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domingo, 1 de outubro de 2017

O ex-presidente Lula deve sua liderança no Datafolha a Moro, Temer e a mídia. Por Kiko Nogueira do DCM


Lula deve seu desempenho no Datafolha a Michel Temer, a Sérgio e à mídia.

Ao primeiro, por razões óbvias: MT é um fracasso completo em todas as áreas, um desastre ambulante que não entregou a rapadura do golpe e cujo horizonte político é tenebroso.

Fisiológico e acostumado a operar nas sombras, foi um pau mandado pago para destruir, em tempo recorde, a obra dos governos anteriores. Ficou claro que nunca teve projeto algum.

Lula sempre teve.

Sob um massacre diuturno, Lula cresceu 5 pontos percentuais e se isolou ainda mais na disputa pela Presidência em 2018.

Agora tem 35% das intenções de voto, contra 30% do levantamento anterior, feito em junho, antes da condenação a nove anos e seis meses de prisão por Moro.

Bolsonaro e Marina aparecem empatados com 16% e 13%, respectivamente. Doria e Alckmn têm 8%.

Em junho, Marina Silva era a única capaz de vencer Lula no segundo turno. Agora ele se isolou na frente.

A Lava Jato fortaleceu Lula, que assumiu uma postura combativa desde o primeiro tiro. Mais de três anos após iniciadas as investigações, o que Moro e seus homens produziram foi uma tentativa malfadada de colocar Lula no centro de uma “organização criminosa”, a tal orcrim, e fazer uma conta de chegada.

O ápice da cruzada fascistoide de Deltan Dallagnol e seus cometas foi um powerpoint ridicularizado até por membros da igrejinha.

Desde então, o decoro foi para o buraco. A delação de Palocci era considerada a bala de prata. Duas semanas depois, vê-se o resultado.

Moro dá sinais evidentes de fadiga de material. De acordo com a Veja, diz que está cansado e vai largar a Lava Jato. Primeiro precisa entregar a cabeça de Lula.

Um fiasco. Na segunda feira aparece com mais um escândalo. O dos recibos durou menos do que se esperava.

Manchetes e jograis do Jornal Nacional não conseguiram destruir uma candidatura. Vazamentos a granel, armações, ataques a Marisa Letícia, morta — nada disso funcionou. Os Marinhos querem cortar os pulsos.

Se Lula está assim depois de uma condução coercitiva, imagine-se se Moro decretar sua prisão. No cenário de destruição promovido pelo estado policialesco que vivemos, com a esperada descrença na democracia, Lula vai surgindo como o que seus inimigos não queriam: o pacificador.

DCM

sexta-feira, 4 de agosto de 2017

A lava jato e o kafkiano colapso do Direito Constitucional brasileiro, por Fábio de Oliveira Ribeiro

Há alguns dias critiquei severamente a decisão de Sérgio Moro. Disse que a sentença dele me parece problemática por causa de três detalhes importantes:​

1- A condenação considerou prova do crime cometido pelo réu as reportagens jornalísticas que acusaram Lula de receber propina. Em virtude dos fatos enunciados nestes documentos particulares elaborados por jornalistas o juiz resolveu desprezar um documento público (a certidão do Cartório de Registro de Imóveis que prova que a construtora sempre foi e ainda é a legítima proprietária do Triplex);

2- A Lei considera crime receber propina, mas Sérgio Moro condenou Lula não porque ele recebeu propina e sim porque ele foi acusado por jornalistas de ter recebido propina (o que é muito diferente). Portanto, me parece evidente que ao proferir sua sentença o juiz da Lava Jato inventou um novo tipo penal para decretar a prisão do réu;

3- Em virtude da condenação, todos os bens de Lula adquiridos honestamente foram arrestados pelo juiz. Mas Sérgio Moro tomou o cuidado de não arrestar o Triplex que seria o próprio objeto do crime. Ele fez isso porque o terceiro proprietário poderia facilmente desembaraçar seu imóvel expondo a incoerência da condenação de Lula? http://jornalggn.com.br/blog/fabio-de-oliveira-ribeiro/explorando-as-cavernas-dos-casos-de-sergio-moro-por-fabio-de-oliveira-ribeiro.

Hoje o juiz da Lava Jato resolveu confiscar o Triplex para entregá-lo à Petrobras. A princípio, a nova decisão parece coerente. Afinal, Sérgio Moro declarou que Lula recebeu o imóvel como propina, portanto, ele seria o proprietário do bem. E nada seria mais justo do que perder a propriedade do objeto do crime.

Todavia, a decisão esbarra em dois problemas. O primeiro é o princípio do Direito Penal de que a pena não pode ultrapassar a pessoa do réu expressamente assegurado no inciso XLV, do art. 5o. da CF/88. O imóvel está registrado em nome da construtora e ela não é parte no processo em que Lula foi julgado e condenado. Portanto, a pena imposta a Lula ultrapassa a pessoa do réu para produzir efeitos na vida do terceiro.

Outro problema é a grave violação do direito de propriedade da construtora. No Brasil o proprietário de um imóvel (aquele em cujo nome o bem está registrado no Cartório de Imóveis) tem seus direitos garantidos pelo art. 5o., XXII, da CF/88. O criminoso pode ser condenado a perder a posse e a propriedade da coisa que foi objeto do crime. Mas o imóvel não está registrado em nome de Lula e a construtora não foi parte no processo que resultou na condenação do ex-presidente.

Além de garantir o direito de propriedade, a CF/88 prescreve expressamente que ninguém será privado dos seus bens sem o devido processo legal (art. 5o. LIV). O proprietário pode até perder seu imóvel numa ação desapropriação, mas isto só ocorrerá mediante justa e prévia indenização apurada num processo em que o prejudicado tenha tido a oportunidade de se defender (art. 5o., XXIV c.c. art. 5o. LV).

Sérgio Moro expropriou o Triplex de Lula não para atribuí-lo à construtora (legítima proprietária do bem de acordo com o registro no Cartório de Imóveis), mas para entregá-lo à Petrobras. A construtora foi privada do seu bem sem o devido processo legal e sem indenização. Quem indenizará o prejuízo causado por Sérgio Moro à construtora? Como pode a Petrobras receber a restituição de um imóvel que nunca lhe pertenceu?

A mim parece que neste caso a emenda ficou pior que o soneto. Para conferir mais “aparência de coesão” à sua decisão, o Juiz da Lava Jato foi obrigado a grosseiramente violar vários princípios constitucionais. Na prática Sérgio Moro transformou a 13a. Vara Federal de Curitiba num Tribunal de Exceção. Desprezando o que consta no art. 5o., XXXVII, da CF/88, ele  age como se pudesse criar as regras jurídicas que vai aplicar, pouco se importando com sua obrigação funcional de cumprir e fazer cumprir fielmente a Lei tal como ela foi aprovada e promulgada (art. 35 da Lei Orgânica da Magistratura).

Em 30 anos de profissão (27 de advocacia mais 3 de estágio) nunca vi nada parecido. De abuso em abuso, Sérgio Moro está cada vez mais se transformando num personagem literário. Não, não estou me referindo ao guarda que zomba Joseph K. dizendo que ele “Admite não conhecer a lei, mas declara-se inocente…” (O processo, Franz Kafka). Sérgio Moro está cada vez mais ficando parecido com o pobre Gregor Samsa, caixeiro viajante que certo dia acordou transformado num inseto (A metamorfose, Franz Kafka).

Ao impor uma pena à construtora que não foi parte do processo movido contra Lula, ao privar o terceiro da propriedade do Triplex sem o devido processo legal e, pior, sem qualquer indenização para entregá-lo a quem nunca foi seu legítimo proprietário, O juiz da Lava Jato se transformou num fantástico ser kafkiano. Mas ao contrário de Gregor Samsa, o vaidoso Sérgio Moro parece não ter qualquer consciência da imagem que está projetando dentro e fora do Brasil. Quem em sã consciência investiria num país em que os membros do Judiciário são capazes de ignorar, pisotear, violar e desprezar o direito de propriedade?

GGN

sábado, 22 de julho de 2017

A formação de Moro deve ser investigada, diz Marcos Danhoni

Foto: Agência Brasil

Marcos César Danhoni Neves, professor e pesquisador da Universidade Estadual de Maringá, publicou artigo na Revista Fórum alertando para a formação do juiz Sergio Moro. Segundo Neves, Moro teria concluído mestrado e doutorado em prazo inferior ao padrão. Além disso, critica as teorias de Deltan Dallagnol no caso triplex.

Neste sábado, Veja publicou reportagem com Rosângelo Moro, esposa do juiz de Curitiba, contando que conheceu a estrela da Lava Jato quando ele tinha "20 e poucos anos", mas já era juiz e dava aulas de Direito em uma universidade.

Marcos César Danhoni Neves. Na Revista Fórum

Sou professor titular de Física numa universidade pública (Universidade Estadual de Maringá-UEM) desde 2001 e docente e pesquisador há quase 30 anos. Sou especialista em história e epistemologia da ciência, educação científica, além de processos de ensino-aprendizagem e análise de discursos.

Orientei mais de 250 alunos de graduação, especialização, mestrado, doutorado e pós-doutorado, além de professores in-service. Conto tudo isso, como preâmbulo, não para me gabar, mas para salientar que li milhares de páginas de alunos brilhantes, medianos e regulares em suas argumentações de pesquisa.

Dito isso, passo a analisar duas pessoas que compõem o imaginário mítico-heróico de nossa contemporaneidade nacional: Sérgio Moro e Deltan Dallagnol.

Em relação ao primeiro, Moro, trabalhei ativamente para impedir, junto com um coletivo de outros colegas, para que não recebesse o título de Doutor honoris causa pela Universidade Estadual de Maringá.

Moro tem um currículo péssimo: uma página no sistema Lattes (do CNPq – Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico ligado ao extinto MCT – Ministério da Ciência e Tecnologia). Lista somente 4 livros e 5 artigos publicados.

Mesmo sua formação acadêmica é estranha: mestrado e doutorado obtidos em três anos. Isso precisaria ser investigado, pois a formação mínima regulada pela CAPES-MEC (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior – Ministério da Educação) é de 24 meses para Mestrado e 48 meses para o Doutorado.

Significa que “algo” ocorreu nessa formação apressada.. Que “algo” é esse, é necessário apurar com rigor jurídico.

Além de analisar a vida acadêmica de Moro para impedir que ele recebesse um título que não merecia, analisei também um trabalho seminal que ele traduziu: “O uso de um criminoso como testemunha: um problema especial”, de Stephen S. Trott.

Mostrei que Moro não entendeu nada do que traduziu sobre delação premiada e não seguiu nada das cautelas apresentadas pelos casos daquele artigo.

Se seguirmos o texto de mais de 200 páginas da condenação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva, e guiando-me pela minha experiência em pesquisa qualitativa, análise de discurso e fenomenologia, notamos claramente que parte significativa do texto consiste em Moro tentar apagar suas digitais, sem sucesso, ao desdizer que agiu com imparcialidade.

Nestas páginas robustas lemos uma declaração clara de culpa: Moro considera a parte da defesa de Lula em menos de 1% do texto total! E dos mais de 900 parágrafos, somente nos cinco finais alinhava sua denúncia e sentença sem provas baseada num misto frankensteiniano de “explanacionismo” (uma “doutrina” jurídica personalíssima criada por Deltan Dallagnol) e “teoria do domínio do fato”, ou seja, sentença exarada sobre ilações, somente.

Aqui uso a minha experiência como professor e pesquisador: quando um estudante escreve um texto (TCC, monografia, dissertação, tese, capítulo de livro, livro, ensaio, artigo), considero o trabalho muito bom quando a conclusão é robusta e costura de forma clara e argumentativa as premissas, a metodologia e as limitações do modelo adotado de investigação.

Dissertações e teses que finalizam com duas ou três páginas demonstram uma análise rápida, superficial e incompetente. Estas reprovo imediatamente. Não quero investigadores apressados, superficiais!

Se Moro fosse meu aluno, eu o teria reprovado com esta sentença ridícula e persecutória. Mal disfarçou sua pressa em liquidar sua vítima.

Em relação a outro personagem, o também vendedor de palestras Deltan Dallagnol, há muito o que se dizer. Angariou um título de doutor honoris causanuma faculdade privada cujo dono está sendo processado por falcatruas que o MP deveria investigar.

O promotor Dallagnol não seguiu uma única oitiva das testemunhas de defesa e acusação de Lula, além daquela do próprio ex-presidente.

Eu trabalho em pós-graduações stricto sensu de duas universidades públicas: uma em Maringá e outra em Ponta Grossa. Graças a isso fui contactado por meio de um coletivo para averiguar a dúvida sobre a compra por parte de Dallagnol de apartamentos do Programa Minha Casa Minha Vida em condomínio próximo à UEPG (Universidade Estadual de Ponta Grossa).

Visitei os imóveis guiado por uma corretora e me dirigi ao Cartório de Registro de Imóveis da cidade. Após algumas semanas, a resposta: os dois apartamentos modestíssimos, destinados a gente pobre, tinham sido adquiridos pelo Promotor e estavam à venda com um lucro líquido em menos de um ano de aquisição de 135 mil reais.

Reuni o material e disponibilizei para a imprensa livre (aqui a matéria do DCM). O promotor teve que admitir que comprou os apartamentos para ganhar dinheiro na especulação imobiliária, sem resquícios de culpa ou de valores morais em ter adquirido imóveis destinados a famílias com renda de até R$ 6.500,00 (Deltan chegou a ganhar mais de R$ 80.000,00 de salários – além do teto constitucional, de cerca de R$ 35.000,00; e mais de R$ 220.000,00 em suas suspeitosas palestras).

Bom, analisando os discursos de Dallagnol, notamos claramente a carga de preconceito que o fez construir uma “doutrina” de nome exótico, o “explanacionismo”, para obter a condenação de um acusado sem prova de crime.

Chega a usar de forma cosmética uma teoria de probabilidade – o bayesianismo – que ele nem sequer conhece ao defender a relativização do conceito de prova: vale seu auto-de-fé a qualquer materialidade de prova, corrompendo os princípios basilares do Direito.

Como meu aluno, ou candidato a uma banca de defesa, eu também o teria reprovado: apressado, superficial e sem argumentação lógica.

Resumindo: Dallagnol e Moro ainda vestem fraldas na ciência do Direito. São guiados por preconceitos e pela cegueira da política sobre o Jurídico.

Quando tornei-me professor titular aos 38 anos, eu o fiz baseado numa obra maturada em dezenas e dezenas de artigos, livros, capítulos, orientações de estudantes e coordenações de projetos de pesquisa.

Infelizmente, estes dois personagens de nossa República contemporânea seriam reprovados em qualquer universidade séria por apresentar teses tão esdrúxulas, pouco argumentativas e vazias de provas. Mas a “Justiça” brasileira está arquitetada sobre o princípio da incompetência, da vilania e do desprezo à Democracia.

Neste contexto, Moro e Dallagnol se consagram como “heróis” de papel que ficariam muito bem sob a custódia de um Mussolini ou de Roland Freisler, que era o presidente do Volksgerichtshof, o Tribunal Popular da Alemanha nazista. Estamos sob o domínio do medo e do neo-integralismo brasileiro.

*Marcos César Danhoni Neves é professor titular da Universidade Estadual de Maringá e autor do livro “Do Infinito, do Mínimo e da Inquisição em Giordano Bruno”, entre outras obras.

GGN

Os crimes de Moro contra Lula, por Márcio Sotelo

Foto: Evaristo Sá/AFP

Concluído em primeira instância o “processo do tríplex”, de fato constata-se que crimes foram cometidos. Os do juiz. Sobre os imputados ao réu nada se pode dizer.

Trata-se de lawfare. A aniquilação de um personagem político pela via de mecanismos judiciais. A série de episódios grotescos que caracterizou a jurisdição nesse caso não deixa qualquer dúvida a respeito. Só o fato de o processo entrar para o imaginário social como um combate “Moro vs. Lula” evidencia o caráter teratológico da atuação do magistrado. Moro cometeu crimes, violou deveres funcionais triviais, atingiu direitos e garantias constitucionais do réu, feriu o sigilo de suas comunicações, quis expô-lo e humilhá-lo publicamente, manteve-o detido sem causa por horas, revelou conversas íntimas de seus familiares.

Vejamos, nessa perspectiva, algumas das arbitrariedades cometidas pelo juiz e aspectos da decisão. O reconhecimento da validade dessa sentença pelos Tribunais superiores será a mais contundente evidência de que vivemos um estado de exceção e a Constituição é hoje um inútil pedaço de papel.
                
Violação do sigilo telefônico
A Constituição de 1988 estabelece o sigilo das comunicações como direito e garantia fundamental no artigo 5º., inciso XII:  “é inviolável o sigilo da correspondência e das comunicações telegráficas, de dados e das comunicações telefônicas, salvo, no último caso, por ordem judicial, nas hipóteses e na forma que a lei estabelecer para fins de investigação criminal ou instrução processual penal. ”

Há duas condições para que se possa violar uma comunicação telefônica: (i) ordem judicial; (ii) para investigação criminal ou instrução criminal penal. A ressalva está regulamentada na Lei 9.296, de 24 de julho de 1996, que, em seu artigo 10, dispõe que “constitui crime realizar interceptação de comunicações telefônicas, de informática ou telemática, ou quebrar segredo da Justiça, sem autorização judicial ou com objetivos não autorizados em lei”. A pena prevista é de dois a quatro anos de reclusão e multa.

Moro havia determinado escutas telefônicas de linhas utilizadas pelo ex-presidente Lula. No dia 16 de março de 2016, às 11h13, suspendeu a medida e comunicou à Polícia Federal. O diálogo entre Lula e Dilma foi captado às 13:32hs, quando já não estava em vigor a medida. Moro recebeu a gravação e às 16:21hs é registrado o despacho em que levantou o sigilo e tornou pública a conversa entre a presidenta e o ex-presidente, em seguida divulgada pela Rede Globo.

A conduta enquadra-se rigorosamente no que prevê como crime a Lei 9.296/96. A gravação já não estava mais coberta pela autorização judicial e não havia objetivo autorizado por lei. O dolo foi específico e completamente impregnado de interesse político. Lula havia sido nomeado ministro e tomaria posse no dia seguinte. A divulgação do áudio, naquele dia, por intermédio da Rede Globo, visou criar clima político para inviabilizar a investidura do ex-presidente. Moro utilizou-se criminosa e indignamente da toga para impor a Lula um revés político, tumultuar o país e criar clima para o impeachment da presidenta.

O ministro Teori Zavaski considerou patente a ilegalidade da divulgação da escuta. Neste caso a ilegalidade era evidentemente crime. O ministro, no entanto, absteve-se da conclusão, não só nesse momento, mas também, como seus pares, quando o assunto foi ao plenário do STF.

Abuso de autoridade
As hipóteses de condução coercitiva são taxativas no Código de Processo Penal. Pode ser determinada em dois casos, previstos nos artigos 218 e 260. Neste, quando o acusado não atender à intimação para o interrogatório. Naquele, quando a testemunha não atender à intimação.

Lula foi arrancado de sua casa ao alvorecer e levado ao aeroporto de Congonhas. O ex-presidente não era naquele momento (4 de março de 2016) réu e não havia sido intimado. Nunca houve uma explicação aceitável para ser conduzido ao aeroporto, dada a existência de múltiplas instalações da União na cidade de São Paulo em que poderia ser tomado o seu depoimento “sem tumulto” (explicação dada por Moro).

Pesa a suspeita de que a ideia era conduzi-lo a Curitiba. Pretendia-se um espetáculo midiático (a imprensa fora avisada) com o perverso conteúdo de uma humilhação pública do ex-presidente. Lula foi privado por seis horas de sua liberdade. Tanto se tratou de violação à garantia constitucional da liberdade individual quanto de abuso de autoridade, como previsto no art. 4º, letra “a”, da Lei 4.898, de 9 de dezembro de 1965: ‘constitui também abuso de autoridade (…) ordenar ou executar medida privativa da liberdade individual, sem as formalidades legais ou com abuso de poder. ”

Grampo no escritório dos advogados de Lula
Todos os telefones do escritório de Advocacia Teixeira Martins foram grampeados. Roberto Teixeira, notório advogado de Lula, é o titular do escritório. A operadora Telefônica comunicou a Moro que se tratava de escritório de advocacia. A prerrogativa de sigilo na comunicação advogado – cliente é inerente ao direito de defesa. Moro escusou-se de forma que beirou a zombaria: não havia atentado para os ofícios da operadora em face do volume de serviços de sua Vara, dos inúmeros processos que lá correm. Ocorre que Moro tem designação exclusiva e cuida apenas dos processos da Lava Jato. Desse modo, ou confessou grave negligência ou mentiu. Negligência que nunca se viu quando se tratava de matéria da acusação.

A corrupção passiva
O fato pelo qual Lula foi condenado pode ser assim sintetizado. Segundo a acusação, a OAS, responsável por obras em duas refinarias da Petrobrás, distribuía propinas a diretores da estatal e agentes políticos. Teria cabido a Lula vantagem auferida basicamente por meio da diferença de preço entre um apartamento simples e um tríplex em um edifício situado no Guarujá, diferença que somaria R$ 2.429.921,00. Por isso Lula teria incorrido no crime de corrupção passiva, que consiste, de acordo com o artigo 317 do Código Penal, em “solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda que fora da função ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar promessa de tal vantagem”.

A condenação somente se justificaria se demonstrado que Lula tinha o domínio do que ocorria na Petrobrás. Que consentiu, aderiu, participou e que houve prática de ato de ofício recompensado pelo apartamento do Guarujá. Recorde-se que Collor foi absolvido exatamente porque não demonstrada a prática do ato de ofício no crime de corrupção passiva.

Nada foi provado. Não há o mais remoto indício de prática de ato de ofício ou do domínio do que acontecia no âmbito da estatal. Essa fragilidade Moro tentou, em vão, compensar com confissões informais (não houve o acordo formal de delação premiada) dos corréus da OAS, particularmente Leo Pinheiro. Após negar, em uma primeira delação, a participação de Lula no esquema das propinas, Pinheiro mudou seu depoimento quando foi preso por Moro. Viu a oportunidade de conseguir benefícios dizendo para Moro o que todo mundo sabia que Moro queria ouvir. Embora condenado a mais de trinta anos também em outro processo, teve suas penas unificadas para dois anos e seis meses de reclusão.

Lavagem de dinheiro
Está tipificada no artigo 1º. da Lei 9.613/98: “ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal”. O fato de o apartamento constar em nome da OAS, sendo supostamente Lula o “proprietário de fato” – a alegada vantagem pelo ato de ofício jamais praticado – ensejou a condenação por lavagem de dinheiro.

O entendimento de que o próprio autor do crime antecedente pode ser sujeito ativo da lavagem de dinheiro, embora tenha adeptos, é insustentável. É parte da sanha punitivista que nos assola. Destaca-se parte do “iter criminis” para torná-lo outro crime.

Os verbos que são o núcleo do tipo, ocultar ou dissimular, são inerentes ao crime antecedente. Ninguém comete algum crime sem cuidar de não expor o seu produto para que possa obter a vantagem que o moveu. Ninguém furta, por exemplo, um automóvel para desfilar ostensivamente com ele pelas ruas da cidade. A ocultação ou dissimulação é meio para o exaurimento do crime, apropriação final da vantagem. Portanto, punir o próprio autor do crime por meramente ocultar ou dissimular é punir duas vezes pelo mesmo fato, o chamado “bis in idem”.

Mesmo que se admita que o próprio sujeito ativo do crime antecedente possa ser sujeito ativo do crime de lavagem de dinheiro, seria necessária uma segunda conduta para tornar aproveitável o fruto do crime. No julgamento da AP 470, o mensalão, vários ministros se pronunciaram nesse sentido. Pela síntese e clareza tomo uma passagem do ministro Barroso:

“O recebimento por modo clandestino e capaz de ocultar o destinatário da propina, além de esperado, integra a própria materialidade da corrupção passiva, não constituindo, portanto, ação distinta e autônoma da lavagem de dinheiro. Para caracterizar esse crime autônomo seria necessário identificar atos posteriores, destinados a recolocar na economia formal a vantagem indevidamente recebida” [1]

Indeterminação da data dos fatos e prescrição
Moro em nenhum momento estabelece em que data exata teriam se dado os fatos. Isso é indispensável para verificar a consumação e a consumação é o marco inicial da prescrição. Lula tem hoje mais de 70 anos, o que reduz à metade os prazos prescricionais. Como aferir a prescrição?

Tudo isto é típico lawfare. A destruição do inimigo político por meio de um processo aparentemente legal.

Moro não é um juiz solitário e temerário perseguindo um personagem político. O lawfare somente chegou a esse ponto porque ele tem endosso, cobertura e cumplicidade por parte dos Tribunais superiores, inclusive do STF, que, entre outras coisas, se omitiu diante do crime de violação do sigilo da comunicação telefônica (Teori não se deteve sobre o assunto quando o tema foi a plenário, assim como seus pares). Com isso recebeu “licença para matar”.

No TRF-4, o relator da representação contra Moro pela violação do sigilo telefônico socorreu-se de Carl Schmitt, o príncipe dos juristas nazistas, para abrigar o fundamento de que se tratava de uma situação excepcional, negando assim eficácia aos direitos e garantias constitucionais do ex-presidente.

Moro tem a cobertura favorável da grande mídia, que fez dele no imaginário popular o santo guerreiro combatendo o dragão da maldade.

Moro participou, consciente, deliberadamente, do golpe do impeachment. A divulgação do áudio da conversa entre Lula e Dilma ilegalmente, entregue para a Rede Globo no dia imediatamente anterior à posse de Lula como ministro, não podia ter outro objetivo.

Importa, sobretudo, concluir que não estamos mais em uma democracia. O que temos, com os preparativos e a consumação do impeachment, é uma ditadura de novo tipo, que preserva enganosamente as instituições políticas e jurídicas clássicas do Estado liberal e democrático, mas esvazia-as do real conteúdo democrático (o que o jurista e magistrado Rubens Casara vem denominando pós-democracia). Nesta ditadura de novo tipo, o que antes se fazia pela força das armas e pela violência para destruir o adversário político agora se faz pelo lawfare. Nisto, o Judiciário, que nas antigas ditaduras tinha um papel acessório, de coadjuvante, torna-se o protagonista da violência estatal ilegítima. Antes era um soldado ou policial que na calada da noite destruía o cidadão. Agora é uma sentença à luz do dia.

Márcio Sotelo Felippe é pós-graduado em Filosofia e Teoria Geral do Direito pela Universidade de São Paulo. Procurador do Estado, exerceu o cargo de Procurador-Geral do Estado de 1995 a 2000. Membro da Comissão da Verdade da OAB Federal.



 Do Justificando

sexta-feira, 21 de julho de 2017

Reinaldo Azevedo: Moro virou cabo eleitoral de Lula

Um dos porta-vozes do movimento neoconservador brasileiro, o jornalista Reinaldo Azevedo afirma que o juiz Sergio Moro se converteu no principal cabo eleitoral do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, ao condená-lo sem provas, no episódio do chamado "triplex do Guarujá".

"Hoje, um de seus cabos eleitorais involuntários, dadas a sentença e a resposta aos embargos de declaração, é Moro. Ele empurrou para o TRF-4 uma escolha sem saída virtuosa: ou confirma uma condenação sem provas e alheia à denúncia, o que seria um desastre, ou absolve o chefão petista, outro desastre", diz Reinaldo, que concorda com a defesa de Lula e afirma que a condenação não guarda relação com a acusação proposta pelo Ministério Público

A cada dia, fica mais claro que a democracia brasileira foi golpeada em razão do fator Lula. Depois da quarta vitória sucessiva do PT, em 2014, a direita nacional não suportou a hipótese da volta de Lula em 2018. Na fase um do golpe, a presidente legítima Dilma Rousseff foi derrubada com a armação em torno das chamadas "pedaladas fiscais". A fase dois, que prevê a condenação do ex-presidente Lula em primeira e segunda instâncias, está em pleno curso.

No entanto, o tiro pode sair pela culatra. Segundo o colunista Reinaldo Azevedo, ao condenar Lula sem provas, o juiz Sergio Moro se tornou num de seus principais cabos eleitorais. "Hoje, um de seus cabos eleitorais involuntários, dadas a sentença e a resposta aos embargos de declaração, é Moro. Ele empurrou para o TRF-4 uma escolha sem saída virtuosa: ou confirma uma condenação sem provas e alheia à denúncia, o que seria um desastre, ou absolve o chefão petista, outro desastre", diz Reinaldo, em artigo publicado nesta sexta-feira.

O jornalista que concorda com a defesa de Lula e diz que a condenação não guarda relação com a acusação proposta pelo Ministério Público. "Indagado, nos embargos de declaração, a respeito da ausência de nexo, na sentença, entre o apartamento e os contratos, o juiz respondeu de forma surpreendente e insólita: 'Este juízo jamais afirmou, na sentença ou em lugar algum, que os valores obtidos pela Construtora OAS nos contratos com a Petrobras foram usados para pagamento da vantagem indevida para o ex-presidente'. E a acusação feita pelo MPF? Se um juiz acha que um réu deve ser condenado por algo distinto do que está na denúncia que ele próprio aceitou, é forçoso que isso seja feito em outro processo", diz Reinaldo.

"Moro aceitou, em setembro do ano passado, a denúncia contra Lula por corrupção passiva e lavagem de dinheiro no caso do tríplex de Guarujá. Segundo o Ministério Público, o imóvel era pagamento de propina decorrente de três contratos que consórcios integrados pela OAS mantinham com a Petrobras. Assim, restaria aos procuradores a tarefa de apresentar as provas de que eram os tais contratos a origem daquele bem. A condenação veio. Mas as coisas se complicaram. Se o MPF não apresentou as provas de que o imóvel pertence a Lula, e não as apresentou!, tampouco conseguiu evidenciar a relação entre aquelas obras em particular e o dito-cujo". diz o jornalista. Segundo ele, "Moro, em suma, criou a versão dissertativa do PowerPoint de Deltan Dallagnol."

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quinta-feira, 20 de julho de 2017

Moro é um chicaneiro e um sádico, diz Eugênio Aragão

Eugênio Aragão: despacho de Moro que sequestra bens de Lula ‘é uma chicana’. “Moro é um juiz chicaneiro, não tem outra expressão”, diz ex-ministro da Justiça. “Isso mostra que Moro tem lado. Não é coisa que se faça com um réu comum. Ele está fazendo isso porque é o Lula”.

 “Ou Moro é um sujeito completamente desorganizado, ou está fazendo isso por chicana, ou por sadismo puro”.

São Paulo – O pedido de sequestro dos bens e o bloqueio de contas bancárias do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pelo juiz Sérgio Moro, da 13ª Vara Federal de Curitiba, no âmbito da operação Lava Jato, “é um absurdo e uma chicana”, segundo o ex-ministro da Justiça Eugênio Aragão, que integrou o Ministério Público Federal de 1987 a 2017. Em despacho de 14 de julho, mas divulgado nesta quarta-feira (19), Moro ordenou o bloqueio, pelo Banco Central, de R$ 606.727,12 do ex-presidente e o sequestro de três apartamentos, dos quais o imóvel onde Lula reside. Todos os imóveis estão na declaração de bens de Lula quando de suas candidaturas à presidência em 2002 e 2006.

“O que ele está fazendo, em bom juridiquês, é uma chicana (“abuso dos recursos, expedientes e formalidades da Justiça”, segundo o dicionário Michaelis). A coisa mais absurda de tudo isso é, primeiro, que a própria sentença reconhece que não houve nenhum prejuízo à Petrobras. Em segundo lugar, reconhece que o apartamento não é do Lula. Afinal de contas, o que ele quer? O Lula tem que indenizar o quê? Em terceiro lugar, ele está lançando mão das verbas alimentares, o que é um absurdo em relação à pessoa física, num valor que o Lula nunca teve na vida, e ele sabe disso. Esse Moro é um juiz chicaneiro, não tem outra expressão”, diz Aragão.

Na semana passada, Moro condenou o petista a nove anos e seis meses de prisão. Em entrevista coletiva, o advogado Cristiano Zanin Martins afirmou que “a sentença despreza as provas da inocência” e “potencializa um espetáculo midiático-penal”.

“Se é uma medida de natureza executória, caberia na sentença condenatória, e não num despacho posterior, que é para dificultar a apelação”, comenta o ex-ministro. Segundo ele, dificulta a apelação porque, se Moro tivesse adotado a medida antes da sentença, caberia recurso em sentido estrito (artigo 581 do Código de Processo Penal). “Agora não cabe mais. Provavelmente, (a defesa) vai ter que entrar com mandadode segurança. Isso deveria ter sido resolvido na sentença, mas ele resolve como medida de execução provisória de uma sentença que ainda não foi confirmada no segundo grau”, aponta.

Para o jurista, Moro deveria ou ter colocado tal medida na sentença, ou ter resolvido o sequestro dos bens antes da sentença. “E então caberia recurso em sentido estrito. Mas fazer isso depois? Para ele ter por toda a semana os seus dez minutos de glória? Isso é tortura chinesa?”, ironiza.

Aragão diz que o despacho que bloqueia contas e sequestra bens “é uma teratologia” (“estudo das monstruosidades”, segundo o dicionário Aurélio). “Mostra que Moro tem lado. Isso não é coisa que se faça com um réu comum. Ele está fazendo isso porque é o Lula.”

Ele enfatiza que o pedido do juiz de Curitiba de sequestro de bens foi requerido pelo Ministério Público Federal (em 4 de outubro de 2016) muito antes da sentença proferida na semana passada. “Moro deixou isso encadernado lá, sem resolver. Foi arrastando esse pedido e agora resolve esse pedido depois da sentença. É um absurdo completo. Ou ele é um sujeito completamente desorganizado, ou está fazendo isso por chicana, ou por sadismo puro, para fazer as maldades aos pouquinhos.”

Nota da defesa
Em nota divulgada no início da noite de hoje, os advogados de Lula afirmam que a decisão de Moro é ilegal. “A decisão é de 14/07, mas foi mantida em sigilo, sem a possibilidade de acesso pela defesa – que somente dela tomou conhecimento por meio da imprensa, que mais uma vez teve acesso com primazia às decisões daquele juízo”, afirma o documento.

A defesa diz que vai entrar com recurso. “Somente a prova efetiva de risco de dilapidação patrimonial poderia justificar a medida cautelar patrimonial”, diz a nota assinada pelos advogados Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Martins.

O comunicado acrescenta ser contraditório Moro afirmar que o bloqueio de bens e valores tem o objetivo de assegurar o cumprimento de reparação de “dano mínimo”, mas a medida ter sido “efetivada um dia após o próprio Juízo haver reconhecido que Lula não foi beneficiado por valores provenientes de contratos firmados pela Petrobras”.

quarta-feira, 19 de julho de 2017

Bandeira de Mello: Moro não está habilitado para ser juiz

O jurista Celso Antônio Bandeira de Mello disse, em vídeo publicado no Youtube, que Sergio Moro não está habilitado para ser juiz, pois adotou uma postura parcial e partidária na Lava Jato, chegando a atuar como um "acusador".

"Esse juiz Moro é um homem, a meu ver, muito pouco habilitado para exercer a função de magistrado. A magistratura exige serenidade e sobretudo imparcialidade. Não pode ser uma conduta apaixonada. Mesmo que ele assuma um ar sereno, e assume, o comportamento dele não é de magistrado. O comportamento dele é de acusador."

Bandeira de Mello ainda disse que usar prisões preventivas para obter delações é digno de torturadores e avaliou o caso triplex como uma "perseguição" a Lula, para evitar que o ex-presidente tente disputar o Planalto em 2018. Confira o vídeo abaixo:

GGN

terça-feira, 18 de julho de 2017

Fernando Horta: Com Supremo, com tudo

Em março de 2016 vazava uma conversa entre o ex-presidente Lula e a presidenta Dilma Rousseff em que Lula dizia, em alto e bom som, que temos uma “suprema corte totalmente acovardada”. Não vamos rediscutir a ilegalidade do vazamento, a falta de punição aos agentes públicos que vazaram o áudio ou ao fato de que os governos de Lula e Dilma terem indicado quase todos os ministros desta corte. De fato, se Dilma tivesse continuado seu governo e a PEC da Bengala não tivesse sido aprovada, Lula e Dilma teriam indicado 10 dos onze ministros do STF. Apenas Gilmar Mendes seria a exceção.
Este cenário também deve ser levado em conta para entender a inércia da corte quanto ao golpe.

Mas para quê, afinal, serve o STF?

Existem estimativas de que o STF custe R$ 1,7 milhão de reais por dia ao povo brasileiro. Um tribunal caro para um judiciário que está entre os mais caros do mundo, chegando ao valor anual de quase 80 bilhões de reais, o que representa algo como 1,3% do PIB. Segundo números do judiciário, ele próprio arrecadou apenas R$ 45 bilhões, sendo deficitário, portanto.

Não são todos os países do mundo que tem um Superior Tribunal de Justiça como uma última instância do judiciário em linha normal e, acima dele, um Supremo Tribunal Federal. Algo um pouco além do que a mera justiça. Algo diferente. É o reconhecimento, feito por nossos legisladores, de que o judiciário, por si só, não faz justiça. Pode fazer numa demanda entre o indivíduo A e o B, ou entre a empresa A e o indivíduo C, mas nada substitui a política. Esta aliás, foi uma das lições tiradas das discussões no século XVIII, quando da formação dos EUA. Os “pais fundadores” de lá reconheciam o caráter subjetivo da lei e mais ainda da aplicação desta lei, e sempre criaram formas de o executivo não ficar escravo do judiciário. A própria Suprema Corte norte-americana exerce-se com um comedimento imenso, evitando se intrometer onde a política deve prevalecer. Quando houve um aumento da atividade jurídica dela por sobre a política por lá (durante o governo Obama) a própria Hillary Clinton falou abertamente que os senadores estavam “chocados” com o assanhamento da suprema corte. A palavra “assanhamento” é minha, não de Hillary Clinton.

No Brasil, há algum tempo, o STF vem se assanhando. Legislando nas brechas do congresso, mudando a constituição quando lhe convém (e tem ocorrido bastante esta conveniência), definido os espaços de atuação da Democracia ou permitindo e retirando atores do jogo político sem uma regra clara. Apenas a título de curiosidade o mesmo Gilmar Mendes que afrontou a tudo e a todos dando liminar contra a nomeação de Lula para ministro, deu liminar para que o senador Cássio Cunha Lima do PSDB fosse empossado por cima da lei da ficha limpa. Nos últimos tempos o STF se tornou tudo o que um tribunal não deveria ser: o centro das atenções.

Entretanto, todos os efeitos ruins deste tribunal seriam bem aceitos se ele estivesse contribuindo com o país. É preciso entender que o STF não foi pensado para ser última instância de processos de polos enriquecidos que conseguem, com boa retórica, transformar qualquer coisa em “questão constitucional”. As funções jurídicas do STF têm se alargado imensamente nos últimos tempos. E a corte tem deixado de lado suas originais funções.

Não vou me deter nas funções jurídicas do STF, tem gente muito mais qualificada para isto no cenário nacional. E que está já fazendo esta crítica. Vou me deter nas funções políticas dele. O STF foi pensado, em primeiro lugar, para ser um amortecedor da imensa liberdade que foi dado aos juízes de piso no nosso sistema. Liberdade, diga-se de passagem, sem o contraponto da prestação de contas à sociedade. Na prática, nossos juízes podem olhar para o céu e decretar que estão vendo ele verde com bolinhas rosas. Sentenciar assim e ponto final. O segundo grau foi organizado ser uma primeira barreira contra estes abusos, mas, com o passar do tempo, a segunda instância virou meramente burocrática, para a imensa maioria dos processos. Pesquisas atuais mostram que o grau de deliberação da segunda instância é pífio e só existe quando há interesse político ou financeiro em algum dos lados da demanda. O STF deveria, pois, conter o próprio judiciário.

A segunda função do STF é ser um dos “freios e contrapesos” entre os poderes. Desde Montesquieu, a ideia de poderes independentes e de mesma envergadura precisa ser pensada na prática. Como só um poder limita outro, ficou estabelecido que os poderes teriam mecanismos para se conterem mutuamente. Nos EUA, por exemplo, o impeachment é usado contra juízes de primeiro grau. No Brasil, uma das únicas formas do executivo agir sobre o judiciário é o STF. Algumas vozes têm defendido uma mudança na escolha do STF. Não sei se por ignorância ou má fé falam em “concursos” ou “indicação legislativa”, retirando o poder atual do executivo. A indicação de um ministro da suprema corta deveria ser algo de extrema importância. De novo, voltando aos EUA, por lá são feitos meses de entrevistas com os candidatos, análises das suas últimas decisões, de sua produção na vida e etc. Os governos progressistas no Brasil acreditaram que deveriam ser “republicanos” indicando ministros com critérios insondáveis. Estamos onde estamos.

A terceira função política do STF é evitar a conflagração social. Alguns nomeiam de “Poder Moderador”, lembrando o tempo do império. Uma palavra que deveria se basear na lei e moderar a vida do país quando em situação de risco. Este poder moderador serviria sempre como apaziguador, mas teria que ser ativo. Teria que se pronunciar e não se calar omitindo-se, como faz o atual STF. Não sei se a experiência do regime militar (quando três ministros não aceitaram o golpe e foram trocados pelos militares sem que a corte tomasse qualquer atitude) ainda é presente, mas desde então o STF se tornou um carimbador de pequenos, médios e grandes golpes. A corte procura se eximir da sua função de moderação. Protegem seu status pessoais sem incorrer em muitos riscos. É sempre providencial o pedido de vista indefinida, com que os ministros evitam até que o assunto seja debatido em plenário. Qualquer tentativa de reverter este descalabro encontra a voz corporativa da “independência do judiciário”. Defendem o direito de engavetarem decisões pelo tempo que interessar a eles individualmente. E dizem que isto é “independência” do poder que – em princípio – a teoria apontava que deveria ser como uma segurança para a sociedade, e não para os próprios membros.

Agora, se o STF se furta de ser um amortecedor do judiciário, quase sempre em função do corporativismo. Se se furta decidir em momentos-chave para evitar conflagrações sociais e se o executivo o livrou de ser um dos freios e contrapesos (porque indicou com base em critérios não definidos), então este STF não serve ao país. Não serve para mais nada. Esta situação ocorreu sim, em parte, por inação do executivo. Entretanto, outra significativa parte ocorre porque sim, temos uma suprema corte acovardada. Uma suprema corte em que o único que ruge como um leão no plenário e na frente das câmeras fala como um gatinho ao telefone com senadores de determinado partido. Lula estava certo em seu julgamento. É um escárnio terem votado o processo do Collor quase 20 anos depois do impeachment. E é um escárnio que os processos de Dilma Rousseff caminhem a mesma senda. Uma corte que só grita para defender os seus.

O país não precisa se onze supremas autoridades, protegidas social e politicamente, regiamente pagas, nobiliarquicamente tratadas, artisticamente filmadas em sessões para que eles deixem, por conveniência, a “história seguir seu curso”. É muito caro ter um STF que engaveta o que de mais importante existe para o país, enquanto põe em pauta um recurso da empresa X contra fulano de tal e passa horas debatendo sobre uma questão minúscula com ares de importância magistral enquanto o país se liquefaz.

Do GGN

segunda-feira, 17 de julho de 2017

O que Palocci tem a dizer da Globo na delação premiada?

Há alguns dias, a revista Veja divulgou uma nota informando que a delação premiada de Antonio Palocci tem um "anexo que entra e sai" exclusivamente dedicado à Rede Globo. O que o ex-ministro da Fazenda tem a dizer sobre o império erguido pela família Marinho, que esteve bem perto de quebrar no início dos anos 2000?

Diante de Sergio Moro, em abril passado, Palocci deu uma dica: poderia colaborar com a Lava Jato entregando negociações que ocorreram nos bastidores de Brasília para "salvar" empresas de comunicação que, sem a ajuda do governo, corriam sério risco de quebrar. 

Reportagem veiculada pela Record, no domingo (16), mostra que a Globo se beneficiou da edição da lei 12.996, que abriu uma brecha para que a emissora pudesse pagar parte da dívida que tem com a União, com 100% de desconto em multa. Ou seja, o grupo devolveu R$ 1 bilhão referente a impostos sonegados aos cofres públicos, mas deixou de pagar outro R$ 1 bilhão em multa, diz a matéria. 
  
Palocci poderia, entre outros pontos, revelar a eventual pressão exercida pela Globo para conseguir essa janela e se beneficiar do não pagamento de multas.

Ainda segundo a reportagem, o governo passou a investigar a Globo, através da Receita federal, em meados do ano 2005. As autoridades haviam descoberto o esquema da emissora para comprar direitos de transmissão de grandes eventos esportivos da Fifa sem pagar nenhum imposto no Brasil. 

A "operação fraudulenta" acontecia através da empresa com nome Empire, que a Globo abriu em um paraíso fiscal para adquirir os direitos de transmissão. "Assim que a Empire ficou com o direito da Copa do Mundo, ela foi dissolvida e transferiu os bens para a Globo. Só com essa manobra, Globo deixou de pagar R$ 170 milhões em impostos no Brasil."

A Receita chegou a acusar a Globo de simulação, multou em 150% sobre o valor do imposto sonegado e pretendia processar a emissora criminalmente. À época, o valor devido em multa e juros passava dos R$ 615 milhões.

Mas às vésperas do processo ser entregue ao Ministério Público, uma funcionária da Receita que estava em férias furtou o processo. Ela foi condenada a 4 anos, mas não passou uma semana na cadeia. Teve habeas corpus do Supremo Tribunal Federal. Hoje, ela, que mora em um condomínio luxuoso no Rio de Janeiro, responde em liberdade, diz a reportagem da Record.

O veículo ainda mostrou os negócios da Mossak Fonseca e abordou a pressão sobre os procuradores da Lava Jato para não aceitarem a delação de Palocci sobre a Globo.

Na sentença em que condenou Palocci a 12 anos de prisão, Sergio Moro deu um sinal de que a delação não deve ser negociada, afirmando que a promessa de cooperação mais parecia uma "ameaça", um recado àqueles que podem ser atingidos, para que dessem um jeito de ajudar o ex-ministro.

GGN

A parcialidade do judiciário desmoraliza princípios básicos do direito. Opinião do Luís Nassif

Conheça as razões que fazem com que a maioria dos casos de grande repercussão no país tenham condenações com foco político. 
Em todo inquérito penal existe uma margem de flexibilidade para o juiz decidir, ou seja, em cima de um conjunto de dados um juiz pode ter uma interpretação, outro juiz pode ter uma segunda interpretação. Dependendo da maneira que decidem é possível identificar os juízes em dois grupos, basicamente: os garantistas e os conservadores. Os garantistas são aqueles que prezam acima de tudo os direitos individuais, então o crime precisa ser muito bem comprovado para poder haver a punição, e a punição depende de um conjunto de alternativas que não são, necessariamente, a prisão. Confira a opinião de Nassif no vídeo abaixo:
Já os penalistas, conservadores, ou o nome que se dê, são os juízes que acham que precisam ser bastante severos mesmo contrariando a consistência das provas. Além desses dois perfis básicos, a tomada de decisão depende muito da influência do setor do judiciário onde o magistrado trabalha. Por exemplo, a Justiça Trabalhistas aceita mais os depoimentos testemunhais, já o direito penal, onde está inserida a Lava Jato, é extremamente severo com a produção de provas. Ou seja, em toda a ação penal você precisa identificar, claramente, o crime de cada agente com provas. 

Geralmente, no tráfico e roubo os juízes que atuam tendem a ser mais severos com as penas aplicadas. Mesmo assim, no tráfico, se não tiver tudo comprovado não tem punição. Porém, quando você chega no caso do ex-presidente Lula e lê a sentença do juiz Sérgio Moro em relação ao Triplex, não existem provas. 

Alguns argumentam que o juiz tem o direito de interpretar e ser convencido, como fizeram advogados que querem agradar o diabo dos jornais e deus do respeito ao direito. Entretanto, não existe no direito penal esse padrão de se provar convicção em cima de delações onde está mais do que comprovado que os procuradores induzem os delatores a mencionar Lula em qualquer hipótese, mesmo sem ter a prova. Esse quadro é uma exceção. Ao mesmo tempo, quando você pega esse tipo de abuso e tenta dividir por grupos políticos percebe que com o PSDB isso nunca acontece, diferente do PT, onde alguns dos seus membros, como o João Vacari Neto, foram condenados em cima de delações, sem provas. 

Por que, então, o outro lado político não sofre os mesmos abusos? No Supremo Tribunal Federal, onde estão os processos dos políticos, ou seja, do pessoal com foro privilegiado, como Aécio Neves, José Serra e Geraldo Alckmin, tem um problema sério que são os sorteios dos processos para os ministros. Teoricamente, esse sorteio é baseado em um algorítimo que faz o cálculo das probabilidades e entrega o processo para o ministro com menos ações no momento. 

Mas há uma suspeita muito pesada de que acima desse algorítimo tem uma gambiarra que permite a uma pessoa, sem o conhecimento das demais, imputar os nomes dos ministros que vão ser sorteados. Ou seja, tem um determinado processo e quero que caia com o ministro Gilmar Mendes, ou com Alexandre de Moraes, então coloco o nome deles especificamente. Essa é uma suspeita que está crescendo muito e vai exigir, em um certo momento, que a presidente do Supremo, a ministra Carmem Lúcia, faça uma auditoria no sistema porque é impossível, probabilisticamente, o que está ocorrendo. 


Vamos tirar a prova nos próximos dias, com o caso de José Serra sob quem foi aberto um inquérito que entrou no Supremo. Vamos esperar quem será o sorteado para receber essa ação. No Tribunal Superior Eleitoral, também a mesma coisa: nas horas críticas os processos caem sempre com o Gilmar Mendes. Em outros tribunais não temos certeza se as mesmas suspeitas podem ser aplicadas. No caso da Lava Jato, por exemplo, todas as ações contra o ex-presidente Lula caem com o Desembargador Gebran Neto que é amigo do Sérgio Moro, endossador das teses do juiz que coordena na Lava Jato. 

Essas suspeitas, sobretudo sobre o Supremo Tribunal Federal, de que pode haver manipulação dos sorteios, são baseadas em indícios veementes. Estamos falando da instituição mais relevante, daquela que defende a Constituição. Essa suspeita vai aumentar e vai chegar o momento em que vai ter que se abrir a caixa preta - o que é obrigatório por lei - para auditar o que está acontecendo.

Além dessa questão, temos ainda a própria posição política de advogados, juízes e desembargadores. Neste final de semana, por exemplo, comentei sobre um advogado que saiu na Folha escrevendo sobre a Lava Jato de uma forma horrorosa porque admitiu que a condenação de Lula foi feita sem provas, por outro lado argumentando que o juiz Moro se convenceu. Então, no texto, achamos que o advogado endossa a tese de Moro, mas no meio do artigo, mais escondido, ele coloca uma ressalva contrária ao entendimento do juiz de Curitiba. 

Outro exemplo é de Luís Francisco Carvalho Filho, um grande advogado, um penalista fantástico da melhor estirpe. Ele sabe que está tudo imoral na ação do Moro contra o Lula. Ele diz que tem certeza que Lula não enriqueceu ilicitamente, por outro lado, acredita que o ex-presidente se beneficiou da amizade com os empreiteiros. Então, ele justifica que a saída de Moro é investir na sentença, já que não pode admitir os erros da falta de provas. Apesar de ser um grande cara, o Chico erra porque se o sujeito recebeu benefícios mínimos de uma empreiteira, é certo ele ser condenado como um corrupto? E, ainda, é certo condenar ele por reagir contra essa acusação? Não tem lógica defender isso, Luis Francisco! Você precisa pegar a sua função de grande penalista e fazer uma análise crítica real do que está acontecendo.

Então, até que ponto vai persistir esse engodo em relação ao judiciário? Até que ponto que um tribunal, que nem o TRF-4, vai endossar essa barbaridade, que declarou o Ministro Luis Roberto Barroso, de que estamos em um estado de exceção para combater a corrupção? Isso é uma desmoralização do direito. Os senhores são juízes, desembargadores, ministros, pessoas que devotam a vida a uma causa e, de repente, vão atropelar a causa por uma questão político-partidária? 

Esse será o grande desafio daqui em diante. Acho que as reações contra esse abuso dessa ação do Triplex vão crescer. Tivemos essa incoerência em outros momentos, como no próprio mensalão. Ali você teve tantos abusos que o próprio Ives Gandra Martins se manifestou contra. Na época o foco da ação era José Dirceu, que já estava fora do combate do jogo político, mas agora Ives não irá se manifestar, porque estamos falando de Lula, que ainda está dentro do jogo. 

Se você desmoraliza os princípios básicos do direito, para quê tribunais, não é mesmo? Isso aí é o estado de exceção, efetivamente, é a zorra. Agora, tanto no mensalão, onde começou esse jogo, quanto nessa última ação da Lava Jato, temos o papel direto do Ministério Público Federal, não apenas do ex-procurador geral, Rodrigo Janot, como também do seu antecessor Antonio Fernando de Souza, e Joaquim Barbosa, ex-presidente do Supremo, e egresso do MPF. Isso traz para a linha de frente, daqui em diante quando se voltar a normalidade, uma discussão séria sobre todas as distorções que acometeu o Ministério Público, principalmente quando tinham pela frente governantes sem nenhuma noção de exercício no poder. 

Então vamos ver até que ponto esse jogo de cena vai continuar. 

 GGN