Estimulado pelos filhos e por Olavo de Carvalho,
Bolsonaro abriu mão de todas suas “âncoras” e decidiu partir para a guerra
individual. Ampliou o discurso ideológico e, em Santa Maria, expôs a estratégia
do armamento da população.
Vamos a uma rodada de
Xadrez, em cima de notícias atuais pós-Intercept. Leve em conta o
extraordinário dinamismo dos fatos para não tirar nenhuma conclusão definitiva.
Vale para entender os movimentos e as contradições do jogo.
Peça
1 – decreto das armas e milícias
Já havíamos antecipado
há meses que o armamento da população fazia parte da estratégia dos Bolsonaro
de criar suas milícias particulares, ampliando o poder de seus aliados,
milícias, empresas de segurança privada, ruralistas dos confins.
A cada dia que passa
amplia-se o isolamento de Bolsonaro.
No início do governo, a
arca de Noé era composta por negocistas, militares da reserva, fundamentalistas
e pelas supostas “âncoras” Sergio Moro e Paulo Guedes.
A saída do general
Santa Cruz sela o fim da parceria com os militares. A foto simbólica do general
Villas Boas – principal avalista militar da candidatura de Bolsonaro – ao lado
de Santa Cruz é apenas isso: simbólica, um retrato da falta de rumo
generalizada que jogou não apenas o poder civil, mas também o militar, sob
lideranças de baixa dimensão.
A cada dia que passa,
Paulo Guedes se revela um blefe, sem uma estratégia sequer para enfrentar a
crise, jogando todas suas fichas em propostas inviáveis para a Previdência,
como maneira de preparar antecipadamente um álibi para o fracasso. O Congresso
retirou dele o protagonismo das reformas, por sua incapacidade absoluta de
comandar qualquer articulação.
Por seu lado, Moro
virou um dependente total de Bolsonaro.
Hoje em dia, para obter
sinais de aprovação de Bolsonaro, o ex-juiz sai dos auditórios internacionais
para estádios de futebol e para o programa do Ratinho, para provável desgosto
da senhora Moro.
Ou seja, estimulado
pelos filhos e por Olavo de Carvalho, Bolsonaro abriu mão de todas suas
“âncoras” e decidiu partir para a guerra individual. Ampliou o discurso
ideológico e, em Santa
Maria expos a estratégia do armamento da população: armar o povo para
resistir a golpes. Daqui para frente, será um crescendo, diretamente
proporcional à incapacidade política do grupo Bolsonaro de se colocar no jogo
institucional.
Peça
2 – a grande tacada com a Petrobras
Paulo Guedes adotou a
estratégia da terra arrasada: o que não puder ser vendido, tem que ser
destruído.
Nessa estratégia, a
única resistência tem sido do estamento militar, impedindo a privatização de
algumas empresas da indústria de defesa.
Há uma série de
cúmplices, em jogadas cinzentas, que não escaparão de investigações futuras,
Membros do CADE
(Conselho Administrativo de Direito Econômico) serão alguns deles. O órgão
analisou uma das muitas ações contra a Petrobras, por monopólio do refino. Ressalve-se,
a única acusação era ter o monopólio do refino. Não houve acusação sobre qual
seria a prática monopolista, pois aí ensejaria um Termo de Ajustamento de
Conduta, e não a obrigatoriedade de se desfazer das refinarias. Em vez disso,
impingiu uma multa bilionária à empresa, caso não se desfizer de suas
refinarias, uma decisão estapafúrdia – que certamente servirá de tema para mais
uma CPI, quando a grande noite terminar.
Entra
nesse pacote, a privatização da TAG, transportadora de gás da Petrobras,
dias antes do anúncio da descoberta de grandes reservas de gás no Nordeste, aí
envolvendo decisão do Ministro Luiz Edson Fachin. O Ministro deve explicações.
Á medida que se
aprofundar a decepção com a economia, haverá uma releitura de todas as tacadas
de Paulo Guedes, acelerando o desgaste do governo
Peça
3 – Levy e o sistema internacional
Mais uma frente de
desgaste emergirá do episódio Joaquim Levy-BNDES.
Levy é funcionário de
carreira do FMI. Antes de vir para a presidência do BNDES, Levy era o segundo
nome no organograma do Fundo, como CHIEF FINANCIAL OFFICER, ou seja,
DIRETOR FINANCEIRO. Sua demissão de forma grosseira vai reverberar
em Washington, onde ele e família moram faz tempo.
Desgostou Guedes por
tentar preservar de forma responsável o banco. Foi
Guedes quem provocou a reação de Bolsonaro, colocando a carne fresca do
antipetismo na sua frente. Provavelmente para o lugar de Levy irá Gustavo
Franco, ironicamente o presidente do Banco Central responsável maior pelas
autorizações das contas CC5, do escândalo Banestado, e poupado por Sérgio Moro
na época.
Até para o trabalho
sujo, Guedes se mostrou submisso, recorrendo a intrigas palacianas. Bolsonaro,
imperial, fez saber a todos que ele bancou a nomeação de Levy e ele o
demitiria, passando por cima de Guedes, reduzindo ainda mais a expressão
política de seu Ministro da Economia.
A alegação posterior de
Guedes, de que Levy não abriu a caixa preta do BNDES é de absoluta má fé,
porque nem dispondo do álibi da ignorância. Só um banco suicida vai
colocar problemas na janela para se autoflagelar. Isso afeta o “rating” e
o BNDES é ativo captador em bônus no mercado internacional. O que ele pretendia
é que o BNDES, por sua própria iniciativa, fizesse o trabalho sujo que a Lava
Jato fez em relação à Petrobras.
Peça
4 – os movimentos das instituições
Há movimentos dúbios no
sistema de freios e contrapesos.
É evidente que todos os
setores responsáveis já se deram conta dos riscos para o país das políticas de
Bolsonaro.
Em um primeiro momento,
despertam as primeiras conversas entre lideranças, os primeiros encontros
reservados, visando construir a massa crítica capaz de segurar definitivamente
Bolsonaro. Pela tentativa de montar uma aliança direta com o povo, Bolsonaro
certamente já percebeu esses movimentos.
Há destaque para as
movimentações políticas, a aglutinação de partidos de esquerda, o papel do
Centrão, os movimentos de direita em relação a Dória.
Mas os movimentos
decisivos são mais reservados, envolvendo altas autoridades brasilienses, do
mundo jurídico, político, militar, dos grupos empresariais representados na
capital.
É curioso analisar
esses movimentos.
Publicamente, com
exceção do Congresso, os poderes vêm recorrendo à estratégia “amansa o touro”.
Dias Toffoli cumpre a
missão desenhada para ele: toma atitudes pusilânimes para poupar seus pares da
acusação de pusilanimidade. Foi o caso da não inclusão na pauta da votação
sobre prisão em segunda instância, por exemplo. Vamos ver qual será seu
malabarismo para evitar a discussão sobre a suspeição de Sérgio Moro.
Por outro lado, foi o
mesmo Toffoli que tomou a atitude ousada de abrir investigações contra a Lava
Jato. É evidente que há uma estratégia em curso.
No momento, o poder que
se firma como freio e contrapeso é o Congresso Nacional.
Mas os demais não estão
inertes
Peça
5 – os desdobramentos
Não há a menor
possibilidade de Bolsonaro baixar a poeira, e definir uma estratégia sutil de
destruição nacional. Cada vez mais acelerará a retórica do confronto, da guerra
ideológica, do foco único no fundamentalismo mais tacanho.
Sua insistência em
armar as milícias, mais cedo ou mais tarde exigirá providências das Forças
Armadas.
A tortura chinesa do
The Intercept sobre Moro, pingando dia a dia parafina quente na sua testa,
tornará sua permanência um fator adicional de desgaste.
A cada dia que passa,
mais aumentará o desalento com Paulo Guedes e sua incapacidade de reverter a
crise.
Provavelmente, à esta
altura ocorrem movimentações relevantes de bastidores, especialmente em
Brasília.
E não se assistirá a
próxima guerra através de setoristas do Palácio, que presentearam Bolsonaro com
uma Bíblia, ou da Globonews.
Do GGN