Infeliz,
sob todos os aspectos, a frase do presidente argentino Alberto Fernández, numa
brincadeira idiota, querendo fazer uma “graça” com a frase “”os mexicanos
vieram dos indígenas, os brasileiros, da selva, e nós, chegamos em barcos”.
É
uma reedição anacrônica das disputas de ironias que eram comuns entre os hermanos e
nós, que tinha como chiste reverso de se dizer que os argentinos “se
acreditavam ingleses, mas eram italianos”.
E
quando não debochamos do “índio” boliviano Evo, e do mulato mestiço Chávez e de
tantos outros que não tinham o tipo físico “adequado” a serem governantes,
porque encarnavam até no rosto o “povão”
Infelizmente,
muitos não se apercebem do quanto isso representa, há dois séculos, um dos
truques dos dominadores para dividir povos que têm, afinal, um continente e um
destino em comum e onde a estratégia de dividir-nos sempre foi a maneira de nos
conservarmos cativos.
Mas
para nós, brasileiros, isso tem sido pior.
Estamos
partindo o que o tempo vinha fazendo, ao nos fundir como um país mestiço, ainda
que nesta mestiçagem haja muitas tristezas e opressões: os negros que vinham
escravizados e eram abusados; os índios que perdiam sua terra e identidade, os
europeus pobres, que vinham com alguns farrapos para trabalhar nas lavouras
calejando as mãos, os árabes que juntavam moedas até poder mascatear pelas
poeiras do interior, os judeus que se enfurnavam nos porões de navio e
despencaram-se para cortiços e subúrbios para fazerem a vida.
Sim,
o retrocesso tem como método nos dividir.
Tribos
são sempre menores e mais fracas que nações e a estratégia de nos tribalizar,
embora pareça atraente para alguns acaba por ser vantajosa para os que pensam
que podem manter todo o povo se ele se dividir.
Fernández
pode até estar certo ao dizer que argentinos vieram de barco, como de barco
vieram muitos de nossos pais, avós, bisavós que, sem a passagem de volta – que
só está disponível hoje para elites que, na Argentina, no Brasil e em inúmeros
países da América Latina enriqueceram – vieram para a América.
Nosso
barco agora, senhor presidente, é este continente latinoamericano e não é por
outra coisa que a direita sempre quis destruir o Mercosul que nos fortalece
politicamente ante a voragem neocolonial.
E
é por isso que o senhor acabou por prestar um favor imenso a um governo
brasileiro que trabalha por isso, mudando o tempo do verbo da frase infeliz: os
brasileiros vieram da selva, da África, da Europa pobre, dos árabes, judeus e
dos orientais de vidas miseráveis e avançaram. E que hoje estamos sendo
arrastados à barbárie violenta.
Após
dias de especulação, atletas divulgam texto em suas redes sociais. Seleção
Brasileira está confirmada para disputar o torneio no Brasil.
Jogadores
ficaram decepcionados com a postura do presidente afastado da entidade Rogério
Caboclo. (Lucas Figueiredo/CBF).
Os
jogadores da seleção brasileira divulgaram manifesto sobre a realização da Copa
América no Brasil após a vitória sobre o Paraguai nesta terça-feira. No texto,
os jogadores ressaltam que nunca quiseram tornar a discussão política.
"Somos contra a organização da Copa América, mas nunca diremos não à
seleção brasileira."
No
manifesto, os jogadores explicam que não houve tentativa ou sugestão de boicote
à Copa América. Assim se limitam a expor o desconforto com as mudanças de sede
e dificuldades com a organização. Apoiadores do presidente Jair Bolsonaro
usaram as redes sociais, ao longo dos últimos dias, para criticar a postura da
seleção, principalmente do técnico Tite, contrária à celebração do evento no
Brasil.
"É importante frisar que em nenhum
momento quisemos tornar essa discussão política. Somos conscientes da
importância da nossa posição", escreveram os jogadores.
As informações sobre o descontentamento de integrantes da seleção brasileira
surgiram logo após o anúncio de que o Brasil passaria a receber o evento,
diante das negativas de Colômbia e Argentina, países que originalmente
abrigariam a competição. A insatisfação de jogadores e comissão técnica veio ao
encontro da repercussão negativa em celebrar a Copa América no Brasil mesmo em
meio à pandemia do novo coronavírus com números que ultrapassam os 450 mil
mortos.
Além da situação da pandemia, outro fator que
abalou a relação da seleção com a direção da CBF foi a falta de aviso e
consulta aos atletas sobre a vinda do torneio para o país. Jogadores ficaram
decepcionados com a postura do presidente afastado da entidade Rogério Caboclo.
O dirigente é acusado de assédio moral e sexual por uma funcionária da
entidade. O afastamento será pelo prazo de 30 dias, no entanto, articulações na
CBF sugerem que em breve haverá novas eleições na entidade.
Antes do duelo com o Equador, na última
sexta-feira, o técnico Tite já havia pedido que seus comandados se
concentrassem na missão de levar o País a mais uma Copa do Mundo. Mas deixou
clara a insatisfação de sua parte e também dos atletas. Após o jogo, o volante
Casemiro não entrou em maiores detalhes e reforçou as informações anteriores
repassadas pelo treinador.
Nesta quarta-feira, Tite fará uma nova
convocação para definir os nomes que atuarão na competição sul-americana. A
expectativa é que haja mudanças, uma vez que alguns atletas podem ser chamados
para atuar pela seleção olímpica. O Brasil defende o ouro em Tóquio, e alguns
jogadores já se mostraram interessados em participar novamente dos Jogos.
A Copa América tem início agendado para 13 de
junho. Em Brasília, no estádio Mané Garrincha, às 18h, a seleção brasileira
enfrenta a Venezuela, pelo Grupo B. No mesmo dia, às 21h, Colômbia e Equador
duelarão na Arena Pantanal, em Cuiabá. Em 14 de junho, será a vez da Argentina
começar sua jornada na competição, enfrentando o Chile, no Engenhão, às 18h.
Mais tarde, às 21h, Paraguai e Bolívia jogam em Goiânia. A final do torneio
está marcada para 10 de julho, no Maracanã.
Leia o manifesto na íntegra:
"Quando nasce um brasileiro, nasce um
torcedor. E para os mais de 200 milhões de torcedores escrevemos essa carta
para expor nossa opinião quanto a realização da Copa América.
Somos um grupo coeso, porém com ideias
distintas. Por diversas razões, sejam elas humanitárias ou de cunho
profissional, estamos insatisfeitos com a condução da Copa América pela
Conmebol, fosse ela sediada tardiamente no Chile ou mesmo no Brasil.
Todos os fatos recentes nos levam a acreditar
em um processo inadequado em sua realização.
É importante frisar que em nenhum momento
quisemos tornar essa discussão política. Somos conscientes da importância da
nossa posição, acompanhamos o que é veiculado pela mídia, estamos presentes nas
redes sociais. Nos manifestamos, também, para evitar que mais notícias falsas
envolvendo nossos nomes circulem à revelia dos fatos verdadeiros.
Por fim, lembramos que somos trabalhadores,
profissionais do futebol. Temos uma missão a cumprir com a histórica camisa
verde amarela pentacampeã do mundo. Somos contra a organização da Copa América,
mas nunca diremos não à Seleção Brasileira."
O
episódio da combinação entre o falsário que inseriu, na noite de domingo, um
relatório fajuto e combinado com o presidente da República – ou com os filhos
presidenciais, o que dá no mesmo – para que este colocasse em dúvida a extensão
das mortes pela Covid, é só um retrato do que é a entrega do comando deste país
à pior malta de escroques em sua história, e olhe que já tivemos por aqui
escroques capazes de superar os maiores do mundo.
O
sujeito que emprenhou com documentos faltos o site do TCU é “peixe” de
Bolsonaro, que por ele interferiu para ser nomeado para um cargo no BNDES, em
telefonema pessoal do presidente da República, ao então presidente do TCU para
que este autorizasse sua requisição para o cargo, informa Waldo Cruz, da Globonews.
Temos
uma escumalha no comando da República, como diz, na edição de hoje da Folha o
colunista Bruno Boghossian, ao dizer que Bolsonaro levou gangue golpista ao poder, e não apenas
no sentido do golpe político, mas no de aplicação de golpes de toda espécie,
espalhados numa imensa rede de favorecimentos.
Mas
vivemos um tempo em que tudo isso se aceita “em nome” do combate ao que seria
“esquerdismo”contrário a um governo que, afinal, está “combatendo a corrupção”.
O
governo Bolsonaro, se é que se pode chamá-lo de governo, está se putrefazendo.
Mas,
muito mais rapidamente do que se dissolve, dissolve as instituições da
República, a vontade nacional e nosso senso de decência púbica.
Ainda
faltam 16 meses para as eleições e só quem for muito tolo acreditará que todo
este tempo se permitirá que se forme naturalmente a consciência da população.
Não
estamos lidando com um adversário político, mas com uma quadrilha.
Alexandre
Figueiredo da Costa Silva Marques é amigo dos filhos de Jair Bolsonaro e foi
levado por eles para ser, durante alguns meses, para o BNDES por outro
integrante da “turma”, Gustavo Montezano, quando este foi nomeado presidente do
Banco pelo presidente, que não se conformava de Joaquim Levy não ter criado a
“caixa preta” escandalosa que desejava usar para atingir os governos petistas.
Alexandre
acabou sendo barrado pelos ministros do TCU, que não queriam alguém do Tribunal
exercendo uma função que seria auditada pelo próprio Tribunal.
Foi o auditor
Alexandre Figueiredo Costa Silva Marques o responsável por elaborar o “estudo
paralelo” apontando que metade das mortes pela covid-19 no país não ocorreram.
Segundo ele, os governadores inflaram o total de óbitos para obterem mais
verbas do governo federal.
Procurado
pelo Blog, Alexandre disse que só falaria com autorização da assessoria de
imprensa do TCU, que já foi demandada. O auditor é amigo dos filhos do
presidente Jair Bolsonaro e do presidente do Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES), Gustavo Montezano.
O “estudo
paralelo” foi citado por Bolsonaro na segunda-feira (07/06) para desqualificar
a pandemia do novo coronavírus, que já matou quase 500 mil brasileiros. Nesta
terça (08/06), o presidente assumiu que o “estudo” não pertence oficialmente ao
Tribunal de Contas da União.
Alexandre está
lotado na secretaria do TCU que lida com inteligência e combate à corrupção.
Quando começou a pandemia do novo coronavírus, ele pediu para acompanhar as
compras com dinheiro público de equipamentos para o combate à covid.
A partir dali, o
auditor começou a elaborar o “estudo paralelo”. Quando apresentou os resultados
de sua tese aos colegas de trabalho, foi veemente repreendido, pois ficou claro
que ele queria desqualificar os governadores e favorecer o discurso de
Bolsonaro. Nenhum outro auditor do TCU endossou o “estudo” por considerá-lo uma
farsa.
Assustados com a
insistência de Alexandre, os colegas de trabalho comunicaram os ministros da
Corte de Contas o que estava acontecendo. Mas o auditor entregou a sua tese aos
filhos de Bolsonaro, que a tornou pública. O TCU abriu investigação para apurar
a conduta de Alexandre.
Quem acompanha as
redes sociais de Alexandre pode verificar que ele costuma compartilhar fake
news, como os benefícios do uso de ivermectina no combate à covid, e incitar
ataques a governadores, justamente a quem ele quer prejudicar com seu “estudo
paralelo”.
Num
final de apuração de tirar o fôlego, o candidato da esquerda peruana, Pedro
Castillo, acaba de passar à frente da direitista Keiko Fujimori, com pouco mais
de 44 mil votos de vantagem, o que representa perto de 0,3% de diferença.
Keiko
ganha em Lima e Castillo, com larga margem, entre população indígena da região
andina e do litoral sul do país, numa divisão que se reproduz quase que
eternamente na política peruana.
Falta
boa parte da apuração dos votos no exterior (onde onde Keiko leva vantagem, mas
também muitos das regiões de Cuzco, Puno, Junín, Ayacucho e outros de maioria
indígena, com vantagem ainda maior, em geral de 4 para um.
Mas
os votos do exterior são muitos e, com um quarto apenas apurados entre os quase
93% de urnas da contagem atual, devem deixar o resultado final em suspenso até
o final da noite de hoje, ou até a madrugada.
Não
há mais tempo para se perseguir terceiras vias ou esperar que a crise ou as
manifestações de rua resolvam. O país está no momento mais decisivo da sua
história e com a pior geração de homens públicos e privados.
Há
uma enorme discrepância entre o que a mídia passa sobre o pensamento militar,
através de inúmeras declarações em off, e os atos concretos do Exército. Nas
declarações, apoio integral à disciplina e à visão das Forças Armadas como
poder de Estado. Na prática, endosso tácito às arbitrariedades de Jair
Bolsonaro.
As
explicações devem ser buscadas em um fenômeno manjado do mercado de opinião: a
diferença entre as opiniões individuais e as opiniões coletivas.
Individualmente todos somos a favor do bem, da verdade, dos bons propósitos. No
coletivo, tudo é possível, pois submetido ao monstro, a onda instável criada no
grupo, que pode ir da generosidade mais sensível à ferocidade mais
inexplicável. Isso porque entra, no comportamento, o componente dos interesses
corporativos e pessoais e o efeito-manada.
Nenhuma
categoria está imune ao efeito manada. O discurso de ódio dos últimos anos
transformou jornalistas experientes em bestas feras sedentas de sangue e
exigindo autocrítica das vítimas. O refluxo os devolveu à civilização, com um
discurso humanista emocionado – e sem autocrítica. Nos órgãos de controle,
transformou burocratas pacatos em justiceiros do velho oeste, daqueles que
arrombam a porta da delegacia para enforcar suspeitos. No Ministério Público,
infundiu um sentimento de onipotência que se espalhou por toda a corporação,
calando as vozes de bom senso.
O
primeiro passo, então, é separar dois tipos de opiniões pessoais. Um, a das
chamadas pessoas-bússola, que mantêm suas convicções independentemente das
ondas. Outra, a das birutas-de-aeroporto, que seguem as ondas. Tudo isso em um
país sem nenhum caráter institucional, com uma história secular de oportunismo.
Por isso, jornalistas, ministros, juízes, procuradores, políticos, militares,
cronistas de variedades, seguem as ondas de opinião com a mesma facilidade com
que adolescentes seguem a última moda.
Nesse
quadro, em qualquer dessas organizações há pouco espaço para as
figuras-bússola. Assim, o caráter dessas corporações-instituições acaba
refletindo o oportunismo e a tibieza da cúpula que, por sua vez, foi filtrada
justamente por sua postura acomodatícia.
No
caso do Exército, há uma dificuldade extra para decifrar os movimentos
coletivos. As declarações têm que ser sempre em off. Como toda reportagem é em
off, elas são vulneráveis ao efeito “elefante e os 7 cegos”, cada qual dando ao
elefante o formato de acordo com o pedaço do corpo que apalpa. Ou então,
valendo-se da cegueira generalizada para incluir jabutis nas declarações
em off. Afinal, como tudo é off, um pouquinho de subjetividade não fará mal a
ninguém.
É
o caso de Merval Pereira, sustentando que a decisão do Exército foi para não
fragilizar Bolsonaro perante Lula. Nenhum dos colunistas supostamente com
fontes militares reportou tal preocupação. Donde se conclui que Merval apalpou
apenas a tromba do elefante e transformou a preocupação lateral imediata de uma
fonte em objetivo geral. Ou então quis reeditar o efeito Villas Boas, trazendo
de volta o fantasma da intervenção militar contra Lula para estimular a chegada
de algum dom Sebastião, descendo dos céus para salvar o país do lulismo e
transformar em algo sólido o ectoplasma da terceira via.
Mas
acertou a questão maior. Quando houve a invasão da administração pública por
militares, eles se acostumaram com o poder com suas diversas benesses: melhoria
da renda, aumento da influência sobre setores da economia e celebrização.
E, cimentando esses interesses menores, a afinidade com várias das teses
defendidas por Bolsonaro no plano moral, ambiental e no antipetismo
exacerbado.
Assim
como em 1964, a ocupação militar se dá, inicialmente, preservando alguns
formalismos democráticos. Em 1964 não faltou o endosso de uma eleição indireta
de Castello Branco – depois do Congresso devidamente expurgado por cassações. E
a promessa – jamais cumprida – de devolver o poder aos civis, depois do país
ser limpado dos indesejáveis.
O
mesmo ocorre agora. O Supremo ordena que o Exército vá atender as populações
indígenas atacadas pelo Covid. Não há questionamento, mas não se cumpre a
ordem. A ordem é jogada de um lado para o outro, de um escaninho
burocrático para outro e nada se faz.
Repete-se
com as milícias oficiais ligadas à violência. Tome-se o massacre de
Jacarezinho. O STF só autorizou operações policiais em casos graves. Aí, o
Secretário da Policia Civil dá como motivo quadrilhas aliciando menores – um
dado rotineiro na vida carioca. Mas é suficiente para montar uma operação
bélica que resulta no maior massacre da história do Rio de Janeiro. Mas,
como dizem os idiotas da objetividade, as instituições continuam funcionando.
A
estratégia de Bolsonaro tem sido óbvia. Vai comendo a democracia pelas bordas.
Vez por outra tenta o embate frontal, encontra resistências e muda de assunto.
E continua comendo pelas bordas, enquanto o país civilizado alimenta o sonho de
que irá tirá-lo do poder nas eleições de 2022.
PONTO
1 – PREPARAÇÃO DO GOLPE
O
processo de golpe em marcha consiste dos seguintes pontos:
1.
Entrada descontrolada de armamentos beneficiando dois setores formais e um
setor criminoso ligados a Bolsonaro: ruralistas e clubes de tiro e caça, e
asmilícias propriamente ditas. No primeiro caso, assinou vários decretos não só
liberando a importação e compra indiscriminada de armas como aboliu até os
procedimentos para identificação de origem das munições. No segundo caso,
afastou um superintendente da Polícia Federal no Rio de Janeiro e fiscais da
Receita do porto de Itaguaí – porta de entrada do contrabando de armas no país
– que combatiam diretamente a atividade criminosa do contrabando de armas.
2.
Cooptação das bases das polícias militares. A última iniciativa, do Ministério
da Justiça – dirigido por um ministro bolsonarista – é conseguir o e-mail de
todos os policiais militares do país para um suposto levantamento das suas
condições sócio-econômicas. É evidente que a ideia será inseri-los no circuito
dos algoritmos que sustentam a base bolsonarista.
3.
As benesses aos militares, escancarando os cargos na administração civil para
militares da ativa e da reserva, ampliando suas verbas e benefícios funcionais.
Ao aceitar os decretos de armas de Bolsonaro, o Exército abriu mão do seu maior
poder, o do monopólio da força. É uma instituição sem espinha dorsal.
4.
Fortalecimento das bases evangélicas, com a atuação pertinaz da Ministra
Damares destruindo políticas de saúde e de inclusão para transferir poder a
asilos e escolas especiais dominadas pelo neopentecostalismo.
5.
Manutenção dos laços de parceria com a ultradireita mundial através do
Itamarati. Tirou-se um Ministro das Relações Exteriores trapalhão, mas não se alterou
a orientação do Itamarati.
6.
Queima irresponsável de ativos públicos essenciais – em operações conduzidas
por quadros militares, como o Ministro das Minas e Energia Bento Albuquerque –
para comprar o apoio do mercado.
7.
O maior projeto de suborno da história do país, entregando todo o orçamento
para controle absoluto dos parlamentares, visando fortalecer
Parafraseando
Noel Rosa – por aqui tudo se compra -, Bolsonaro logrou cooptar três
instituições essenciais:
Congresso –
com o suborno das emendas.
Exército –
com empregos e tornando-o co-gestor do país.
Mercado –
com o suborno das privatizações.
PONTO
2 – AS FORÇAS DO CONTRAGOLPE
Em
todo esse imbróglio, há apenas uma força impedindo o golpe: a indignação de
parte da população com a necropolítica de Bolsonaro e a permanência da crise
econômica. É esse alarido que impõe limites à própria ampliação do poder
militar, confere autoridade aos Supremo Tribunal Federal e à própria CPI do
Covid. Esse desgaste é medido nas pesquisas de opinião e nas manifestações de
rua.
Atualmente,
há há dois processos promovendo a mobilização. O primeira, os desastres da
política de saúde de Bolsonaro no combate à pandemia. O segunda, a crise
econômica e a notável inoperância do Ministério da Economia.
E
se esses fatores se diluirem?
Do
lado da saúde, a vacinação – ainda que tardia – afastará o fantasma do Covid,
deixando para trás a lembrança das centenas de milhares de famílias órfãs.
Afastado o risco da pandemia, o foco maior será a economia.
Do
lado da economia, com o controle da pandemia haverá uma melhoria óbvia. E
haverá também o efeito externo, do novo ciclo de alta dos commodities
permitindo alguma recuperação econômica. E, obviamente, fortalecendo o discurso
de Bolsonaro de que seu combate ao isolamento social garantiu a recuperação.
Coloque-se
nesse caldeirão a reativação dos programas de transferência de renda e se terá
um candidato competitivo.
Há
outras sombras no horizonte, como a provável crise hídrica, uma possível
terceira onda do Covid.
Repare,
portanto, que todo o blábláblá dos idiotas da objetividade sobre a força das
instituições, fica na dependência exclusiva de fatores fora do controle das
instituições. Se a economia se recuperar, o resultado político será um; se
piorar, será outro.
PONTO
3 – O QUE SERIA UM SEGUNDO GOVERNO BOLSONARO
Caso
prevaleçam os fatores pró-Bolsonaro na economia e na saúde, há o risco concreto
de uma consolidação da barbárie, mas ampliada com outros atores. Afinal,
trata-se definitivamente de um país sem caráter institucional.
Para
impedir um governo social-democrata que coloque um fim a esse banquete de
bárbaros, poderá ocorrer o seguinte movimento.
1.
Bolsonaro repaginado
Fortalecido,
Bolsonaro não terá necessidade de continuar apelando às suas bases radicais,
moderando a retórica – não a prática – para ampliar sua base de apoio.
Hoje
em dia, por exemplo, o desmonte final do Estado é contido pela resistência de
quadros do Estado ligados ao bolsonarismo – especialmente as forças policiais.
Conseguindo diversificar sua base de apoio, poderá se aventurar a encarar
a pá de cal no Estado brasileiro, a reforma administrativa. Preservando,
obviamente, a polícia e o Judiciário.
2.
Exército co-gestor do desastre
Sem
o alarido das ruas, o Exército poderá se curvar cada vez mais a Bolsonaro.
Afinal, tornou-se uma corporação sem nenhum verniz intelectual, sem projeto
algum de país, sem uma liderança de fôlego sequer, meramente administrando
alianças com outros setores e benesses para a corporação. Juarez Távora,
Estilac Leal, os Cardoso, Golbery, personalidades à esquerda e à direita serão
apenas um quadro na parede das Forças Armadas, substituídos por DAS armados.
Assista
a entrevista do historiador Manuel Domingos sobre os militares, hoje. Vídeo
abaixo:
3.
Mercado comprado
Se
der certo o projeto Bolsonaro repaginado, haverá uma aceleração do desmonte do
Estado, com a destruição final do sistema público de serviço. Com o endosso do
mercado, bastarão alguns acenos de Bolsonaro para a mídia corporativa cair de
novo em seus braços consumando a privatização total da educação, com a
destruição do sistema público de ensino, e a ampliação da privatização da
saúde.
4.
Diques de contenção
Sem
o endosso das ruas, um cabo e um sargento bastarão pra retrair o Supremo, a CPI
do Covid e outras tentativas de conter Bolsonaro.
PONTO
4 – OS PONTOS DE RESISTÊNCIA
Menciono
o cenário acima como um argumento “ad terrorem”. Mas é uma possibilidade
concreta. Não é por outro motivo, que a própria OCDE e o Fórum Econômico
Mundial conferem ao Brasil o status de ameaça – tanto climática quanto à
democracia -, em pé de igualdade com a Turquia.
Veja,
a propósito, entrevista com o jornalista Jamil Chade, sobre o pensamento dos
organismos multilaterais e das principais associações do capitalismo. Vídeo abaixo:
Não
há mais tempo para se perseguir terceiras vias ou seja lá isso o que for, ou
procrastinar em relação aos abusos de Bolsonaro, esperando que a crise ou as
manifestações de rua resolvam a questão.
O
país está no momento mais decisivo da sua história e com a pior geração de
homens públicos e privados da história. Resta apenas uma personalidade com
dimensão – Lula, por sua história e por seu papel de ex-presidente. Resta ver
se conseguirá superar o pensamento miúdo e imediatista de um país que perdeu
todas as referências.
As
recentes manifestações conjuntas de Lula e FHC acendem uma luz, ainda que
tênue, de esperança.
Misturar
seleção de futebol com política é uma estupidez e, portanto, providência que os
estúpidos logo tratam de tomar.
A
lista é imensa e se tornou, durante a ditadura, uma constante, desde que o
general Emílio Médici se deixava fotografar de “radinho de pilha” (os mais
jovens procurem no Google o que é) e rebrotou há alguns anos com a camisa CBF
servindo de uniforme das manifestações da direita, ao ponto de desestimular
muitos de nós, como era hábito, darmos de presente a nossos filhos, em algum
tempo de sua infância.
Seguiu-se
a compulsão permanente de Jair Bolsonaro em virar papagaio de pirata em jogos
de futebol, como aconteceu na primeira Copa América de seu governo, em 2019. Na
época, ele ainda podia descer ao gramado ou ir fazer arminha da
tribuna, algo que não impossível agora apenas porque os jogos são sem público.
Daí
veio a “grande ideia” pegar a xepa da Copa América, que rodava disponível como
um vira-latas, nestes tempos de pandemia.
Jair
Bolsonaro, tal como estimulou e apadrinhou a ida de Eduardo Pazuello a um
palanque para apertar o garrão sobre o Exército de olho em criar uma tensão
militar ante as eleições de 2022, também fez da polêmica em trazer a competição
para o ajudou – sabe-se lá por iniciativa própria ou conselho de quem – a
catalisar as tensões dentro da CBF e mira eliminar as resistência a que seja
ele o “dono da bola” na Copa do próximo ano.
Ao
que parece, o técnico Tite seria uma das ‘pedras na chuteira” a este processo.
Claro
que não se pode ser ingênuo de apostar que o time esteja absolutamente fechado
com a ideia de que a competição é um inconveniente sanitário. Não é a história
das nossas seleções.
Mas
está evidente que estão fechados com o treinador e, ao que parece, dispostos a
um gesto que os coloque a seu lado.
Onde
Bolsonaro bota a mão, tenha certeza, haverá conspiração, manipulação, “camas de
gato” e desastre.
Havia,
na mitologia, o Toque de Midas, que a tudo transformar em ouro. A boa educação
evita dizer de que é o toque de Bolsonaro.
A
médica Luana Araújo carregou duas bombas para CPI.
Uma
foi bomba-relógio, que vai ser detonada quando Marcelo Queiroga, o Ministro da
Saúde, voltar a prestar depoimento. Gentil, não quis avançar em especulações
sobre o veto que recebeu para ser nomeada para o cargo que foi convidada e
aceitou: o de comandar o combate à pandemia no Brasil. Disse que foi comunicada
disso por Queiroga e, portanto, ele terá de explicar as razões pelas quais, nas
palavras do ministro, “sua indicação não foi aprovada”.
Quem
a reprovou, portanto, é resposta a que
A
segunda, de ação continuada e arrasadora, a firmeza e a clareza de linguagem
para demonstrar que toda esta história de cloroquina e demais integrantes do
“kit covid”é, a esta altura, algo que, nas suas próprias palavras, é apenas
“neocurandeirismo”.
—
Essa é uma discussão delirante, esdrúxula, anacrônica e contraproducente. Ainda
estamos discutindo uma coisa sem cabimento. É como se estivéssemos discutindo
de qual borda da terra plana vamos pular
—
Todos nós somos favoráveis a uma terapia precoce que exista. Quando ela não
existe, não pode ser uma política de saúde pública. Essa é uma discussão
delirante, esdrúxula, anacrônica e contraproducente.
Ao
explicar a diferença entre testes “in vitro” – nos quais se fundam muitas
supostas indicações ineficazes contra a Covid – e testes clínicos, não poderia
ser mais clara:
—
Se eu botar uma cultura viral no microondas, o vírus vai morrer. Mas não é por
isso que eu vou mandar o paciente entrar no forno duas vezes por dia.
Luana
deixou claro que está errada toda a política de enfrentamento da pandemia,
focada apenas na questão de leitos de UTI e descuidando de programas de
testagem em massa, medidas de distanciamento social, abandono da atenção básica
de saúde, descoordenação entre os entes federativos. E, sobretudo, com a falta
de “uma comunicação clara, de mensagem única. Do contrário, as pessoas ficam
perdidas”.
O
literato inglês Samuel Johnson, no século 18. criou a frase que atravessou o
tempo: “o patriotismo é o último refúgio dos canalhas”.
Voltasse
no século 21 e tivesse a desventura de ver o que o Brasil é hoje, talvez
reformasse a frase e dissesse que o Patriota, pseudopartido no qual
Jair Bolonaro pretende desembarcar, é o tal último refúgio do – a palavra é
elegante na língua inglesa – scoundrel.
Pois
não é que, ao que parece (e tudo pode ser uma jogada de negócios) que Jair
Bolsonaro inclina-se a usar o partido Patriota (ex-Partido Ecológico Nacional –
PEN) como seu refúgio para as eleições do ano que vem, depois de conseguir
perder o PSL e frustrar-se o tal “partido 38”, o Aliança pelo Brasil.
—" Está quase
certo. Estamos negociando. É como um casamento, né? Programado, planejado, para
não dar problema, né?”
No
PSL, foram para o brejo os negócios com Luciano Bivar, o dono da sigla, alugada
ao candidato de 2018.
No
“Aliança”, a inacreditável história de que não foi possível reunir assinaturas
suficientes para legalizar a legenda daquele calibre. Assinaturas em número
que, recordem-se, até Marina Silva e Paulinho da Força conseguiram juntar, e
não há dúvida que o “Mito”, que alega ter multidões atrás de si, teria mais
facilidade em arrebanhar, se me perdoam o verbo.
Será
seu candidato a presidente, vaga que foi ocupada em 2018 pelo Cabo Daciolo, que
deixou a legenda.
É
claro que um presidente que tem maioria (e folgada) na Câmara dos Deputados
possuiria, em tese, um cardápio de partidos e partidecos a escolher no qual
filiar-se.
Mas
não é bem assim.
Em
primeiro lugar, os deputados que controlam suas máquinas partidárias sabem que
Bolsonaro lhes entraria como um trator. Uma, duas ou três cadeiras que lhes
caberiam seriam abiscoitadas, provavelmente, pelos candidatos das suas falanges
e diminuiriam ou anulariam a chance de eles próprios conservarem o mandato.
Depois,
numa eleição polarizada, na qual – em especial no Nordeste – sentem que Lula
pode se tornar uma onda e, claro, não têm porque remar contra a maré. Como escreve a jornalista Helena Chagas, “querem marchar livres,
leves e soltos para 2022. Alguém duvida que, num eventual novo governo do PT, eles
estarão lá?”.
Bolsonaro
também não se importa muito com um partido – e alianças – que lhe garantam um
tempo expressivo de televisão. Aposta que sua campanha seja nas redes, no smartfone,
não nos aparelhos de TV.
Robôs
valem militantes, fake news valem mais que argumentações. Está no
poder, mas faz-se de vítima.
Bolsonaro
é o “rei da treta”, tem uma estrutura profissional (e, em parte, clandestina)
montada e uma estratégia pronta, que só não vê quem não quer. Ser a vítima, o
anti-establishment faz parte do seu show.
Levantamento
do Inesc traz raio-x dos dois anos de gestão e aponta normas de “alto risco”.
Salles
editou pelo menos 317 atos oficiais que comprometem a política ambiental
brasileira.
Ao
longo da gestão de Ricardo Salles, o Ministério do Meio Ambiente (MMA)
editou pelo menos 317 atos oficiais que colocam a política ambiental brasileira
em risco. O dado resulta de um levantamento feito pelo Instituto de Estudos
Socioeconômicos (Inesc),
que localizou e avaliou medidas adotadas pela pasta desde quando o mandatário
assumiu o cargo, em janeiro de 2019, data em que Salles foi empossado pelo
presidente Jair Bolsonaro (sem partido).
O
registro feito pelos pesquisadores sistematiza portarias, instruções
normativas, resoluções, deliberações e despachos publicados até dezembro
de 2020, quando o ministro completou dois anos de gestão.
Todos
esses dispositivos são considerados atos normativos infralegais e foram
categorizados conforme uma escala de cinco graus de risco, variando entre
“muito baixo”, “baixo”, “médio”, “alto” e “muito alto”. Os pesquisadores também
consideraram a categoria “não se aplica”, usada para medidas que não impõem
danos ao meio ambiente. Ao todo, 207 ficaram neste último grupo, enquanto as
que trazem riscos somam 317.
“É
um processo de desmonte muito grave, e isso consolida a visão de que o Salles
está lá para isso. O MMA, do ponto de vista do orçamento, nunca foi muito
relevante, mas ele passa a ter um papel muito relevante neste governo, que é
justamente o de desmontar o que existia de política ambiental”, analisa a
assessora política do Inesc Alessandra Cardoso, coordenadora do estudo.
RICARDO
SALLES E SUAS MEDIDAS
O
levantamento analisou as 524 medidas normativas publicadas pelo ministério e
alguns de seus braços. Foram 118 atos do próprio MMA, 282 do Instituto Chico
Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio), 113 do Instituto Brasileiro
do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) e uma do Instituto
de Pesquisas Jardim Botânico do Rio de Janeiro (JBRJ).
A
pesquisa identificou que 10 medidas têm risco “muito alto” enquanto 38 têm
“alto” potencial negativo. Questionada sobre os critérios para se enquadrar
determinados atos de acordo com esse grau, a coordenadora explica que tais
categorias abrigam ações que promovem uma maior fragilização do controle
ambiental.
“A
gente classificou assim aquelas que têm elementos que configuram o
enfraquecimento do órgão, seja do ponto de vista de pessoal, seja do ponto de
vista da normativa. No Ibama, por exemplo, tem algumas instruções que mudam o
processo de julgamento de multas, o rito do processo de infração e monitoramento,
e isso está muito evidente”, explica.
É
o caso da Instrução Normativa Conjunta Ibama/ICMBio/MMA Nº 1, de
janeiro de 2020. O dispositivo normatizou procedimentos para a conversão direta
de multas ambientais em serviços de preservação da qualidade do meio ambiente e
permite que, a partir disso, o autuado implemente projetos por conta
própria.
Os
especialistas apontam que a norma é de alto risco porque dispensa decisões
técnicas na aprovação desses projetos, que ficam restritos ao julgamento de
ocupantes de cargos políticos. Por conta disso, o Inesc entende que a instrução
compromete os mais de 130 mil processos de infração ambiental pelos quais
respondem os órgãos que editaram essa orientação.
DANOS
AO MEIO AMBIENTE
“Quando
se coloca, por exemplo, mais poder pra um gestor que é indicado politicamente
para dar sequência ou não a um processo de condução da fiscalização, a gente
considera isso uma medida de altíssimo risco, porque você sabe que isso vem
junto com outros sinais e movimentos que mostram que essa medida existe pra
desmontar a política de fiscalização”, aponta Alessandra Cardoso.
A
Instrução Normativa Nº 1 está também entre as 12 medidas que foram consideradas
pelos pesquisadores como “as mais danosas” das 524 catalogadas. O rol inclui
ainda regras que fragilizam a estrutura do ICMBio e o seu papel de
gestão das unidades de conservação.
Também
estão na lista orientações que debilitam a atuação do MMA e reorientam a
participação da pasta na agenda ambiental. É o caso do que o estudo classifica
como “gestão pouco transparente e tendenciosa” das verbas do Fundo Nacional
sobre Mudança do Clima (FNMC), observada por meio da ata da 28ª reunião do MMA.
O
desmonte do Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), promovido pelo Decreto
9.806/2019 e normatizado pela Portaria MMA nº 630/2019, é outro exemplo
resgatado pelos pesquisadores. O estudo completo está disponível para visualização neste link.
O Brasil
de Fato procurou o Ministério do Meio Ambiente (MMA) e não obteve
respostas até o fechamento desta matéria.
O DCM publica a foto de um certo “Tenente Albuquerque”,
policial militar que prendeu um professor com base na Lei de Segurança Nacional
, por recusar-se a tirar um adesivo “Bolsonaro Genocidade ” de seu automóvel.
No
Recife, permanecem anônimos os que deram ordem de avançar atirando balas de
borracha – que perfuraram um olho em dois homens que passavam pelo local do
qual se aproximavam, em paz e desarmados, manifestantes antibolsonaro.
Um
sujeito andando de bicicleta à luz do dia, desarmado, é algemado e preso por
não colocar imediatamente as mãos na cabeça porque um PM, com uma pistola
apontada para o seu rosto deu a famosa “ordem legal”, absolutamente ilegal.
Como
é absoutamente ilegal termos uma “tropa” – irregular mas fortemente armada – de
“atiradores” civis, em tamanho suficiente , se contar com a cumplicidade
militar, para desfechar um golpe paramilitar no país.
Ao
que parece, estamos dentro do pesadelo imaginado em 1968 pelo então
vice-presidente Pedro Aleixo: a ditadura do guarda da esquina, o império do
“esculacho” policial que, ontem, foi corroborado pelo próprio presidente da
república, ao dizer que manifestantes de oposição estão agitados ‘porque está
faltando erva”.
É
a “zorra total” com as instituições militares, que tem seu exemplo mais
simbólico com a certeza de que Eduardo Pazuello não vai ser punido por ir a um
palanque político ao lado de Bolsonaro porque Jair não quer. E, se for, o
“Mito” anula.
Polícia
e Exército estão sendo transformados num partido, e faz tempo, porque são
centenas de personagem que colocam um prefixo militar – de soldado a general –
para galgarem cargos eleitorais com apelos à ordem policialesca e a promessa de
que enfrentarão “os vagabundos”.
Não
se desarma este castelo pela base, como não se pôs freios aos abusos de juízes
e promotores senão quando se fez ruir o sei “Mito”, o ex-juiz Sergio Moro.
É
preciso que se tire o chefe do “Partido da Arma”, como se tirou o chefe do
“Partido da Toga”.
O
Brasil participa atualmente de duas negociações econômicas de importância
estratégica – importância muito mais negativa do que positiva, como vou
explicar. Refiro-me ao acordo Mercosul/União Europeia e à entrada do Brasil na
Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE). As duas
remontam ao governo Temer, que decidiu pleitear o ingresso na OCDE e retomar
negociações antigas com a União Europeia. Foram levadas adiante pelo governo
Bolsonaro, mas estão basicamente paralisadas, por obra das suas políticas
climáticas. Dificilmente serão concluídas enquanto o governo não for
substituído ou não mudar suas políticas nessa área (e a primeira hipótese
parece mais fácil do que segunda!).
As
duas questões devem ficar para um outro governo, que começará em janeiro de
2023, admitindo-se que Bolsonaro chegue ao final do seu mandato, mas não
alcance a reeleição. (Deixo de lado, neste artigo, a possibilidade – a melhor
para o País – de que o seu mandato acabe sendo abreviado, terminando antes das
eleições de 2022.)
Do
governo Bolsonaro, um dos poucos bons resultados – completamente involuntário –
é o de ter inviabilizado, com suas políticas de destruição ambiental, tanto a
entrada na OCDE quanto a ratificação do acordo com a União Europeia. Como diz
meu amigo Gabriel Ciríaco, “há Salles que vêm para bem”. Diga-se de passagem,
que uma administração Mourão, que adotaria presumivelmente política ambiental
mais civilizada, traria a desvantagem de talvez viabilizar a conclusão dessas
duas iniciativas, emparedando o próximo governo.
Porém,
o mais provável é que Lula ou Ciro Gomes, ambos defensores de políticas de
desenvolvimento, venham a ser confrontados, se eleitos, com as duas em aberto:
a) um acordo pronto ou praticamente pronto, mas ainda não ratificado, entre o
Mercosul e a União Europeia; e b) um processo relativamente adiantado de
preparação para a entrada do País na OCDE. Como nem Ciro nem Lula dariam
continuidade aos descalabros ambientais do atual governo, o caminho estaria
aberto para finalizar as negociações internacionais em curso. Pequeno problema:
elas se chocam frontalmente com a autonomia das políticas nacionais de
desenvolvimento.
Se,
por outro lado, o vencedor das eleições for alguém da direita tradicional,
não-bolsonarista, digamos Mandetta, Dória ou Jereissati, é provável que a
questão se coloque de outra forma e sem grandes dificuldades, pois a
finalização das duas negociações se enquadra perfeitamente na agenda neoliberal
tradicionalmente defendidas pelas forças políticas que eles representam.
Quais
são os argumentos neoliberais? São, em boa medida, genéricos ou de natureza
ideológica, do tipo “O Brasil precisa estreitar laços com os países mais
avançados”, “não podemos ficar restritos ao mundo emergente e em
desenvolvimento”, “precisamos modernizar e abrir a economia”, “temos de
aprimorar nossas leis e regulamentos e obter um selo de qualidade”. Conversa
que não comove nenhum país emergente que tenha noção dos seus objetivos de
longo prazo e da importância de conservar margem de manobra na definição de
políticas públicas.
OCDE
– órgão pesadamente normativo
A
OCDE, leitor, não é um clube confortável em Paris, com toalhas felpudas e
outras amenidades. Não é apenas um fórum de discussão, onde nossa voz seria
ouvida se nos tornássemos membros. Trata-se de um organismo normativo, que
estabelece diferentes tipos de compromissos e obrigações para seus países
membros. Ela existe desde 1961 e se cristalizou como organismo que reflete, de
forma infalível, as prioridades e interesses dos Estados Unidos, dos principais
países da Europa e de outras nações desenvolvidas. Os emergentes que lá figuram
são meros coadjuvantes, sem peso real na definição das normas da instituição,
há muito consolidadas pelos desenvolvidos. Na prática, são sócios de segunda
classe, que aceitam limitar suas políticas em troca do prestígio de participar
do “clube dos ricos”.
O
Brasil está, desde 2017, na fila dos candidatos e vem se esforçando para
atender os requisitos e exigências. Sintomático que o secretário-geral da OCDE,
o mexicano Angel Gurría, tenha afirmado recentemente que, entre os seis
candidatos atuais, “o Brasil tem enorme vantagem, faz parte da família e já
está na cozinha”. De lá não sairá… Pode até ser aceito como membro, mas
continuará na cozinha da OCDE na companhia de México, Colômbia, Chile e Costa
Rica.
Os
compromissos exigidos pela OCDE são mais amplos do que os de outras
instituições multilaterais. No campo dos movimentos internacionais de capital,
por exemplo, a OCDE é bem mais rigorosa do que o FMI na busca de compromissos
de liberalização. Quando eu era diretor do Brasil e de outros países no FMI,
houve tentativas de importar aspectos das normas da OCDE nesse tema. Não sendo
o Brasil membro da OCDE, eu podia me opor a isso com sucesso, assim como fazia
o ministro Mantega nas reuniões do conselho ministerial do FMI.
Não
é por acaso que nenhum dos outros países dos BRICS está pleiteando ingresso na
OCDE. Rússia, Índia e China são grandes países emergentes que prezam a sua
autonomia estratégica. Mesmo a África do Sul, menor e potencialmente mais
vulnerável às pressões ocidentais, não faz questão (até onde sei) de entrar
nesse clube.
Acordo
Mercosul/União Europeia – poucas vantagens, muitas limitações
O
acordo Mercosul/União Europeia também é altamente problemático. A negociação
propriamente dita já foi concluída; o acordo encontra-se em fase de revisão
jurídica e tradução para depois ser encaminhado aos Parlamentos. Engana-se quem
pensa que se trata de um acordo de livre-comércio. Não é. E por duas razões.
Primeira: os europeus se reservam o direito de proteger, de formas variadas, a
sua agricultura contra a concorrência dos produtores mais competitivos do
Mercosul. O acordo proporciona, na verdade, pouco acesso adicional aos mercados
da União Europeia. Mas abre, por outro lado, os mercados do Mercosul para as
exportações industriais europeias por meio da diminuição das tarifas de
importação.
Segunda
razão: o acordo vai muito além do comércio de bens para estabelecer obrigações
em áreas como serviços, investimentos, competição, solução de controvérsias,
propriedade intelectual (inclusive indicações geográficas), compras
governamentais e proteção do meio ambiente. No que se refere a compras
governamentais, por exemplo, o acordo coloca em pé de igualdade as empresas do
Mercosul com as empresas europeias industriais e de serviços, mais avançadas
tecnologicamente e mais competitivas.
No
frigir dos ovos, obtém-se um pouco de acesso adicional ao mercado europeu em
troca de: a) abertura dos mercados do Mercosul para as exportações industriais
da Alemanha e outros países; e b) severa limitação de políticas governamentais
em diversas áreas.
Não
por acaso, um negociador europeu foi flagrado confessando que “we got way with
murder on this deal” (em tradução livre: obtivemos tantas concessões que o
acordo foi um assassinato). A inconfidência não surpreende. Nos seus aspectos
principais, o acordo foi concluído em 2019, no primeiro ano do incompetente
governo Bolsonaro e na reta final de um governo fraco na Argentina, o de Macri.
Vamos
ter que nos livrar desse entulho todo.
O
que fazer?
Um
futuro governo brasileiro pode desativar as duas armadilhas (e outras, não
abordadas neste artigo) sem confrontação e sem alarde. Seria fazer algo
semelhante ao que fez o governo Lula com a ALCA (Área de Livre Comércio das
Américas) em 2003 e 2004, acordo que serve de matriz, aliás, para o acordo
Mercosul/União Europeia. Graças à ação inteligente e habilidosa de Celso
Amorim, Samuel Pinheiro Guimarães e Adhemar Bahadian, sem barulho e sem brigar
com ninguém, o Brasil impediu a concretização da ALCA, que o governo Fernando
Henrique Cardoso, submisso às orientações dos Estados Unidos, havia deixado
praticamente pronta. Não restou aos americanos outra alternativa do que
negociar acordos bilaterais no modelo ALCA com alguns países latino-americanos.
O Mercosul ficou de fora.
No
que diz respeito à OCDE, basta abandonar o pedido de ingresso e continuar como
parceiro-chave da organização, participando sempre que possível e conveniente
de discussões sobre temas de nosso interesse. Os regulamentos e as práticas
recomendados pela OCDE que forem úteis para a nossa economia e o nosso
desenvolvimento podem ser adotados em âmbito nacional, sem estreitar por
compromisso internacional o espaço de atuação do País em áreas de interesse
estratégico.
No
que se refere ao acordo Mercosul/União Europeia, o natural seria buscar uma
redefinição do acordo, buscando maior equilíbrio em várias áreas. Os europeus
nem teriam condições de denunciar uma volta atrás, posto que eles mesmo vêm
tentando reabrir o acordo concluído em 2019 para introduzir mais compromissos e
obrigações na área ambiental. Se for possível reequilibrar o acordo, ótimo. Se
não, continuaremos a prezar e desenvolver as nossas relações econômicas com o
bloco europeu, sem amarrar-nos a compromissos internacionais desequilibrados e
invasivos.
Em
tudo isso, o fundamental é nunca esquecer que o Brasil não pode abrir mão da
sua capacidade de desenvolvimento nacional independente.