Modalidade de
financiamento ao microprodutor dispara 68% em 2013 e favorece a ascensão
social no Brasil.
Um empréstimo de R$ 100
aqui, outro de R$ 1 mil acolá. De pouco em pouco, o microcrédito destinado aos
microempreendedores alcançou em 2013 seu saldo em carteira recorde: R$ 4,8
bilhões. Do fim de 2012 ao do último ano, os financiamentos aos pequenos
produtores subiram nada menos que 68%. Enquanto isso, os repasses aos
consumidores, em tendência de queda desde 2010, recuaram mais 39% no ano
passado - leia o "histórico", mais abaixo. No total, entre
microempreendedores e consumidores, o saldo em carteira do microcrédito subiu
42% em 2013.
Perto do saldo total do
crédito direcionado no País, de R$ 1,2 trilhão no mesmo mês, o microcrédito é,
de fato, "micro". Mas é "macro", no entanto, por sua função
social.
"O mercado de
trabalho não supre toda a necessidade de vagas", diz o presidente da
Associação Brasileira de Entidades Operadoras de Microcrédito e Microfinanças
(Abcred), Almir da Costa Pereira. "Por isso, um cliente típico de
microcrédito produtivo é aquele que não tem condição de empregabilidade e busca
como alternativa abrir um negócio próprio e se tornar um
microempreendedor."
Os microempreendedores
urbanos mantêm, por exemplo, pequenas lojas, confecções, mercearias e salões de
beleza nas periferias. Na zona rural do Brasil, quem recebe os financiamentos
são produtores, normalmente, com mínimas condições de sair sozinhos das classes
D e E.
A paranaense Beatriz
Rocha, de 37 anos, está entre esses brasileiros. Mãe de três crianças entre 2 e
11 anos, mora num barraco de madeira de 20 metros quadrados, na cidade de Santo
Antônio do Sudoeste, divisa do Paraná com a Argentina. Com um empréstimo de R$
3 mil adquirido no banco Fomento Paraná, pôde comprar um freezer e uma vaca -
de nome Ariana. Somada às outras duas vacas que já tinha comprado com ajuda do
programa Bolsa Família, do governo federal, a dona de casa pôde iniciar pequena
produção, vendida a uma cooperativa da região.
Para Antonio Mendonça,
diretor executivo do Banco do Povo Paulista (BPP), ligado ao Governo do Estado
de São Paulo, o microcrédito faz parte da "revolução social"
observada no Brasil nos últimos anos. Embora ainda não seja possível calcular o
tamanho do impacto do acesso ao microcrédito na inserção de mais de 40 milhões
de brasileiros nas classes consumidoras desde a última década, ele não tem
dúvidas da importância da modalidade. "O microcrédito é responsável por
mudar a vida de muitas famílias", diz.
O BBP realizou
entrevistas com microempreendedores para avaliar seus serviços. De acordo com a
pesquisa, 98,9% dos clientes entrevistados dizem que seus negócios melhoraram
após tomarem microempréstimos; 79,2% tiveram aumento de faturamento; e
outros 95,8% disseram que suas vidas melhoraram após os financiamentos.
O BBP oferece linhas de
microcrédito entre R$ 200 e R$ 15 mil e dez minicursos voltados ao
microempreendedor. Diz atender hoje 74 mil famílias em 514 municípios. Tem
saldo em carteira de R$ 290 milhões, com recursos do Estado e dos municípios.
"As parcerias são feitas com prefeituras de diversos partidos, aliados ou
não", diz Mendonça.
Histórico. Em
2007, início da série histórica do Banco Central, o microcrédito no Brasil era
majoritariamente voltado ao consumo: 75% do total. E, embora o crescimento
econômico do País tenha sido estimulado pela demanda desde a última década, a
partir de 2011 o cenário do microcrédito mudou radicalmente. Hoje, 89% dos
empréstimos é para microempreendedores.
O microcrédito ao
microempreendedor é oferecido basicamente por Organizações da Sociedade Civil
de Interesse Público (Oscips de microcrédito); programas do governo federal
(como o Crescer) e de governos regionais (como o Paraná Juro Zero e o Programa
de Microcrédito Gaúcho); ou diretamente em bancos públicos ou privados.
Os financiamentos são
de baixo valor - a partir de R$ 100. Os juros giram na casa dos 5% ao ano - bem
abaixo do juro médio de 29% do ano passado. Na região Nordeste, onde o
Banco do Nordeste consolidou o programa Crediamigo nos últimos 15 anos, por
exemplo, o tíquete médio dos empréstimos em 2013 foi de R$ 1,2 mil.
Principalmente por meio
da atuação das Oscips de microcrédito, os empréstimos incluem parcela da
população excluída do sistema financeiro comum. É gente que não tem garantias
de patrimônio ou renda. O compromisso de pagamento é baseado na confiança ou na
atuação de grupos solidários (conhecidos que garantem o pagamento uns dos
outros).
'Microinadimplência'. Ao
contrário do senso comum, esses empréstimos para quem quer (e tem) pouco
dinheiro têm taxa de inadimplência igual ou menor que a do sistema financeiro
em geral. Somados os consumidores e os microempreendedores, a inadimplência do
microcrédito foi de 6,94% - em linha com a taxa de toda total de toda a
economia brasileira em 2013, de 6,7%, de acordo com o Banco Central.
"No microcrédito
produtivo orientado, temos profissionais agentes de crédito que acompanham os
empreendimentos para oferecer o crédito acertado", avalia Pereira, da
Abcred. Dessa forma, quem recebe o financiamento pode investir em algo que dará
retorno". A inadimplência média dos empréstimos feitos via Oscips de
microcrédito gira em torno de 3%, calcula a Abcred.
A taxa de inadimplência
(mais de 90 dias de atraso) do microcrédito ao microempreendedor em dezembro
foi de 5,34%. Para o consumidor, o registro é bem menos favorável: 20,77% de
taxa de inadimplência. Ou seja, a orientação produtiva gera maior compromisso
com os pagamentos que empréstimos feitos para mero consumo.
Da Folha
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