De
um bravo Ministro do Supremo Tribunal Federal, anos atrás ganhei um livro do
jurista italiano Luigi Ferrajoli e a crença de que o século 21 seria o século
do Judiciário, trazendo luzes, direitos, sede de Justiça, o poder
contra-hegemônico levando a justiça às minorias e aos órfaos da política.
O
Século 20 havia sido o do Legislativo, no início impondo o poder da maioria
sobre os direitos das minorias, insuflado por massas ululantes e levando ao
poder ditadores terríveis. Depois da Segunda Guerra, as maiorias legislativas
acabaram sendo contidas por constituições, que definiam princípios
civilizatórios e limites que não poderiam ser ultrapassados pela
legislação comum, impedindo golpes de Estado de maiorias eventuais.
Agora,
com o Século do Judiciário, o que se vê, em nível global, é o arbítrio sendo
exercido de uma forma inédita justamente pelo poder incumbido de trazer as
luzes. A desmoralização da democracia representativa, dos partidos políticos, a
ampliação da cooperação internacional, fizeram com que Ministérios Públicos e
Judiciários de vários países passassem a instrumentalizar seus poderes
constitucionais, cometendo toda sorte de abusos e sendo alimentados pela malta
que passou a vociferar através das redes sociais.
Os
casos de multiplicam. No Japão, o franco-brasileiro Carlos Ghosn está sendo
submetido a uma perseguição implacável do MP japonês, mantido isolado na
prisão, sem direito de se comunicar com o exterior e sem acesso aos autos para
se defender. E tudo tendo como pano de fundo a disputa entre franceses e
japoneses pelo controle de uma empresa automobilística.
No
Canadá, o MP foi acionado pelos Estados Unidos para prender a filha do dono da
Huawei, como instrumento da guerra tecnológica pelo desenvolvimento do 5G.
Em
Portugal, o ex-primeiro ministro José Sócrates foi submetido a um ano de
massacre pela parceria dos procuradores portugueses com a imprensa. Depois,
permaneceu um ano preso sem culpa formada.
Nos
Estados Unidos, alguns juizes e procuradores se aliaram a escritórios de
advocacia e empresas de auditoria para criar uma indústria do compliance,
arrancando bilhões da economia produtiva para a economia improdutiva que se
instalou. A última vítima foi a Petrobras.
No
Peru, a perseguição da Lava Jato local levou um ex-presidente ao suicídio.
País
sem tradição democrática, o Brasil comprometeu a própria democracia, tendo como
episódios trágicos o impeachment e a prisão política de Lula. O plantio
pertinaz das sementes do arbítrio não foram praticadas por jovens
procuradores concurseiros, mas por Ministros do STF, como Joaquim Barbosa,
Ayres Brito, Carmen Lúcia, o indizível Luís Roberto Barroso, de Procuradores
Gerais, como Antonio Fernando de Souza, Roberto Gurgel, Rodrigo Janot, todos
encantados com seus novos poderes, e sem um pingo de responsabilidade em
relação à Constituição, às leis, ao país. E, principalmente, devido à cegueira
generalizada da mídia, só percebendo o monstro que criara quando de suas
entranhas nasceu essa figura pública disforme de nome Jair Bolsonaro.
O
século do Judiciário gerou a maior ameaça à democracia desde a
ascensão do nazismo. A lógica é a mesma: a legitimação dada pelo clamor das
turbas, derrubando leis, Constituição, calando os críticos, exterminando as
oposições e impondo o populismo penal, sem freios nem contrapesos. E com
procuradores se comportando como milícias vingadoras, sem estarem submetidos a
nenhuma forma de freio.
Hoje
o Brasil está mergulhado em uma luta entre corporações, com o caos
institucional se espalhando por todos os poros do Estado.
Espera-se
que, vendo a bocarra escancarada da barbárie, Ministros, juízes, procuradores,
políticos, jornalistas de bom senso acordem a tempo de evitar o caos final.
Do
GGN
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