quarta-feira, 5 de agosto de 2020

O QUE OS ”INTOCÁVEIS” DA LAVA JATO QUEREM ESCONDER DOS BRASILEIROS MAS JÁ PASSARAM AO FBI? DIZ PAULO PIMENTA

A democracia brasileira já sofreu violações suficientes para compreender que um Ministério Público sem controle externo pode ser tentado ao arbítrio, vindo a se converter “em um monstro”, para repetir a expressão de Sepúlveda Pertence, ex-ministro do Supremo Tribunal Federal.
O conflito entre o Procurador-Geral da República, Augusto Aras, e os procuradores da Operação Lava-Jato de Curitiba em torno do acesso às informações recolhidas ao longo de seis anos de atividades dos “Intocáveis”, tem desdobramentos.
Lança as primeiras luzes oficiais — tardias, porque apontadas há meses pelo “The Intercept” — sobre os porões de um dos principais projetos políticos da extrema-direita no Brasil.
A SERVIÇO DOS EUA
Um projeto a serviço dos interesses geopolíticos dos Estados Unidos e do capital financeiro internacional, com fortes vínculos com a mídia corporativa, setores empresariais que incluem notórios sonegadores de impostos, o agronegócio e grandes bancos.
Esse projeto foi capaz de aparelhar setores do Ministério Público e do Judiciário para golpear a Constituição de 88.
Fazia parte dessa estratégia de poder a derrubada da presidenta legítima Dilma Rousseff e a prisão da maior liderança popular da história do País, o ex-presidente Lula, visando impedi-lo de concorrer às eleições de 2018 e, por fim, abrir caminho para eleger um representante que pudesse cumprir um papel de subserviência a este conjunto de interesses.
Foi assim que o ex-capitão Jair Bolsonaro acabou sendo eleito.
GOVERNO NEOFASCISTA
O passo seguinte, como sabemos, foi incorporar seu líder, o ex-juiz Sérgio Moro, aos quadros do governo neofascista de Jair Bolsonaro como “super-ministro” da Justiça.
Aos olhos de Bolsonaro, uma retribuição aos serviços prestados durante a campanha.
Para os objetivos de Moro, um passo na estratégia de disputa da Presidência da República, em 2022.
Durou 16 meses sua permanência no governo em cuja eleição ele teve papel-chave.
Sua atuação no cargo foi pontilhada por tentativas de institucionalizar, por meio do Congresso, um Estado Policial, legitimar os métodos que utilizou quando comandava a Operação Lava-Jato e preparar o Estado Brasileiro para sua pretendida chegada ao poder.
TRAIDOR
Escolheu o momento adequado para trair o homem que ajudou a eleger, se afastar do Ministério, produzir algum desgaste na imagem do ex-capitão diante dos seus seguidores e habilitar-se com a ajuda dos aliados de sempre, particularmente a Rede Globo de Televisão, como opção da extrema direita no próximo pleito presidencial.
A proteção da mídia corporativa, a leniência de cúmplices no Judiciário e a segurança da impunidade afrouxaram a vigilância dos rapazes de Curitiba e eles foram deixando rastros de violações e crimes pelo caminho:
— conluio entre a acusação e juízo;
— campanha publicitária em favor deles próprios;
— pretensão inconstitucional, flagrada em pleno voo, de constituir um Fundo com recursos oriundos da Petrobrás, negociados com o sistema judiciário dos Estados Unidos, que somariam R$ 1,3 bilhão, a ser gerido por quem deveria fiscalizá-lo;
— montagem de um sistema privativo de informações que agora se revela um sistema policial de espionagem e controle capaz de mapear 38 mil cidadãos e cidadãs brasileiras e levantar cerca de 50 mil documentos.
Neste momento os líderes da operação disputam no STF a pretensão de não partilhar com a própria Procuradoria-Geral da República, as informações em seu poder, embora elas já sejam do domínio do FBI. Agem como se constituíssem em Curitiba um Estado paralelo.
Qual o medo da Lava-Jato?
Cabe perguntar:
O que os “Intocáveis” da Lava-Jato desejam esconder da sociedade brasileira?
Sob que argumento o órgão instituidor – a Procuradoria-Geral da República – tem bloqueado seu acesso às informações obtidas por uma força-tarefa por ele instituída?
Por que o ministro do STF Edson Fachin — aquele saudado por Dallagnol em 5 de julho de 2019 (Intercep/Veja), “Caros, conversei 45 minutos com Fachin. Aha, uhu, o Fachin é nosso!” — tenta blindar os procuradores suspendendo a decisão do presidente do STF, Dias Toffoli, de franquear os arquivos da Lava-Jato à PGR?
É necessário, mais do que nunca, reafirmar a direta e irrefutável formulação do governador maranhense Flávio Dino: Não podemos aceitar que em nome do suposto combate à corrupção, se corrompa a legalidade democrática.”
Não é recomendável nutrir otimismos exagerados expressos em réquiens prematuros da Operação Lava-Jato.
Ela segue sendo o mais consistente projeto de um Estado Policial em construção no Brasil, alicerçado na quebra da democracia, da soberania e dos interesses nacionais.
É necessário cobrar a imediata instalação da CPI da Lava-Jato como um instrumento para se contrapor, com o auxílio da sociedade à consolidação do Estado Policial que nos ameaça.
*Paulo Pimenta é deputado federal e presidente do PT do Rio Grande do Sul.
Do Viomundo

ESTADOS INFORMAM SALTO NAS MORTES, PARA 1.469 EM 24 HORAS, POR FERNANDO BRITO


Os números de hoje do Consórcio Nacional de Secretarias de Saúde recolocam o número de mortes pela Covid-19 no patamar onde de fato estão: bem acima das mil mortes diárias. Roram registrados, nas últimas 24 horas, 1.469 óbitos, bem acima das 1.159 anotadas ontem.
A razão foi uma falha nos registros referentes a Minas Gerais, que está em níveis recorde para o Estado, na ordem de 150 mortes por dia.
Com isso, o país chegou a 97.288 vidas perdidas desde o início da pandemia e, no sábado, atingirá a macabra marca de 100 mil óbitos.
Na mesma data, teremos, também, alcançado os 3 milhões de casos confirmados de contaminação pelo vírus Sars-Cov 2.

Do Tijolaço

terça-feira, 4 de agosto de 2020

CORREGEDORIA DO MPF VAI APURAR IRREGULARIDADES NA DISTRIBUIÇÃO DE INVESTIGAÇÕES DA LAVA JATO


A corregedoria quer saber se foram respeitados os critérios para designar o chefe de cada investigação.
A Corregedoria-Geral do MPF determinou a abertura de sindicância para apurar se houve irregularidade na distribuição de investigações conduzidas pela força-tarefa da Lava Jato em SP. A corregedoria quer saber se foram respeitados os critérios para designar o chefe de cada investigação.
A portaria 54/20, publicada no Diário Oficial do MPF nesta terça-feira, 4, determina que a apuração tem o objetivo de averiguar se as forças-tarefas cumpriram regras internas para a escolha dos responsáveis pela condução de inquéritos e outros procedimentos, como delações premiadas.
Se considerar que houve algum tipo de irregularidade, a procuradora regional da República Raquel Branquinho pode pedir instauração de inquérito. O prazo para conclusão da sindicância é de 30 dias.
Veja a íntegra portaria:
PORTARIA Nº 54, DE 30 DE JULHO DE 2020
Instauração de Sindicância.
A CORREGEDORA-GERAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL, no uso das atribuições legais que lhe são conferidas pela Lei Complementar nº 75, de 20 de maio de 1993, art. 65, II, e pelo art. 3º, V, do Regimento da Corregedoria do Ministério Público Federal (Resolução CSMPF nº 100, de 3 de novembro de 2009),
RESOLVE
Art. 1º Instaurar SINDICÂNCIA CMPF, autuada sob o nº 1.00.002.000060/2020-17, para apuração do estrito cumprimento das regras gerais de distribuição de procedimentos derivados de Forças-Tarefa da Operação Lava Jato.
Art. 2º Designar a Procuradora Regional da República RAQUEL BRANQUINHO PIMENTA MAMEDE NASCIMENTO, como autoridade sindicante, para cumprir os encargos desta designação, objetivando a realização das ações administrativas adequadas à apuração dos fatos descritos na Decisão nº 56/2020-ER, para ao final, oferecer relatório circunstanciado com proposição de arquivamento ou de instauração de inquérito administrativo disciplinar, se caso constatada falta funcional na espécie - considerada as disposições do artigo 236,da Lei Complementar nº 75/93.
Art. 3º Fixar o prazo de 30 (trinta) dias para a conclusão da apuração, a contar da data de instalação dos trabalhos, consideradas as eventuais prorrogações de lei.
Art. 4º Após a finalização dos trabalhos e a elaboração do respectivo relatório circunstanciado, a Sindicante deverá encaminhar os autos à Corregedoria do Ministério Público Federal.
Art. 5º A Sindicante tem sua sede na Procuradoria Regional da República da 1ª Região, Setor de Autarquia Sul, Quadra 5, Lote 8, Bloco "E" - Brasília-DF, CEP: 70.070-911.
Art. 6º Esta Portaria entra em vigor na data da sua assinatura.
Publique-se no Diário do Ministério Público.
ELIZETA MARIA DE PAIVA RAMOS
Do Migalhas

FAZER QUEIROZ “ASSINAR” RACHADINHA É PLANO QUE NÃO CONVENCE, POR FERNANDO BRITO

Nos presídios, quando um grupo criminoso resolve “apagar” algum detento que violou as regras da “irmandade”, é comum que se escolha alguém, já com muitas condenações e nenhuma esperança de liberdade, para “assinar o 121”, referência ao crime de homicídio do dito cujo.
Parece que esta foi a tática definida para Fabrício Queiroz assumir, sozinho, a responsabilidade da “rachadinha” do gabinete do então deputado estadual e agora senador Flávio Bolsonaro na Assembléia Legisltativa.
Se foi, é preciso que se conte com muita hipocrisia para que tenha o mínimo de veracidade para que alguém se convença disso.
Vejam o que diz o amigo da família há décadas, sob o juramento de testemunha:
Eu tive um contato com o senador — ele não era senador, era deputado, mas já estava eleito. Eu dei satisfação a ele do que aconteceu. Ele estava muito chateado, revoltado. Ele falou: ‘Não acredito que tu tenha feito isso, não acredito’.
Todos se recordam que Flávio, nesta época, deu uma versão do encontro que em que não parece em nada “revoltado” com o ex-assessor:
– Hoje o Fabrício Queiroz veio conversar comigo. Fui cobrar esclarecimentos dele sobre o que estava acontecendo. Ele me relatou uma história bastante plausível. Me garantiu que não teria nenhuma ilegalidade nas suas movimentações – disse ao sair da casa do presidente eleito, Jair Bolsonaro, no Rio.
Logo em seguida, apareceu a história que, segundo o filho presidencial, seria “bastante plausível”: que a dinheirama que circulava pela conta de Queiroz se devia a “rolos” que ele faria com a compra e venda de automóveis.
O relato desfia um rosário de contradições:
  • Por que Queiroz depositava dinheiro na conta da mulher de Flávio, na conta de Michele Bolsonaro e o usava para pagar mensalidades escolares e plano de saúde da família do chefe?
  • Por que, se pretendia ir para Brasília, com Flávio ou com Jair, foi afastado – bem como sua filha, que era do gabinete do futuro presidente, no dia 15 de outubro, se não houve o tal “vazamento” de que estava na mira do Ministério Público?
  • Por que, se estavam “revoltados” com ele, recebeu auxílio do advogado de Flávio (e de Jair) Frederick Wassef para ocultar-se em Atibaia?
  • De onde vieram os recursos em espécie para pagar um valor altíssimo de seu tratamento no Hospital Albert Einstein se ele não movimentou contas bancárias e não usou “rachadinhas” em proveito próprio?
E mais: como é que Flávio, se tratando de Queiroz, um amigo de décadas de seu pai – alguém íntimo a ponto de pedir-lhe “um empréstimo de R$ 40 mil – como é que não deu ciência ao então presidente eleito da gravíssima irregularidade que o havia “revoltado” ao ser narrada a ele não deu ciência disso a Jair Bolsonaro?
Queiroz pode tentar “assinar” o crime, mas as evidências mostram que ele não agiu por conta e proveito próprios.
Não vai funcionar e acaba por complicar Flávio e Jair que, no mínimo, sabiam de tudo e mentiram fingindo que nada conheciam do caso.
Do Tijolaço

segunda-feira, 3 de agosto de 2020

XADREZ DA LAVA JATO COMO BODE EXPIATÓRIO DA HIPOCRISIA NACIONAL, POR LUIS NASSIF

A Justiça de Transição que o país necessita não é a a execração pública de pessoas, não é ajoelhar no milho nem se vergastar em público. É uma desafio institucional, um pacto entre poderes, especialmente aqueles que mais responsáveis pelo macarthismo do período anterior, assumindo as culpas institucionais.
PEÇA 1 – A JUSTIÇA DE TRANSIÇÃO
Justiça de Transição é o sistema de julgamentos que sucede a cada período ditatorial. Consiste, de um lado, no levantamento da memória do período, de expor as chagas dos crimes cometidos, dentro do lema “para que não se esqueça, não se repita”. Depois, na reparação dos crimes cometidos. No caso das famílias de desaparecidos, em indenização financeira e pedidos oficiais de desculpas em nome do Estado que acobertou ou comandou os crimes. Depois, no financiamento de iniciativas que ajudem a lembrar os crimes – como, por exemplo, restauração de locais onde se praticava a tortura, construção de museus de memórias etc.
A lógica da Justiça de Transição é deixar claro para o país – e, especialmente, para quem praticou ou foi omisso em relação aos crimes – que tais crimes não podem passar impunes e não podem se repetir. No mínimo, há que se ter uma condenação moral e pública para constranger os que tentarem, no futuro, repeti-los.
No caso da ditadura brasileira, não houve a justiça de transição. Na Constituinte, alguns juristas   negociaram o esquecimento com as Forças Armadas, com o entendimento de que a Lei da Anistia absolvia todos os crimes, mesmo aqueles considerados crimes contra a humanidade.
Foi um acordo tão hipócrita que foram englobados nesse pacto até crimes cometidos após a promulgação da lei – como o atentado do Rio Centro e o assassinato da secretária da Ordem dos Advogados no Rio de Janeiro, assim como os atentados a bancas de revistas e tentativas de jogar bombas no centro do Rio.
Os responsáveis por esse pacto foram basicamente Sepulveda Pertence e Nelson Jobim que, mais tarde, tornaram-se Ministros do Supremo Tribunal Federal.
Nas Forças Amadas, o pacto resultou em um processo de afastamento dos homens dos porões – os militares que estiveram na linha de frente da guerra suja, matando, torturando. Houve recompensas, para que pudessem iniciar a vida civil. Alguns ganharam garimpos, como foi o caso do Major Curió. Outros tornaram-se seguranças de bicheiros. Muitos criaram esquadrões da morte em vários estados. Grande parte ajudou a criar as milícias, que passaram a ocupar territórios inteiros em alguns estados.
A falta da Justiça de Transição permitiu, finalmente, que as milícias e os subterrâneos ganhassem o poder, através da eleição de Jair Bolsonaro.
A revisão da Lei da Anistia repousa há anos na gaveta do Ministro Luiz Fux, do STF, dentro da obscuridade que marca os pedidos de vista da casa.
PEÇA 2 – A DITADURA CIVIL INSTALADA
Há enormes semelhanças entre a ditadura atual e o período pós 64, e entre os porões da ditadura e a Lava Jato.
Digo ditadura atual porque, desde que começou a campanha pelo impeachment, os direitos foram suprimidos no país – bem antes da chegada de Bolsonaro e preparando o terreno para ele. No período pós 2013, o discurso de ódio foi mais radicalizado ainda na mídia. Os Tribunais, especialmente de primeira instância, se envolveram no jogo político e toda forma de arbitrariedades foi cometida.
O Ministério Público Federal, em função da irresponsabilidade e exibicionismo dos procuradores da Lava Jato Curitiba e do Distrito Federal, tornou-se o bode expiatório responsável pelo estado de exceção. Mas o clima de exceção perpassou todos os poderes.
Algumas exemplos desse estado de exceção:
1. A humilhação dos funcionários do BNDES, submetidos em bloco a conduções coercitivas com acompanhamento de toda a mídia, por denúncia do Ministério Público Federal do Distrito Federal.
2. Julgamentos midiáticos em cima de denúncias falsas, como as acusações contra o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e operações contra o ex-governador de Minas Gerais Fernando Pimentel, posteriormente arquivadas, mas que alimentaram as manchetes durante meses.
3. Procurador entrando em presídios e humilhando políticos presos, no episódio envolvendo o ex-governador Sérgio Cabral Filho. Condução de Cabral algemado nas mãos e nos pés pelo delegado federal Igor de Paula.
4. Juíza intimando o cientista Elisando Carlini, por ter participado de um evento para discutir as propriedades medicinais da maconha.
5. Invasão da Escola Florestan Fernandes, com policiais civis paulistas arrombando janelas e intimidando idosos e alunos da escola.
6. O caso Rafael Braga, o catador de recicláveis preso em 2013 durante ato público do qual sequer participava, com suspeita de flagrante forjado. Contraiu tuberculose na prisão.
7. Jovens presos em uma operação em que houve espionagem por parte de um militar. Indiciados em um caso claro de flagrante forjado. Procuradores da República correram ao local, para impedir abusos contra a moçada. Foram denunciados ao Conselho Nacional do Ministério Público por colegas do MP de São Paulo, por se intrometer no trabalho dos colegas paulistas – que não compareceram ao local.
8. Juiz de Brasilia que quase matou José Genoino, ao proibir que recebesse atendimento fora da prisão, mesmo depois de ter sido submetido a uma cirurgia cardíaca de alta complexidade.
9. Prisão de lideranças da Frente de Luta pela Moradia em São Paulo, com falso flagrante imputando a elas práticas cometidas pelo tráfico.
10. Manipulação da sentença contra Lula pelo TRF4, com os três desembargadores majorando a sentença na mesma proporção, para impedir qualquer recurso, depois de constatado que a sentença inicial de Sérgio Moro, por engano, permitiria colocar Lula em liberdade.
11. Busca e apreensão na casa de um dos filhos do Lula pela Policia Civil paulista, tendo como justificativa um telefonema anônimo.
12. Grampo no Palácio do Planalto, a pretexto de controlar os celulares da Papuda.
13. Operação Carne Fraca, que comprometeu a carne brasileira nos mercados mundiais, transformando um problema de corrupção de fiscais sanitários em uma crise do setor.
14. Proibição para que diversas universidades ministrassem cursos sobre o golpe militar de 1964.
15. Ação concatenada de Tribunais Regionais Eleitorais, autorizando invasão de diversos campus universitários pela Polícia na véspera das eleições de 2014.
16. Ação coordenada da Polícia Federal e da Controladoria Geral da União permitindo invasão de campus universitários e humilhação de professores, levando ao suicídio o reitor Cancellier, da Universidade Federal de Santa Catarina.
17. O jornalista mineiro premiado, jogado na cadeia pela polícia civil de Minas Gerais, por críticas a Aécio Neves.
Nenhum desses abusos foi denunciado como tal pela mídia na época. Sequer provocou um respiro de indignação democrática. Nenhum dos responsáveis respondeu a qualquer processo por crime de abuso de autoridade e sequer a uma condenação pela mídia. Convalidou-se o Estado de Exceção com a mídia praticando o jornalismo de guerra e os tribunais aplicando o direito penal do inimigo.
Agora, depois que o furacão Bolsonaro mostrou um perigo concreto, há um aggiornamento rápido e oportunista dos principais agentes do período de trevas, na mídia e nos tribunais superiores, assumindo a função de arautos da democracia e dos direitos. Pode-se criticar a Lava Jato sem risco.
Os crimes contra a democracia foram esquecidos e, como tal, estão sujeitos a serem repetidos.
PEÇA 3 – O PAPEL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Assim como a mídia, desde o mensalão o STF avalizou as arbitrariedades e ilegalidades da Lava Jato e convalidou aquelas politicamente mais relevantes, todas – repito TODAS – as que tinham implicações diretas em favor do impeachment e da prisão de Lula.
1. A votação da prisão após 2a instância, que poderia abrir espaço para a libertação de Lula antes das eleições. A Ministra Rosa Weber, originalmente contra a prisão em 2a instância, mudou seu voto em nome da “colegialidade” – isto é, para não ficar contra a maioria. Seu voto, por ser de desempate, definiria a maioria. Ou seja, antes de ser proferido, não havia maioria e, portanto, nenhuma razão para a tal colegialidade. Seu voto foi recheado de citações de juristas internacionais. Um repórter da Folha, na época, consultou a jurisprudência do STF e constatou que a maioria dos juristas citados constavam de votos do Ministro Luiz Edson Fachin, jamais de Rosa Weber.
2. Os algoritmos do Supremo e do Tribunal Superior Eleitoral, com os sorteios dos casos mais sensíveis sempre caindo com Ministros dos quais já se sabia de antemão a posição  – os de Lula e Dilma com Ministros anti-PT; os de Aécio Neves e José Serra com Ministros pró-PSDB, em ambos os casos os mesmos.
3. A autorização para a prisão de um senador da República, com base em uma grampo induzindo a uma informação falsa – a de que Lula e André Esteves, do BTG Pactual, teriam proposto uma fuga a um dos delatores da Petrobras. Notícia falsa, mas que permitiu novas prisões preventivas.
4. Impedimento de Lula assumir a Casa Civil de Dilma com base em um grampo triplamente falso: fora do prazo permitido; envolvendo conversa com a presidente da República, portanto fora da alçada da 1a instância; por não dizer respeito aos fatos investigados, não poderia ter sido divulgado. Mesmo assim, foi acatado pelo STF.
É canhestra a tentativa de atribuir os recuos do STF a um mero Twitter do general Villas Boas. Ou mencionar algumas discordâncias do STF em relação à Lava Jato, em episódios de menor relevância, como álibi para apagar a história do período. A opinião militar ganhou peso porque, antes disso, o jornalismo de guerra convalidou o vale-tudo contra os adversários políticos, transformados em inimigos.
Desde o mensalão, o fuzilamento moral pela mídia impôs o discurso de ódio, o primado de que os fins justificam os meios, promovendo  escrachos em aeroportos contra qualquer Ministro que ousasse conceder o reconhecimento dos direitos dos réus, por mais inexpressivos que fossem seus gestos – meramente acatando um embargo de declaração, por exemplo.
PEÇA 4 – O NOVO PACTO DA ANISTIA
Assim como no fim da ditadura, esboça-se atualmente um novo pacto de anistia.  É relevante por duas coisas: por explicitar a ansiedade dos pactuadores em superar rapidamente o clima irrespirável do momento; mas por se saber claramente, hoje em dia, os resultados de sair dos períodos de exceção sem uma justiça de transição, sem punição – ainda que meramente moral -, uma autocrítica, um pedido público de desculpas pelo mal que causaram, abrindo espaço para a ascensão das bestas do Apocalipse na condução do país.
A falta de punição permite a instrumentalização dos princípios e a reiteração dos abusos. O sujeito, jornalista, político, homem público, Ministro, pula de um barco para outro e pode voltar para o barco inicial sem risco de ser exposto e podendo retornar daqui a pouco ao barco do golpismo.
A força desses homens-bambus (que acompanham o movimento dos ventos) reside em sua exposição pública. A imagem pública de alguém deveria ser a síntese dos atos que pratica. E um dos atributos é a coerência em torno de princípios claros. Bolsonaro é coerente, no alinhamento com a barbárie. Mas os novos campeões da democracia, não são. Nós sabemos o que eles fizeram nos últimos verões.
Não se trata de revanchismo, de criminalizar pessoas, mesmo porque o grande pacto nacional tem que se dar em torno de um amplo processo de pacificação. Mas se trata de expor e condenar as práticas nas quais incorreram.
Juristas progressistas, que avalizaram o impeachment, precisam admitir que transformar um problema contábil em crime de responsabilidade é uma violência contra a democracia. Ministros do STF que aceitaram o estupro da Constituição, sob o argumento de que a presidente tinha perdido condições de governabilidade, tem que assumir que seu papel é defender a Constituição. Imprensa que praticou, e ainda pratica, o jornalismo de guerra, tem que buzinar aos quatro cantos que os princípios legitimadores do jornalismo são a defesa dos direitos e a diversidade de opiniões. O PT tem que admitir que o excesso de pragmatismo político comprometeu todo um projeto popular e expôs aos inimigos a Petrobras.
Sem essa purgação dos pecados, tudo será como antes. Ou seja, se os fins procurados exigem garantismo, tornam-se garantistas; se os fins exigem punitivismo, punitivistas se tornam, sem a menor preocupação com a coerência. Voam da intolerância mais abjeta para o legalismo mais defensável sem serem cobrados. Qual a garantia de que, passado o fantasma Bolsonaro, não retomem o discurso de ódio do período anterior, sabendo que a memória publicada e televisada tem prazo de validade, não quer saber os pecados que foram cometidos.
É esse país de hipócritas que se deseja legar para as próximas gerações?
Há um pacto em andamento, similar ao pacto da anistia, que consiste dos seguintes passos:
* Atribuam-se todos os abusos do período à Lava Jato Curitiba, ao brilho inexcedível de Sérgio Moro e Deltan Dallagnol, que conseguiram ludibriar mídia, Supremo, tribunais superiores.
* Considerem-se todos os escorregões do STF como fruto da ação incomparavelmente maliciosa de Moro explorando a boa fé de Ministros ingênuos (levante alguns casos irrelevantes, em que decisões de Moro foram reformadas, para defender a ação isenta do Supremo no período).
* Atribua a adesão incondicional da mídia à Lava Jato como reflexo legítimo da indignação com a corrupção, mesmo que tenha feito a divisão entre os corruptos do lado de lá e os do lado de cá, e poupado os amigos.
* Esqueça que todos os abusos da Lava Jato foram testemunhados por repórteres setoristas, alocados em tempo integral da operação e que esconderam as torturas inflingidas a presos, as retaliações contra delegados que reagiram contra as ilegalidades. Diga que foi a astúcia incomparável de Moro que permitiu levar a mídia no bico e todos se beneficiaram profissionalmente da parceria por idealismo desprendido.
PEÇA 5 – MORO E A LAVA JATO
A figura pública de Sérgio Moro foi exposta pela primeira vez como Ministro da Justiça. Na Lava Jato era apenas o juiz monossilábico que se manifestava através de sentenças mas que, nas audiências, mostrava uma timidez surpreendente para o personagem criado pela mídia.
Conhecendo, agora, ele, Deltan Dallagnol e seus colegas, dá para apostar na narrativa dos seres cerebrais, que manipularam STF, mídia, tribunais superiores? É evidente que não. Foram apenas instrumentos de um jogo muito maior. Aliás, ambos, juiz e procuradores, foram a parte mais viciada da aliança nacional pelo impeachment, pelo excesso de pequenas ambições, pelo discurso salvacionista e pelo deslumbramento tipicamente provinciano.
Na Vazajato, juiz e procuradores, que se tornaram a principal peça para derrubar uma presidente da República, se encantavam com o mercado de palestras, com os convites para salões grã-finos, com os cachês recebidos, em fazer bonito para a sua Igreja e para seu banco de investimento de predileção, ou em exibir fotografias de viagens internacionais em seus perfis, em uma demonstração típica de agentes políticos microscópicos, que agiam apenas como bactérias oportunistas sobre o tecido social e político do país.
Transformá-los em bodes expiatórios não melhorará em nada a democracia brasileira. Apenas mudará a guarda para as próximas aventuras antidemocráticas, para as quais serão convocados novos personagens dos porões.
PEÇA 6 – O NOVO ARREGLO DA ANISTIA 
A Justiça de Transição que o país necessita não é a a execração pública de pessoas, não é ajoelhar no milho nem se vergastar em público. É uma desafio institucional, um pacto entre poderes, especialmente aqueles mais responsáveis pelo macarthismo do período anterior, assumindo as culpas institucionais.
Um primeiro ensaio de autocrítica seria a defesa intransigente de um aprofundamento da democracia e não apenas da perna penal da Lava Jato. Por exemplo, cobrar do Procurador Geral da República Augusto Aras a recomposição da área de direitos humanos que tem em cargo chave, hoje em dia, um procurador terraplanista de ultra-direita. As áreas de direitos humanos têm sido desmontadas no âmbito da Procuradoria Geral da República, sem um centésimo da repercussão dos temas da Lava Jato. Apoiar o PGR sem exigir a contrapartida da recuperação da defesa dos direitos difusos e das minorias, é hipocrisia.
Um segundo ensaio seriam manifestações de Ministros do Supremo – especialmente os que mais se lambuzaram com o clima da Lava Jato – de afirmação dos princípios constitucionais e o fim da manipulação das eleições com suas decisões. E uma defesa firme dos direitos daqueles que eram e continuam sendo tratados como “inimigos’.
Um terceiro ensaio seria a mídia ir além das meras manifestações de fé na democracia e assumir a defesa intransigente das vítimas do outro lado – lideranças rurais e indígenas assassinadas, jornalistas independentes massacrados por ondas de processos, o genocídio na periferia etc.
Principalmente, o reconhecimento que foi essa guerra política irresponsável, essa exploração do ódio, do direito penal do inimigo que levou o Brasil ao ponto mais baixo da degradação moral, com a eleição e, mais do que isso, a contemporização com a presidência de Jair Bolsonaro.
Do GGN

domingo, 2 de agosto de 2020

“PARCIALIDADE DE MORO É ESCANDALOSA. MAIS ESCANDALOSO APENAS SE O STF NÃO A RECONHECER”, DIZ CELSO TRÊS

Celso Três. Foto: Reprodução/YouTube
O Supremo Tribunal Federal ainda não sabe quando retornará aos trabalhos presenciais, justamente pelo temor de disseminação da Covid-19. A dúvida da data de retorno torna também incertos os destinos de alguns julgamentos, dos mais importantes deste ano. Um deles é o da suspeição de Sergio Moro na condenação do ex-presidente Lula no caso do triplex do Guarujá.
O Habeas Corpus sobre a parcialidade do ex-juiz federal poderia ser julgado em sessão virtual, mas o ministro Gilmar Mendes já disse que o julgamento ocorrerá em sessão presencial, que não tem data para ocorrer.
Para o procurador Celso Antônio Tres, 57, a parcialidade de Moro é escandalosa. “Mais escandaloso apenas se o STF não a reconhecer”, disse o gaúcho de Tapejara, “pai” da “lava jato”, que na década de 1990 atuava nas investigações da CC5 do Banestado.
O HC 165.973 está com o ministro desde dezembro de 2018, depois que votaram Luiz Edson Fachin e Carmem Lúcia. Eles foram contra a concessão do HC, mas podem mudar o voto. Gilmar pediu vistas.
Em junho de 2019, depois que estourou o escândalo da “vaza jato”, o ministro disse que devolveria a ação para julgamento e sinalizou que votaria pela parcialidade de Moro. Em seguida, devem votar Ricardo Lewandowski e Celso de Mello, todos pela 2ª Turma do Supremo.
Porém, em razão da decisão de Gilmar de só reiniciar o julgamento quando as sessões presenciais voltarem, isso poderá ocorrer depois da aposentadoria de Celso de Mello, com a presença de um ministro indicado pelo presidente Jair Bolsonaro e aprovado pelo Senado. O decano completa 75 anos em novembro deste ano.
Sobre o recente “enfrentamento” do consórcio de Curitiba contra as ordens da Procuradoria-Geral da República, Tres lembrou que operações se iniciaram no segundo governo de Fernando Henrique Cardoso (1999-2002), quando a Polícia Federal ganhou mais musculatura.
“Desde lá, são pautas permanentes. Geraram big data de informações. Sempre foram partilhadas pacificamente. A “lava jato” inventou direito autoral de operação. Acho que logo buscarão seus direitos no Ecad. Em suma, o parquet, os dados, apurações, são meus. Que faria de indevido o PGR Aras com os dados? Processaria inocentes? Pode, aí o temor, descobrir o limbo, submundo descortinado pelo Intercept. Pessoas que foram investigadas indevidamente, que nunca foram processadas. Que digam eles, objetivamente, no que Aras impede que investiguem ou denunciem.”
Leia abaixo os principais trechos da entrevista de Tres à ConJur, feita por telefone e e-mail.
ConJur — Sergio Moro atribuiu-se a prevenção da “lava jato” porque foi juiz da delação de Alberto Youssef no caso Banestado. A autodenominada “força-tarefa” inicia-se com a investigação da família do deputado José Janene (1955-2010), e Moro vincula esse inquérito à sua vara, pois quem estaria lavando o dinheiro da família seria o “primo” [Alberto Youssef]. E, segundo o então consórcio recém-formado, descumprindo o acordo, cujo processo já havia sido arquivado. Existe prevenção de caso encerrado?
Celso Antônio Tres — Paraná não é sede da Petrobras, tampouco de qualquer de suas unidades que teve desvios. Igualmente jamais foi o locus delicti da corrupção, hegemonicamente urdida em Brasília, onde agentes políticos têm domicílio funcional. Em 2016, a ConJur já atestava que no espectro de mil mandados judiciais [busca domiciliar, prisão, condução coercitiva], ínfimos 3% foram cumpridos naquele estado, provando que lá nada acontecera. O ex-procurador-Geral da República Rodrigo Janot, em seu livro “Nada menos que tudo”, diz que o procurador natural da “lava jato” seria Pedro Soares, não sabendo porque declinou a Deltan Dallagnol.
Declinação não pode ser por reles ato de vontade. Há de haver causa de impedimento ou suspeição. Na realidade, a “lava jato” em Curitiba procedeu tal qual têm agido os americanos com seu Foreign Corrupt Practices Act — FCPA, consoante também explicada pela ConJur, em reportagem mês passado. Ou seja, foro universal, processando quem bem entendem.
Basta ver o introito das sentenças, exaustivo exercício de conexão a justificar a competência. Um acordo de [Alberto] Youssef, a pedido do Ministério Público do Paraná, foi anulado pela Justiça Estadual. Eis que ele voltara delinquir. Tudo, porém, foi avalizado a reboque do tsunami pela derrubada do governo Dilma, tendo ápice na divulgação por Moro da fala entre a presidente e Lula, clandestinamente interceptada, sabido estopim do impeachment, incendiando o país à decapitação da chefe do Executivo.
Aliás, Moro, não por coincidência, também está no epicentro de espúria divulgação da reunião ministerial de Bolsonaro por Celso de Mello [em 22 de abril último], igualmente tendo por única função derrubar o governo, inútil à investigação, trazendo brutais prejuízos ao país, algo que nunca seria feito em outra nação.
ConJur — Qual a chance do Supremo declarar a suspeição de Moro na condenação do ex-presidente Lula?
Tres — Rogo vênia para indicar um artigo da Conjur, do juiz e professor Carlos Alberto Garcete, abordando o código de ética dos juízes norte-americanos. Igualmente abordado pela Conjur, escrito de Antonio Vieira, professor em Salvador: “Como a justiça dos EUA tratou casos de troca de mensagens entre juízes e promotores, durante julgamentos criminais”. A imparcialidade não se deduz se da seara subjetiva, dolo ou não do julgador. Tampouco é presumida. É ônus estético da autoridade, conduta objetiva, ostensiva, pois é dela que emana a confiança da sociedade na Justiça.
Isso vale, inclusive, para o Ministério Público. Parte sim, porém necessariamente imparcial, pois na acusação deve estar movido, não por alvos, consoante confessa dos chavões das operações, sim pelo encalço, sempre balizado pelo devido processo legal, de esclarecer autoria do fato criminoso. Diz o Conselho da Europa, órgão de 1949, reunindo os ministros dos Estados, recomendação 19/2000, sobre atuação do Ministério Público: “O MP deve ser objetivo e justo durante o o julgamento. Deve, em particular, zelar para que o tribunal disponha de todos os elementos de fato e de direito necessários a uma boa administração da justiça”. Portanto, o problema central não é espetacularizar denúncia com PowerPoint. Veja que até hoje, embrenhado e assumido como ator político, Sergio Moro exibe desabrida catilinária contra Lula. Olvida que foi o juiz dele, agora apenas expressando a repulsa que sempre cultivou pelo réu, causa confessa de suspeição. A parcialidade de Moro é escandalosa. Mais escandaloso apenas se o STF não a reconhecer.
ConJur — Até quando pode durar a “lava jato” como o país a conheceu até 2018?
Tres — Confessa o big boss da “lava jato”, Rodrigo Janot, no livro “Nada Menos que Tudo” (página 41), que o Aras [procurador Vladimir] se lembrou, então, de um diálogo que teve com com um procurador  menos incensado que Dallagnol, mas, certamente, o principal estrategista da força-tarefa no Paraná. “Segundo ele, disse que a intenção da força-tarefa era “horizontalizar para chegar logo lá na frente”, e não “verticalizar” as investigações, e que, por isso, teríamos dificuldade em fundamentar os pedidos de inquérito. O que seria “horizontalizar para chegar logo lá na frente”? Não entendi direito o conceito. Creio que meus colegas também não. Só depois de muito tempo, quando vi Sergio Moro viajando ao Rio de Janeiro para aceitar o convite para ser o ministro da Justiça do governo Jair Bolsonaro, é que me veio de novo à cabeça aquela expressão”.
Então, já cumprido o desiderato da “lava Jato”? Não. Eis que, uma vez mais capitaneado por Moro, agora a bola da vez é o próprio Bolsonaro, a quem se busca destronar, reprisando a práxis de usurpar a decisão do povo na eleição.
Na Itália, operação “mãos limpas” — que elegeu [Silvio] Berlusconi, homólogo de Bolsonaro —, decantado standard da “lava jato”, condenou cerca de 3 mil acusados. Quantos temos no Brasil? Em seis anos da “lava jato”, se você buscar a média de denúncias criminais de procuradores pelo país que atuam na área criminal, individualmente, eles fizeram — inobstante sem similar performance em palestras, seminários, viagens, eventos, celebridades — mais denúncias que a operação. Óbvio que, na média, sem a complexidade e importância da “lava jato”. Porém, também óbvio que há um batalhão de procuradores, quando há apenas dois juízes federais, titular e substituto. Pergunte a Deltan e cia. se gostariam de integrar força-tarefa à repressão da momentosa e gigantesca fraude no recebimento de auxílio emergencial? Não há interesse. Tal qual não há ibope.
ConJur — O senhor foi o precursor do caso Banestado, embrião do que seria a “lava jato” uma década depois. Porque a segunda obteve o principal objetivo traçado pelo núcleo do consórcio, com a condenação em tempo recorde do ex-presidente Lula, ao contrário do embrião, que teria morrido de inanição em 2003?
Tres — Minha atuação foi em Cascavel (PR). No contexto de efervescentes CPIs dos Precatórios e do Sistema Financeiro, clara leniência do Banco Central na controladoria das contas CC5 [Carta Circular nº 5 do Bacen-1969], destinada a enviar dinheiro a domiciliados no exterior. Obtive na Justiça Federal quebra de sigilo de todas as remessas do país, ocorridas entre janeiro de 1992 a dezembro de 1998, cujo total —  excluídos valores até US$ 150 mil — pertencente a milhares de pessoas físicas e jurídicas, somou US$ 124 bilhões. De per si, envio nada tem de ilícito. Deveria ser apurado a tributação ou não dos valores, bem assim sua origem, podendo ser produto de crime. Assim, pedi à Justiça distribuição da apuração a todo o país, de acordo com o domicílio fiscal dos remetentes. A Receita Federal foi eficaz, tendo muitas autuações. O Ministério Público Federal, não. Tivemos poucas investigações que prosperaram. Muitas figuras exponenciais da República, pródigos no discurso em prol da moralidade pública, figuravam como remetentes de milionárias somas. Portentosos grupos de comunicação tiveram valores de expatriação revisados e rebaixados pelo Banco Central. Presumem-se todas elas legítimas. Passados 20 anos, até assassinato hediondo estaria prescrito. O Banestado era um dos tantos que atuavam nas CC5.
No Paraná, também tivemos a Araucária, instituição sem ativos, expatriando valores bilionários com sendo seus, claramente disfarçando titularidade de terceiros. A força-tarefa CC5, criada pelo PGR Claudio Fonteles em 2003, já com Sergio Moro atuando em Curitiba, com vários procuradores que depois criaram a “lava jato”. Fizeram um bom trabalho, dentro dos limites de então.
Muitos fatos eram anteriores à lei de lavagem de dinheiro. A grande defecção foi não identificar os destinatários dos recursos no exterior, consoante êxito da “lava jato”. Consta que no Banestado de Nova York, conta matriz (beacon hill), teriam de titulares a elite pátria. O PT, assumindo em 2003, porém, nunca fez força para levar a apuração adiante.
ConJur — O senhor já disse que os lavajatistas cometeram “erros capitais” no decorrer de toda a operação: atropelaram o devido processo legal, flexibilizaram medidas, como conduções coercitivas e buscas e apreensões a rodo “para assustar seus alvos” e, “nos contratos de delação premiada, não incluíram nenhuma cláusula que evitasse o desemprego e a quebradeira em massa” de empresas que negociavam com a Petrobras. Além disso, politizaram as operações, “focando na destruição de alguns partidos”.
Tres — A “lava jato” é a maior investigação da história. Depois dela, tudo será menor, ibope depreciado. Procuradores celebrizaram sua atuação ad aeternun. Volume e status da elite política e do capital que interage com o Estado, valores desviados — parte recuperados — , repercussão no centro do poder, definindo impeachment e eleição de presidentes, são inigualáveis.
Todavia, no seu épico transcurso, padeceu de três graves desvios: a) econômico; b) político; c) devido processo legal. Sabido que a diferença entre o remédio — repressão à corrupção — e o veneno — destruição do bem público, empresas, empregos, democracia — pode estar na dosagem (modus operandi da investigação). Portanto, a questão não é investigar ou não, mas a maneira de fazê-la. Não pode ser operação de Pirro [rei Pirro do Epiro, após guerra contra os romanos na qual teve pesadas perdas (280 a.C.), respondeu a quem o louvava pelo sucesso: “mais uma vitória dessa e estaremos completamente arruinados”].
Precioso standard de modus operandi, autêntica aula magna, foi o mensalão. Aparato investigatório insignificante, PGR Antonio Fernando, breve temporis, sem danos colaterais, produziu imputação na Suprema Corte.
Já a operação carne fraca foi desastroso exemplo oposto. Apunhalou a exportação da proteína brasileira, raro segmento que somos potência mundial, dizimando milhares de empregos. Bastava investigar os ínfimos desvios sem estardalhaço, em suma, sem operação. Aliás, para que operação? O jornalista Alberto Dines dizia que o impeachment de Collor, quando a imprensa foi protagonista de várias revelações, contaminou a mídia brasileira, no sentido de conceituar jornalismo competente aquele que derruba governo, ou seja, aquele que desfaz o que o povo fez quando elegeu a autoridade. Esse vício contaminou o Ministério Público brasileiro. Atacar e derrubar político virou láurea.
Soma-se a isso à demofobia que permeia o estamento judiciário nacional. Entendem que o povo é inepto, escolhe erroneamente seus representantes, devendo, portanto, ser tutelado. Não é contra PT, PSDB, PMDB, PP. É contra a política. Nisso, a distopia de Deltan quando projetou monumento à “lava jato”, consoante revelou o “The Intercept Brasil”, simbolizando coluna da política tombada pela da Justiça, a qual, depois da batalha, remanescia triunfantemente ereta.
Veja trecho da mensagem do PGR Janot dirigida a todos os membros do MPF quando ele encerrou seu mandato: “O Brasil é nosso! Precisamos acreditar nessa ideia e trabalhar incessantemente para retomar os rumos deste país, colocando-o a serviço de todos os brasileiros, e não apenas da parcela de larápios egoístas e escroques ousados que, infelizmente, ainda ocupam vistosos cargos em nossa República”.
CNJ e CNMP têm pesquisas a respeito do perfil dos agentes da Justiça. É uma elite branca na nação recordista mundial da desigualdade. Concursados nas disputas mais acirradas da nação, capazes, na média muito bom nível de probidade e dedicação. Mas elite branca, com honrosas exceções. Cada pessoa enxerga o mundo das frestas de sua biografia.
Acusar e julgar exige empatia, alteridade com o imputado e a vítima. Isso não está nos livros. Está na vida. Bem diz Lula: “todos falam da fome; eu passei fome; quem entende melhor de fome? Rodrigo Janot e Deltan Dallagnol são elite branca. Não têm a menor ideia do quanto relevante ter emprego, carteira assinada, mesmo que por indigno salário. Por isso, sequer cogitaram de proceder delações, acordos tendo por prioridade máxima o seguimento da atividade econômica, manutenção dos investimentos e empregos. Espoliando a Petrobras, vítima da delinquência, foram colaboracionistas para que os americanos crucificassem a estatal. Pior. Ainda inventaram fundação para propagandear contra a corrupção. A ConJur já repercutiu vários estudos de gabaritados economistas, todos atestado o colossal desastre econômico provocado pela “lava jato”.
Os valores recuperados são insignificantes em face dos prejuízos. Exemplo aqui gaúcho, Porto de Rio Grande, dezenas de milhares de empregos foram ceifados porque exportaram a construção das plataformas da Petrobras à China. Igualmente, nada sabem de política, necessidade que o povo busca, realidade de uma campanha eleitoral. Exemplo típico é que criaram o inexistente delito de caixa 2 eleitoral. Os próprios, na proposta das dez medidas contra corrupção, criminalizavam a prática, atestando sua atipicidade.
Enfiaram na falsidade (artigo 350 do Código Eleitoral). Lei quando sequer existir prestação de contas. Sabido que falso existe apenas quando, de per si, o ato tem valor jurídico. Exemplo, atestado de domicílio eleitoral, valor em si relevante aos processo eleitoral. Levado ao cabo, todas as prestações de contas têm falsidade. Simples, espontânea e irrelevante entrega de santinho por simpatizante a eleitores é auxílio, caixa 2 não declarado.
O jurista argentino Sebastián Soler diz que tipo penal deve apontar não apenas o que é crime, mas também o que não é delito.
Quando toda conduta vira crime, é porque não há delito. Pior. Inventaram o caixa 2 e depois promoveram patética cruzada contra o STF porque ele disse o óbvio, sabido desde sempre, qual seja, sendo a Justiça Eleitoral de natureza especial, ela prevalece sobre a Justiça Comum.
ConJur — Qual a avaliação do senhor sobre o projeto de centralização das investigações anticorrupção na Procuradoria-Geral da República?
Tres — Pior que unificada, as forças-tarefas sempre foram personalizadas. Regra geral, amigos do procurador natural. Extremamente competentes, mas amigos. Curiosa a hipocrisia do discurso republicano. Moro teve um chilique porque Bolsonaro pretendia amigo da família na direção da Polícia Federal. Quem Moro levou para o Ministério da Justiça? Encheu, lotou, incluindo cargos sem qualquer afinidade, de delegados da Polícia Federal, seus amigos em Curitiba.
ConJur — Existe razões para tanto barulho dos procuradores de Curitiba diante da ação do comando em Brasília?
Tres — Óbvio que não. Operações iniciaram nos segundo governo de FHC, quando a Polícia Federal alçou estruturação. Desde lá, são pauta permanente. Geraram big data de informações. Sempre foram partilhadas pacificamente. A “lava jato” inventou direito autoral de operação. Acho que logo buscarão seus direitos no Ecad. Em suma, o parquet, os dados, apurações, são meus. Que faria de indevido o PGR Aras com os dados? Processaria inocentes? Pode, aí o temor, descobrir o limbo, submundo descortinado pelo Intercept, pessoas que foram investigadas indevidamente, pessoas que nunca foram processadas e assim por diante. Que digam eles, objetivamente, no que Aras impede que investiguem ou denunciem.
Augusto Aras, amplamente aprovado no Senado por todas as forças políticas e que é uma figura altamente respeitável, quer apenas uma coisa da força-tarefa da “lava jato”: prestação de contas. Apenas isso. Conformidade e controle.
ConJur —  Há falta de humildade, autocrítica, que diaboliza membros do STF que não atendem os anseios de integrantes da autodenominada “força-tarefa”?
Tres — A “lava jato” pretendeu fazer a lei (10 medidas contra a corrupção), investigar, acusar, condenar — conluio com Moro revelado pelo Intercept — e tutelar todas as instâncias do Judiciário. Alguém precisa avisar a operação do anacronismo. Isso realmente podia, mas antes de Montesquieu, no absolutismo do rei Luís 14, “o estado sou eu”. Aliás, de Montesquieu, preciosa lição à “lava jato”: “até a virtude precisa de limites”. Veja o momentoso caso da crítica de Deltan a Toffoli, em razão da cassação da busca e apreensão no gabinete do senador José Serra. Fato é de 2014, delito de per si ínfimo, caixa 2 eleitoral, determinada devassa indiscriminada de crasso e clássico desvio de finalidade: a) não se quebra sigilo para desvendar delito prenunciado em provas; quebra-se para, a esmo caçar, encontrar algum delito, prova fortuita preordenada; b) procede-se assim à desmoralização do Poder Legislativo; vencidos seis anos do fato, Estado-Acusação, até então incompetente e relapso em produzir imputação por delito anão, decide ostentar serviço.
ConJur — Como o senhor avalia o que restou do projeto anticrime tão propagandeado por Moro e os amigos de Curitiba, sancionado por Bolsonaro na véspera do Natal do ano passado?
Tres — Moro e “lava jato” sempre crucificaram a legislação vigente em praça pública. A lei sempre padece em silêncio em face de seus hermeneutas tendenciosos e demagogos. Não foi com a lei vigente que a “lava jato” procedeu suas façanhas? Então, como será ela tão ruim. Pacote anticrime tinha aspectos positivos. Alguns hediondos, a exemplo da exculpação da polícia em atentados contra vida, que Moro inseriu a pedido de Bolsonaro. No geral, bom resultado, especialmente na parte rejeitada.
ConJur —  O senhor já disse que delator é assistente da acusação remunerado pelo Estado mediante a moeda da impunidade. Como aperfeiçoar esse instrumento?
Tres — O STF errou gravemente quando conferiu ao Ministério Público poder absoluto em negociar a delação, ou seja, podendo ele exculpar qualquer delito, obtenha provas consistentes ou não contra outrem, seja qual for o crime desvendado, menos ou mais grave, bem assim a relevância da participação do seu autor. Isso é um poder de fazer e desfazer da lei que nenhum outro Poder, sequer o STF, goza.
Evidente que no conceito de legalidade da delação sempre esteve contido seu sentido lato, da proporcionalidade (delinquente/delito exculpado & delito/delinquente imputado), eficácia (prova condenatória produzida pelo delator), vedação à proteção insuficiente (delação não pode isentar lesão a bem jurídico relevante) e assim por diante. Tudo isso deve ser avaliado pelo juiz. Está no STF o caso do Paraná, onde o Ministério Público isentou de estupro contra menor à obtenção de prova contra corrupção. Com a recente mudança da legislação, inserida a adequação, o panorama deverá mudar.

BRIZOLA E A GLOBO, A HISTÓRIA NO “METEORO”, POR FERNANDO BRITO

Não tinha visto, até ser avisado, ontem, por meu filho, o ótimo minidocumentário sobre o confronto entre Brizola e a Globo pela construção do Sambódromo. E é excelente, reproduzindo com grande precisão – faltou mencionar apenas que a Passarela do Samba era, fora do Carnaval, uma imensa escola para 5 mil crianças – e contextualiza fatos para quem – que inveja! – tem 20 ou 30 anos e não pode lembrar do que se passou décadas atrás.
É do Meteoro.doc, canal do Youtube criado por Álvaro Borba e Ana Lesnovski, que foram buscar imagens de arquivo preciosas para a construção dos antecedentes do histórico “Direito de Resposta” que Cid Moreira foi obrigado a ler em março de 1994, onde registro e agradeço o tratamento gentil e generoso que teve meu modesto papel nos fatos, o qual levei 20 anos para narrar.
Vale a pena assistir a este e outros vídeos do Meteoro e, se puder, increver-se, como fiz, no seu canal.
Do Tijolaço

sábado, 1 de agosto de 2020

ARAS BATE-BOCA E ACUSA PROCURADORES QUE DEFENDEM A LAVA JATO DE PLANTAR FAKE NEWS

Discussão entre Aras e o procurador Nicolao Dino marcou sessão do Conselho Superior do MPF para discutir orçamento da entidade.
Foto: Sérgio Lima/Poder360
O embate entre o procurador-geral da República, Augusto Aras, e procuradores que defendem a Operação Lava Jato acirrou nesta sexta-feira, 31 de julho, durante sessão do Conselho Superior do Ministério Público Federal (MPF) realizada por videoconferência. 
O encontro virtual, a fim de discutir a proposta orçamentária da entidade para 2021, começou com um bate-boca entre Aras e o procurador Nicolao Dino, que comentou a oposição do chefe do MPF sobre a força-tarefa de Curitiba em entrevista exclusiva ao jornalista Luis Nassif nesta semana
Dino foi o primeiro a falar na sessão e usou seu tempo para ler carta aberta, subscrita pelos subprocuradores Nivio Freitas, José Adonis e Luiza Frischeisen, em crítica às últimas acusações de Aras contra o modus operandi da Operação – criada em Curitiba. 
“Vossa Excelência, com o peso da autoridade do cargo que exerce, e evocando o pretexto de corrigir rumos ante a supostos desvios das forças-tarefas, fez graves afirmações em relação ao funcionamento do Ministério Público Federal em debate com advogados”, disse Dino. 
No entanto, o procurador foi interrompido pelo chefe do MPF. Aras disse para Dino focar no tema da reunião. “[Aqui] não será um palco político de Vossa Excelência e de ninguém”, afirmou Aras.
O embate não parou por aí. No final da Sessão, Aras acusou os procuradores de vazarem informações suas à imprensa e plantar notícias falsas contra sua gestão e sua família.  
“Todas as matérias que saem na imprensa, é um procurador ou uma procuradora que fala. O anonimato mais do que inconstitucional e ilegal, é covarde. Eu não tenho medo de enfrentar nenhum argumento, eu tenho o costume de enfrentar tudo o que faço e digo e não tenho receio de desagradar”, disse Aras. 
O chefe do MPF ainda afirmou que tem provas sobre as acusações contra os procuradores e já encaminhou o material para investigação. 
“Não me dirigi, em um evento acadêmico, se não pautado em fatos e em provas que se encontram sob investigação da Corregedoria Geral do Ministério Público Federal e do Conselho Nacional do Ministério Público. Caberá a eles apurar a verdade, a extensão, a profundidade e os autores, os coautores e os partícipes de tudo o que declarei. Porque me acostumei a falar com provas, tenho provas e essas provas já estão depositadas perante os órgãos competentes. De logo, registro que não houve nenhum protesto, houve fatos e provas que estão entregues e sob apreciação dos órgãos oficiais competentes”, afirmou Aras. Assista a sessão:
Do GGN, com informações do jornal Estado de S. Paulo