo nas primeiras páginas, ele tenta convencer de que é isento para julgar o ex-presidente, condição em que nem o seu mais radical defensor acredita.

Não é à toa que a revista Veja, ao tratar do depoimento de Lula a Sérgio Moro, no dia 10 de maio deste ano, fez uma capa em que os dois eram apresentados com máscara de atletas de luta livre.

O processo em que Lula acaba de ser condenado teve, portanto, um julgamento sem juiz.

Moro escreveu sobre essa suspeita em sua sentença:

“Então, ao contrário do que persiste alegando a Defesa de Luiz Inácio Lula da Silva, mesmo em suas alegações finais, a decisões judiciais deste Juízo, conforme já apreciado nos foros próprios da Justiça, não foram criminosas e constituíram atos regulares no exercício da jurisdição.”

Atos regulares no exercício da jurisdição…

Em sua defesa, Moro argumenta que o Tribunal Regional Federal da 4ª Região rejeitou as ações dos advogados de Lula sobre a sua parcialidade.

É fato.

Num dos julgamentos, o tribunal considerou que Moro conduz um processo excepcional.

“É sabido que os processos e investigações criminais decorrentes da chamada operação ‘lava jato’, sob a direção do magistrado representado, constituem caso inédito (único, excepcional) no Direito brasileiro. Em tais condições, neles haverá situações inéditas, que escaparão ao regramento genérico, destinado aos casos comuns”, afirmou o relator de um processo em que 19 advogados pediam o afastamento de Moro por ter violado a Constituição ao interceptar e divulgar conversas da então presidente da República, Dilma Rousseff.

Uau.

A considerar válido esse entendimento, a Vara de Moro seria um tribunal de exceção.

Nos últimos julgamentos, agora que a popularidade de Moro está em queda, o Tribunal já começou a barrar os abusos do juiz.

Um desses abusos, ainda não julgados nas instâncias superiores, é a autorização que ele deu para grampear o telefone dos advogados de Lula.

É muito grave, pois indica que ele, o Ministério Público e a Polícia Federal poderiam ter acesso a conversas sobre a estratégia de defesa de Lula.

Na sentença, Moro também gasta algumas páginas tentando se defender dessa acusação, que, em países civilizados, resultaria no afastamento imediato do juiz e na abertura de um processo.

Moro confessa que, de fato, a empresa de telefonia alertou que uma das linhas interceptadas por ele pertencia a um escritório de advocacia, que é, pela Constituição, inviolável.

Moro diz que, com a atenção tomada por “centenas de processos complexos”, não percebeu.

Na sentença contra Lula, Moro escreveu:

“É fato que, antes, a operadora de telefonia havia encaminhado ao Juízo ofícios informando que as interceptações haviam sido implantadas e nos quais havia referência, entre outros terminais, ao aludido terminal como titularizado pelo escritório de advocacia, mas esses ofícios, no quais (sic) o fato não é objeto de qualquer destaque e que não veiculam qualquer requerimento, não foram de fato percebidos pelo Juízo, com atenção tomada por centenas de processos complexos perante ele tramitando”.

Moro ainda tem em suas mãos um segundo processo contra Lula, o do sítio de Atibaia.

Mas foi no processo do tríplex que ele deu o seu canto de cisne.

Ele tomou a sua decisão com rapidez, de forma que o TRF tenha tempo de julgar Lula ainda antes da eleição de 2018.

Se Lula for condenado em segunda instância, a lei da ficha limpa proíbe sua candidatura.

Não há, no processo no tríplex, prova de que o imóvel pertença a Lula.
Os documentos provam que o imóvel pertence à OAS.

Nem Lula ou alguém da sua família passou uma noite sequer no imóvel.

Portanto, se não tem a propriedade legal e se não desfruta do bem, que tipo de dono é esse?

Condenar sem prova é um ato político.

Para quem conhece o processo, isso já está claro.

Aos poucos, apesar do massacre da Globo, isso também ficará claro perante o público em geral.

Moro, ao tentar tirar Lula da vida pública, pode ter dado a ele mais um trunfo para sua eleição a presidente em 2018.

DCM

Willy Delvalle: Ao falar da condenação, imprensa internacional destaca as conquistas de Lula para o Brasil

Os principais veículos jornalísticos do mundo listam nesta quarta-feira, dia da condenação de Lula, as grandes conquistas do ex-presidente enquanto governou o Brasil.

O britânico “The Guardian” destaca que Lula saiu da pobreza na infância para se tornar presidente da República duas vezes, sendo agora condenado no primeiro de cinco inquéritos.

Cita a sentença como um grande abalo para o “primeiro presidente da classe trabalhadora, que deixou o governo seis anos atrás com 83% de aprovação”.

O jornal menciona que “o ex-líder sindical obteve admiração global por suas políticas de transformação social que ajudaram a reduzir a grande desigual social do maior país da América Latina”. Lembra também que Barack Obama se referia a Lula como o político mais popular da Terra.

A publicação britânica informa que a defesa já havia dito que apelaria de qualquer decisão, tendo afirmado continuamente que uma condenação seria perseguição partidária e que Moro é enviesado e motivado a condenar Lula por razões políticas. Moro nega as acusações, como o fez no início do depoimento prestado por Lula.

O “The Guardian” aponta também que a senadora Gleisi Hoffmann, presidente do partido, afirmou que a condenação serve para impedi-lo de se candidatar à presidência no ano que vem. E que o partido protestaria contra a decisão, confiante numa reversão da sentença.

O principal jornal do Reino Unido também observa que, apesar da condenação e outras acusações contra Lula, ele permanece como a figura mais popular entre os eleitores brasileiros, de acordo com as pesquisas recentes, e que ele manifestou querer concorrer novamente ao Palácio do Planalto ano que vem.

A expectativa do veredito de um recurso seria de oito meses, aponta a publicação.  Analistas políticos ouvidos pelo jornal, dizem que a esquerda estará arrasada se Lula não puder se candidatar, tendo que encontrar uma nova liderança “sob a sombra que Lula deixou na política brasileira pelas últimas três décadas”. “A ausência de Lula abre um imenso vazio na cena política, o que cria um enorme vácuo na esquerda. Entramos agora numa situação de extrema tensão política, além de todo o caos que estivemos vivendo no ano passado”, disse o professor da FGV Cláudio Couto ao Guardian.

O periódico cita que os dois mandatos de Lula foram marcados por um “boom” nas commodities, fazendo do Brasil uma das economias que cresciam mais rápido no mundo, com “políticas externas ambiciosas”, alinhando o país a outras grandes nações em desenvolvimento e inseriu o Brasil no cenário mundial.

Com Lula, aponta o The Guardian, o Brasil contestou a política hegemônica do norte, engajando-se em problemas globais como a paz no Oriente Médio e o programa nuclear do Irã. Por outro lado, cita que com a saída de Lula e a eleição de sua sucessora, Dilma Rousseff, a economia do país piorou, com a nação agora começando a se emergir de sua pior recessão.

A presidente, cita ainda o jornal, foi derrubada “por quebra de regras orçamentárias”, sendo que ela e seus apoiadores dizem que sua queda foi, na verdade, um golpe orquestrado pelo vice e agora presidente Michel Temer, que enfrenta acusações de corrupção. O próprio The Guardian, em outros momentos, se referiu ao processo de impeachment como “dúbio”.

Durante o julgamento de Lula, cita o diário, o ex-presidente alegou sua inocência e que foi por sua política e não desvio de dinheiro público que ele está sendo julgado. “Mas o que acontece não me deprime, me motiva a ir além e falar mais. Vou continuar lutando”, disse Lula.

O francês “Le Monde” destaca a condenação, referindo-se a Lula como “ícone da esquerda” e lembrando que o ex-presidente permanecerá em liberdade enquanto houver possibilidade de recursos. Diz que a condenação complica suas chances de concorrer à presidência e que, apesar de alta rejeição, ele está no topo das intenções de voto.

O espanhol “El País” observa que, no ano passado, após o processo de impeachment, Lula se apresentava como salvação para o Brasil, em meio aos seus favoráveis resultados eleitorais, mas que logo o Ministério Público começou a apresentar denúncias contra ele. E que ele apelava para a emoção de seus seguidores contra a perseguição que sofria.

O “The New York Times” fala do ex-presidente como alguém “que teve enorme influência na América Latina por décadas”. O norte-americano também aponta as afirmações de Lula de que as acusações contra ele são uma “farsa”. E cita que o juiz Sergio Moro disse que as ações de Lula eram parte de um sistêmico esquema de corrupção: “O presidente da República tem enormes responsabilidades”. “‘Desse modo, sua responsabilidade’ é norme”.

Como o The Guardian, The New York Times também menciona o grande crescimento econômico durante os governos Lula, creditado como uma liderança que retirou da pobreza milhões de pessoas “numa das nações com maior desigualdade entre ricos e pobres no mundo”.

“Moro disse que Lula tentou intimidar a corte, o que o juiz argumentou que seria motivo para prendê-lo imediatamente. Mas, Moro escreveu ainda que achou ‘prudente’ deixar Lula permanecer livre para recorrer. Prendê-lo seria ‘traumático’, escreveu (o juiz)”, cita o jornal norte-americano.

A correspondente da BBC em São Paulo, Katy Watson, diz que Lula permanece um político popular e que a sentença vai dividir profundamente o Brasil.

DCM 

Sérgio Moro cumpre seu papel e condena o ex-presidente Lula com sentença longa e vazia, por Fernando Brito

Sem que fosse surpresa para ninguém, Sérgio Moro condenou o ex-presidente Lula a nove anos e meio de prisão, em regime fechado.

Porque ele “recebeu” um apartamento no Guarujá que nunca lhe foi transferido ou teve qualquer promessa de entrega.

Mas não vem ao caso.

Só há uma coisa indiscutível na sentença de Moro, os parágrafos de número 48 e 49:

48. Questionam as Defesas de Luiz Inácio Lula da Silva e de Paulo Tarciso Okamoto a imparcialidade deste julgador.

49. Trata-se de questão já superada.

Absoluta verdade, Doutor Moro. Está claro para qualquer rpessoa neste país e por muitas partes do mundo que o senhor não apenas não é imparcial, mas um dedicado militante da causa do delenda Lula.

Ninguém na face da Terra acredita no que o senhor escreve:

A ampla cobertura jornalística à investigação denominada de ‘Operação Lava-Jato’, bem como a manifestação da opinião pública, favoráveis ou contrárias, para as quais o magistrado não tenha não acarretam a quebra da imparcialidade do magistrado.

Não, claro, ninguém viu o senhor esparramar-se no deleite dos holofotes, dos prêmios globais, nas palestras de João Dória e nem em vídeos e mensagens às manifestações “coxinhas”.

Tudo foi muito discreto, como apropriado a um juiz “imparcial”.

(…)o ex-Presidente Luiz Inácio Lula da Silva não está sendo julgado por sua opinião política e também não se encontra(sic)em avaliação as políticas por ele adotadas durante o período de seu Governo.

Também não tem (sic)qualquer relevância suas ( de Lula  ou de Moro?) eventuais pretensões futuras de participar de novas eleições ou assumir cargos públicos.

São, como se vê, alegações às quais não se pode dar concordância, exceto a verbal, que lhe falta.

Há páginas, páginas e mais páginas onde Moro afirma sua total neutralidade e todas as “liberdades” que deu à defesa, quando qualquer um que tenha assistido seus diálogos com os advogados de Lula, autoritários e descorteses.

Defende a condução coercitiva dizendo que – ahá! – os protestos surgidos por ela são sua própria justificativa, como se não pudesse ter marcado um depoimento.

E reclama da multidão que foi à Curitiba prestar solidariedade a Lula, de forma ordeira, porque exigiu “a montagem de um imenso esquema de segurança”. Quer dizer, Lula também é responsável por ter se montado uma praça de guerra na capital curtitibana.

Mas e a prova que o apartamento era de Lula? A compra, declarada no IR, de outra unidade do empreendimento e um documento, sem assinatura, que teria o número do tal “triplex”.

Diz que Lula “não apresentou explicação concreta nenhuma” sobre o fato de que a OAS não ter vendido o apartamento triplex, como se coubesse a ele responder, inclusive, por uma propriedade da empreiteira que estava penhorada à Caixa.

Há, depois, uma colagem de depoimento de delatores, embora nenhum deles faça menção a Lula, tudo para sustentar a tese – calçada unica exclusivamente no depoimento do Léo Pinheiro – de que João vaccari teria posto o apartamento  na “conta” de eventuais acertos com a OAS.

E Delírios incríveis, quando Moro, mesmo tendo de reconhecer o avanço do combate a corrupção diz que ele não promoveu ” a necessária alteração da exigência do trânsito em julgado da condenação criminal para início da execução da pena, algo fundamental para a efetividade da Justiça Criminal e que só proveio, mais recentemente, da alteração da jurisprudência do Egrégio Supremo Tribunal Federal (no HC 126.292, julgado em 17/02/2016, e nas ADCs 43 e 44, julgadas em 05/10/2016). Isso poderia ter sido promovido pelo Governo Federal por emenda à Constituição ou ele poderia ter agido para tentar antes reverter a jurisprudência do Supremo Tribunal Federal”.

Olha, é difícil não mandar um juiz a alguma parte depois de uma manifestação destas. Quer dizer que Lula é culpado de não ter mudado a jurisprudência secular do Supremo Tribunal Federal? É repugnante, imbecil, idiota alguém que usa – ainda que tresloucada – uma argumentação de natureza meramente especulativa numa sentença criminal!

Não há, em qualquer ponto da sentença, sequer uma indicação objetiva de como Lula “recebia” vantagens, exceto a palavra dos delatores que fazem uma “conta de chegar”  para reduzir suas penas nesta e em outras ações que respondem. E que conseguiram, claro.

Na parte da guarda do acervo presidencial, obvio, seria ridículo condenar e Moro, o justo, absolve Lula.

São as primeiras observações, numa leitura , ainda superficial, da imensa sentença. Aliás, sua vastidão, como costuma acontecer nas peças de Direito, é indicativo de sua fraqueza. Direito é fato e lei, não argumento e suposição, que vêm a ser literatura.

No caso de Moro, um romance policial ao inverso.  Nos tradicionais, há um crime e procura-se o criminoso. Neste, há um criminoso para o qual, de forma deliberada e prolixa, procurou-se um crime.

A sua sentença, se ainda houver equilíbrio na Justiça deste país é  que está condenada à revogação. E olhe lá, porque, num exame frio, o caso era de nulidade, mesmo.

Tijolaço

Xadrez das caçadas do rinoceronte por Sérgio Moro, Nassif

Cena 1 – as caçadas de Pedrinho e de Sérgio Moro
A história é de Monteiro Lobato no seu clássico “As Caçadas de Pedrinho”.

O rinoceronte foge do circo e se embrenha no mato. Cria-se um pânico geral e é montada uma força tarefa para caçar o rinoceronte. Em pouco tempo, a força tem centenas de homens nas mais variadas funções. Instala centrais telefônicas, de telégrafo para seus membros de comunicarem.

Por fim, descobrem o rinoceronte vivendo placidamente no sítio do Pica Pau Amarelo. Toca então negociar com a dona do sítio, dona Benta, com a intermediação da boneca Emília.

Decidem deixar o bicho por lá, mas com a condição de se manter o caso sob sigilo. Se soubessem que o rinoceronte estava em paz, o governo teria que desmontar toda a força tarefa criada.

De certo modo, a história reflete a saga de Sérgio Moro e seus companheiros da Lava Jato. Por lei, nem deveriam ser companheiros, mas cada qual na sua, a Polícia federal investigando, o Ministério Público denunciando ou não, e o juiz julgando. Todos se uniram irmãmente na mesma empreitada de caçar o rinoceronte, as provas definitivas contra Lula.

Gastaram energia, manchetes, recursos. Pressionaram testemunhas para delatar, transformaram as delações em manchetes definitivas e, agora, descobrem que o rinoceronte não existe. Não existe a bala de prata, a delação definitiva, a prova irrefutável. O rinoceronte é uma miragem.

E agora? Como fazer com as dezenas de anúncios dizendo que a caça ao rinoceronte estava prestes a se completar, que ele seria encontrado, preso e enjaulado? Foram três anos de caçadas de Moro, de celebrações antecipadas de vitória, de retratos tirados ao lado do rinoceronte morto, na forma de Power Point. E chega-se à conclusão de que o rinoceronte não existe.

Depois de tanto carnaval, não dá simplesmente para chegar ao distinto público e admitir que “foi engano”. Em vez de filé de rinoceronte, iriam exigir ensopado de Moro com molho de fígado de Dallagnol.

Esse é o dilema da Lava Jato, agora que sua hora começa a passar, sem que haja o mínimo sinal de rinoceronte à vista.

Cena 2 – o procurador que viu o rei nu
Ontem, viu-se o primeiro efeito regenerador do Ministério Público Federal (MPF), já sob os eflúvios da nova direção.

Lá atrás, o procurador Ivan Cláudio Marx desmascarou as denúncias de pedaladas contra Dilma Rousseff. Foi massacrado. Na oportunidade seguinte, analisando procedeimentos abertos por conta da delação do ex-senador Delcídio do Amaral, taxou Lula de “chefe de quadrilha”, denotando os efeitos da enorme pressão sofrida com a decisão anterior.

Agora,  solicitou o arquivamento de procedimento investigatório contra Lula, aberto em cima da delação do ex-senador Delcídio do Amaral, Para Ivan Marx, "não se pode olvidar o interesse do delator em encontrar fatos que o permitissem delatar terceiros, e dentre esses especialmente o ex-presidente Lula, como forma de aumentar seu poder de   barganha ante a Procuradoria-Geral da República no seu acordo de delação."

Ivan Marx disse o óbvio. Seguiu estritamente o que manda a lei. Como o menino da fábula, enxergou o rei nu e teve coragem de externar sua opinião. Por que agora, e não lá atrás? Porque o clima mudou. A fada do bom senso começa a baixar sobre o MPF e a corporação se dá conta de que o novo normal instituído pela Lava Jato, era insubsistente, ilegal, atentatórios aos princípios basilares de direito.

Enquanto isto, no Paraná, os procuradores questionam os benefícios concedidos por Sérgio Moro a Renato Duque. Segundo os próprios procuradores, a unica contribuição de Duque foi afirmar que "Lula sabia de tudo", comprovando, agora em casa, a ideia fixa e falta de discernimento jurídico da operação (https://goo.gl/NGuQwQ).

Enfim,  há um vento forte varrendo os dejetos que se acumularam no MPF, no período em que foi presidido por um Procurador Geral pusilânime.

Cena 3 – a lógica dos acordos de leniência
À medida em que vai se retirando as coberturas de vento colocadas pelos jovens deslumbrados da Lava Jato, é possível entender melhor a consistência, os conceitos centrais que fundamentam os institutos dos acordos de leniência e da delação premiada.

Não se pense que Deltan Dallagnol e seus companheiros sejam capazes de alguma sofisticação analítica. O máximo que conseguem extrair das novas doutrinas são gambiarras capazes de se encaixar nas suas narrativas e o uso despudorado do tribunal da mídia para suprir a falta de investigações.

A melhor explicação veio de um advogado, Caio Farah Rodriguez, em artigo para o caderno Ilustríssima, da Folha.

A lógica dos acordos de leniência – firmado com as empresas – é torna-las “cães de guarda” da ética empresarial. A punição pela reincidência é tão grave que, a partir do acordo, a empresa terá que zelar pelo estrito cumprimento da lei internamente, estendendo à toda a rede de fornecedores e clientes. Ela se torna um cão de guarda da legalidade.

Diz Rodriguez:
“Sob esse ângulo, o exemplo mais fecundo para reflexão sobre a Lava Jato não seria tanto a operação Mãos Limpas, na Itália, mas o processo Brown versus Board of Education (Brown contra Junta de Educação), decidido em 1954 pela Suprema Corte dos Estados Unidos. Trata-se do caso mais importante da jurisprudência constitucional americana no século 20”.

Era um caso de segregação e exclusão social. Havia hábitos arraigados de segregação – assim como há hábitos arraigados de corrupção nas relações empreiteiras-poder público.

“Ao reconhecer a uma menina negra o direito de se matricular em um colégio localizado em distrito escolar no qual habitavam apenas brancos, a Suprema Corte considerou não ser suficiente declarar o direito. Orientou cortes inferiores a tomar medidas necessárias para efetivar a promessa constitucional de igualdade na educação, o que incluiu —por intermédio das chamadas ordens judiciais de dessegregação— realocar linhas de ônibus entre distritos escolares, capacitar professores para ensinar em ambiente de maior diversidade, rever bibliotecas etc.

Ou seja, tratou de criar as condições para mudar radicalmente o ambiente que permitia a permanência da segregação.

(...) A partir dessa situação, criou-se uma prática judicial nos EUA (chamada de execução complexa), para além da aplicação típica da lei  a controvérsias específicas. Seu emprego, que contou muitas vezes com o apoio do Poder Executivo, estendeu-se de escolas a hospitais públicos e prisões.

O Direito serviu mais para desestabilizar costumes arraigados do que para refleti-los”.

Por aqui, transformou-se esses instrumentos em um parangolé jurídico, com procuradores unicamente empenhados em instrumentalizar as ferramentas para propósitos político-partidários e de autopromoção.

Cena 4 – o fim do golpe
O golpe do impeachment acabou. Não significa que não haverá ainda consequências. A própria aprovação da nova lei trabalhista é prova disso.

O método e o conteúdo foram tão primários quanto o discurso de ódio que levou multidões às ruas, colocando de joelhos Ministros do Supremo.

Nenhuma multinacional vai investir no país com base nessas reformas.

É evidente que havia necessidade de reformas na legislação trabalhista. Há mudanças enormes no universo do trabalho, novas formas de trabalho, novas organizações.

Mas o caminho seria uma discussão ampla que permitisse um entendimento sobre o trabalho nesses novos tempos, a identificação clara dos pontos vulneráveis nas relações de trabalho e, a partir daí, uma nova legislação erigida em torno de conceitos bem definidos.

Por exemplo, hoje em dia há duas partes fracas na Justiça trabalhista: os empregados de alguns grandes setores e as pequenas e microempresas.

Há um universo regulado nas grandes metrópoles, entre empresas modernas e respectivos sindicatos. Fora dos grandes centros, abusos intermináveis, como é o caso das centenas de denúncias contra a JBS no campo. Nos grandes centros, uma indústria de ações trabalhistas vitimando especialmente pequenos empresários. E, por cima de tudo, novas formas de relações de trabalho, como é o próprio caso da Uber e seus motoristas.

Segundo especialistas, a nova legislação foi montada a golpes de machado.

 Juntou-se um grupo de empresários em uma sala e se perguntava o que incomodava na legislação trabalhista. Alguém apontava um item qualquer que imediatamente era decepado.

O caminho correto seria chamar especialistas para destrinchar as novas formas de trabalho e definir um aparato conceitual que permitisse identificar os pontos de precarização tanto do trabalho como da segurança dos pequenos empresários.

Uma reforma séria deveria obrigar que parte do dinheiro do Sistema S (que é dinheiro de impostos) fosse alocado em programas de defesa e de aprimoramento do trabalho nas pequenas empresas. Grandes empresas nas grandes cidades dificilmente são alvos de ações trabalhistas, porque sabem se locomover no cipoal regulatório. Nada mais justo que as federações empresariais usassem o dinheiro dos impostos que recebem para defender e modernizar as pequenas e micro empresas.

Em vez disso, o que se viu foi a manipulação escandalosa de estatísticas até por Ministros do Supremo, e a transformação do que deveria ser fruto de um novo pacto social, em uma vitória absoluta sobre a outra parte.

Nenhuma multinacional racional irá aportar por aqui por conta das mudanças na legislação trabalhista. Ainda há uma Justiça do Trabalho a zelar por pontos centrais. Qualquer forma de precarização do trabalho, por si, abre espaço para novas demandas trabalhistas, independentemente do que reza a lei.

Em vez de um pacto social, o que a nova legislação promoverá será um boom nas ações trabalhistas por todo o país. A reconquista dos direitos perdidos trará de volta as grandes batalhas campais dos primórdios do capitalismo.

GGN

Joaquim de Carvalho: o Advogado Adolfo Gois grampeado por Moro conta como “lava jato” nasceu fora da lei

O advogado e o grampo admitido por Moro: Constituição rasgada.

O advogado que teve o sigilo telefônico quebrado em 2006, na origem da investigação que resultou na Lava Jato, disse hoje ao DCM que a operação não resiste a uma verificação séria de legalidade.

“Interceptaram uma conversa minha com um cliente, o que é a violação de um direito constitucional, e investigaram José Janene, que era meu cliente, sem terem poderes para isso. Janene era deputado federal e quem tinha que investiga-lo é o Supremo Tribunal Federal”, afirmou o advogado Adolfo Gois, de Londrina, na primeira entrevista que concede sobre o caso.

Gois advogou para Janene durante muitos anos, inclusive quando o deputado federal foi acusado de envolvimento no mensalão, em entre 2005 e 2006.

O advogado defendia os parentes e funcionários de Janene acusados de envolvimento com a lavagem dos recursos de caixa 2.

Nas conversas sobre esses fatos que o advogado teve com funcionários de Janene, a Polícia Federal descobriu que Alberto Youssef era doleiro do deputado federal.

Mas, em vez de remeter o caso para o Supremo, continuou a investigar.

Investigou, mas ninguém foi julgado.

“Toda hora, chamavam meus clientes para depor e eu não sabia que estava sendo grampeado. Soube em 2016, quando o advogado de Paulo Okamotto (presidente do Instituto Lula) me procurou para falar sobre o inquérito lá de trás. Ele tinha tido acesso a alguns documentos da Polícia Federal que eu não tinha visto, e encontrou os relatórios que mostravam as minhas conversas com meus clientes”, afirmou.

O advogado também considera muito estranho como os inquéritos foram parar nas mãos do juiz Sérgio Moro.

“Quem cuidava desses inquéritos era outro juiz, o doutor Nivaldo Brunoni, e eu nunca entendi como saíram da mão dele e foram para as de Sérgio Moro, que, aliás, nem era um juiz tão brilhante assim. Mais tarde é que ele virou uma unanimidade nacional, e eu vi que ninguém teve coragem de verificar o que ele exatamente fez para assumir a investigação toda”, declarou.

Segundo Adolfo Gois, não havia nenhuma relação dos fatos investigados em 2006 com a Petrobras.

“Era o mensalão”, insiste.

Os clientes dele não foram denunciados, e ele deixou o caso depois que Janene morreu, em 2010.

“Em 2014, vejo que o Sérgio Moro começa a prender todo mundo e descubro que estava relacionado com a investigação lá atrás. Como ele fez isso? É só analisar os documentos para ver que forçaram a barra para que ele se tornasse o juiz competente para todos os casos. Pela lei, não podia assumir tudo isso”, afirmou.

“Mas eu acho que a culpa maior nem é dele. É das instâncias superiores, que não tiveram coragem de barrar o que Moro vinha fazendo – só agora é que algumas decisões do juiz da 13ª Vara Federal de Curitiba começam a ser revistas, como a que absolveu João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do PT, que havia sido condenado por Moro sem provas.

No meio jurídico, circulou a informação de que o juiz Sérgio Moro divulgaria hoje a sentença no processo em que o ex-presidente Lula é acusado de receber um tríplex da empreiteira OAS como propina por contratos da Petrobras.

Até agora, nada.

Mas a expectativa é que a sentença saia a qualquer momento, e o juiz condene o ex-presidente, embora não haja uma única prova de que o apartamento do Guarujá pertença a Lula ou a sua família.

Pelo contrário.

As provas existentes no processo mostram que o apartamento nunca deixou de pertencer à empreiteira.

E Lula é credor de mais de R$ 200 mil da OAS e de sua antecessora no empreendimento, a Bancoop, valor que Marisa Letícia, mulher do ex-presidente, pagou por uma cota do condomínio.

O que leva à expectativa de condenação é o envolvimento demonstrado por Moro no processo e as declarações que já deu, sendo identificado como adversário de Lula.

Moro e Lula foram retratados na capa da revista Veja como atletas de luta livre, preparados para um confronto no ringue.

É a percepção pública da Lava Jato: Moro x Lula.

Se deixar de condenar o ex-presidente, Sérgio Moro passará a imagem de que perdeu a luta.

Se condenar, como é provável, ficará bem com seus seguidores, mas sairá com a imagem queimada no meio jurídico.

Passado esse ambiente de vale tudo, quando as instâncias superiores do Judiciário se dispuserem a analisar os abusos cometidos, o advogado Adolfo Gois é uma personalidade a ser chamada.

“Tenho muitos documentos, juntados no processo, que mostram que Moro nunca poderia ser o juiz da Lava Jato”, afirmou.


DCM

Ministério Público Federal: Delcídio pode ter citado Lula em delação só para ganhar benefício

Para o procurador da República Ivan Cláudio Marx, o ex-senador Delcídio Amaral pode ter citado o nome do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva na tentativa de atrapalhar as investigações da Operação Lava-Jato com o objeto de aumentar seu poder de barganha e, assim, ampliar os benefícios da delação premiada negociada com a Procuradoria-Geral da República (PGR).

Na avaliação de Ivan Marx, a palavra de Delcídio, que teve seu acordo homologado no Supremo Tribunal Federal (STF), perde credibilidade.

O diagnóstico foi feita em documento protocolado na Justiça Federal de Brasília no qual o procurador pediu o arquivamento de um procedimento investigatório criminal (PIC) que apurava a participação do ex-presidente Luiz Inacío Lula da Silva em tentativa de obstrução de justiça.

"Ademais, não se pode olvidar o interesse do delator em encontrar fatos que o permitissem delatar terceiros, e dentre esses especialmente o ex-presidente Lula, como forma de aumentar seu poder de barganha ante a Procuradoria-Geral da República no seu acordo de delação", escreveu Ivan Marx.

O pedido de arquivamento do procedimento não afeta diretamente outro processo, em curso na Justiça Federal, que apura se Lula participou dos esforços para comprar o silêncio do ex-diretor da Petrobras Nestor Cerveró, que viria a firmar acordo de delação. Mas essa ação penal, que tem sete réus, entre eles Lula, também é baseada na delação de Delcídio. E Ivan Marx faz considerações sobre o caso no documento.

"A participação de Lula só surgiu através do relato de Delcídio, não tendo sido confirmada por nenhuma outra testemunha ou corréu no processo. Ressalte-se não se estar aqui adiantando a responsabilidade ou não do ex-presidente Lula naquele processo, mas apenas demonstrar o quanto a citação de seu nome, ainda que desprovida de provas em determinados casos, pode ter importado para o fechamento do acordo de Delcídio do Amaral, inclusive no que se refere à amplitude dos benefícios recebidos. Assim, a criação de mais um anexo com a implicação do ex-presidente em possíveis crimes era sim do interesse de Delcídio. Por isso, sua palavra perde credibilidade", acrescentou o procurador.


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