Confesso que sempre fiquei agoniado com o pensamento
monofásico, aquele em que a pessoa desenvolve UM raciocínio, com UM ângulo
apenas de análise e entra em tilt se o interlocutor ousa colocar uma azeitona
que seja no seu prato.
Com Zélia Cardoso de Mello era assim. Quando Zélia pensava
parecia que sua cabeça doía. Era incapaz de juntar dois ângulos em cima do
mesmo tema.
Ao longo da minha longa carreira jornalística, conheci outros
tipos assim. Cristovam Buarque era um deles, desde os tempos de militância de
esquerda.
Dilma Rousseff fazia outro tipo, da teimosia, sim, mas mais
elaborada. Você queria saber a razão de ter aumentado a Selic, ela fazia
digressões sobre o fim do quantitative easy pelo FED. A rigor, não havia
correlação óbvia entre ambos, mas questionar seu raciocínio exigia do
interlocutor entrar em uma série de outros conceitos. Enfim, não era pensamento
monofásico.
Mas o que ocorre hoje em dia na Globonews é algo inédito: a
epidemia de pensamento monofásico em uma emissora que se pretende ser a
vanguarda do intelectualismo televisivo. Pobre país!
Funciona assim: o repórter coloca UMA questão para o
entrevistado e só admite UMA resposta. Se o entrevistado ousar elaborar
minimamente sua resposta, dá um tilt e, como dono do espaço, o repórter corta a
resposta e exige a volta ao script da casa. É tico ou teco, e não venha
confundir minha cabeça!
Não foi por outro motivo o espanto de Kátia Abreu, ante a
insistência do colunista Gerson Camarotti para que ela respondesse a resposta
padrão, para que ele pudesse recorrer à tréplica padrão.
Gerson, Mirian Leitão e Andreia Sadi se tornaram os campeões
desse estilo inacreditável de jornalismo, vindo de um canal de primeiro nível.
Mirian insistindo na autocrítico dos erros do PT. Jogava a
bola para Haddad. Este analisava o período de 12 anos do PT e, no período
final, admitia os erros cometidos por Dilma. E a entrevistadora:
- Mas, candidato, se não fizer a autocrítica, como iremos
acreditar que o PT mudou?
Aí toca Haddad pacientemente responder que ao mencionar os
erros de Dilma, ele estava fazendo a tal autocrítica solicitada. E ela:
- Mas candidato?
Andreia Sadi recorreu ao bordão da conversa entre Lula e
Haddad sobre a eventualidade ou não de um indulto presidencial a Lula. Não
estava interessada em saber a opinião de Lula ou de Haddad, mas exclusivamente
se houve a conversa sobre o tema entre ambos, como se a simples conversa fosse
a prova do crime.
É inacreditável! É evidente, óbvio, lógico que conversaram
sobre o indulto. O país inteiro discutindo o indulto, e os dois principais
atores – Lula, o preso, Haddad, se presidente eleito – não iriam discutir?
Ai Haddad pacientemente explicava que conversaram. Pronto, a
admissão de culpa:
- Então conversaram!, vibra a repórter por ter seu “furo”
confirmado.
Haddad ainda se dá ao trabalho de explicar que conversaram
porque o tema já tinha saído nos jornais.
- Mas Lula disse que não quer indulto, quer ser absolvido.
- Mas conversaram!, vibra a repórter.
- Conversamos, claro, mas Lula disse que a melhor resposta
foi de Ciro, que disse que Lula é inocente e tem que ser absolvido pelos
tribunais.
E a repórter, com o sorriso fulgurante de quem descobriu o
mais recôndito segredo político do momento:
- Então, conversaram!
Socoooooooooorro!
GGN
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