domingo, 25 de junho de 2017

Numa pós-verdade defesa de Dallagnol cita norma da Magistratura como se fosse do MP

Sobre Deltan Dallagnol e as suas palestras

Em uma das investigações contra o ex-presidente Lula, o Ministério Público Federal o acusa de fazer palestras como forma de lavar dinheiro. A operação Lava Jato quebrou sigilo da LILS – Palestras, Eventos e Publicações, para constatar o que já havia sido divulgado pelo próprio ex-presidente, e que consta em suas declarações de imposto de renda. No caso trata-se de pessoa física, não ocupante de cargo público, pra quem não há qualquer óbice de atividades privadas, com ou sem remuneração. Como tem sido praxe, tudo foi feito de forma espetaculosa para criar a presunção de culpa de uma atividade exercida regularmente, na busca de atribuir-lhe alguma espécie de ilegalidade.

De outra sorte, o coordenador da força-tarefa da Lava Jato e procurador do Ministério Público Federal Deltan Dallagnol recebeu R$ 219 mil apenas no ano de 2016, em 12 palestras feitas para falar da corrupção e da operação. Os valores percebidos neste ano de 2017 não foram informados.

Quando a história foi parar nos jornais, o procurador afirmou que doou “quase tudo” para um hospital no Paraná, que cuida de crianças com câncer. Em seguida, a força-tarefa da Lava Jato emitiu nota na página do Ministério Público Federal reiterando o que já afirmado pelo procurador, de que a atividade é autorizada pela Constituição e por normas internas, por se tratar de atividade docente. Diz a nota:

“... As resoluções 34/2007 do CNJ e 73/2011 do CNMP, nos termos da Constituição Federal, reconhecem que membros do PJ e do MP podem realizar atividade docente, gratuita ou remunerada. A resolução 34/2007 expressamente reconhece que a realização de palestras é atividade docente. É perfeitamente legal a realização de palestras remuneradas segundo o valor de mercado, o que é uma prática comum no meio jurídico.
(...)”

Para qualquer pessoa desinteressada em checar os argumentos postos, o texto pareceria contundente. Não resiste, porém, nem mesmo a uma primeira leitura dos dispositivos citados. Dois pontos o descredenciam totalmente. O primeiro é que ao Conselho Nacional de Justiça – CNJ cumpre zelar pela autonomia do Poder Judiciário e pelo cumprimento do Estatuto da Magistratura, o que significa que membros do Ministério Público Federal, como é o caso de Deltan Dallagnol, não estão sujeitos às resoluções do CNJ. Portanto, a citação de uma resolução do CNJ figura na nota apenas para conferir-lhe ilustração.

Desse modo, ainda que Resolução do CNJ autorizasse a prática de receber pagamento por palestras - coisa que efetivamente a Resolução nº 34/2007/CNJ não faz - estaria restrita à atuação dos magistrados. De fato, o que faz a resolução citada, no caput de seu art. 4º, é reconhecer palestras como atividade docente, limitando-as, contudo, no parágrafo 6º, do mesmo artigo, às vedações constitucionais do art. 95, da CF/88, dentre as quais o inciso IV prevê:

“Art. 95. Os juízes gozam das seguintes garantias:
..........................................................................................
Parágrafo único. Aos juízes é vedado:
IV - receber, a qualquer título ou pretexto, auxílios ou contribuições de pessoas físicas, entidades públicas ou privadas, ressalvadas as exceções previstas em lei; (Incluído pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004)”

A menção à Resolução do CNJ é uma tentativa de justificar a prática do procurador. Ocorre, por outro lado, que a questão se apresenta mais grave justamente pelo texto citado por Deltan Dallagnol e reproduzido na nota do MPF. 

Logo em seu artigo 1º, a Resolução nº 73/2011 do CNMP - essa sim totalmente aplicável ao caso - fulmina a defesa do procurador:

“Art. 1º. Ao membro do Ministério Público da União e dos Estados, ainda que em disponibilidade, é defeso o exercício de outro cargo ou função pública, ressalvado o magistério, público ou particular, por, no máximo, 20 (vinte) horas-aula semanais, consideradas como tais as efetivamente prestadas em sala de aula.” (grifamos)

Como se pode notar, o CNMP não apenas não reconhece palestras como atividade docente, como determina expressamente que o magistério somente pode ser considerado como tal se prestado em sala de aula. Causa muita estranheza que o procurador tenha citado duas resoluções, uma que não lhe socorre em nada, por não lhe ser aplicável e  outra que evidencia com toda clareza seu desvio de conduta. 

Parece um daqueles estranhos casos de convicção em sentido contrário ao que diz a norma, e de adoção de pesos e medidas completamente distintos ao conceito de moralidade quando se trata de averiguar a conduta de outrem e a própria. Dito de modo simples, as palestras de Lula, exercidas dentro das leis e de forma regular, sem qualquer vedação que as impeça e devidamente declaradas no imposto de renda assumem, de antemão, uma pecha de suspeição. As de Dallagnol, exercidas fora das normas recebem respostas vazias de sentido jurídico. É a linha do dito popular: “faça o que eu digo, não o que eu faço”

A expressão “exercer o comércio”, contida no art. 117, X, da Lei 8.112/1990, à qual todos os servidores públicos devem obediência, não é um conceito que pode tratado de forma restritiva. A atividade de proferir palestras em troca de valor pecuniário é certamente atividade de mercancia. Se a lei proíbe a administração e a gerência de sociedade privada, que são ações menores, pelos mesmos fundamentos proíbe a concepção de empresário individual e de percepção de valores por atividade tipicamente privada, como palestras, que configuram atos nítido exercício do comércio.

Provocado por parlamentares, resta saber se o Conselho Nacional do Ministério Público irá cumprir com seu dever constitucional, exigir o cumprimento de sua Resolução, da Lei 8.112/90 e da Constituição Federal, investigando o procurador Deltan Dallagnol e aplicando-lhe as devidas sanções, ou irá fazer jogo com a opinião pública alimentando a falsa percepção de que se trata de mais uma ação para tentar “barrar a Lava Jato”, jargão infelizmente usado para que alguns dos agentes públicos envolvidos na operação atuem em desacordo com as normas impunemente.

247, Por Gleisi Hoffmann, senadora da República e presidenta do PT, e Tânia Oliveira, assessora jurídica da bancada do PT no Senado.

Fábio de Oliveira Ribeiro: A jornada de Dallagnol entre Joseph Campbell e Maquiavel

Com ajuda da mídia, carreira de procurador submergiu dando lugar a uma verdadeira trajetória do herói. 
Há alguns meses teci alguns comentários sobre o Morodämmerung, no texto O crepúsculo do deus da Lava Jato. Hoje farei algumas considerações sobre o crepúsculo de outro inimigo mortal do PT.

Quando declarou guerra a Lula, Deltan Dallagnol foi apresentado ao respeitável público como um moço religioso, abnegado, honesto e totalmente comprometido com a cruzada contra a corrupção. As entrevistas e fotos dele inundaram a internet. Impossível esquecer a imagem dele ajoelhado sendo ungido por pastores evangélicos como se fosse um hospitalário que colocaria a vida em risco para garantir a rota entre a Europa e Jerusalém conquistada aos mouros.

É evidente que o procurador da Lava Jato deixou de ser apenas um servidor público como outro qualquer. A imprensa o transformou num personagem grandioso e passou a reforçar esta imagem. Em pouco tempo a carreira profissional de Deltan Dallagnol submergiu e deu lugar à uma verdadeira trajetória do herói concebida sob a inspiração da obra de Joseph Campbell:

Todavia, o procurador da Lava Jato apenas se tornou um verdadeiro pop-star quando apresentou o powerpoint demonstrando que Lula era o líder máximo de uma organização criminosa. Foi nesta oportunidade que ele disse a frase famosa que começou a destruir sua imagem. Perguntado sobre como havia chegado à conclusão de que o ex-presidente petista era o capo di tutti capi Dellagnol disse:

“Não temos provas, mas convicção…”
A corrupção dos princípios constitucionais de Direito Penal pelo procurador, porém, não foi notada pela imprensa. O acusado não era um dos mascotes amestrados dos barões da mídia. José Dirceu foi condenado porque não provou sua inocência (voto de Luiz Fux), Lula foi denunciado porque a convicção do procurador servia como indício da prova do crime, da autoria e da motivação.

Imediatamente os juristas brasileiros começaram a questionar as estranhas teorias de Dallagnol. Mas a imagem dele não sofreu um grande dano, pois a grande imprensa seguiu reforçando a imagem positiva que criou para ele. Seguro de si, o procurador começou a cometer erros.

O primeiro foi adquirir imóveis utilizando um programa social destinado à população de baixa renda. Dallagnol ganha quase 100 mil reais por mês e não é exatamente um pobrezinho que precisa de subsídio estatal para comprar a primeira casa própria. O segundo erro dele foi bem mais grave do ponto de vista iconográfico. No dia da audiência de interrogatório de Lula por Sérgio Moro, o hospitalário do MPF tirou folga e deixou a espada pendurada na parede. A ausência dele foi interpretada como covardia profissional imperdoável.

E então uma bomba explodiu no colo do procurador mutilando definitivamente sua imagem de bom moço. É fato, Dellagnol está utilizando seu cargo e as informações privilegiadas sobre a Lava Jata que detém para dar palestras em troca de dinheiro. No início do processo as motivações dele pareciam ser apenas religiosas, políticas e ideológicas. No final, o que impele o acusador de Lula é apenas a ganância pelo vil metal.

A saga do procurador da Lava Jato começou como uma jornada do herói descrita por Joseph Campbell e tudo indica que ela terminará como uma paródia da obra de Maquiavel.

“O quanto os homens podem facilmente corromper-se

O decenvirato nos fornece um exemplo da facilidade com que os homens se deixam corromper; da presteza com que o seu caráter se transforma, ainda quando naturalmente bom e cultivado pela educação.

Basta considerar como os jovens que Ápio escolhera para acompanhá-lo logo se familiarizaram com a tirania, deixando-se seduzir em troca de umas poucas vantagens. Basta ver Quinto Fábio, membro do segundo decenvirato, homem famoso pela virtude, mas a quem a ambição cegou, sendo seduzido pela perversidade de Ápio e desprezando a virtude para mergulhar no vício, tornando-se em tudo um émulo deste.

São fatos, que examinados maduramente, darão mais motivos ainda aos legisladores da república e dos reinos para impor um freio às paixões dos homens, tirando-lhes a esperança de poder errar impunemente.” (Comentários sobre a primeira década de Tito Lívio, Nicolau Maquiavel, editora UNB, Brasilia, 5a.edição, 2008, p. 139)

Além de corromper os princípios constitucionais de Direito Penal ao acusar e humilhar publicamente Lula sem provas, Dallagnol fez a mesma coisa que os corruptos fazem: ele usou o cargo que ocupa para obter vantagens pessoais. O ciclo dele está completo e a imprensa certamente irá descartá-lo. A queda do procurador da Lava Jato é inevitável. Quando for suspenso ou perder o cargo ele poderá finalmente se dedicar mais ao estudo da bééééblia. Mas se ele resolver estudar Direito Constitucional e Maquiavel tanto melhor.

Do GGN

“A classe média é feita de imbecil pela elite”, Jessé Souza

Os extratos médios, diz o sociólogo, defendem de forma acrítica os interesses dos donos do poder e perpetuam uma sociedade cruel forjada na escravidão.
Paulo Pinto/Fotos Públicas
Inocentes úteis? Ou só úteis?

Em agosto, o sociólogo Jessé Souza lança novo livro, A Elite do Atraso – da Escravidão à Lava Jato. De certa forma, a obra compõe uma trilogia, ao lado de A Tolice da Inteligência Brasileira, de 2015, e de A Ralé Brasileira, de 2009, um esforço de repensar a formação do País.

Neste novo estudo, o ex-presidente do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada aprofunda sua crítica à tese do patrimonialismo como origem de nossas mazelas e localiza na escravidão os genes de uma sociedade “sem culpa e remorso, que humilha e mata os pobres”. A mídia, a Justiça e a intelectualidade, de maneira quase unânime, afirma Souza na entrevista a seguir, estão a serviço dos donos do poder e se irmanam no objetivo de manter o povo em um estado permanente de letargia. A classe média, acrescenta, não percebe como é usada. “É feita de imbecil” pela elite.

CartaCapital: O impeachment de Dilma Rousseff, afirma o senhor, foi mais uma prova do pacto antipopular histórico que vigora no Brasil. Pode explicar?

Jessé Souza: A construção desse pacto se dá logo a partir da libertação dos escravos, em 1888. A uma ínfima elite econômica se une uma classe, que podemos chamar de média, detentora do conhecimento tido como legítimo e prestigioso. Ela também compõe a casta de privilegiados. São juízes, jornalistas, professores universitários. O capital econômico e o cultural serão as forças de reprodução do sistema no Brasil.

Em outra ponta, temos uma classe trabalhadora precarizada, próxima dos herdeiros da escravidão, secularmente abandonados. Eles se reproduzem aos trancos e barrancos, formam uma espécie de família desestruturada, sem acesso à educação formal. É majoritariamente negra, mas não só. Aos negros libertos juntaram-se, mais tarde, os migrantes nordestinos. Essa classe desprotegida herda o ódio e o desprezo antes destinados aos escravos. E pode ser identificada pela carência de acesso a serviços e direitos. Sua função na sociedade é vender a energia muscular, como animais. É ao mesmo tempo explorada e odiada.

CC: A sociedade brasileira foi forjada à sombra da escravidão, é isso?

JS: Exatamente. Muito se fala sobre a escravidão e pouco se reflete a respeito. A escravidão é tratada como um “nome” e não como um “conceito científico” que cria relações sociais muito específicas. Atribuiu-se muitas de nossas características à dita herança portuguesa, mas não havia escravidão em Portugal.

Somos, nós brasileiros, filhos de um ambiente escravocrata, que cria um tipo de família específico, uma Justiça específica, uma economia específica. Aqui valia tomar a terra dos outros à força, para acumular capital, como acontece até hoje, e humilhar e condenar os mais frágeis ao abandono e à humilhação cotidiana.

CC: Um modelo que se perpetua, anota o senhor no novo livro.

JS: Sim. Como essa herança nunca foi refletida e criticada, continua sob outras máscaras. O ódio aos pobres é tão intenso que qualquer melhora na miséria gera reação violenta, apoiada pela mídia. E o tipo de rapina econômica de curto prazo que também reflete o mesmo padrão do escravismo.

CC: Como isso influencia a interpretação do Brasil?

JS: A recusa em confrontar o passado escravista gera uma incompreensão sobre o Brasil moderno. Incluo no problema de interpretação da realidade a tese do patrimonialismo, que tanto a direita quanto a esquerda, colonizada intelectualmente pela direita, adoram. O conceito de patrimonialismo serve para encobrir os interesses organizados no chamado mercado. Estigmatiza a política e o Estado, os “corruptos”, e estimula em contraponto a ideia de que o mercado é um poço de virtudes.

"O ódio aos pobres é intenso"
CC: O moralismo seletivo de certos setores não exprime mais um ódio de classe do que a aversão à corrupção?

JS: Sim. Uma parte privilegiada da sociedade passou a se sentir ameaçada pela pequena ascensão econômica desses grupos historicamente abandonados. Esse sentimento se expressava na irritação com a presença de pobres em shopping centers e nos aeroportos, que, segundo essa elite, tinham se tornado rodoviárias.

A irritação aumentou quando os pobres passaram a frequentar as universidades.
 Por quê? A partir desse momento, investiu-se contra uma das bases do poder de uma das alas que compõem o pacto antipopular, o acesso privilegiado, quase exclusivo, ao conhecimento formal considerado legítimo. Esse incômodo, até pouco tempo atrás, só podia ser compartilhado em uma roda de amigos. Não era de bom tom criticar a melhora de vida dos mais pobres.

"O ódio aos pobres é intenso"

CC: Como o moralismo entra em cena?

JS: O moralismo seletivo tem servido para atingir os principais agentes dessa pequena ascensão social, Lula e o PT. São o alvo da ira em um sistema político montado para ser corrompido, não por indivíduos, mas pelo mercado. São os grandes oligopólios e o sistema financeiro que mandam no País e que promovem a verdadeira corrupção, quantitativamente muito maior do que essa merreca exposta pela Lava Jato. O procurador-geral, Rodrigo Janot, comemora a devolução de 1 bilhão de reais aos cofres públicos com a operação. Só em juros e isenções fiscais o Brasil perde mil vezes mais.
Souza: novo livro em agosto (Foto: Filipe Vianna)

CC: Esse pacto antipopular pode ser rompido? O fato de os antigos representantes políticos dessa elite terem se tornado alvo da Lava Jato não fragiliza essa relação, ao menos neste momento?

JS: Sem um pensamento articulado e novo, não. A única saída seria explicitar o papel da elite, que prospera no saque, na rapina. A classe média é feita de imbecil. Existe uma elite que a explora. Basta se pensar no custo da saúde pública. Por que é tão cara? Porque o sistema financeiro se apropriou dela. O custo da escola privada, da alimentação. A classe média está com a corda no pescoço, pois sustenta uma ínfima minoria de privilegiados, que enforca todo o resto da sociedade. A base da corrupção é uma elite econômica que compra a mídia, a Justiça, a política, e mantém o povo em um estado permanente de imbecilidade.

CC: Qual a diferença entre a escravidão no Brasil e nos Estados Unidos?

JS: Não há tanta diferença. Nos Estados Unidos, a parte não escravocrata dominou a porção escravocrata. No Brasil, isso jamais aconteceu. Ou seja, aqui é ainda pior. Os Estados Unidos não são, porém, exemplares. Por conta da escravidão, são extremamente desiguais e violentos. Em países de passado escravocrata, não se vê a prática da cidadania. Um pensador importante, Norbert Elias, explica a civilização europeia a partir da ruptura com a escravidão. É simples. Sem que se considere o outro humano, não se carrega culpa ou remorso. No Brasil atual prospera uma sociedade sem culpa e sem remorso, que humilha e mata os pobres. 

CC: Algum dia a sociedade brasileira terá consciência das profundas desigualdades e suas consequências?

JS: Acho difícil. Com a mídia que temos, desregulada e a serviço do dinheiro, e a falta de um padrão de comparação para quem recebe as notícias, fica muito complicado. É ridícula a nossa televisão. Aqui você tem programas de debates com convidados que falam a mesma coisa. Isso não existe em nenhum país minimamente civilizado. É difícil criar um processo de aprendizado.

CC: O senhor acredita em eleições em 2018?

JS: Com a nossa elite, a nossa mídia, a nossa Justiça, tudo é possível. O principal fator de coesão da elite é o ódio aos pobres. Os políticos, por sua vez, viraram símbolo da rapinagem. Eles roubam mesmo, ao menos em grande parte, mas, em analogia com o narcotráfico, não passam de “aviõezinhos”. Os donos da boca de fumo são o sistema financeiro e os oligopólios. São estes que assaltam o País em grandes proporções. E somos cegos em relação a esse aspecto. A privatização do Estado é montada por esses grandes grupos. Não conseguimos perceber a atuação do chamado mercado. Fomos imbecilizados por essa mídia, que é paga pelos agentes desse mercado. Somos induzidos a acreditar que o poder público só se contrapõe aos indivíduos e não a esses interesses corporativos organizados. O poder real consegue ficar invisível no País.

CC: O quanto as manifestações de junho de 2013, iniciadas com os protestos contra o reajuste das tarifas de ônibus em São Paulo, criaram o ambiente para a atual crise política?

JS: Desde o início aquelas manifestações me pareceram suspeitas. Quem estava nas ruas não era o povo, era gente que sistematicamente votava contra o projeto do PT, contra a inclusão social. Comandada pela Rede Globo, a mídia logrou construir uma espécie de soberania virtual. Não existe alternativa à soberania popular. Só ela serve como base de qualquer poder legítimo. Essa mídia venal, que nunca foi emancipadora, montou um teatro, uma farsa de proporções gigantescas, em torno dessa soberania virtual. 
Um resumo das relações sociais no Brasil
CC: Mas aquelas manifestações foram iniciadas por um grupo supostamente ligado a ideias progressistas...

JS: Só no início. A mídia, especialmente a Rede Globo, se sentiu ameaçada no começo daqueles protestos. E qual foi a reação? Os meios de comunicação chamaram o seu povo para as ruas. Assistimos ao retorno da família, propriedade e tradição. Os mesmos “valores” que justificaram as passeatas a favor do golpe nos anos 60, empunhados pelos mesmos grupos que antes hostilizavam Getúlio Vargas. Esse pacto antipopular sempre buscou tornar suspeito qualquer representante das classes populares que pudesse ser levado pelo voto ao comando do Estado. Não por acaso, todos os líderes populares que chegaram ao poder foram destituídos por meio de golpes. 

Da Carta Capital

Datafolha: 83% dos brasileiros acham que temer é corrupto

Pesquisa do instituto Datafolha divulgada neste domingo, 25, mostra que 83% da população brasileira acredita que Michel Temer tem participação direta no escândalos de corrupção revelados pelo empresário Joesley Batista, da JBS.

Joesley gravou conversa que travou com Temer no Palácio do Jaburu, em um encontro fora da agenda oficial, onde Temer deu aval para a compra do silêncio do deputado cassado e preso Eduardo Cunha (PMDB), aliado de Temer no golpe. Perícia da Polícia Federal já constatou que a gravação não sofreu edições.

Além disso, relatório da PF aponta que Temer praticou corrupção "com vigor" no caso da mala de R$ 500 mil em propina da JBS flagrada com o ex-assessor Rodrigo Rocha Loures (PMDB).

Michel Temer deve ser denunciado nesta semana  pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, sob acusação de corrupção passiva, organização criminosa e obstrução de Justiça.

Segundo a pesquisa Datafolha, 64% da população reprovaram o acordo de colaboração premiada que a PGR fechou com os donos da JBS, ao prever multa, mas não a prisão dos delatores. Para 81%, os irmãos Batista deveriam ter sido presos, apesar das revelações.

A pesquisa Datafolha foi realizada de 21 a 23 de junho com 2.771 entrevistados. A margem de erro é de dois pontos percentuais para mais ou para menos.

247

sábado, 24 de junho de 2017

Caciques do PSDB descobrem tarde que Doria é uma fraude

Primeiro foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso quem afirmou que o atual prefeito de São Paulo, João Doria, só sabe mexer no celular e não produziu nenhuma mudança relevante em São Paulo; agora, o ex-governador José Serra foi além e disse que Doria é "um blefe"; mais do que isso, Serra garantiu que deixará o PSDB se Doria vier a ser o candidato do partido à presidência da República; uma espécie de novo Jânio Quadros, Doria desagrada quadros históricos do PSDB e pode ser alvo de impeachment por ter favorecido a Ambev no carnaval de São Paulo.

O prefeito de São Paulo, João Doria, não terá um caminho fácil para se viabilizar candidato do PSDB à presidência da República, a despeito da morte política do senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) e do péssimo desempenho nas pesquisas do governador Geraldo Alckmin.

Isso porque tucanos históricos não engolem seu estilo populista, à la Jânio Quadros. 

Primeiro foi o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso quem afirmou que o atual prefeito de São Paulo, João Doria, só sabe mexer no celular e não produziu nenhuma mudança relevante em São Paulo – no que tem razão.

Agora, o ex-governador José Serra, também com razão, foi além e disse que Doria é "um blefe", segundo informa a coluna Radar.

Mais do que isso, Serra garantiu que deixará o PSDB se Doria vier a ser o candidato do partido à presidência da República.

Doria também pode ser alvo de impeachment por ter favorecido a Ambev no carnaval de São Paulo.

Abaixo, reportagem da Rede Brasil Atual:
A denúncia de favorecimento a uma agência contratada pela Ambev em uma licitação pública para o carnaval de rua de 2017, veiculada no início do mês pela Rádio CBN, levou o vereador Toninho Vespoli (Psol) a pedir abertura de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) na Casa, que já conta o mínimo de 19 assinaturas para que o pedido seja acolhido e submetido ao plenário.

"A conduta de um agente público que visa macular um procedimento licitatório atenta contra os princípios da administração pública e, também, contra a lei de improbidade administrativa", afirmou o vereador. De acordo com o edital que organiza o carnaval de rua na cidade, publicado durante a gestão de Fernando Haddad (PT), vence o processo licitatório a proposta que privilegie segurança, limpeza, banheiros químicos e ambulâncias. Com Doria, não foi assim que funcionou.

Segundo a denúncia, a Dream Factory, contratada da Ambev, teria sido favorecida por informações privilegiadas. E terminou vencendo o pleito mesmo em disputa com proposta mais adequada ao edital. A proposta da empresa foi de R$ 15 milhões, dos quais R$ 2,6 milhões sendo destinados ao interesse público. Já a concorrente, SRCOM, que representa a Heineken, orçou o projeto em R$ 8,5 milhões, com R$ 5,1 milhões de gastos em itens como segurança e limpeza. A SRCOM Heineken perdeu.

"Resultando comprovado que Doria teve participação nas negociações, tanto ele quanto os demais envolvidos serão obrigados a ressarcir os cofres públicos com acréscimo de multa, poderão tanto perder o mandato eletivo quanto as funções públicas que os demais exercem e podem ter os direitos políticos suspensos por até oito anos", disse Vespoli, ao explicar que, confirmadas as denúncias, Doria estaria passível de sofrer um processo de impeachment.

"Pedimos a abertura de CPI tendo em vista que possui maior poder de investigação, de modo a auxiliar o Ministério Público numa provável propositura de Ação de Improbidade Administrativa", afirmou Vespoli. A CPI ainda deve passar por votação na Casa para ser instaurada.

'Marketing e abandono'
Mesmo diante das denúncias, com apresentação de áudios comprometedores, parte da sociedade demonstra apatia em relação às contradições e às possíveis fraudes da gestão Doria. Para Vespoli, isso é parte de um discurso de desconstrução da política, constante nos meios de comunicação e crescente no país.

"A população está cansada da classe política. Diante dos escândalos de corrupção revelados pela operação Lava Jato há uma falsa ideia de que o público é um problema e a solução seria privatizar tudo para que se melhore. O que não é dito, no entanto, é que boa parte das empresas privadas e dos grandes empresários estão no olho da corrupção", disse.

"Doria baseia seu governo em ações de marketing", observa Vespoli, dentro de uma lógica de falar o que os eleitores querem ouvir e maquiar a realidade. "O programa Cidade Linda, por exemplo, é uma grande farsa. A cidade está abandonada, porém, as pessoas querem ver o prefeito indo para a rua e pintando muros, capinando praças, mas a realidade é que a zeladoria da cidade, principalmente na periferia, está completamente abandonada. A sociedade está encantada com Doria e seu marketing, o discurso e a retórica dele seduziu as pessoas, porém sabemos que as coisas são bem diferentes."
  
Sobre o caso, a prefeitura emitiu o seguinte posicionamento:
A reportagem da CBN se esforçou para fazer parecer haver irregularidade onde houve esforço do poder público para que se obtivesse o maior benefício possível à população: a ação da Prefeitura de São Paulo permitiu à cidade ter um Carnaval com maior qualidade sem nenhum gasto público, ao contrário do que ocorreu em 2016, quando foram investidos R$ 10 milhões de recursos do município. 

O edital, elaborado e publicado pela gestão passada, foi inteiramente obedecido. Como previsto, a empresa que havia feito a maior oferta financeira foi chamada a esclarecer sua proposta. Ainda conforme previa o edital, foi permitido que a esta empresa, a Dream Factory, alterasse os itens de investimento, mas mantendo-se dentro do escopo do que já havia sido apresentado. Pare que fique claro: a proposta da SRCOM foi de R$ 8,5 milhões; a da Dream Factory, de R$ 15 milhões. 


 O conteúdo da proposta de maior valor, porém, foi julgado insatisfatório pela comissão, pois boa parte dos recursos era destinada a ações de marketing. Como o edital permitia, foi solicitado à Dream Factory que alterasse o conteúdo de sua proposta, para que esse valor se destinasse inteiramente a serviços de interesse público (segurança, ambulâncias, banheiros químicos). À diferença do que sugere a reportagem da CBN, o mesmo não poderia ser oferecido à SRCOM, uma vez que o edital não permitia que o valor da proposta fosse alterado, apenas sua composição, desde que dentro do escopo. 

Ou seja, a SRCOM não poderia oferecer R$ 15 milhões em serviços. Se fosse mantida a decisão de dar vitória à SRCOM, a Prefeitura teria, portanto, de investir pelo menos R$ 10 milhões no Carnaval. Cabe mencionar que, se houvesse qualquer intenção de praticar irregularidades por parte dos funcionários públicos envolvidos, os atos da comissão não teriam saído divulgados em ata publicada no Diário Oficial, nem a ocorrência da reunião seria confirmada pela Prefeitura. 

Os “especialistas” consultados pela CBN, evidentemente, falam sem conhecimento do edital de chamamento e dos decretos municipais que regulam contratos como esse. Não houve contato para favorecer uma das empresas, houve contato com a única empresa que teria condições de melhorar sua proposta, em benefício da população paulistana e do Carnaval. Um indicativo de que nada de errado foi feito é o fato de que a SRCOM, que segundo a CBN teria sido prejudicada, não recorreu e nem mesmo se manifestou na reportagem. 

Com base num relatório de auditores do Tribunal de Contas do Município, a CBN dá como fato comprovado que tenha havido irregularidades no edital e no processo de escolha. Deixa de informar a seus ouvintes que, a esta altura, as supostas irregularidades são apenas a opinião dos auditores, uma vez que o relatório não passou pela análise do conselheiro responsável nem foi a julgamento. 

A Prefeitura ressalta ainda que saúda a decisão do Ministério Público de abrir investigação a respeito do patrocínio ao Carnaval de 2017. Assim, ficará comprovado ao final que foi cumprida a lei e que a ação da administração municipal beneficiou a população, que pode ter acesso a um Carnaval com mais qualidade, preservando os cofres públicos, que deixaram de investir R$ 10 milhões.

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Moro e os bastidores da raiz da lava jato preparada pelos EUA para em nome do combate a corrupção destruir o país

Foto ilustração: Joana Brasileiro
Moro, Lava Jato e interesses dos EUA

O juiz Sérgio Moro é louvado em verso e prosa pelos meios de comunicação tradicionais, nacionais e estrangeiros. Foi “personalidade do ano” pelo Globo, esteve entre “as 100 personalidades mais influentes” da revista Time, alçado à condição de 13o entre “os maiores líderes mundiais” pela revista Fortune e 10o entre os mais influentes da agência de notícias financeiras Bloomberg.

O que teria levado o juiz federal ao estrelato? Que apoios teria acumulado para se tornar uma quase unanimidade internacional? Certamente muitos se apressarão em concluir que foi seu trabalho destemido e incansável contra a corrupção. No entanto, outros tentaram e não tiveram sucesso com seus processos, nem tampouco viraram ídolos mundiais, muito ao contrário.

As ocorrências com o juiz Fausto De Sanctis nos dão um exemplo marcante do caminho oposto ao de Moro. De Sanctis teve sua condenação do banqueiro Daniel Dantas revertida e toda a operação Satiagraha anulada, mesmo de posse da gravação da entrega da propina aos policiais federais para que paralisassem as investigações de lavagem de dinheiro e evasão de divisas no Banco Opportunity. Sua carreira, especializada em crimes financeiros, foi encerrada pela “promoção” ao Tribunal Regional Federal para atuar na área previdenciária.
Por que os processos de Moro não tiveram a costumeira gaveta como destino? Qual teria sido seu diferencial?

Alguns amigos do juiz paranaense declararam ao jornal Washington Post que sua abordagem pode ter sido influenciada pela exposição que teve aos processos legais nos Estados Unidos: ele participou de um programa especial na Universidade de Harvard em 1998 e de um programa para líderes potenciais em 2007, patrocinado pelo Departamento de Estado daquele país.

As relações de Moro com as autoridades estado-unidenses já pareciam consolidadas quando ele “determinou em 2007 a criação de RG e CPF falsos e a abertura de uma conta bancária secreta para uso de um agente policial norte-americano, em investigação conjunta com a Polícia Federal do Brasil. No decorrer da operação, um brasileiro investigado nos EUA chegou a fazer uma remessa ilegal de US$ 100 mil para a conta falsa aberta no Banco do Brasil, induzido pelo agente estrangeiro infiltrado”, conforme reportagem dos Jornalistas Livres.

Em seminário sobre o crime organizado no Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, em maio de 2009, o juiz defendeu a delação premiada e revelou conhecimento sobre os métodos da justiça estado-unidense. Ele afirmou que “nos Estados Unidos entende-se como acordo precioso aquele que tem efeito dominó” e que “a sugestão de juiz dos Estados Unidos é pedir uma amostra ao delator com o compromisso de não utilizá-la, a não ser que haja acordo”.

“Outra experiência que o juiz contou é de que, nos Estados Unidos, foi levada à Suprema Corte um caso em que delator grava declarações do investigado. Alguns sustentaram que isso era vedado, por entender que era autoincriminação. Os EUA, diz Moro, entenderam que o devido processo legal não protege quem confia na pessoa errada e que a autoincriminação só ocorre quando é feita diante de autoridade pública”, revela, ainda, a matéria do Consultor Jurídico.

Projeto Pontes: Construindo Pontes para a Aplicação da Lei no Brasil

No final de outubro, ainda em 2009, a comunicação interna da Agência de Contraterrorismo do Departamento de Estado dos EUA, vazada pelo Wikileaks, destacou a cooperação com juízes, procuradores e policiais brasileiros na realização de uma conferência, denominada Projeto Pontes, no Rio de Janeiro, financiada pela Agência. Sérgio Moro, que fez parte do time de apresentadores, falou sobre os casos de lavagem de dinheiro nas cortes brasileira. Os apresentadores estado-unidenses discutiram vários aspectos relativos à investigação e ao julgamento de casos de transações financeiras ilícitas e de lavagem de dinheiro, incluindo cooperação internacional formal e informal, arresto de bens, delação premiada, entre outros assuntos.

Para os treinamentos futuros, o comunicado do Departamento de Estado sugere que: “Idealmente, o treinamento deve ser de longo prazo e coincidir com a formação de forças-tarefa de treinamento. Dois grandes centros urbanos com apoio judicial comprovado para casos de transações financeiras ilícitas, em particular São Paulo, Campo Grande ou Curitiba, devem ser selecionados como local para este tipo de treinamento. Em seguida, as forças-tarefa podem ser formadas, e uma investigação real utilizada como base para treinamento que evoluiria, sequencialmente, desde a investigação até a apresentação do caso no tribunal e a conclusão do caso. Isso proporcionaria uma experiência real aos brasileiros, em trabalhar em uma força-tarefa proativa, de longo prazo, de transações ilícitas e permitir o acesso a peritos dos EUA para orientação e suporte contínuos”. Destaque-se que a sugestão de “orientar” uma força-tarefa em um caso real ocorreu pouco mais de quatro anos antes do início da operação Lava Jato.

O “monitoramento” da NSA sobre a comunicação da Petrobras

O cientista político brasileiro Luiz Alberto de Vianna Moniz Bandeira, ao unir as relações de Moro com os Estados Unidos, apontou, em entrevista ao Jornal do Brasil, que: “a Agência Nacional de Segurança (NSA), que monitorou as comunicações da Petrobras, descobriu a ocorrência de irregularidades e corrupção de alguns militantes do PT e, possivelmente, forneceu os dados sobre o doleiro Alberto Yousseff ao juiz Sérgio Moro, já treinado em ação multi-jurisdicional e práticas de investigação, inclusive com demonstrações reais (como preparar testemunhas para delatar terceiros)”.

Moniz Bandeira denunciou que os prejuízos, causados pela Lava Jato à Petrobras, às construtoras e a toda a cadeia produtiva associada, ultrapassam “em uma escala imensurável” os prejuízos que dizem combater. Contabilizando a desestruturação, a paralisação e a descapitalização das empresas nacionais, públicas e privadas, ele pergunta: “a quem serve o juiz Sérgio Moro, eleito pela revista Time um dos dez homens mais influentes do mundo? A que interesses servem com a Operação Lava Jato? A quem serve o procurador-geral da República, Rodrigo Janot?”

Os crimes apurados nos EUA e na Europa não destruíram as corporações que os cometeram

Na mesma linha de Moniz Bandeira, o professor de Economia Política Internacional da UFRJ, Maurício Metri, observou, na GGN, que os vazamentos de Snowden, em 2013, já revelavam que um dos alvos da espionagem da NSA era a Petrobras. O que torna absolutamente plausível a conclusão que informações sobre a empresa devam ter sido repassados aos operadores da Lava Jato. Processo que culminou com “uma conjuntura que tem fragilizado a própria empresa para além do necessário à averiguação de responsabilidades por malversações, forçando-a a se desfazer de ativos estratégicos e comprometendo a cadeia produtiva ligada a ela”.

O contexto político produzido abriu espaço para a mudança do marco regulatório que dava prioridade à Petrobras na exploração do pré-sal. Metri complementa: “em nome do combate à corrupção, acaba-se por retirar do Estado brasileiro sua capacidade de iniciativa estratégica no setor, atendendo aos objetivos geopolíticos de outros países e de suas respectivas empresas nacionais”.

Para Metri as potências estrangeiras perceberam a política externa autônoma exercida pelo Brasil nos últimos governos, a política de defesa com acesso à energia nuclear e as grandes reservas descobertas de petróleo. O professor finaliza: “alguns dos alvos da operação Lava Jato constituem-se pilares deste conjunto de iniciativas. Sob a névoa das disputas políticas domésticas, as conexões estrangeiras da operação Lava Jato ainda não estão claras, mas seus efeitos já se fazem sentir.”

O Brasil se insinuava forte candidato a tornar-se uma potência média, o que gerou imediatas hostilidades da Superpotência, os EUA, aponta Bruno Lima Rocha, mestre e doutor em ciência política pela UFRGS. “Assim, simplesmente não estamos negando a existência de corrupção, ou mesmo de corrupção estrutural. Afirmamos sim que para a Superpotência, as acusações de práticas empresariais criminosas são um recurso de guerra, uma arma com emprego tático, assim como o uso da força ou da espionagem. Logo, o alvo estratégico da relação EUA com os frutos das delações da Lava Jato, é o desmonte da Petrobras e das empresas de engenharia complexa operando a partir do Brasil.”

Uma bactéria alienígena que se nutria de frações de classes nacionais

“Os órgãos de inteligência americanos, ao passarem as informações da Petrobras, inocularam uma bactéria perigosa no organismo institucional brasileiro, mas que, provavelmente, poderia ter sido contida por anticorpos institucionais básicos em sua fase inicial”, asseverou o estudo A Guerra de Todos contra Todos: A Crise Brasileira, do Instituto de Economia da UFRJ.

A flagrante desestruturação econômica, política e institucional do país atende os interesses externos, especialmente dos EUA, na medida em que “(i) possibilita a abertura da exploração do pré-sal para as empresas estrangeiras; (ii) retarda/paralisa o projeto nuclear brasileiro; (iii) desestabiliza o engajamento do Brasil aos arranjos configurados pelos BRICS; e (iv) desestabiliza a presença das empresas de construção civil nacional na América Latina e África, abrindo mercados para novos entrantes”, complementa o estudo.

“[…] o projeto político aliado com a Lava Jato não se importa com a ‘‘justiça’’, somente em perpetuar uma crise política viciosa como meio de arrastar a sétima maior economia do mundo para a lama”, já afirmava Pepe Escobar antes do impedimento de Dilma Rousseff.

Do GGN/Jornalistas Livres, Cesar Locatelli

Datafolha: Michel Temer o mais rejeitado em 28 anos e 83% dos brasileiros querem eleições diretas

A pesquisa do instituto Datafolha divulgada neste sábado, 24, mostra que 83% da população brasileira quer realização de eleições diretas para presidente, com a saída de Michel Temer. Apenas 12% se dizem a favor de que o Congresso Nacional escolha o sucessor de Temer.

O levantamento revela também que 76% dos brasileiros querem que Temer renuncie ao cargo, enquanto 20% defendem a permanência do peemedebista. Para 65%, o melhor para o País é que Temer deixe o Palácio do Planalto imediatamente, contra 30% que defendem que ele termine o mandato.

Caso Temer não renuncie ao cargo,  a maioria absoluta de 81% da população defende que o Congresso inicie um processo de impeachment para retirá-lo do cargo. A Câmara dos Deputados, responsável por instaurar o processo de impeachment, já recebeu vários pedidos contra Temer, entre eles protocolados pela Ordem dos Advogados do Brasil e por partidos como a Rede e PSOL. 

O mais rejeitado
Na mesma pesquisa, divulgada pelo jornal Folha de S. Paulo, o governo Michel Temer aparece com aprovação de apenas 7%, a menor para o cargo em 28 anos. O governo fruto de um golpe parlamentar é considerado ruim ou péssimo por 69% do eleitorado brasileiro (leia mais).

A pesquisa da Datafolha foi realizada entre os dias 21 e 23 de junho, com 2.771 entrevistados em 194 cidades. A margem de erro é de 2 pontos percentuais para mais ou para menos e o intervalo de confiança é de 95%. 

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Sérgio Moro está sendo mais político que juiz, diz Oscar Vilhena Vieira PHD em Direito pela Oxford

Em artigo publicado neste sábado, 24, na Folha de S. Paulo, o advogado Oscar Vilhena Vieira, pós-doutor em Direito pela Universidade de Oxford, fez uma crítica indireta ao juiz Sérgio Moro e aos procuradores da operação Lava Jato.

Sem citar nomes, Vieira defendeu que a autoridade do Poder Judiciário deriva de sua capacidade de aplicar de forma coerente e imparcial as normas jurídicas. "As razões fundamentais que devem orientar suas decisões são, portanto, aquelas estabelecidas pelo direito. Quando uma questão lhe é apresentada, o juiz deve consultar o direito para determinar qual a conduta a ser seguida. Se o juiz se afasta desse tipo de ética baseada em regras, princípios e valores que são estabelecidos pelo direito, passando a basear suas decisões nos ocasionais resultados que dela derivarão, a função jurisdicional terá se convertido em função política. O que é muito ruim, por diversos motivos", diz o jurista. 

Para Oscar Vieira, o magistrado deve "impor de maneira imparcial as regras do jogo àqueles que delas se afastam", para que os demais jogadores cumpram suas obrigações. "Ao pendurar a toga, dando prevalência a uma ética de responsabilidade em detrimento a uma ética de princípios (jurídicos), ainda que em benefício de uma estabilidade política ou econômica imediata, o Judiciário poderá estar contribuindo para ampliar a instabilidade e a desconfiança no longo prazo", afirma. 

Leia o artigo de Oscar Vilhena Vieira AQUI.

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Roleta do STF dá inveja a caça-níqueis de botequim, Tijolaço

Vou só copiar a notícia de O Globo, porque qualquer comentário é dispensável:

Um dos inquéritos a que o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) responde no Supremo Tribunal Federal (STF), baseado na delação premiada de executivos da Odebrecht, será relatado pelo ministro Gilmar Mendes.

O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a redistribuição da investigação, que estava sob a responsabilidade de Edson Fachin, por não ver relação com desvios na Petrobras, foco inicial da Lava-Jato.

No inquérito, Aécio é investigado pela acusação de ter recebido “pagamento de vantagens indevidas em seu favor e em benefício de seus aliados políticos” nas eleições de 2014.

Janot solicitou também a redistribuição de outro inquérito contra Aécio, mas pediu que fosse feita uma “distribuição por dependência”, ou seja, que o mesmo sorteio valesse para os dois processos. Ainda não está definido, contudo, se o pedido foi aceito e se Gilmar será também o relator desta outra investigação.

Neste outro inquérito, também baseada na delação da Odebrecht, ainda fazem parte o senador Antonio Anastasia (PSDB-MG), Oswaldo Borges da Costa, assessor de Aécio, e Paulo Vasconcelos do Rosário Neto, marqueteiro do tucanos

A roleta do STF é uma beleza, destas de dar inveja aos caça-níqueis de botequim: dos nove inquéritos contra Aécio, quatro estão com Gilmar Mendes.

Só falta caber a Gilmar Mendes analisar se são válidas as gravações em que ele foi flagrado combinando com Aécio fazer pressão sobre parlamentares pela lei de abuso de autoridade.

A justiça brasileira tornou-se uma “coisa”  da qual riríamos, se não fosse tão trágica.

Do Tijolaço

Dallagnol doou 45% a 60% de lucro de palestras em 2016, por Patricia Faermann do Jornal GGN

Levantamento feito pelo GGN mostra, ainda, que membros do Ministério Público não podem dar palestras que não sejam em Instituições de Ensino ou exercer atividades fora do meio acadêmico.
Foto: Reprodução

O coordenador da força-tarefa da Operação Lava Jato, Deltan Dallagnol, deu cerca de 12 palestras remuneradas no ano de 2016. Em nota pública, o procurador da República afirmou que optou "por doar praticamente tudo". A jornalistas nesta quinta-feira (22), disse que omitiria os valores para não "expor o contratante", mas que o hospital que recebeu suas doações contabilizou R$ 219 mil no ano passado. O valor, contudo, é quase a metade da média do que Dallagnol teria recebido, segundo dados divulgados pela própria agência de palestras.

O GGN fez os cálculos. De todas as apresentações, palestras e seminários, o procurador admite que 12 foram remuneradas e também não confirma que a totalidade delas foi destinado ao hospital. 

Em nota publicada nas redes sociais, após reportagens darem conta de que ele prestava a atividade remunerada, o procurador afirmou que  "no caso de palestras remuneradas sobre ética e corrupção em grandes eventos, tenho destinado o dinheiro para entidades filantrópicas ou para a promoção da cidadania, da ética e da luta contra a corrupção". "Optei por doar praticamente tudo para que não haja dúvidas...", havia manifestado.

A primeira denúncia, publicada pelo jornal Folha de S. Paulo, mostrava que uma empresa estava oferecendo em seu site palestras de Dallagnol, e revelava a faixa de R$ 30 mil até R$ 40 mil por participação do investigador em exposições. O procurador não negou que a empresa não foi contratada para o serviço de intermediar a atividade. 

Mas irritado com a divulgação das quantias, pediu que Motiveação retirasse "imediatamente" as suas informações do portal. "Esta página foi retirada do ar, pois não foi autorizada pelo palestrante e nem por sua equipe. A Motiveação Palestras vem por meio desta se retratar por qualquer tipo de prejuízo e/ou situação que tenha vindo a causar ao Sr. Deltan Dallagnol e aproveitamos para deixar nosso apoio ao trabalho muito bem feito que o mesmo vem ajudando a tornar realidade e história em nosso país", publicou depois a empresa no mesmo link onde continha os dados das palestras do procurador.

Em resposta, Dallagnol informou: "A maior parte das palestras é gratuita e nunca autorizei que empresas de agenciamento usassem meu nome para a divulgação de serviço oneroso (quem o fez agiu sem minha autorização e estão sendo adotadas providências para que cessem a indevida divulgação)."

Após ser alvo de críticas e, inclusive, motivar uma representação junto ao Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP) para investigar as atividades, Dallagnol falou sobre o assunto na noite desta quinta-feira a jornalistas, após mais uma de suas palestras remuneradas, em evento da XP Investimentos, na capital paulista.

Questionado, o coordenador da Lava Jato respondeu que "não controla" os valores recebidos, mas que "foram dadas, segundo informações do próprio hospital, porque eu não controlava isso diretamente, 12 palestras, que somaram R$ 219 mil [em doações]. As destinações foram feitas diretamente pelas entidadas [filantrópicas] para a construção do hospital infantil". 

Com um simples cálculo, considerando que a faixa de valor cobrado pelo investigador é de R$ 30 mil a R$ 40 mil por exposição, chega-se a um valor de R$ 360 mil a R$ 480 mil pelas 12 palestras remuneradas. Assim, entre 45% a 60% de suas remunerações teriam sido destinadas ao hospital, com a quantias fornecidas pela agência de palestras.

Controversas

A questão que deve ser esclarecida pelo Conselho Nacional do Ministério Público, por meio da representação ingressada por deputados da oposição, Wadih Damous (PT-RJ) e Paulo Pimenta (PT-RS), nesta terça-feira (20), e a investigação já aceita pelo CNMP, é se a atividade é ilícita.

O procurador defende que a atividade de palestras é uma função "legal, lícita e privada", "autorizada por resoluções do Conselho Nacional do Ministério Público e do Conselho Nacional de Justiça", mas que, para que não restassem dúvidas, optou por "decisão própria, voluntária" doar a maior parte dessa remuneração a uma entidade filantrópica para a construção de um hospital a crianças com câncer.

Aos jornalistas, após apresentar palestra no considerado o maior evento da América Latina para a indústria de investimentos, com preços de entrada a R$ 800 por pessoa, sem citar o cachê recebido, afirmou que se quisesse "embolsar" todo o montante, "também não teria nenhum problema".

O que dizem as regulamentações?

O argumento do procurador da República traz a tese de que suas palestras e participações em exposições se caracterizariam como "atividade docente". Para justiciar a lógica, citou a Resolução 34, de 2007, do Conselho Nacional de Justiça. O GGN verificou:

CNJ fiscaliza procuradores?

O artigo 4º, letra A, da resolução estabelece que "a participação de magistrados na condição de palestrante, conferencista, presidente de mesa, moderador, debatedor ou membro de comissão organizadora, inclusive nos termos do art. 4º da Resolução CNJ 170/2013, é considerada atividade docente" (acesse aqui).

Entretanto, a referência ao artigo é sobre a aplicação de atividades "desempenhadas por magistrados em cursos preparatórios para ingresso em carreiras públicas e em cursos de pós-graduação". Não menciona, especificamente, casos de palestras em outras instituições que não a do Ensino Superior ou de carreiras públicas.

Ainda, o artigo impõe que tais atividades devem ser acompanhadas e controladas pelo órgão do profissional. "A participação nos eventos mencionados no caput deste artigo deverá ser informada ao órgão competente do Tribunal respectivo em até 30 (trinta) dias após sua realização, mediante a inserção em sistema eletrônico próprio, no qual deverão ser indicados a data, o tema, o local e a entidade promotora do evento".

Por fim, a resolução se aplica a magistrados, e não a membros do Ministério Público, que devem se submeter às decisões do Conselho Nacional do Ministério Público, e não da Justiça. 

O que diz o CNMP?

Como justificativa, Deltan Dallagnol mencionou também a "resolução do CNMP 73, de 2011, que trata das aulas". Ao acessar a resolução, logo em sua introdução, é exposto: "Aos membros do Ministério Público é vedada a acumulação de funções ministeriais com quaisquer outras, exceto as de magistério, nos termos do art. 128,II, 'd', da Constituição" (acesse aqui).

Com o intuito de justamente aprofundar os limites de atuação de um procurador da República ou membro do Ministério Público, o CNMP criou a resolução. Entretanto, na exposta "importância de serem delineados os contornos objetivos da atividade de magistério" a regulamentação não traz uma linha sobre palestras ou exposições. 

Apesar de não claramente proibir, as três páginas especificam com precisão o que pode ser feito por um procurador nessa atividade de magistério: cumprir um limite de 20 horas-aula semanais em "sala de aula", coordenar cursos ou atividades de ensino, e especificamente acompanhar projetos pedagógicos, formar e orientar professores, articular o corpo docente da Instituição e orientar projetos acadêmicos.

Ainda, estabelece que o membro do Ministério Público só poderá exercer a docência "fora do município de lotação" em "hipóteses excepcionais" e quando "se tratar de instituição de ensino sediada em comarca próxima".

Procuradores não podem, por exemplo, ocuparem cargos de diretor de Instituições de ensino. Além disso, o exercício de docência "deverá ser comunicado pelo membro ao Corregedor-Geral da respectiva unidade do Ministério Público, ocasião em que informará o nome da entidade de ensino, sua localização e os horários das aulas que ministrará".

Por fim, o coordenador da Lava Jato faz referência ao Ato Ordinatório 3, de 2013, do Conselho Superior do Ministério Público Federal. O texto apenas menciona o preenchimento de um formulário eletrônico para o CNMP acompanhar "o exercício da atividade de magistério quando cumulada com as funções ministeriais" (acesse aqui).

Estabelece os prazos, como e quando deve ser preenchido o formulário de controle do Conselho. O artigo 3 dispensa dessa obrigatoriedade "as palestras, conferências e outras atividades de natureza semelhante quando sua periodicidade for inferior a 15 dias".

Por outro lado, ressalta que o tal formulário é uma medida submetida à Resolução 72 do CNMP, explicada acima, que não traz nenhuma permissão para membros do Ministério Público de concederem palestras fora do meio acadêmico e de instituições de ensino, sejam públicas ou privadas. 

Arquivo


Do GGN