quinta-feira, 13 de maio de 2021

BOLSONARO AUMENTA O PRÓPRIO SALÁRIO E DE UM GRUPO DE MINISTROS EM QUASE 70%, E´O 'TETO DUPLO'

Portaria publicada no final de abril e editada pelo próprio presidente Bolsonaro permite que os salários de algumas autoridades furem o teto e ultrapassem o valor de R$ 66 mil.

Entre os beneficiados com a nova portaria, Bolsonaro deve ter o aumento mais modesto Foto (Marcos Corrêa/PR)

Um grupo seleto de servidores, incluindo o presidente Jair Bolsonaro, o vice Hamilton Mourão e ministros militares, terá aumento de salário de até 69%, estourando o teto de R$ 39.293,32 do funcionalismo. Com a regra, editada pelo presidente Bolsonaro, os salários de algumas autoridades podem passar de R$ 66 mil. As informações são da Folha de São Paulo.

A portaria foi publicada no dia 30 de abril pela Secretaria de Gestão e Desempenho de Pessoal do Ministério da Economia e entrou em vigor neste mês, com efeito nos salários a partir de junho. O impacto fiscal anual da medida é estimado pelo governo em aproximadamente R$ 66 milhões, mas pode variar.

Conforme a Folha, a portaria inova ao criar uma espécie de teto duplo, uma vez que o limite da remuneração incidirá de forma separada para cada um dos vínculos no caso de aposentados e militares inativos que retornaram à atividade no serviço público. Na prática, o teto total mensal para esse grupo privilegiado passa a ser de R$ 78.586,64.

Entre os beneficiados com a nova portaria, Bolsonaro deve ter o aumento mais modesto. O presidente recebe R$ 30,9 mil de salário e mais R$ 10,7 em outros benefícios, mas é feito um corte de R$ 2.300 para que o teto seja obedecido. Agora, a remuneração atingirá R$ 41,6 mil, uma alta de 6%.

General da reserva, o vice-presidente Hamilton Mourão terá reajuste de 63%. O abatimento de R$ 24,3 mil para respeitar o teto não deve mais ser feito. Assim, a remuneração mensal passa de R$ 39,3 mil para R$ 63,5 mil, diferença de 62%.

O ministro da Casa Civil, Luiz Eduardo Ramos, terá o maior reajuste entre os militares do primeiro escalão federal. O desconto mensal de R$ 27 mil poderá ser incorporado, elevando o salário mensal para R$ 66,4 mil, incremento de 69%.

Já o ministro da Defesa, Walter Braga Netto,  terá aumento de R$ 22,8 mil, totalizando R$ 62 mil por mês, 58% a mais. Número 1 do Gabinete de Segurança Institucional, Augusto Heleno deve passar a receber R$ 23,8 mil a mais, totalizando R$ 63 mil, alta de 60%.

Titular do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações, Marcos Pontes, com elevação de R$ 17,1 mil, indo a R$ 56,4 mil por mês (aumento de 44%).

O Ministério da Economia informou à Folha que 70% das mil pessoas que serão beneficiadas pela regra são médicos e professores. O teto duplo vale para profissionais dessas áreas que acumulam funções.

 A pasta afirma que a portaria adequa o cálculo do teto a decisões do Supremo Tribunal Federal (STF) e do Tribunal de Contas da União (TCU).

Dom Total.

A LIBERDADE PELAS MÃOS DO POVO PRETO É A VERDADEIRA HISTÓRIA DO 13 DE MAIO E DA ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO

Movimento negro e pesquisadores ressaltam luta social de cativos e abolicionistas como causa do fim da escravidão.

Racismo e violência do Estado ainda assolam a população negra 133 anos depois da Abolição - Foto: Carl de Souza/AFP.

A sanção da Lei Áurea, que há exatos 133 anos aboliu oficialmente o trabalho escravo no Brasil, consolidou o 13 de Maio como uma data de protestos contra violências que atravessaram séculos e continuam vitimando a população negra. 

Uma realidade que, por si só, coloca em xeque a narrativa registrada por muito tempo nos livros de história de que os males da escravidão teriam sido sanados no momento seguinte à assinatura de Princesa Isabel.

Matheus Gato, professor da Universidade de Campinas (Unicamp) e pesquisador do Núcleo Afro do Centro Brasileiro de Análise e Planejamento (Cebrap), afirma que o 13 de Maio é uma data importante pelo simbolismo que adquiriu nas lutas sociais do Brasil e pelo processo social que fora interrompido, transformando o significado de pertencimento dos negros à nação brasileira. 

Mas, explica que, ao longo do século 20, a data engendrou uma série de disputas de imaginário sobre como realmente se deu o processo da abolição.

“Primeiro, tínhamos uma narrativa que enfatizava muito a importância do Estado, na qual a abolição aparece como uma dádiva e não como uma conquista de movimentos sociais, uma conquista popular. De uma certa maneira, o 13 de Maio fez parte dessa narrativa de que as conquistas do povo brasileiro, no fundo, foram concessões. Aí está a armadilha ideológica”, aponta Gato. 

Enxergar o processo da Abolição como farsa, a partir da anulação do protagonismo das camadas populares, é uma tônica histórica do movimento negro, como defende Seimour Souza, ativista da Uneafro Brasil. 

Segundo ele, o 13 de Maio representa uma abolição para a população branca que escravizava negros e negras, e que, após a assinatura da lei, não indenizou a população preta e permaneceu sem criar mecanismos de amparo e inclusão no mercado de trabalho aos ex-escravos e seus descendentes.

Por isso, é importante relembrar a data e suas consequências, mas em uma perspectiva completamente oposta à celebração ou reconhecimento à monarquia, regime então vigente no Brasil quando foi promulgada a lei abolicionista.

“O 13 de Maio é um dia de denúncia contra o Estado brasileiro que ainda é responsável pela condição de miserabilidade e vulnerabilidade que a população negra enfrenta. Não só hoje, mas ao longo da história. Tudo isso se dá por um tipo de abolição inconclusa, que deixou ao léu milhares de pessoas por todo Brasil”, afirma Seimour. 

O analista ressalta que a luta do povo negro pela abolição surgiu desde o primeiro momento que uma pessoa escravizada foi trazida da África, contra um regime que buscava manter o controle social dos corpos negros, sem qualquer benevolência:

“Nossa luta não começou ontem, não começa hoje. Nossos ancestrais um dia ousaram sonhar com a liberdade, e nós somos frutos desses sonhos. Somos frutos de uma gente que sobreviveu ao horror com altivez, de uma gente que sonhou com um futuro diferente. Somos frutos de teóricos e militantes como Abdias Nascimento, Lélia Gonzáles, Guerreiro Ramos, que há muito tempo denunciam a farsa da abolição”. 

Para Matheus Gato, apontar a abolição como um engodo, de forma crítica, é interessante na medida que alerta para a existência e a persistência do racismo, a despeito do fim da escravidão. Ele pondera, entretanto, que há o risco de incorrer em uma visão simplificada dos processos sociais. 

O pesquisador traça um paralelo com a Constituição de 1988, já que, embora até hoje muitos direitos previstos na Carta Magna não sejam de fato assegurados, a Constituição Cidadã não deixa de ser uma conquista da luta pela democracia.

Gato ainda cita a convocação da Coalizão Negra Por Direitos para manifestações em todo país nesta quinta-feira (13), pelo fim do racismo, do genocídio negro e das chacinas como um exemplo de ressignificação da data histórica, como um dia importante na consciência antirracista. 

A mobilização exige justiça para as vítimas na favela do Jacarezinho, no Rio de Janeiro, e de todas as operações policiais que resultaram em mortes nas favelas e comunidades do Brasil.

Ainda que 1888 e 2021 sejam momentos históricos muito diferentes, o pesquisador sublinha que, ao olhar para ambos, a retirada de direitos da população negra é um dos principais pontos em comum.

“Era isso que estava em jogo com a abolição. E é isso que está em jogo com a luta contra a violência de Estado. A pergunta é essa. A população negra tem ou não tem direitos civis? Se existe algum tipo de permanência e continuidade que tenha paralelo, embora a linguagem seja diferente e o tempo e as questões sejam outras, é que a instabilidade e a insegurança dos direitos civis dos afrobrasileiros permanece como uma dura realidade”, diz Gato, organizador do livro Treze de Maio: e outras estórias do pós-Abolição. 

A obra reúne, de forma inédita, contos de Raul Astolfo Marques, escritor e intelectual negro que viveu em São Luís do Maranhão durante a passagem do século 19 para o 20. Os textos retratam como as pessoas negras, em particular, enfrentaram as mudanças e transformações do pós-abolição, dando ênfase para importância dos movimentos sociais e da resistência as novas dinâmicas de inclusão e exclusão que surgiram desde então.

“HERÓIS INVISÍVEIS”

Na opinião de Seimour Souza, da Uneafro Brasil, a historiografia oficial tentou apagar a resistência de expoentes do movimento negro não dando visibilidade para suas trajetórias. Ainda que a história de Zumbi dos Palmares e Dandara, por exemplos, tenham se tornado mais conhecidas nas últimas décadas, muitos lutadores como Zacimba Gaba, Tereza de Benguela e Luísa Mahin, entre outros, não recebem o devido reconhecimento.

Gato, por sua vez, endossa que a compreensão coletiva do que foi a abolição enquanto processo social, de mobilização civil, também é afetada por esse apagamento que atingiu “não só randes abolicionistas negros ou brancos, como Joaquim Nabuco, mas gente comum que aceitou esconder uma pessoa escravizada, fugida. As rotas de fuga, a formação dos quilombos. Essa agência popular, de modo geral, ficou apagada nesse processo”. 

Ele afirma ainda que a mobilização dos extratos populares que lutaram pela liberdade do povo negro “mudou a estrutura de percepções no Brasil”.

“A Abolição não é só uma reforma política. Foi passar a pensar o mundo de uma forma completamente diferente do que era. Reorganizar a forma como classifica as pessoas. Mudam-se sentimentos e concepções.”

LUIZ GAMA, DO JORNALISMO AOS TRIBUNAIS

Ainda que tenham tentado contar outra história sobre o processo da abolição e apagar o passado escravocrata, de acordo com Ligia Fonseca Ferreira, escritora e professora de Letras da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), nos últimos 30 anos se fortaleceu uma corrente historiográfica, acompanhada pelo atuação do movimento negro, que juntos batalham pelo reconhecimento das figuras que fizeram a história do Brasil.

Entre os abolistas que são referências está o chamado “quarteto negro” composto por André Rebouças, José do Patrocínio, Ferreira de Menezes e o pioneiro Luiz Gama, um dos mais proeminentes pensadores e ativistas do século 19.

Ferreira é especialista na obra de Gama, considerado o maior abolicionista do país.  Nascido em 1830 na cidade de Salvador (BA), era filho de pai branco de origem portuguesa e Luiza Mahin, negra livre que participou de insurreições de escravizados.

Foi vendido como escravo aos 10 anos de idade e se alforriou apenas aos 17. Autodidata, aprendeu a ler e a escrever sozinho, e sem cursar a universidade, estudou Direito para advogar em defesa de escravos. 

Respeitadíssimo pelos demais abolicionistas e o mais velho deles, era chamado por José do Patrocínio como "nosso general". Gama advogou pela libertação de mais de 500 escravos, sem cobrar honorários, sustentando-se como jornalista.

Em setembro do ano passado, Ferreira organizou e lançou Lições de Resistência: artigos de Luiz Gama na imprensa de São Paulo e do Rio de Janeiro, livro publicado pela Edições Sesc, com objetivo de jogar luz à obra jornalística de Gama.

"Luiz Gama insere uma perspectiva negra em órgãos da imprensa de São Paulo de forma pioneira. Nos primeiros periódicos ilustrados como Diabo Coxo e Cabrião, ao lado do cartunista italiano Ângelo Agostini. E depois na imprensa abolicionista e republicana. Luiz Gama é uma presença constante nesses movimentos todos. Fazia da imprensa um lugar para expor suas ideias e mostrar para o povo brasileiro, nas palavras dele, "a maneira extravagante" como se administra a Justiça do Brasil”, comenta Ferreira.

Ela destaca que, à época, tanto o jornalismo como o Direito eram lugares de influência, de poder, onde era rara a presença de homens negros. 

Para a publicação da obra, a especialista mergulhou em arquivos físicos e digitais para realizar um levantamento desde 1864, data na qual a primeira publicação de Gama foi localizada, que vai até 1882, ano em que o intelectual publicou seu último artigo 15 dias antes de morrer.

A docente da Unifesp ressalta a importância da obra por possibilitar que os leitores “leiam Luiz Gama e não sobre Luiz Gama”, conhecendo de fato a obra original e a dimensão da trajetória do abolicionista.

“A faceta do jornalista não pode ser esquecida. Não é lembrar a memória de um abolicionista, apenas, mas lembrar a dinâmica de um homem que tinha um público, que era ouvido. Escrevia para ser lido. Ele dispensava porta-vozes.  Como costumo dizer, ele não só escrevia notícia, mas ele era notícia.”

A professora da Unifesp detalha que, também enquanto poeta, Gama marcou a literatura brasileira. Grande orador, defendia os direitos dos escravizados com a autorização de advogado provisionado, que o permitia exercer a profissão mesmo sem o bacharelado. 

Em um momento em que ainda não havia defensoria pública, Luiz Gama possibilitou, com seu trabalho, o acesso de inúmeros negros à justiça / Reprodução/Nação.

Nas matérias jornalísticas, não perdia a chance de denunciar a conivência de juízes para manutenção da propriedade escrava, dando publicidade às ideias abolicionistas com grande habilidade retórica e agudas análises político-jurídicas.

“Temos relatos e comprovação documental que Luiz Gama encarnou uma liderança, uma coisa improvável, rara, especialmente em meados do século 19, onde se acreditava na inferioridade racial e na incapacidade congênita dos negros, africanos e descendentes, de praticarem as artes e ciências. Luiz Gama então, nesse sentido, vai mostrar exatamente o contrário de tudo isso.”

A memória de Luiz Gama é celebrada pela imprensa negra do século 20 pelas associações negras e pela maçonaria, que garantiu que seu nome Gama batizasse ruas e avenidas pelo Brasil.

 ‘‘Se algum dia [...] os respeitáveis juízes do Brasil, esquecidos do respeito que devem à lei, e dos imprescindíveis deveres, que contraíram perante a moral e a nação, corrompidos pela venalidade ou pela ação deletéria do poder, abandonando a causa sacrossanta do direito, e, por uma inexplicável aberração, faltarem com a devida justiça aos infelizes que sofrem escravidão indébita, eu, por minha própria conta, sem impetrar o auxílio de pessoa alguma, e sob minha única responsabilidade, aconselharei e promoverei, não a insurreição, que é um crime, mas a ‘resistência’, que é uma virtude cívica [...]’’ 

LUIZ GAMA, CORREIO PAULISTANO, 10 DE NOVEMBRO DE 1871

O anti-monarquista aguerrido morreu em 1882, anos antes de assistir seus dois grandes sonhos, para qual tanto contribuiu, tornarem-se realidade: a abolição e a Proclama da República, em 1889.

 Mais de cem anos depois, Seimour Souza, militante do movimento negro, condena a continuidade de políticas de embranquecimento e de eugenia, a exemplo da violência policial.
"Somos submetidos historicamente a um cotidiano de violência, ao cárcere, à morte, a um verdadeiro genocídio e a perseguição de expressões religiosas de matriz africana. É a continuidade do extermínio. Uma tentativa de apagamento étnico e a despeito disso o movimento negro vem há anos denunciando essa grande farsa que é a democracia racial", finaliza o militante da Uneafro.

Brasil de Fato.

PESQUISA PRESENCIAL DO DATAFOLHA LULA SEPULTA A ‘3ª VIA’, POR FERNANDO BRITO

Há um dado que explica a diferença dos dados da pesquisa eleitoral do Datafolha, que aponta uma disparada no favoritismo, agora absoluto, do ex-presidente Lula na disputa presidencial em 2022.

Ela é presencial e não por telefone, como a maioria das que vinham sendo realizadas até agora e, portanto, não tem as distorções provocadas por este tipo de acesso ao eleitor que as feitas por via telefônica.

O resultado é acachapante e mais, até do que os números mais que expressivos: Lula vence do primeiro turno com 41% das intenções de voto contra 23% de Jair Bolsonaro e, num possível 2° turno, aplicar um implacável 55% a 32% no atual presidente.

Num resultado eleitoral real, no qual não se contam nulos ou brancos, isso quer dizer mais de 60% dos votos válidos, tanto quantos recebeu em 2002 e 2006.

O resultado da pesquisa tem, porém, mais indicadores do que o simplesmente numérico. A política vale mais.

O primeiro deles é a “murchada” que ele induz ao surgimento de uma “terceira via”.

De Amoedo a Moro, todos os demais candidatos ficam entre 2% e 7%. Isto é, não existem como “perspectiva de poder”, como costumam dizer os políticos.

Ou seja, não atraem apoios políticos de outras forças pela expectativa de estarem ou orbitarem o poder.

Será que alguém acha que os contatos de políticos de centro e centro-direita com Lula, na semana passada, são pelos olhos do ex-presidente?

Informações importantes: Lula captura, num segundo turno, a maioria dos votos dos que preferem, na primeira volta eleitoral, Ciro (6%), Dória (3%) e Luciano Huck (4%), enquanto Bolsonaro, claro, herda a grande maioria dos moristas, que seriam 7%.

O ex-presidente, segundo o Datafolha, está vencendo Bolsonaro até entre os que ele acha serem a sua maior força: ele tem 35% entre os evangélicos, ante 34% de intenção de voto pró-Bolsonaro entre os que se declaram com esta confissão religiosa.

O favoritismo absoluto de Lula não vai fazer, entretanto, que ele adote uma linha politicamente mais estreita, por duas básicas e óbvias razões.

A primeira, que ela estimularia o “salto alto”, o “já ganhou”, tantas vezes fatal.

A segunda, e mais importante, é que ele sabe que é preciso que a vitória precisa ser estrondosa, com a redução do bolsonarismo sendo tão evidente que faça recolherem-se os ímpetos golpistas e sirva como balde de gelo na febre de ódios fundamentalistas que ele conseguiu injetar na sociedade.

Ainda não é hora de fazer subir a onda Lula que, adiante, não será uma “marolinha”, mas um tsunami.

Tijolaço.

quarta-feira, 12 de maio de 2021

O AUMENTO DAS MILÍCIAS NO BRASIL EXPÕE A AUSÊNCIA DOS SERVIÇOS DO ESTADO. POR JOSÉ DIRCEU

Milicianos posam com fuzis numa das favelas da Praça Seca Foto: Reprodução.

Em 6 de maio, ao ver as cenas da chacina de 28 jovens da comunidade de Jacarezinho pela Polícia Civil do Rio de Janeiro às ordens do governador Cláudio Castro (PSC), me veio à memória nossa longa e tenebrosa história de chacinas e suas origens num Brasil remoto e bem próximo a nós. No passado tínhamos os jagunços e os pistoleiros de aluguel, que sobrevivem até hoje alugando suas mãos e armas para assassinar líderes rurais e ambientalistas, sindicalistas e políticos.

Lembro aqui 3 líderes, vítimas de pistoleiros de aluguel em pleno vigor da vida e da militância: Margarida Alves, líder dos camponeses e trabalhadores rurais da Paraíba; Chico Mendes, destacado ambientalista e defensor da Amazônia; e Marielle Franco, vereadora do PSOL (Partido Socialismo e Liberdade), assassinada pelas milícias.

Nosso Brasil escravocrata, quando ainda colônia, conviveu com as bandeiras e com os capitães do mato. Na República Velha e mesmo durante os anos da Constituição de 1946, o latifúndio impunha no campo sua lei e vontade pelas mãos de jagunços e pistoleiros de aluguel sob as vistas de uma Justiça cúmplice. Nada muito diferente dos dias de hoje, em que assassinatos de representantes dos trabalhadores rurais continuam impunes.

ESQUADRÕES DA MORTE

Também é preciso lembrar da prática da tortura como política de Estado e do assassinato de opositores no Estado Novo (1937-1945) e durante a longa Ditadura Militar (1964-1985). Nos porões da Operação Bandeirantes —financiada por empresários e organizada por policiais civis e militares das Forças Armadas, com pleno conhecimento de seus estados-maiores e dos presidentes militares de plantão—, surgiram facções criminosas que passaram a controlar o jogo do bicho e o tráfico de drogas. Essas facções muitas vezes usavam dinheiro e propriedade dos presos torturados ou assassinados para financiar suas atividades. Um exemplo dos expoentes dessa prática odiosa foi o capitão Guimarães, famoso no Rio de Janeiro e nos carnavais da Unidos de Viradouro.

Quando cheguei em São Paulo, em 1961, ainda bem jovem, era comum se ouvir sobre as práticas violentas e criminosas da polícia mineira e também sobre esquadrões da morte, grupos de extermínio que atuavam à sombra dos governos e da Justiça. O mais famoso era o comandado pelo delegado Sérgio Paranhos Fleury, de São Paulo.

Esses esquadrões, além de assassinar “suspeitos” e desovar “presuntos”, vendiam proteção para comerciantes e ficavam com os despojos e bens dos assassinados ou extorquidos. Como é sabido, esses mesmos policiais civis e militares serviram depois à ditadura e se associaram aos Doi- Codi na repressão criminosa às oposições em geral, e não só aos guerrilheiros, como provam os covardes assassinatos do deputado Rubens Paiva e do jornalista Vladimir Herzog, entre tantos outros.

HERANÇA DOS PORÕES

As práticas criminosas que pareciam ter sido enterradas no processo de redemocratização do país começaram a ressurgir pela conivência de governantes com o crime organizado e a violência policial e pela falência das políticas públicas —não só a de segurança— nas grandes cidades brasileiras. O nome no século 21 dos que foram os esquadrões da morte que extorquiam e matavam é milícia. As milícias, que se espalham pelo país, de Belém a Porto Alegre, já controlam 27,7% dos bairros do Rio de Janeiro, onde vivem 2,178 milhões de pessoas, ou seja, 33,8% da população da cidade, segundo o relatório “Expansão das Milícias no Rio de Janeiro” (íntegra – 1 MB), de janeiro deste ano, produzido pelo Grupo de Estudos dos Novos Ilegalismos (Geni/UFF) e Observatório das Metrópoles (Ippur/UFRJ).

Apresentadas por alguns governantes e muito especialmente pela família Bolsonaro como solução para combater o controle de territórios pelo tráfico organizado e trazer segurança à população, as milícias não passam de bandos de criminosos. A pretexto de vender proteção às famílias e empresas, essas organizações, compostas geralmente por ex-policiais militares, controlam a economia das comunidades onde atuam e a vida de seus moradores. Vendem, ilegalmente, serviços como os de energia, gás, TV. Também atuam no mercado imobiliário, no de transporte, vendem produtos roubados e até controlam alguns órgãos públicos. E se impõem pelo terror, por ameaças e pela chantagem, quando não pelo assassinato de “inimigos” na disputa de territórios com o tráfico de drogas.

O avanço das milícias é proporcional à ausência do Estado nesses territórios, onde fracassou mais do que a política de segurança. Nesses locais também faltam educação, saúde, atividades culturais, saneamento, transporte público e emprego para os jovens. Carências crônicas, fruto da desigualdade social e da concentração de renda, o problema mais agudo do país que emerge em toda sua dimensão nas periferias das grandes cidades brasileiras e nas comunidades.

A pretexto de combater o tráfico, as milícias vão expulsando, no caso do Rio de Janeiro, os grupos de traficantes do Comando Vermelho, Amigos dos Amigos, Terceiro Comando Puro para assumir seu lugar. Hoje, já respondem por 58,6% dos territórios sob controle do crime organizado, de acordo com o relatório já citado. Da Barra da Tijuca a Jacarepaguá temos um arco dominado pelas milícias, inclusive em bairro de classe média, revelando uma coincidência entre a votação de Bolsonaro e seus candidatos e esse território. Essa falência do Estado foi, em parte, camuflada pela atuação das UPPs (Unidades de Polícia Pacificadora), que fracassaram, em grande medida, pela corrupção, cooptação e colaboração de amplos setores da Polícia Militar com o crime organizado.

Do controle de territórios as milícias passaram ao controle político de eleitorados, com a eleição de vereadores e deputados ligados a elas, o que também se verifica em menor grau com o tráfico. Foi um salto rápido. Hoje temos representantes das milícias não só nos legislativos, mas em governos e nas máquinas públicas, como decorrência da corrupção e do cooptação de funcionários públicos. Políticas de segurança, nomeações e promoções, legislação urbana, de transporte, são hoje, em muitas câmaras municipais e assembleias legislativas, determinadas pelas milícias.

A bárbara e covarde chacina de Jacarezinho é mais um capítulo da falência da segurança pública, que infelizmente não conseguiu ser detida nem pelas UPPs, nem pelas operações de GLO (Garantia da Lei e da Ordem). A pura e simples eliminação, assassinato, execução, como nos tempos dos esquadrões da morte de triste histórico no Rio de Janeiro —as tragédias de Vigário Geral, Alemão e Calendária não nos deixam esquecer— é a opção pela guerra como solução.

Como revelam fotos e vídeos da chacina e depoimentos de moradores, 28 jovens, 13 dos quais sequer eram investigados, foram assassinados a sangue frio, executados, quando se entregavam ou quando encontrados em casas onde se esconderam. Tudo isso na frente de famílias e crianças. E levanta-se suspeita sobre a morte do policial civil André Frias, pois foi baleado quando descia de um veículo policial e não em confronto.

Estamos falando de um ato de barbárie pela mão do Estado por meio de sua Polícia Civil. E não se trata de um caso isolado. Infelizmente, trata-se de um padrão, de uma política planejada que substitui a prevenção, a inteligência, a presença do Estado com políticas públicas para as favelas e bairros, e para os jovens pela guerra e extermínio de grupos e organizações criminosas. Uma guerra sem nenhum efeito prático na diminuição do tráfico ou do aliciamento de menores, razão apresentada para a operação.

DEBATE NACIONAL

A opção do povo não pode ser escolher entre o tráfico e as milícias. E o país não pode aceitar a pena de morte para suspeitos. Suspeitos que o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, chamou de “bandidos” e o delegado Felipe Curi, do Departamento Geral de Polícia Especializada do Rio de Janeiro, considera criminosos como se condenados fossem, sem o devido processo legal, substituindo a Justiça e instituindo, na prática, a pena de morte, proibida pela Constituição Federal.

Gravíssimo é o fato de a operação da Polícia Civil em Jacarezinho ter sido feita à revelia da decisão do STF (Supremo Tribunal Federal), de junho de 2020, que proibiu operações em favelas do Rio durante a pandemia. E mais grave ainda o que disse o presidente Jair Bolsonaro ao dar parabéns, no Twitter, à Polícia do Rio de Janeiro pela operação: “Ao tratar como vítimas traficantes que roubam, matam e destroem famílias, a mídia e a esquerda os igualam ao cidadão comum, honesto, que respeita a lei e o próximo. É uma grave ofensa ao povo que há muito é refém da criminalidade”.

A letalidade trágica da política de segurança no Rio de Janeiro e em todo país, expressa no altíssimo número de mortos (944, incluindo policiais, desde a decisão do STF) exige uma imediata e radical mudança em toda a estrutura policial e na política de segurança pública. As medidas precisam passar, também, pela reforma do sistema penitenciário, pela mudança na legislação sobre drogas que trata o usuário como traficante e pela revogação de toda legislação, via decretos de Bolsonaro, de liberalização de armas promovida à revelia do Estatuto do Desarmamento e das decisões judiciais.

A repercussão da chacina de Jacarezinho, em nível nacional e internacional, e o repúdio a ela exigem uma resposta do Congresso Nacional: propor e debater uma nova política de segurança pública sob pena de regredirmos à época dos esquadrões da morte e grupos de extermínio agora diretamente pelas mãos do Estado e de suas polícias. Exigem também uma resposta do STF, que teve sua decisão desrespeitada. Não se pode permitir a impunidade dos policiais e superiores responsáveis pela criminosa operação.

É uma urgência nacional que a questão das milícias, do crime organizado, do tráfico e das drogas seja prioridade nos debates da próxima campanha presidencial.

DCM.

MINISTRO EDSON FACHIN FORÇA A BARRA COM DELAÇÃO DE SÉRGIO CABRAL E EXPÕE STF, POR FERNANDO BRITO

A notícia de que a Polícia Federal pediu ao Supremo Tribunal Federal a abertura de inquérito para investigar um suposto recebimento de R$ 4 milhões pelo Ministro Dias Tóffoli para “resolver o problema” de dois prefeitos fluminenses quando era presidente do Tribunal Superior Eleitoral, tem o efeito de um explosivo nos intestinos da Corte.

É que a denúncia integra a delação premiada do ex-governador Sérgio Cabral que, condenado a três séculos de prisão, atira para todo e qualquer lado em busca de “descontar” algumas décadas de suas infindáveis penas. Tanto é assim que o Ministério Público Federal rebarbou seu pedido de colaboração e, tal como aconteceu com Antônio Palocci, foi a Polícia Federal quem recolheu a xepa acusatória e levou ao Ministro Luiz Edson Fachin que, como se sabe, a homologou, como homologa qualquer acusação que sirva ao lavajatismo.

No lote de acusações feitas com Cabral, claro, há trechos que buscam atingir o filho de Lula, Fábio Luís Lula da Silva.

Em setembro do ano passado, no final de sua presidência no STF, Dias Tóffoli atendeu a pedido da Procuradoria Geral da República para que os inquéritos oriundos da delação de Cabral fossem arquivados, por falta de provas. É quase certo que o que o visava não estava entre eles, porque seria inevitável que o ministro e desse por impedido desta decisão.

Agora Fachin acolhe este novo pedido e o envia à Procuradoria Geral da República, para opinar. Será, provavelmente, contrário e voltará para o arquivo morto.

Mas dá para imaginar o “climão” dentro do Tribunal com o levantamento de suspeitas genéricas contra um de seus integrantes.

Sugere-se que, com ou sem Covid, Fachin entre em quarentena. Pois não há dúvidas de que ficará isolado, e por bem mais de 14 dias.

Tijolaço.

terça-feira, 11 de maio de 2021

LULA TEM RAZÃO AO PROCURAR ALIANÇAS AO CENTRO SIM. POR FERNANDO BRITO

Ainda que a resposta seja quase óbvia, diante do quadro de terror que o país atravessa, creio que é preciso assumir sem medo de patrulhas que sim, não apenas tem razão como é seu dever inescapável superar o quanto puder as rejeições movidas pelo preconceito e pela imensa campanha de demonização midiática que ele sofreu e que é o único empecilho que há hoje para afirmar que ele terá uma estrondosa vitória nas eleições de 2022.

As supostas condenações de Lula, agora anuladas na Justiça, permanecem ainda em parte da classe média que simplifica no maniqueísmo de “bem e mal” a vida, e que se deixa contaminar por vestais, como o juiz e os promotores de Curitiba, ainda funcionam como freios à obviedade de que se compara um presidente desastroso e desumano àquele que que mais obteve apoio da população e que a fez progredir econômica e socialmente, embora com muitas falhas – e quem não as têm, exceto os cínicos?

É o espaço onde, claramente, procura crescer Ciro Gomes, à espera de que um posicionamento razoável nas pesquisas atraia-lhe o apoio da direita órfã de Bolsonaro – mas que guarda a herança do antipetismo – e dos sobreviventes do empresariado não-financeiro do país.

O potencial de votos nem-nem (nem Bolsonaro, nem Lula) é limitado, porém, pela atuação do próprio presidente, que assume a cada dia discurso e atos cada vez mais radicais, garantindo para si o posto exclusivo de “anti-Lula”. E, por consequência, garantindo a Lula o lugar de “anti-Bolsonaro”, sem precisar, para isso, radicalizar seu discurso. Com isso, assume a condição de proponente de uma grande “reconciliação nacional” de um país para lá de dividido e cansado dos ódios políticos, sociais, religiosos e econômicos.

Paradoxalmente, o fato de Bolsonaro conservar perto de um terço das intenções e votos ajuda Lula, porque o firma como única alternativa ao ex-capitão e o leva à condição de destinatário dos votos dos quase 60% que o rejeitam. É só olhar o salto de quase 20% das intenções de voto que tem o ex-presidente nas simulações de 2° turno, o triplo ou mais do que o atual presidente obtém no voto que é “sim ou não”.

A outra constatação é a de que um eventual novo governo Lula não será um governo de aprofundamento, mas de restauração de mecanismos sociais e econômicos de justiça e desenvolvimento em meio a uma situação de estagnação da atividade produtiva e de elevação de inflação e de juros. De alguma forma, algo semelhante ao que o ex-presidente enfrentou no seu primeiro mandato, ao qual respondeu com o famoso “Lulinha Paz e Amor”.

Não há outro caminho para um novo governo senão o de atirar-se no ciclo emprego-renda-consumo.

Para isso, é preciso governabilidade político-parlamentar que vai além de uma frente de esquerda, mas que precisa de uma sustentação mais ampla, ainda que nucleada pela esquerda.

Está longe de ser uma escolha – muito menos apenas uma escolha eleitoral – para Lula a necessidade de ampliar seu leque de alianças.

Vencer as eleições e viabilizar um governo de reerguimento e recivilização do país é um dever.

Tijolaço.

PERGUNTA QUE NÃO QUER CALAR, A ANVISA VAI ASSUMIR QUE CLOROQUINA É ‘RECEITA IDEOLÓGICA’? POR FERNANDO BRITO

Notas nos jornais adiantam que o presidente da Anvisa, vice-almirante Antônio Barra Torres, dirá hoje que é a médica Nise Yamaguchi a autora ou inspiradora da minuta de decreto que incluía na bula da hidroxicloroquina a indicação de seu uso para Covid-19.

A médica, figurinha fácil no Palácio do Planalto não é, porém, a origem desta história.

Ela trabalha sob a inspiração de Vladimir Zelenko, ucraniano radicado nos Estados Unidos e que promove e é promovido por grupos de ultradireita daquele pais. Zelenko era, até tornar-se celebridade, médico de família de uma comunidade judaica ortodoxa, chamada Kiryas Joel, que fica a uma hora da cidade de Nova York.

Zelenko foi “entrevistado” por Rudolph Giuliani, advogado de Donald Trump que viria a ser, recentemente, protagonista das tentativas de anulação das eleições. Em dois dias, ainda que indiretamente, Zelenko passou a ser o grande estrategista das orientações da Casa Branca em “terapêutica” da Covid, embora o chefe da Comissão de Controle de Doenças Infecciosas dos EUA e um dos mais renomados infectologistas do mundo, Anthony Fauci, chamasse as supostas “evidências” apresentadas por ele de “anedóticas”.

O suposto tratamento de Zelenko não chegou ao governo brasileiro por Yamaguchi, mas por Donald Trump, que , aliás, contraiu a doença depois de dizer que tomava cloroquina preventivamente e mas não a usou durante sua internação.

Ela e outros apenas agregaram-se e deram “cara” a uma “receita” que chegou através dos grupos de conexão com a extrema-direita norte-americana comandado pelos filhos de Bolsonaro e outros “olavistas”.

Barra Torres sabe disso e será bom que os senadores lhe perguntem qual foi o fato que o afastou da condição de seguidor incondicional ao presidente da República, ao qual acompanhava fielmente há anos, chegando a participar, em março do ano passado, de uma aglomeração promovida por ele às portas do Palácio do Planalto (na foto, ainda sem barba, aqui). Foi a Covid, que contraiu dois meses depois ou a decepção de não ter ocupado a vaga de Luiz Henrique Mandetta no Ministério, para a qual chegou a ser um dos favoritos.

Este é o caminho correto para a CPI hoje, não a discussão sobre a eficácia e segurança da Sputnik V, sobre a qual não há capacidade técnica para discutir-se ali.

A CPI é política e é na política que se tem o caminho de revelação da verdade.

Tijolaço.

segunda-feira, 10 de maio de 2021

A DIPLOMACIA BRASILEIRA NÃO FOI PELA VACINA, ATUOU FORTEMENTE PELA CLOROQUINA, POR FERNANDO BRITO

A detalhada reportagem de Patrícia Campos Melo na Folha é, na pratica, um roteiro para a inquirição do ex-chanceler Ernesto Araújo. descrevendo a intensa atividade diplomática para obter cloroquina e a rala e tardia ação quando o assunto era a obtenção de vacinas. Não apenas por revelar documentos e comunicações oficiais do governo brasileiro como, nelas, ficar caracterizada a orientação direta de Jair Bolsonaro nos apelos para comprar quantidades cavalares do fármaco, quando já havia consenso sobre sua inutilidade – e até riscos – de sua utilização.

Há, nas comunicações do Itamaraty, absoluta confirmação de que o presidente da República, já na gestão de Nélson Teich no Ministério da Saúde, estava empenhando órgão públicos – Fundação para o Remédio Popular, Fiocruz, Laboratório Químico-Farmacêutico da Aeronáutica e Laboratório do Exército – para produzirem a droga além de pressionar para conseguir insumos para laboratórios privados fazerem a festa vendendo o suposto “remédio” para o vírus: nomeadamente a EMS, a Eurofarma, a Biolab e a Apsen.

Se o conteúdo dos documentos, transcritos em parte pelo jornal confirma a impressão dominante de “opção cloroquina” adotada pelo Governo brasileiro no suposto combate à pandemia, isso empurrará o ex-chanceler a ampliar e radicalizar seu negacionismo e, na linha de Jair Bolsonaro, reafirmar o charlatanismo de sua ação como um ato de coragem e de enfrentamento ao que acham ser uma “conspiração globalista”: a pandemia e sua vacina.

Sabe-se que a posição de Bolsonaro é inteiramente traduzida por Araújo, inclusive no relacionamento com a China, sempre importante e, agora, absolutamente vital na obtenção de vacinas e de seus insumos. Fora do cargo e interessado – como revela também o jornal, em sabotar a ação de seu sucessor no Itamaraty, pode-se prever a tentação que terá Araújo de apresentar-se como arauto do profeta do negacionismo.

Ao contrário de Eduardo Pazuello, desesperado por esconder-se, o ex-chanceler tem a vocação exibicionista e olhe lá se não nutre, também, pretensões eleitorais que o coloquem a firmar-se como herói do fundamentalismo.

Tijolaço.

domingo, 9 de maio de 2021

O MODUS OPERANDI DO “TRATORÃO” DO JAIR, POR FERNANDO BRITO

A mídia é pródiga em aplicar logo um “ão” para definir o que crê serem escândalos de corrupção governamental.

Vamos ver se, com a manchete de hoje do Estadão, dando conta de uma verba camuflada no Orçamento, de R$ 3 bilhões, que está sendo distribuída pelo governo Bolsonaro a deputados e senadores segundo o critério de premiar o “governismo” dos parlamentares e usada na compra superfaturada de tratores e outras máquinas, criará o termo “Tratorão” para definir o método corrupto de obter maioria no Congresso.

“Só ganha quem apoia o Planalto”, escreve o jornal para definir como são distribuídos os recursos milionários das chamadas “emendas do relator”, que são partilhadas entre os aliados fiéis e viram peças de campanha eleitoral dos parlamentares dóceis a Bolsonaro.

O agravante do manejo sem controle de dinheiro público aparece num conjunto de 101 ofícios enviados por deputados e senadores ao Ministério do Desenvolvimento Regional e órgãos vinculados para indicar como eles preferiam usar os recursos.

O detalhe é que, oficialmente, o próprio Bolsonaro vetou a tentativa do Congresso de impor o destino de um novo tipo de emenda (chamada RP9), criado no seu governo, por “contrariar o interesse público” e estimular o “personalismo”. Foi exatamente isso o que ele passou a ignorar após seu casamento com o Centrão.
Os ofícios, obtidos pelo Estadão ao longo dos últimos três meses, mostram que esse esquema também atropela leis orçamentárias, pois são os ministros que deveriam definir onde aplicar os recursos. Mais do que isso, dificulta o controle do Tribunal de Contas da União (TCU) e da sociedade. Os acordos para direcionar o dinheiro não são públicos, e a distribuição dos valores não é equânime entre os congressistas, atendendo a critérios eleitorais. Só ganha quem apoia o governo.

 Parte das indicações de parlamentares vai para compra de tratores com preços até 259% acima dos valores de referência.

A utilização favorecida do dinheiro é escandalosamente flagrante e sua destinação a lugares milhares de quilômetro de suas bases eleitorais aumenta a suspeita de que os valores possam gerar “contrapartidas” pessoais aos parlamentares:

O senador Davi Alcolumbre (DEM-AP), por exemplo, determinou a aplicação de R$ 277 milhões de verbas públicas só do Ministério do Desenvolvimento Regional, assumindo a função do ministro Rogério Marinho. Ele precisaria de 34 anos no Senado para conseguir indicar esse montante por meio da tradicional emenda parlamentar individual, que garante a cada congressista direcionar livremente R$ 8 milhões ao ano.
Ex-presidente do Senado, Alcolumbre destinou R$ 81 milhões apenas à Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), a estatal que controla, ao lado de outros políticos. (…)

Há situações até em que parlamentares enviaram milhões para compra de máquinas agrícolas para uma cidade a cerca de dois mil quilômetros de seus redutos eleitorais. É o caso dos deputados do Solidariedade Ottaci Nascimento (RR) e Bosco Saraiva (AM). Eles direcionaram R$ 4 milhões para Padre Bernardo (GO). Se a tabela do governo fosse considerada, a compra sairia por R$ 2,8 milhões.
Planilha secreta do governo obtida pelo Estadão revela que Alcolumbre também destinou R$ 10 milhões para obras e compras fora do seu Estado. Dois tratores vão para cidades no Paraná, a 2,6 mil quilômetros do Amapá. Sem questionar, o governo concordou em comprar as máquinas por R$ 500 mil, quando pelo preço de referência sairiam por R$ 200 mil.

Jair Bolsonaro adora desafiar a apontarem “um só ato de corrupção em seu governo”. Está aí um, o “tratorão” de R$ 3 bi, destes para ninguém “botar defeito”.

Tijolaço.

A VIDA DAS MÃES APÓS UM ANO DE PANDEMIA ENFRENTANDO SOBRECARGA DOMÉSTICA, DESEMPREGO E INSEGURANÇA

Um estudo da UFMS mostrou que quase 84% das mães sentiram maior sobrecarga em cuidar dos filhos durante a pandemia - Foto: Antonio Cruz/Agência Brasil.

Cuidar dos filhos, das tarefas domésticas, enfrentar o desemprego e um futuro incerto. Essa tem sido a vida de muitas mulheres brasileiras que neste domingo (9) irão comemorar o segundo Dia Das Mães em meio à maior crise sanitária do país.

No ano passado, em razão da data, o Brasil de Fato entrevistou algumas mães para entender quais foram os primeiros impactos sentidos após a chegada do vírus. Doze meses depois, estas mesmas mulheres declaram que a situação socioeconômica está ainda pior. 

Uma realidade confirmada por dados que abrangem o gênero feminino como um todo. Segundo a Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (Pnad Contínua), calculada pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o coronavírus deixou mais da metade das brasileiras fora do mercado de trabalho, cerca de 8,5 milhões de pessoas.

A babá Bruna Mendonça, de 31 anos, entrou para essa estatística, mas, preocupada com as condições de sobrevivência de sua mãe e da filha de 5 anos, adaptou-se a uma nova e difícil rotina.

Quando conversou com a reportagem há um ano, ela já havia se mudado do Grajaú, onde vivia com sua família na periferia da zona sul de São Paulo, para morar com o namorado próximo a Raposo Tavares. 

A ideia era ficar mais próxima da casa dos patrões, no Morumbi, para que eles arcassem com o custo de corridas por aplicativos e garantissem um deslocamento com menor risco de contaminação pela covid-19. 

Mãe solo, deixou a pequena aos cuidados da avó com a mudança compulsória. Para sua surpresa, com o aprofundamento da crise econômica, teve sua rotina estremecida novamente.

“Eu fiquei desempregada bem na pandemia, porque tiveram problemas financeiros e me mandaram embora. Minha vida mudou de ponta cabeça. Percebi que na minha área estavam procurando pessoas que podiam dormir no serviço”, conta Bruna. 

“Trabalhei mais dois meses na casa de uma família que precisou, na emergência, e agora trabalho em Santana. Estou trabalhando de segunda a sexta, dormindo no serviço e vou para casa no fim de semana. Cuido de três crianças”, diz a mãe, que sente alívio por estar empregada, mas que enfrenta a saudade de segunda a sexta.

“O difícil mesmo é ficar longe da minha filha, só que eu já ficava. Eu preciso para manter ela. O ex-marido só ajuda quando quer. Para conseguir cuidar dela, me adaptei de novo. Estou pensando no futuro. Com essa epidemia, não sei como vai ser o dia de amanhã”, desabafa a babá. 

Bruna Mendonça Carvalho, de 30 anos, e a filha de 4 anos durante os encontros aos finais de semana / Arquivo Pessoal.

Quando chega o fim de semana, Bruna volta para o Grajaú, e, como diz, “sente o baque” tentando dar conta de todas as demandas - desde as compras no mercado ao ajudar no esforço escolar da filha, que está em fase de alfabetização e tenta superar o prejuízo das aulas presenciais suspensas.

A mãe de Bruna, Beatriz Mendonça, também lidou com todas as dificuldades da maternidade solo. Hoje, as duas se apoiam para conseguir superar os impactos da pandemia.

Ela é costureira e autônoma, sem renda fixa. Estava recebendo o auxílio emergencial ao longo do ano passado e produzindo máscaras de tecido para venda. Agora, é afetada pela queda brusca no valor do benefício e diminuição da demanda por máscaras. 

Ano passado ela recebia o valor de R$ 600, mas atualmente recebe apenas R$ 150.

“[O novo auxílio emergencial] É uma ajuda de custo que não supre nem o preço de uma cesta básica. É muito fácil chegar na televisão e falar que o auxílio não é aposentadoria. Todos nós sabemos disso, mas a pandemia não é culpa nossa”, diz, citando declaração do presidente Jair Bolsonaro em janeiro deste ano, quando negou a volta do auxílio.

“A pandemia está nesse ponto por culpa deles. De um ano para cá, as coisas só pioraram, nada melhorou. Continuamos pagando aluguel, água e luz cada vez mais cara. Esse presidente não faz nada pra ajudar, deveria baixar ao menos a alimentação, não cobrar tanto imposto. E a conta de luz aumentando... As coisas estão cada vez mais difíceis”, lamenta.

Bruna, sua mãe Beatriz e a pequena Brenda / Foto: Arquivo Pessoal.

TRABALHO NÃO REMUNERADO

Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) do ano passado, mulheres dedicam em média 18,5 horas semanais aos afazeres domésticos e cuidados de pessoas, na comparação com 10,3 horas semanais gastas nessas atividades pelos homens. 

Se as mulheres já dedicavam mais tempo às tarefas de cuidados do que os homens antes mesmo da pandemia, a mudança da dinâmica dos lares aprofundou as condições de desigualdade, como mostra o estudo Sem Parar - o trabalho e a vida das mulheres na pandemia, da Sempreviva Organização Feminista (SOF), publicado no ano passado.

O coletivo aponta que 50% das brasileiras passaram a cuidar de alguém na pandemia e 72% afirmaram que a necessidade de monitoramento e companhia aumentou. A pesquisa também evidenciou o racismo estrutural no país: 58% das mulheres desempregadas são negras.

De acordo com a SOF, “a organização do cuidado ancorada principalmente na exploração do trabalho de mulheres negras e no trabalho não remunerado das mulheres é um fracasso retumbante para a busca de redução das desigualdades antes e durante a pandemia do coronavírus.”

O estudo constatou ainda que cerca de 40% das mulheres afirmaram que a pandemia e a situação de isolamento social colocaram a sustentação da casa em risco.

Esse é o relato mais comumente ouvido por Miriam Hermógenes dos Santos, de 48 anos, que trabalha como secretária na Central de Movimentos Populares (CMP). Há um ano, quando conversava com a reportagem, a situação das famílias que recebiam doações do movimento já era delicada.

Um ano depois, ela conta que parcela considerável das famílias assistidas e sem renda foram despejadas. A queda no valor do auxílio emergencial e a manutenção do desemprego em alta acentuam ainda mais a vulnerabilidade dessas pessoas.

“É a mulher que sofre maior impacto. Só ver nos metrôs e nos trens, muitas mulheres com crianças pedindo ajuda… São as mulheres que têm que garantir o leite e o pão pros filhos”, afirma Miriam. 

Trabalhando e se entregando à militância, o dia a dia de Miriam está mais atribulado do que nunca. Além das tarefas do trabalho, ela lida com a preocupação constante com seus 4 filhos e 3 netos, e outros parentes. 

“Estamos nos desdobrando. A situação econômica e social do país se agravou demais. São muitas pessoas desempregadas na minha família, estamos tendo que nos juntar para ajudar os sobrinhos, que tiveram que ser acomodados na casa da minha mãe depois de perder emprego”, diz. 

Atualmente, vive somente com sua filha de 16 anos, a quem tenta ajudar, sem sucesso, a conseguir o primeiro emprego. Segundo ela, seus filhos mais velhos não tiveram tanta dificuldade para ingressar no mercado de trabalho como a encontrada hoje. 

Com unhas e dentes, Miriam enfrenta um cotidiano exaustivo misturando trabalho, militância, afazeres domésticos e a maternidade. Ainda que seus filhos sejam adultos, o  coração aperta diante do risco de contaminação pela covid-19.

Ano passado, a preocupação com seu filho que mora nos Estados Unidos a visitou todos os dias. “Graças a Deus ele já tomou as duas doses da vacina e continua trabalhando lá. Falava pra ele se cuidar, ele trabalha com fast food lá. Os daqui, tadinho, vão demorar para ser vacinados. Nem sei nem se eu consigo tomar”, critica.

Miriam e seus 4 filhos / Foto: Arquivo Pessoal.

NO LIMITE

Todo esse contexto de pressão acende um sinal vermelho para a saúde mental das trabalhadoras, e, novamente, das mães. Um estudo da Universidade Federal do Mato Grosso do Sul (UFMS) mostrou que quase 84% delas sentiram maior sobrecarga em cuidar dos filhos durante a pandemia. 

Dentre as 822 mulheres entrevistadas, das quatro regiões do país, 25% apresentaram sintomas depressivos; 26,7% apresentaram sintomas de ansiedade; 22% de estresse e 39% apresentaram estresse pós-traumático.

HOME OFFICE

A sobrecarga não é apenas relacionada aos trabalhos domésticos ou para as mulheres que não tiveram a opção de cumprir o isolamento social. Mesmo aquelas que entraram em regime de teletrabalho também sofrem o ônus com a sobreposição de papéis sociais.

Bárbara Castro, pesquisadora da sociologia do trabalho e docente da Unicamp, comenta que boas condições para trabalhar não perpassam somente pela garantia de infraestrutura mas pelas condições de existir um ambiente propício para o trabalho, sem interrupções. Algo que é ainda mais difícil para o gênero feminino. Principalmente para as mães. 

"As mulheres, quando estão em casa, articulam trabalho e família o tempo inteiro, sobrepostos. A grande maioria delas não tem um espaço reservado e mesmo quando tem, as que possuem família, relatam terem suas rotinas interrompidas o tempo inteiro pelas demandas familiares, existe uma sobreposição", explica Castro.

Ela afirma que durante as pesquisas que tem realizado é comum que a maioria dos homens tenham um escritório ou outro espaço reservado, e que o relato de interrupções são menores ou inexistentes para eles. Exatamente por isso, os homens afirmam ser mais produtivos trabalhando em casa enquanto as mulheres sentem que rendem menos.

Sob condição de maior estresse em razão do acúmulo de tarefas de cuidado, seja da casa ou dos filhos, as mulheres realizam jornadas mais pesadas no trabalho remoto e no presencial.

De acordo com a pesquisa da SOF, 41% das mulheres que seguiram trabalhando durante a pandemia com manutenção de salários afirmaram trabalhar mais na quarentena.

Brasil de Fato.

sábado, 8 de maio de 2021

PARA PERMANECER NA ESPLANADA DE BOLSONARO DEVE SER USUÁRIO DE CLOROQUINA, POR FERNADO BRITO

Jair Bolsonaro não para de se superar nos “micos” a que submete o país.

Agora anuncia que a gente vai fazer um vídeo na semana, os 22 ministros, todos aqueles que tomaram hidroxicloroquina vão falar ‘eu tomei’.

Que espetáculo!

Vamos colocar os 22 (sic) ministros do Governo na frente do altar do Youtube, recitando: “em louvor ao Messias Bolsonaro, proclamo que tomei cloroquina, em nome do pai, do filho 01, 02, 03 e 04”.

Não é o Credo, é o cruz-credo.

Quem não gravar a confissão perde o lugar na Esplanada dos Ministérios, por não passar no “teste da farinha de cloroquina”?

Será que o Marcelo Queiroga vai gravar?

E o general Braga Neto?

Será que ele vai, também, convocar os comandantes do Exército, Marinha e Aeronáutica para se submeterem a esta “profissão de fé” na cloroquina?

Será que já alcançamos o limite do ridículo ou Bolsonaro conseguirá imaginar alguma situação mais humilhante para seus servos fiéis?

Que vergonha, um bando de marmanjos, diversos deles generais ou altos oficiais das Forças Armadas se submetendo a isso, a ajoelhar a dignidade no milho da humilhação para agradar ao Jim Jones tropical.

Tijolaço.