sexta-feira, 20 de agosto de 2021

AGORA SE PERCEBE O DESASTRE QUE BOLSONARO FEZ COM A IMAGEM DOS MILITARES, NÃO POR FATA DE AVISO, POR FERNANDO BRITO

Os oficiais generais das Forças Armadas brasileiras, em lugar de deixarem que se produzam patéticas operações de intimidação, como aquela dos tanques fumacentos da semana retrasada, deveriam olhar a pesquisa que hoje publica o site Poder360 sobre o que está acontecendo com a imagem dos militares brasileiros.

Pela primeira vez no pós-64, que eu me lembre, nunca foi tão rejeitada a sua participação no governo, depois de 30 anos de reconstrução do prestígio das Forças.

Mais da metade dos brasileiros acham que sua presença no governo e na política é ruim para o país e disparou a quantidade de pessoas que consideram “ruim” ou “péssimo” o desempenho das próprias Forças Armadas como instituição. E ainda pior entre os mais jovens, onde a participação dos militares no governo é repelida por 62%.

É óbvia a ligação entre esta piora veloz da imagem militar está diretamente ligada a cada vez maior identidade do comando militar a Bolsonaro e suas falanges.

Generais que conduzem seus exércitos para a desmoralização os conduzem para a derrota e o enfraquecimento.

Tijolaço.

quinta-feira, 19 de agosto de 2021

JUROS E INFLAÇÃO, AQUI E LÁ FORA, ATRAPALHAM PLANO DO “JAIR NOEL”, POR FERNANDO BRITO

O Estadão abre a manchete do seu site para o alerta do mercado financeiro ao presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, de que o cenário econômico está se deteriorando muito rapidamente.

E é só olhar os indicadores para ver que isso está, mesmo, acontecendo.

Dólar fechando a R$ 5,37 – R$ 5,38 na liquidação dos negócios pós-market -. Bolsa amargando queda de 4,23% no mês, índices de preço mantendo os tristes patamares de julho, quando a inflação chegou a 1%, a maior taxa para o mês em 20 anos e voltando a ter como “puxa fila” a inflação dos alimentos.

Lá fora, o cenário não é de flores. A ata do Federal Reserve divulgada hoje assinala a retirada dos estímulos monetários nos EUA e a preocupação também alta por lá – o dobro da estimada no início do ano – podem ser o início de uma alta de juros por lá.

A China, nosso maior comprador, também sinaliza uma desaceleração e o preço do minério de ferro caiu ao menor nível em seis meses.

Tudo completa-se com o front político nacional: cresce a certeza de que, para implementar seu programa de “bondades” eleitorais, Bolsonaro não vai demorar a “chutar a santa” do teto de gastos, a nova divindade que substitui o velho “tripé macroeconômico” dos liberais do inicio deste pequeno século.

Na reportagem, registra-se que os emissários do dinheiro disseram a Campos Neto que esperam mais juros como resposta: já se fala numa taxa Selic de até 8,5%.

Temos um governo desacreditado, em confronto com o Judiciário, com um ministro da Economia absolutamente patético e, agora, também com dificuldades na Câmara, que parecia estar “controlada”.

Jair Bolsonaro diz que com “fé e crença” se superarão os problemas econômicos:

O povo tem sofrido com isso: tem inflação, tem desemprego. Tem dias, realmente, angustiantes. O que posso dizer aos senhores? Com fé, com vontade, com crença, nós podemos superar esses obstáculos”

Os caras do dinheiro, aqueles que entrariam no céu depois de um camelo passar pelo buraco de uma agulha, vão acreditar, sim…

É capaz de sugerirem Silas Malafaia para o Banco Central.

Tijolaço.

quarta-feira, 18 de agosto de 2021

QUANTO TEMPO DURA A ‘CALMA’ ANIMAL DE BOLSONARO? POR FERNANDO BRITO

O que se disse ontem aqui sobre Jair Bolsonaro ter entrado em modo stand by em seu golpismo furioso foi percebido por muitos, mais bem informados por fontes em Brasília.

Ricardo Noblat diz que os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira e Rodrigo Pacheco, e o recém-ministro da Casa Civil, Ciro Nogueira teriam dito ao presidente, na últimas horas, “que sua situação está ficando cada vez mais difícil dentro e fora do Congresso”.

E ontem, ao adiar-se novamente a votação das mudanças tributárias na Câmara, viu-se que nem com o boideiro-presidente e com medidas simpáticas como o aumento da isenção do Imposto de Renda, a coisa não está fácil no mais sólido reduto bolsonarista.

Ao contrário do que se esperava, o último mês de rugidos presidenciais pode ter gerado mais agitação em suas falanges, mas não lhe agregou um pingo de recuperação do apoio, ao contrário.

Gilberto Kassab, no Poder360 exagera ao dizer que “se [Bolsonaro] continuar assim, não disputa nem a (re)eleição”.

Bolsonaro, certamente, tenta fazer ajustes táticos, mas não estratégicos, porque, como descreve hoje em O Globo o jornalista Bernardo Mello Franco, ele “se alimenta do confronto permanente”.

Precisa fabricar crises para agitar a militância e manter a fantasia de outsider. Apesar da aliança com o Centrão, parte do eleitorado ainda acredita que o presidente luta contra o sistema. Ele depende dessa ilusão para se manter no páreo.

Ilusões, Bolsonaro planta muitas – o país está para cair sob o domínio de uma ditadura sinoateia, drogada e abortista que vai incendiar as plantações de soja.

Mas não tem políticas para a realidade de estagnação (traduzida por Paulo Guedes como “recuperação em V”) e por uma inflação que é muito mais sentida no bolso que nos índices oficiais.

Portanto, não é uma questão de crer que os arroubos golpistas não minguar e desaparecer, É apenas uma questão de quando e como reaparecerão.

Se querem um palpite, será logo e mais fortes.

Tijolaço.

terça-feira, 17 de agosto de 2021

A BOIADA DOS IMPOSTOS DEVE PASSAR. MAS PARA ONDE? PARA O LADO MAIS FRACO? POR FERNANDO BRITO

Arthur Lira tentará – com grandes chances de conseguir – abrir mais uma porteira para sua boiada, com a votação de um arremedo de reforma tributária que, em troca de uma pequena bondade – o reajuste de quase nada na tabela o Imposto de Renda, transformar os impostos brasileiros numa “salada” completamente imprudente, da qual não se tem a menor ideia do que sairá, emendada e remendada para que possa superar as resistências que lhe vem de toda parte.

Lira esmerou-se no arranjo: colocou um relator bolsonarista à testa do projeto, bloqueou a discussão do tema pela sociedade e acelerou uma aprovação a toque de caixa com o argumento insólito de que “tem de votar na terça-feira”, como se votar uma mudança – que só passa, em parte, a valer em janeiro (e depois disso, para a aplicação de outras alíquotas) – hoje, amanhã ou semana que vem fizesse alguma diferença prática.

Faz diferença, sim, e isso motiva a intransigente pressa de Lira, mas na política.

É provável que ele, com seu conhecimento dos humores da maioria dos deputados pressinta que o processo de deterioração da base governista esteja em curso mais rápido do que imaginava e que, daqui a algum tempo, a Câmara esteja em posição de bloqueio ao governo Bolsonaro como já está o Senado, onde há medo de se por em votação até mesmo a antes tranquila indicação de André Mendonça para o Supremo.

Então, é preciso tocar rápido a boiada, para que o pisoteio das regras públicas e a consumação do pacto corrupto de destinação dos recursos públicos, com quase exclusividade, aos interesses eleitorais paroquianos dos parlamentares, num remake da fórmula do Centão mais realista: é recebendo que se dá.

A rigor, ninguém sabe o que vai sair disso. As fontes de compensação das perdas de receita dificilmente passarão ilesas pelo plenário, pois a aprovação do texto-base – cuja versão final nem sequer foi apresentada – serão fortemente “depenadas” na votação de dezenas de destaques, sobre os quais não há acordos.

Será, também, inevitável uma tempestade de questionamentos judiciais. E, a esta altura, disputas judiciais não têm a menor tendência de resultarem em decisões favoráveis ao Governo.

As tais segurança jurídica e estabilidade tão reivindicadas pelo empresariado, pelas mãos de seu escolhido político, estão indo, solenemente, para o brejo.

Tijolaço.

segunda-feira, 16 de agosto de 2021

UMA OPERAÇÃO QUE NEM DE LONGE É “FORMOSA”. POR FERNANDO BRITO

A triste escolha de algo parecido com a trilha da velha série de TV – e depois franquia cinematográfica – Missão Impossível para “dar emoção” a uma modestíssima (sejamos gentis) exibição de força militar da tal Operação Formosa, com direito a Jair Bolsonaro e a um desajeitado Ciro Nogueira disparando canhões foi uma espécie de “Parte 2” da patética “tanqueciata” da semana passada na Praça dos Três Poderes.

Nem se fale do fato de que, como exercício militar basicamente de Fuzileiros Navais – cujo emprego é bem diferente do desempenho de missões em campo aberto de áreas de cerrado, muito mais propício a ações de blindados e de aviação de ataque ao solo – já seja uma exibição da carência e da inadequação do material e do treinamento das Forças Armadas brasileiras.

Uma visita presidencial a operação de treinamento militar deveria ser, é claro, ao posto de comando, para observar a precisão e alcance dos disparos de artilharia, em lugar de disparar cenográfica e desajeitadamente uns poucos canhões de calibre mediano, absolutamente inservíveis para o “fogo de saturação” que o locutor dizia estar sendo treinado.

O único “alvo” exibido, uma casinha de bonecas, feita de madeirite, explodida com uns “traques” de São João, francamente, não contribui em nada para que se dê relevância a um exercício bélico com explosivos.

O que nossos chefes militares querem fazer da imagem de nossas Forças, tão obsoleta nas armas quanto na política de sustentar golpes antidemocráticos?

Nos governos tão odiados por parte das cúpulas militares é que se retomou a modernização de nossa estrutura militar: mísseis para o Exército, ainda que maietados por acordos da era FHC que limitam seu alcança em 300 km – o que é um “cuspe” considerando as dimensões brasileiras -, submarinos (inclusive o primeiro nuclear, o que empresta valor estratégico, pela “invisibilidade” dada pelo tempo de submersão contínua) e caças de 4ª geração com capacidade de construção nacional, única forma de tê-los em quantidades “não decorativas”, porque duas dezenas de aeronaves não existe em matéria de proteção a 8,4 milhões de quilômetros quadrados.

Esta geração de oficiais superiores não absorveu que a requalificação e nacionalização do material bélico brasileiro esteve completamente ligada ao fim do “alinhamento automático” do Brasil e de suas Forças Armadas dos Estados Unidos, o que nos permitiu avançar na capacidade de vender ao mundo a escala do que era necessário pra nós mesmos.

Muitos de nossos generais parece que não se importam com isso e parecem focados na função de nosso poderio militar expressado em soldos vitalícios e tropas para funções repressivas, com base num delírio sobre o “poder moderador” que lhes daria o tal artigo 142 da Constituiçao, que nem perto disso passa.

E, para isso, é mais imortante dar ao presidente da República o poder de “puxar a cordinha” do canhão que talvez valesse algo em Tobruk ou nas Ardenas, não no século 21.

Tijolaço.

domingo, 15 de agosto de 2021

LIBERDADE PARA O ÓDIO, VIOLÊNCIA E MORTE? POR FERNANDO BRITO.

Quem quiser entender porque se alega “liberdade de expressão” para as ameaças armadas e Roberto Jefferson e a prioridade dada por Jair Bolsonaro à edição que, em nome dela, proíba a suspensão de publicações em redes sociais incitem à violência e golpes políticos, leia a reportagem de hoje da Folha de S. Paulo dando conta de uma “escalada de grupos neonazistas e aumento de inquéritos de apologia do nazismo” no Brasil (que saltaram de 6, em 2015, para 110, no ano passado).

Como os inquéritos abertos são só uma ínfima parte dos casos, outros números expressam melhor a ressurgência do extremismo de direita:

“(…) um levantamento na Central de Denúncias de Crimes Cibernéticos da plataforma Safernet Brasil contabilizou uma explosão de denúncias sobre conteúdo de apologia do nazismo nas redes. Em 2015, foram 1.282 casos, ante 9.004 em 2020 —um crescimento de mais de 600%.
O ano de 2020 também marcou o recorde histórico de novas páginas de conteúdo neonazista e também o maior número de páginas removidas da internet por conta de conteúdo ilegal ligado às ideias do regime de Adolf Hitler. Foram 1.659 URLs (endereços) derrubadas no ano passado, contra 329 em 2015.”

E, é claro, sites, postagens e outras mensagens extremistas, autoritárias e desumanas, feitas sem referências nazistas diretas, são muito mais expressivas.

Nem sempre só na internet, mas também nos grandes jornais, como ironiza e adverte Antonio Prata, hoje, na mesma Folha sobre o “direito de expressão” da estupidez:

Muita gente pensa assim? Pelo menos 20% da população. Os mesmos, imagino, que apoiariam um golpe. Teremos um colunista pró-ditadura, portanto? Se crescer o movimento antivacina, a Folha contratará um representante desses alucinados? O que traz de positivo à arena pública amplificar vozes como estas, além de acariciar os que acreditam na cura gay, na cloroquina, na Terra plana?

A ideia de um jornalismo “neutro”, exacerbada, é igual à da “liberdade de expressão” que acolhe a exibição armada antidemocracia, seja ela de marginais, como Jefferson, ou praticada por agentes públicos, civis ou militares.

O mesmo, é obvio, vale (e com muito mais intensidade) para os órgão judiciais e parajudiciais, como a Procuradoria Geral da República.

O caminho que um juiz de São Paulo recusa-se a abrir um processo criminal contra um empresário que dispara um revólver e ameaça o ex-presidente Lula é o que segue o Procurador Augusto Aras ao dizer que está dentro dos limites da liberdade o bolsonarista Jefferson exibir rifles, pistolas e chicotes em seus vídeos nas redes.

Esta é a aposta dos tiranos e dos bandidos: a de que a democracia é um regime de tolos que, em nome da liberdade, nada veem de mau em exibir armas, sejam pistolas, sejam tanques, contra ele e que só há crime quando se os disparam.

Se disparam, senhores, não há reação possível no átimo em que o gatilho e puxado e a bala mata.

Tijolaço.

sábado, 14 de agosto de 2021

INFLUENCIADOS POR BOLSONARO OS INSTINTOS MAIS PRIMITIVOS ESTÃO NA RUA, POR FERNANDO BRITO

Roberto Jefferson, agora preso por liberar os seus instintos mais primitivos contra as instituições republicanas, já foi alguns anos atrás, glorificado por sua propaganda do ódio, quando isto interessava à mídia e ao restante da elite brasileira.

A selvageria que marca nossos dias, por vezes, é pouco percebida e deixa muita gente passar distraída diante deste processo descivilizatório que assola o Brasil.

Por vezes penso que enfrentamos talibãs de um deus católico, gente que saiu da nulidade para a proclamação de verdades absolutas, aquela que condena à morte todos os que não mugem no mesmo diapasão.

Estes são “comunistas”, “esquerdopatas”, destruidores das famílias, abortistas, isso quando não são gays ou drogados, na estúpida retórica do motoqueiro Jefferson, que se nomeia de Bob Jeff Road King, “cristão, conservador e nacionalista”.

E tome de vídeos com rifles, pistolas, tacos de beisebol e chicotes para “dar uma surra nos satanazes“.

Enquanto nos ocupamos disso, vão se enfiando, a toque de caixa, mudanças terríveis nas leis trabalhistas, nos direitos sociais e na tributação dos dinheiros e empresas grandes; grassa a fome, vendem-se irresponsavelmente a Eletrobras e os Correios e até o Palácio Capanema, sede histórica do Ministério da Educação e marco da materialização dos sonhos de que este viesse a ser o país que acreditava em novas ideias.

Abro aqui um parêntesis de quem, nos dias de calor infernal no Rio, aliviou-se no ar marinho que os dois andares de pilotis deixavam circular entre a Avenida Graça Aranha e a Igreja de Santa Luzia, aquela que dava luz aos cegos que não veem que não se pode vender nossa história. Ali, onde tomou forma concreta a aspiração de intelectuais, arquitetos, pintores, escultores e outros artistas fizeram seu trabalho abertos aos passantes na correria da cidade. Gustavo Capanema, maestro desta reunião, era um conservador, mas não era um primitivo.

Mas há que considerar que Roberto Jefferson foi, de alguma forma, um profeta, infelizmente, destes tempos demoníacos.

Quem mais primitivo que Jair Bolsonaro poderíamos imaginar poucos anos atrás?

Não se iludam com a aparente reação da Justiça para impedir o regresso do Brasil ao passado.

A luta é política e todos os sinais são de que ela será terrível. As convocações das manifestações bolsonaristas para o Sete de Setembro são as mais terríveis que se possam imaginar e há indícios de que setores do agronegócio está disposto a financiar a concentração de caminhões diante do Congresso, misturados a veículos das Forças Armadas.

Não há terceira via entre civilização e barbárie. Nem a luta entre elas tem resultado previamente determinado.

Afinal, instintos precedem à razão e é preciso que a razão prevaleça apelando também a outro instinto, o mais primitivo de todos, o da sobrevivência.

O da sobrevivência de um povo que está, além da Covid, morrendo de fome, inclusive a de sonhos.

Tijolaço.

sexta-feira, 13 de agosto de 2021

ROBERTO JEFFERSON PRESO: BOLSONARO VAI REAGIR, POR FERNANDO BRITO

A prisão iminente do ex-deputado Roberto Jefferson tem, em si, pouca importância.

Até porque o presidente do “PTB” – perdão, mas não dá para deixar de usar aspas – virou um escancarado apologista de uma ruptura armada do sistema político nacional.

Importante é que abre espaço para uma reação violenta por parte do chefe do desmoralizado político, Jair Bolsonaro.

Jefferson não é um ilustre desconhecido como Daniel Silveira ou Sara Winter.

É tudo o que Bolsonaro queria para gritar que seus apoiadores estão sendo perseguidos, reprimidos e encarcerados pelo Supremo Tribunal Federal.

É claro que a cana de “Bob Jeff”, como gosta de se autodenominar, vai durar bem pouco e será transformada em prisão domiciliar e tornozeleira eletrônica.

Mas será tempo suficiente para o circo bolsonarista fazer barulho, muito barulho, como se o pistoleiro aí do lado fosse um anjo de candura, injustamente perseguido pelo “malvado” Alexandre e Moraes.

Que o ex-deputado já está chamando de “canalha” pelo Twitter, porque ainda está livre, na Região Serrana do Rio de Janeiro.

Tijolaço.

quinta-feira, 12 de agosto de 2021

LIRA VAI SE TORNANDO UM CUNHA SEM IMPEACHMENT, POR FERNANDO BRITO

Seis meses depois de sua chegada à presidência da Câmara dos Deputados, o país começa a perceber que é ter o Poder Legislativo presidido, como nos tempos de Eduardo Cunha, presidido por alguém sem o mínimo de pudor democrático.

Arthur Lira aproveita a situação de fraqueza do governo Bolsonaro – que entregou-se ao Centrão , alucinado por vender patrimônio público e criar artimanhas econômico-eleitorais – e torna-se o fabricante de leis mais rápido da história.

Ou, para ficar na expressão que já se usou aqui: o grande passador de “boiadas”, atropelando qualquer debate.

Em duas semanas da volta do recesso parlamentar, já tivemos a aprovação da privatização dos Correios, da grilagem de terras públicas, uma “reforma” trabalhista, com a supressão de direitos básicos de trabalhadores, a PEC do voto impresso (esta numa derrota apenas formal do Governo), estamos em meio a uma reforma eleitoral (onde estamos comemorando apenas o “podia ser pior”) vamos para um arremedo de reforma tributária tresloucado e logo para uma reforma administrativa com mais do mesmo: tira-se dos pequenos e não se bole com os grandes.

A coisa é tão escandalosa que a opinião pública, que antes achava que Lira e o Centrão se contentariam apenas com cargos e emendas, está despertando para o fato de que eles são uma nuvem de gafanhotos, também, paara toda a organização jurídica do país, em todos os campos: social, político, tributário, administrativo.

O presidente da Câmara está capitaneando – e veloz, com as velas enfunadas – uma nau de insensatos, que parte do princípio que a maioria parlamentar tem o direito de fazer o que quiser, como e quando quiser.

Por trás desta avalanche, não duvide, há comissões e negócios rolando à solta.

Já não lembro onde, mas li hoje cedo a expressão que resume tudo: Lira é o Bolsonaro do Congresso.

Tijolaço.

quarta-feira, 11 de agosto de 2021

ESCALANDO A CRISE, POR FERNANDO BRITO

Derrotados ontem, mesmo, só saíram os militares brasileiros, levados a “pagar um mico” homérico com seu desfile de tanques e ideias velhas de mais de meio século, do tempo em que expelir colunas de fumaça preta indicava a potência de dragões bélicos e não a obsolescência de geringonças para a guerra e para golpes.

Jair Bolsonaro não se importa nem um pouco em parecer saudosista; é isso mesmo o que quer: evocar a memória de um passado que não existiu, o da “felicidade” dos brasileiros nos tempos do regime militar.

Ironicamente, alegando estar defendendo o que a ditadura de seus “heróis” tirou dos brasileiros, o voto para presidente.

E o presidente também não liga em ter exposto as Forças Armadas, pois em relação a elas não tem senão o recalque do mando finalmente conquistado e a certeza que elas se alimentam de poder, soldo e arrogância, e não de profissionalização, capacidade e eficiência.

A batalha política, lamento informar, não foi mal para Bolsonaro, nem tanto por causa dos 229 votos que seu Cavalo de Troia recebeu, mas pelos 211 contrários, quase 100 a menos que os partidos que se opuseram a ele esperavam registrar no painel da Câmara.

Nem se fale em MDB e DEM, mas dos que assumiram posições claras e deveriam, por isso, ter poucas defecções.

Confiram: no PSDB, o voto foram 14 votos bolsonaristas; no PSD, 20; no PSB, 11; seis votos a favor no PDT e três no Cidadania. Quase 60 fotos que, se fossem coerentes, teriam baixado a votação da manobra governista para os 170 esperados e erguido para 270, como esperados, o muro do “não” a Bolsonaro.

Daqui a pouco começará a gritaria e não é difícil prever que o presidente dirá que, apesar de ter tido a maioria – o que, no seu discurso, vai virar “a vontade do povo” -, não conseguiu a marca necessária de 308 por conta das “pressões indevidas” do presidente do TSE, Luiz Roberto Barroso.

E seguirá em sua agitação, usando os militares como alegorias exibidas como fiadoras de suas pretensões continuístas: tem os exercícios da semana que vem como palco e o Dia do Soldado, 25 de agosto, como motivo para uma manifestação de gala para seus apetites.

As instituições civis, que não soltam fumaça, parecem estar em pior estado que os deprimentes tanques do desfile de ontem. Nem soltam roncos ou fumaças: miam diante do aspirante a ditador.

Tijolaço.

terça-feira, 10 de agosto de 2021

COMANDO DAS FFA POR OBEDIÊNCIA É SÓ MEIO COMANDO, POR FERNANDO BRITO

Thaís Oyama, no UOL, faz um deprimente relato dos questionamentos e desagrados manifestados pelo Alto Comando do Exército com seu comandante, o general Paulo Sérgio Nogueira, ontem, em que pediam ao comando que não participasse da demonstração patética realizada hoje na Praça dos Três Poderes.

“Com maior ou menor eloquência, os generais [do Alto Comando] expressaram seu desagrado à presença do comandante do Exército num evento que, para eles, escancarava a tentativa presidencial de usar as Forças Armadas em seu benefício político — nesse caso, o desejo de intimidar o Congresso e o Supremo Tribunal Federal. Alguns se disseram “envergonhados” e “indignados”.”

Nogueira, como se sabe, formou ao lado do presidente para assistir ao fumacento desfile de tanques. Os generais dissiparam de maneira mais discreta a fumaça de seu desagrado, justamente porque não exibem de público o escape de suas frustrações.

O que não quer dizer que o ar esteja limpo e saudável ali.

O comando do Exército, ao mesmo tempo que investe seu ocupante da chefia, não o exime da colegialidade, do exercício da harmonia entre seus pares.

É, aliás, para isso que o Exército, Marinha e Aeronáutica possuem, cada um, seu Alto Comando, para que as Armas sejam dirigidas não apenas pelo comandante, mas também por seus pares mais qualificados e com maiores responsabilidades.

Vai daí a conclusão, óbvia, de que o general comandante do Exército pode, sim, contar com a obediência de seus pares, mas certamente não conta mais com a sua concordância total.

O general certamente sabe que isso é péssimo para um comando: exercer-se não por solidariedade e unidade, mas apenas por necessário dever de disciplina.

E, pior, quando começa a prosperar a ideia de que há mais compromisso com a defesa do posto que da instituição.

O bastão de comando não é uma varinha mágica capaz de substituir a concordância como fonte de legitimidade.

Mas serve para pedir carona no desfile de tanques fumacentos da Marinha e nos arroubos de Bolsonaro e colocar o Exército em uma posição indefensável.

Tijolaço.

BOLSMARO CHAMA LEGISLATIVO E JUDICIÁRIO PARA SEREM “COIÓS”, POR FERNANDO BRITO

Jair Bolsonaro chamou os presidentes do Legislativo e do Judiciário se humilharem diante da demonstração militar da manhã este terça-feira, diante das colunas de tanque formadas diante do Palácio do Planalto.

Se forem, estarão legitimando não a continência militar ao poder civil, mas, ao contrário, a submissão do poder civil republicano ante o poder de um simples destacamento militar que o reduz à um mosquito que pode ser expelido com um peteleco.

Transformar um mero e rotineiro exercício militar num evento político é produto de mentes doentias que, sem a reação de seus chefes, transforma as Forças Armadas em “Forças de Ameaça”, que exigem, por meio do presidente da República, que o poder civil se alinhe e bata continência às tropas .

Espera-se que reste ao Legislativo e o Judiciário não se verguem a esta humilhação e faça deste ato o que é: uma patética chantagem militar de Jair Bolsonaro sobre os demais poderes da República.

Sinceramente, não tenho certeza de que o farão, tal é o nível de degradação que se pede a poderes que, embora degradados, ainda têm alguma vergonha de se exporem como tal.

Viraram coiós, bobos, idiotas, palermas, bocós, patetas, nossos parlamentares aceitam ser joguetes do poder miliciano que temos.

Não haverá reação à altura, não só pela maioria de nulidades que domina a Câmara, desesperada por reeleger-se, mas pela pequena disposição da oposição de partir para um confronto mais agudo, valorizando o voto em partidos políticos.

Do contrário, o Legislativo terá como função agarrar-se a verbas públicas e, nos raros momentos em que livrar as mãos, apenas usá-las para bater continência uma coluna de tanques.

Tijolaço.

segunda-feira, 9 de agosto de 2021

A ROTA DA BOA ESPERANÇA DOS TEMPOS MODERNOS, POR PAULO NOGUEIRA BATISTA JR.

O artigo anterior desta coluna tratou do que chamei de “destino planetário do Brasil”. Extravagante, mas fez sucesso. Vale a pena, talvez, insistir no tema. O brasileiro está precisando de alento. O artigo foi meio delirante, eu sei. É o que tende mesmo a acontecer – quando alguém sonha sozinho, o sonho pode degenerar em delírio. Mas quando muitos sonham juntos, ah, aí o delírio pode virar realidade. E, convenhamos, o nosso futuro está logo ali.

O leitor quer um exemplo de como o Brasil pode cumprir seu destino planetário? Vou recorrer a uma ideia do Saturnino Braga, um daqueles brasileiros que sabem pensar grande e que, em meio à tormenta, não perdeu a confiança no Brasil. Ognuno sa navigare col buon vento, dizem os italianos. O desafio é vencer tempestades.

Antes da pandemia, participei com Saturnino de uma mesa de debates no Rio de Janeiro sobre a Nova Rota da Seda, aquela grandiosa iniciativa chinesa, lançada em 2013, que consiste essencialmente de uma coleção de projetos de infraestrutura. O nome da iniciativa carrega todo um simbolismo histórico, ao evocar as antigas rotas de comércio entre a Ásia e a Europa numa época em que a China era a economia mais desenvolvida e poderosa do mundo. A Nova Rota da Seda não se circunscreve às áreas originais e alcança, também, a África e a América Latina.

Todos falavam com admiração da iniciativa chinesa, quando de repente o nosso Saturnino resolveu inovar. E saiu-se com uma daquelas belas improvisadas que o brasileiro, como poucos, consegue produzir. Por que não, perguntou ele, uma iniciativa brasileira – uma Nova Rota da Boa Esperança, que uniria as Américas, a Europa, a África e a Ásia? O Brasil refaria, assim, o caminho das Grandes Navegações Portuguesas. Este seria o lema que poderia abrigar e energizar todo um conjunto de projetos e programas de desenvolvimento na América Latina, na África e na Ásia, impulsionados pelo Brasil.

A ideia ressoou em mim porque há muito alimentava o sentimento de que o nosso país é, na verdade, o herdeiro natural do espírito que moveu a aventura global de Portugal nos séculos 15 e 16. Em Washington, cheguei a ensaiar essa ideia, em pequena escala, ao trazer para nosso grupo no FMI países de língua portuguesa da África e da Ásia. Estávamos refazendo, eu dizia na época, tongue in cheek, a trajetória das Grandes Navegações.

PORTUGAL, VÍTIMA DO COMPLEXO DE VIRA-LATA

Antes de desenvolver um pouco a ideia do Saturnino, preciso abrir um rápido parêntese sobre Portugal. O brasileiro, em geral, pouco sabe, pouco entende de Portugal. O que é um absurdo arrematado, por duas razões pelo menos.

A primeira razão, óbvia, é que os portugueses, junto com outros povos, nos constituíram. Mais do que isso: Portugal liderou a criação desse imenso país que viria a ser o Brasil. E nos legou, entre outras coisas, a bela língua nacional – para o meu gosto mais bonita, diga-se de passagem, em várias das pronúncias brasileiras do que na da sua pátria original.

A segunda razão é que Portugal foi uma nação realmente extraordinária. Aquele pequeno país, numa da pontas da Europa, transformou-se em vanguarda da expansão mundial da civilização europeia. Lançou-se ao Oceano Atlântico, percorreu o litoral da África, descobriu o caminho para as Índias, contornando o temível Cabo das Tormentas, rebatizado Cabo da Boa Esperança pelo rei João II. E chegou não só à Índia, mas à China e ao Japão. De quebra, atravessou o Atlântico e criou o Brasil.

O brasileiro sempre teve alguma dificuldade de se dar conta da importância de Portugal para nós e para o mundo. Antigamente, o mais comum era um simples desprezo, expresso nos lamentos do tipo “pena que não fomos colonizados pelos holandeses ou pelos franceses”, “pena que eles não conseguiram fincar pé no Rio de Janeiro, em São Luís e em Pernambuco”. O nosso destino teria sido outro, imaginava-se. Só faltava transformar Calabar (um precursor do marreco de Maringá) em herói nacional. O que se escondia por trás disso (e nem se escondia muito) era um velho conhecido nosso – o indefectível complexo de vira-lata. O desprezo por Portugal era, no fundo, uma faceta da tendência nacional à autodepreciação.

Mais recentemente, surgiu outra maneira de atacar os portugueses. Em certos círculos, a tendência é estigmatizá-los como invasores, colonizadores, escravocratas e genocidas. Tratam de reescrever a história do ponto de vista dos derrotados e escravizados. É um esforço legítimo, que permitirá uma visão muito mais completa e justa da nossa formação nacional. Só não podemos perder de vista que Portugal está em nós, no nosso sangue, na nossa cultura, como estão os africanos, os povos originários e outros povos que para cá vieram. Renegar Portugal é renegar um pedaço enorme do Brasil e da nossa história.

Fiquei sabendo que até em Portugal a sanha “descolonizadora” se faz sentir e há quem peça a remoção daquele célebre monumento às Grandes Navegações em Lisboa, “O Padrão dos Descobrimentos”, um dos emblemas da cidade. Não vai vingar. O dia em que Portugal deixar de se orgulhar do seu passado glorioso será exatamente o fim. Pode fechar para balanço.

A melhor introdução à grandeza de Portugal talvez seja o livro Mensagem de Fernando Pessoa, uma das poucas obras publicadas por ele em vida e dedicada, em grande parte, à aventura marítima portuguesa. “O mar com fim”, escreveu Pessoa, “será grego ou romano: o mar sem fim será português”. Na minha ignorância selvagem de brasileiro, só fui me dar conta da grandeza de Portugal quando travei conhecimento com essa obra de Pessoa.

Mensagem é uma maravilha do primeiro ao último verso. Veja, leitor, por exemplo, o poema “Horizonte”:

Ó mar anterior a nós, teus medos
Tinham coral e praias e arvoredos.
Desvendadas a noite e a cerração,
As tormentas passadas e o mistério,
Abria em flor o Longe, e o Sul sidério
Splendia sobre as naus da iniciação.

Linha severa da longínqua costa
Quando a nau se aproxima ergue-se a encosta
Em árvores onde o Longe nada tinha;
Mais perto, abre-se a terra em sons e cores:
E, no desembarcar, há aves, flores,
Onde era só, de longe a abstracta linha.

O sonho é ver as formas invisíveis
Da distância imprecisa, e, com sensíveis
Movimentos da esp’rança e da vontade,
Buscar na linha fria do horizonte
A árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte
Os beijos merecidos da Verdade.

Faço aqui um apelo ao leitor: não deixe de ler ou reler Mensagem, livro indispensável para entender a nossa história e, também, o nosso futuro.

BRASIL, HERDEIRO DAS GRANDES NAVEGAÇÕES PORTUGUESAS

Volto, então, ao nosso destino planetário e à ideia do Saturnino. Portugal, país pequeno, diluído na União Europeia, talvez só possa permanecer fiel a seu passado em aliança com o Brasil. Não tem mais a energia e o impulso de antes. Já nosso país, um dos gigantes do mundo, tem tudo para retomar o espírito das Grande Navegações Portuguesas. Esse é o sentido da brilhante metáfora do Saturnino.

O que poderia ser a Nova Rota da Boa Esperança? A exemplo da iniciativa chinesa, poderia tomar a forma de um conjunto de projetos e programas de infraestrutura e de desenvolvimento sustentável formulados e/ou financiados pelo Brasil em colaboração com outras nações latino-americanas, africanas e asiáticas. O foco seria o desenvolvimento adaptado às exigências do século 21 – um desenvolvimento fundado, portanto, na sustentabilidade não só econômico-financeira, mas também social e ambiental. A emergência climática faria com que a questão da economia verde assumisse papel central na Nova Rota da Boa Esperança. Trata-se, em uma frase, de contribuir para salvar o planeta.

Temos para isso instrumentos que podem ser mobilizados ou recuperados. O BNDES, a Embrapa, as empreiteiras e outras empresas brasileiras com presença internacional. Temos no Itamaraty um corpo diplomático de excelência que ajudaria a abrir caminho para a iniciativa. O Banco dos BRICS, se for capaz de ampliar o número de seus países-membros, também pode ser dinamizado para ajudar a financiar projetos e programas da Rota da Boa Esperança – até porque foi o primeiro banco de multilateral de desenvolvimento a ter a questão ambiental inscrita no seu Convênio Constitutivo.

Repare, leitor, no nome da iniciativa – “Boa Esperança”. O Brasil deve ser o portador de uma mensagem nova de solidariedade, respeito e igualdade entre as nações. Entre os grandes países, volto a dizer, só o Brasil, por suas características, sua história e sua formação singular, está talhado para trazer essa mensagem de esperança para todos.

O que nos caberá fazer em breve será transformar o que pode parecer mero delírio em realidade. Trata-se, como escreveu Pessoa, sonhar as formas invisíveis e buscar na linha fria do horizonte, com esperança e vontade, a árvore, a praia, a flor, a ave, a fonte – os beijos merecidos da Verdade.

Tijolaço.

domingo, 8 de agosto de 2021

O OURO QUE O BRASIL DA ELITE SEMPRE DESPREZOU, POR FERNANDO BRITO

Pulei, até agora, qualquer publicação sobre a Olimpíada e nossos atletas. Não sou de “tretas”, nem de cobrar que eles tenham de ter posições políticas e eleitorais, menos ainda que se pegue carona nos seus triunfos esportivos.

Mas, no penúltimo dia dos Jogos, a capa do site da Folha, sobre os sucessos dos atletas do Nordeste em Tóquio, numa estranha remissão antípoda do preconceito que sofrem nordestinos aqui, me trouxeram à mente uma das mais impressionantes imagens do drama que os livros me traziam quando jovem, do O Quinze, de Rachel de Queiroz e as Vidas Secas de meu involuntário e mal-seguido mestre Graciliano Ramos.

Veio também a memória a mesma Folha, nos anos 90, retratando o “homem-gabiru”, o nordestino mirrado como a vegetação do sertão, pela subnutrição crônica, por um darwinismo às avessas, onde ser pequeno, encolhido, parecia ser a chave para sobreviver até que “a terra pouca para o defunto parco” do Severino de João Cabral, o deixasse “mais ancho que estava no mundo”.

O repórter, o grande Xico Sá, dizia que havia gente sugerindo que o nordestino evoluía para uma “nova espécie”, menor mas mais adaptada à pobreza crônica.

Pois não é que, 30 anos depois, mesmo sem ter nunca tido o que têm os moços e moças do “Sul Maravilha”, mas tendo algum dicumê, alguma atenção, um pouco de formação, ao menos, de uma classe média, que pode se dar ao luxo de deixar os filhos se divertirem num esporte, de pegar onda com uma tampa de caixa de isopor e levá-los à praça para se divertirem num skate, eles já ns dão a maioria de nossas medalhas de ouro olímpicas?

Mas os nordestinos não eram indolentes, preguiçosos, conformados? Não eram os que esperavam que as coisas caíssem do céu? Ou do governo, como é comum as classes medias do Sudeste dizerem que os carregam nas costas?

Eu cresci ouvindo que eles eram uma raça menor, os “paraíbas”, gente que se aproximava de animais de tração, a carregar no corpo atarracado as obras de nosso progresso embora, disso, só fossem apreciar do outro lado da calçada, as belas construções, o prédio, a ponte, o viaduto.

Não é que deles fosse ou seja o monopólio da pobreza, mas eles foram e são, na visão de nossas elites, um problema, enquanto nos são, como país, parte de nossa solução. Porque o Nordeste tem um quinto do nosso território e um terço de nossa população. Quem seria louco de enxergar tanta terra e tanta gente como uma carga pesada e não um potencial imenso?

Alguém pode achar indolente quem enterra um remo na água, por um quilômetro, como Isaquias Barbosa? Ou quem enterra os braços na água por 10 km, como Ana Marcela? Ou quem voa sobre as ondas, mesmo feias e espumosas, como Ítalo Ferreira, que aprendeu com uma tampa de geladeira de isopor a brincar com o mar? Ou quem parte para o tudo ou nada como o rapaz do boxe, o baiano Hebert Conceição, que nocauteia o adversário? Ou da guria de Imperatriz que se diverte desde pequena no skate, com uma prata que brilha tanto quanto ouro?

A cegueira da elite brasileira, entretanto, é imune a este brilho. É incapaz de ver que o Nordeste nos pode dar, em curto espaço de tempo, não só atletas, mas doutores, profissionais, consumidores, atividade econômica, emprego, progresso.

Exatamente como se fez com estes nossos campeões olímpicos: um pouco de apoio, um muito de esforço, um infinito de orgulho e fraternidade.

Tijolaço.

sábado, 7 de agosto de 2021

LULA DIZ QUE BOLSONARO ATACA POR MEDO DE PERDER E SER PRESO, POR FERNANDO BRITO

Na mais dura reação às bravatas dos últimos dias, o ex-presidente Lula disse, pelo Twitter, que “temos um presidente 100% irresponsável e 100% mentiroso. Um homem que sente prazer em contar mentira, em tentar enganar o povo. Ele acha que o povo é tonto, que não tem consciência” e que “qualquer ser humano faria melhor que o Bolsonaro, que dizia que a pandemia não existia. Ele transformou em inimigo todo mundo que seguia a ciência. Quando chamo o Bolsonaro de genocida é porque são quase 600 mil mortos aqui e boa parte é responsabilidade do comportamento dele”

— O Bolsonaro era tão ignorante que achava que não precisava do Congresso, que ia fazer tudo sozinho com os filhos. Aí ele chegou à conclusão de que é um incompetente politicamente. Não gosta de democracia. Um patético governando o país.

Para Lula, não há risco de Bolsonaro dar um golpe continuísta, cancelando as eleições. “Bolsonaro desafiou a sociedade [e] em algum momento ele será julgado. E é disso que ele tem medo. Essa loucura toda de voto impresso, é medo. Bolsonaro sabe que vai perder e tem medo de ser preso, aí fica nessa bobagem”.

— Não acredito em golpe do Bolsonaro. Ninguém que ganhar as eleições precisa dele pra passar a faixa. O povo entrega. O grande golpe que ele deu já foram as eleições de 2018. Mentiu a campanha toda, não participou de nenhum debate e foi eleito.

Lula sabe que não há adversário para Bolsonaro, senão ele próprio. E, vice-versa, Bolsonaro também compreende isso.

A radicalização do atual presidente deixa para o ex-presidente o terreno aberto para articular apoios, já que a tal “Terceira Via” não terá espaço para crescer sem que haja o desmoronamento total de Jair Bolsonaro. E, no poder, nem mesmo sua incompetência conseguirá desmanchá-lo.

Tijolaço.