Ilustração
A grande frente que se formou para
perpetrar o golpe do impeachment está se desfazendo aos poucos. O ponto de
convergência desta frente foi a operação lava jato. Ela era o estandarte, a
bandeira tremulante, na qual estava estampada a cruz para liderar o expurgo dos corruptos que
haviam se apossado do país. Sérgio Moro parecia ser uma espécie de São Bernardo
de Clairvaux, cujos pareceres nos processos e nos mandatos eram verdadeiras
chamadas à mobilização de cruzados. Ou, quem sabe, era o bispo Fulk um dos
chefes da Cruzada Cátara para combater com violência os hereges porque, entre
outras coisas, estes queriam uma maior igualdade.
Nas cruzadas do impeachment todos eram
santos: os que foram às ruas, os integrantes do judiciário, os porta-vozes da
grande mídia, os políticos contrários ao governo Dilma, os deputados do
indescritível espetáculo do 17 de abril, os grupos que pregavam a volta dos
militares etc. São Michel, com seu cortejo de anjos e arcanjos, haveria de
purificar o Brasil com seu jeitinho manso, com sua habilidade de conversar, com
sua capacidade de construir consensos. O Brasil, livre dos demônios vermelhos, seria
unificado, num estalar de dedos a economia voltaria a crescer e o manto verde e
amarelo da ordem e do progresso haveria de produzir paz, contentamento,
empregos e opulência.
Esta grande mentira, que embebedou boa
parte da sociedade, hoje não passa de um espelho estilhaçado em mil pedaços,
todos eles refletindo a face da maior quadrilha de corruptos que se apossou do
poder. Todos eles refletindo as faces de um grupo indigesto de políticos que se
acotovelam para participar da suruba do Foro Privilegiado. Todos eles
refletindo as faces de antigos comparsas que agora querem queimar o sagrado
estandarte no fogo cruzado que objetiva bloquear a marcha da libertação da
terra santa. Até os santos, os chefes dos cavaleiros templários, o São
Bernardo, são diariamente chamuscados pelas chamas que vêm das barricadas que
tentam bloquear a justiça purificadora.
O PMDB, principal beneficiário, se tornou
também o principal inimigo da lava lato. Já tentou várias manobras no Congresso
para detê-la. Agora vêm os ataques públicos. Junto com alguns colunistas e
blogueiros de direita, que se valeram de todas as ilegalidades da lava lato e
do juiz Moro para derrubar o governo Dilma, desferem petardos contra os
vazamentos seletivos, contra a criminalização da política, contra as conduções
coercitivas, contra a manutenção de acusados na cadeia para que eles façam
delações premiadas, contra o "lado obscuro" da operação e assim por
diante. Investigar corruptos do PMDB e do PSDB virou sinônimo de
"criminalização da política". Contra o PT se tratava de "limpeza
moral". Mas a partir do governo Temer, a fetidez do ar bloqueou até mesmo
a chuva nos céus de Brasília.
O PMDB está na linha de frente no combate
à lava jato. Age como se fosse uma infantaria, uma espécie de bucha de canhão. Já,
o PSDB, age como se fosse um grupo de comando de forças especiais. Usa a
inteligência, tem infiltrados poderosos nas trincheiras "inimigas"
como Rodrigo Janot, o próprio Moro Gilmar Mendes, Dias Toffoli e o ministro
plagiador. Entre os infiltrados, nem todos são amigos entre si. O único ponto
de convergência consiste em proteger os caciques do tucanato. Uns torpedeiam a lava
jato, citando, inclusive, ilegalidades contra petistas; outros, querem
preservá-la no que lhes interessa.
As direitas que patrocinaram as
mobilizações de rua agora estão divididas. De um lado estão aqueles que querem
salvar Temer para salvar o PSDB em 2018. Além de atacarem a lava jato, acusam
seus ex-colegas classificando-os de "direita xucra", de fazer o jogo
da esquerda por querem continuar mobilizando contra a corrupção. Ocorre que as
perspectivas de 2018 colocam as direitas em uma encruzilhada, em marchas para
caminhos distintos. A "direita xucra" quer a continuidade das
mobilizações por duas razões: 1) ficar com Temer poderá significar um
naufrágio; 2) não quer uma alternativa tucana, pois está engajada na construção
de um projeto mais à direita - talvez Bolsonaro, talvez um outro candidato a la
Trump.
Temer deveria renunciar e Moro se afastar
Não é necessário muito esforço de lógica
para perceber o que a "Operação Mula", que envolve José Yunes, Eliseu
Padilha e Michel Temer quer esconder. O PMDB tinha três chefes que recebiam e
distribuíam propinas: Michel Temer, Eduardo Cunha e Eliseu Padilha. Não se
tratava atos fortuitos, ocasionais, mas de operações sistemáticas de corrupção
tramadas, inclusive, em palácios da República.
A continuidade de Temer na presidência da
República foi, é e será uma afronta à dignidade nacional, à moralidade social,
aos conceitos fundantes da Constituição Federal. Se ainda restam alguns
resquícios de comunidade política nacional, Temer precisa se afastar ou ser
afastado. Aqui cabe uma cobrança às sumidas oposições: sem o afastamento de
Temer, o futuro da dignidade da política, da sua moralidade, da
responsabilidade, estará comprometido por anos seguidos. Sem a saída de Temer a
herança que ficará serão os escombros da democracia e a percepção de que golpes
valem a pena.
O juiz Moro, por seu turno, não tem mais condições morais de permanecer à
frente da lava jato. Em recente palestra proferida nos Estados Unidos ele
afirmou que não contribuiu para derrubar Dilma. Ele não só contribuiu de forma
decisiva como, agora se sabe, agiu deliberadamente para proteger os mal-feitos
de Temer ao cancelar perguntas dirigidas pela defesa de Cunha ao
presidente-usurpador. Ao barrar as perguntas de Cunha, o juiz Moro cometeu duas
ilegalidades: 1) barrou o direito de defesa, algo que não cabe a nenhum juiz
praticar; 2) prevaricou, pois o certo era permitir que se pudesse conhecer
aquilo que as perguntas pretendiam revelar.
Vejam-se apenas duas das perguntas
barradas por Moro dirigidas a Temer: "Qual a relação de Vossa Excelência
com o Sr. José Yunes?" e "O Sr. José Yunes recebeu alguma
contribuição de campanha para alguma eleição de Vossa Excelência ou do
PMDB?". Moro classificou como "chantagem" e
"provocações" as perguntas da defesa de Cunha. Está claro que ele
agiu para proteger Temer, protegendo um esquema criminoso.
A cada dia que passa, as provas deixam
mais evidente que quem destruiu a Petrobras pela corrupção foi o PMDB. A
destruiu para agora entregar os seus ativos ao capital estrangeiro. Este
governo foi instituído para liquidar as empresas brasileiras a preço de banana,
para entregar os direitos dos trabalhadores ao capitalismo de predação, para
vender as aposentadorias de pobres idosos ao capital financeiro, para destruir
a educação e a saúde públicas.
Agora a mídia e setores de direita querem
vender a seguinte equação: a política vai mal, mas a economia vai bem, pois os
indicadores estariam melhorando. Proclamar a queda da inflação e dos juros como
grande feito desse governo significa vender fumaça, pois os dois indicadores
são consequência do efeito inercial da recesssão. Na verdade, a política está
podre e a economia vai mal. Uma economia que tem mais de 12% de desempregados
não pode estar bem. Uma economia que produz novos pobres todos os dias não pode
estar bem. Uma economia que destrói o pouco de seguridade social do seu povo
vai muito mal.