sexta-feira, 15 de janeiro de 2021

COM AUMENTO NO NÚMERO DE CASOS, BOLSONARO E DORIA SE ATACAM

Enquanto o Brasil ultrapassa os 200 mil mortos por Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro e o governador João Doria discutem e se atacam.

Enquanto o Brasil ultrapassa os 200 mil mortos por Covid-19, o presidente Jair Bolsonaro e o governador João Doria discutem e se atacam. Nesta sexta (15), o governador chamou Bolsonaro de “facínora” e o presidente retrucou, dizendo que “homem ele não é”.

A declaração de Doria foi dada à tarde, em São Paulo, em encontro com o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ) e o deputado federal Baleia Rossi (MDB-SP), candidato à Presidência da Casa.

“Um governo sem rumo, sem plano, sem meta e, principalmente, sem coração. Será que o Brasil, que já se mobilizou nas ruas pela mudança das Diretas Já, outros movimentos cívicos importantes, vai continuar e não vai reagir?”, questionou.

“Ele quer jogar a responsabilidade para cima de mim? Será que ele tem coragem, que homem ele não é, nós sabemos que esse pilantra não é homem”, foi a resposta do presidente da República, ao programa Brasil Urgente, da TV Band.

E disse que Doria “está morto politicamente”.

“Com palavras de baixo calão, como esse governador está falando, me chamando de facínora, isso é coisa de irresponsável. É um cara que tá morto politicamente em São Paulo. Ele não sai na rua em São Paulo. Não vai na padaria comprar um pão, não vai na praia. Não tem mais prestigio para absolutamente nada. Agora está em um desespero para me atingir.”

Do GGN

quinta-feira, 14 de janeiro de 2021

PAZUELLO E BOLSONARO SÓ MERECEM O NOME DE ‘MONSTROS DE MANAUS’, POR FERNANDO BRITO

O colapso no fornecimento de oxigênio para centenas ou milhares de brasileiros e brasileiras que estão internados nos hospitais de Manaus estava mais do que avisado e era mais do que sabido que isso causaria a morte de muitos deles, com os pulmões atacados pela infecção.

Os pedidos de ajuda à União – e também a outros estados – foram muitos e em vão.

Hoje, funcionários dos hospitais, desesperados, transportavam em macas os poucos cilindros que conseguiam ou que eram trazidos por parentes dos pacientes, arrumados sabe lá Deus como.

O Ministério da Saúde sabia do desastre iminente, o Ministro da Saúde sabia da tragédia anunciada e o presidente da República, com quem Pazuello tratou do assunto hoje cedo, sabia.

A fabricante White Martins, que tem fábrica em Manaus, não dá conta de uma demanda que quintuplicou em 5 dias e está pedindo ajuda para trazer mais cilindros da Venezuela, sem que se saiba de qualquer apoio diplomático para isso.

Ao contrário, o coronel Franco Duarte, representante do Ministério da Saúde no Amazonas (sim, um coronel) prefere colocar a culpa nos pacientes que “não está no leito de UTI” que, por ficar com o cilindro de oxigênio próximo a ele, abre a torneirinha para ampliar o fluxo e ter uma “sensação de bem estar”.

Só agora à noite estão chegando aviões da FAB com alguns cilindros, enquanto o Amazonas tenta “exportar” doentes para outros estados e coloca Manaus sob toque de recolher noturno, diante de mais um recorde de casos.

Que nome merece esta gente?

Os monstros de Manaus?

Como é que meteram o Exército Brasileiro metido neste genocídio sem que tenhamos generais que se indignem com a morte de seus compatriotas sufocados, sem ar, numa agonia horrenda.

Será que o “I can’t Breath” – “eu não posso respirar”, em inglês – vai ser o grito silencioso dos manauaras?

Do Tijolaço.

quarta-feira, 13 de janeiro de 2021

COMO SERÁ O FIM DOS GRUPOS DE MÍDIA NACIONAIS, POR LUIS NASSIF

Confira a análise de Luis Nassif sobre os últimos acontecimentos da conjuntura politica e econômica nacional no boletim desta quarta-feira, 13 de janeiro.

O balanço da covid-19 não foi divulgado devido a problemas com a divulgação dos dados do Ministério da Saúde

Sobre a coletiva feita pelo general Pazuello, Nassif diz que “quando você pega os números em relação ao tamanho da encrenca, são números mínimos (…) Como se jogam com os números sem comparação, fica todo mundo no ar achando que tem algum resquício de competência, mas não tem”

“O início do tal do ‘dia D, hora H, momento F’ está programado para a próxima terça-feira, dia 19, e alguns fatos chamam a atenção, como o desastre da comunicação do Instituto Butantan, pressionado pelo João Doria Jr.”

“Tem um meme bem interessante sobre como comunicar essa questão da vacina: se você tomar a vacina Coronavac, você tem 50% de chance de não se infectar. Mas, se você se infectar, tem 78% de chance de não sentir nada. E se sentir algo, tem 100% de chance de não precisar ser internado”

“Mas o que acontece: como essa discussão leiga sobre a eficácia geral/global deu baixa, o Doria fez um carnaval com o Instituto Butantan (…) O Doria apresenta os dados incompletos, e chora, e logo depois são obrigados a informar os dados completos e dá esse baque”

“Essa partidarização, politização da vacina é um desastre. E não está restrito ao Bolsonaro (…) É uma irracionalidade em todos os níveis”

A respeito da realização do Enem, Gregório Grisa comenta sobre os problemas em manter a realização das provas em janeiro – sendo que, em consulta aos estudantes, a escolha foi pela realização das provas em maio.

“A definição do Enem para janeiro, e a recente manutenção da data, representa mais um capítulo de toda a dificuldade do governo federal de fazer o que é elementar para impedir a expansão do coronavírus”, afirma Grisa.

“Socialmente falando, o Enem coincide com o mês em que se encerrou o auxílio emergencial para milhões de famílias, o que afeta estudantes mais pobres. Diante de todas essas inseguranças, o Enem deve reproduzir inequidades de maneira ainda mais intensa do que já faz, e deve ter uma abstenção significativa”, pontua Grisa.

Sobre ciência e tecnologia, Nassif lembra que Bolsonaro “continua destruindo tudo o que se tem de patrimônio de ciência e tecnologia”, citando o veto da liberação total dos recursos do Fundo Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico.

Com relação a CEITEC – empresa responsável pelo desenvolvimento de microchips essenciais para informatização do país – e a liminar que derrubou a assembleia que escolheria o liquidante da empresa, Nassif detalha os interesses por trás do processo.

“Você fecha a CEITEC, pega os técnicos da CEITEC, leva para uma fundação. A CEITEC sem os técnicos e sem a empresa funcionando, o valor vai lá para baixo, daí entra alguém, uma empresa de fora, compra aquele equipamento e recontrata as equipes”, explica Nassif.

“A ignorância, a incapacidade de juntar informações para segurar essas loucuras é muito grande. É um desrespeito com o país. Temas dessa envergadura e o cara (Paulo Guedes) montar negócios…”

Para Nassif, a situação envolvendo Donald Trump ajudou a clarear o que está acontecendo no Brasil de Jair Bolsonaro. “Quando você lê o noticiário americano, o grande receio que se tem lá – inclusive do FBI – são as milícias armadas espalhadas pelo país e ameaçando matar políticos. Gente, isso é uma realidade concreta no Brasil. Concreta e com agravantes. Aqui, você não tem uma Polícia Militar tão disciplinada como você tem lá. Você tem bases da Polícia Militar aqui que são cooptadas pelo bolsonarismo (…) E vai se deixando isso num crescendo até isso ficar irreversível”

“A liberdade de imprensa está sofrendo a maior ameaça desde a ditadura militar”, diz Nassif. Ao abordar a situação dos grupos de mídia no Brasil, Nassif lembra que o papel da mídia é elemento central na manutenção das democracias, uma vez que “ela tem o domínio sobre o principal agente das democracias, que é o eleitor, a opinião pública”.

“Durante o século XX, todo o modelo da mídia consistiu em ser o principal agente de influência da opinião pública (…) Com a primeira agência de notícias, você tem a primeira manipulação eleitoral, que é muito similar com o que o Trump tentou na Geórgia e que também tivemos no Brasil, em 1982”

“Como o telégrafo sem fio tinha acesso a todas as informações, se identificou que havia empates técnicos em alguns Estados-chave”.

“Então, o sujeito que montou a primeira agência de informação (a Associated Press), que era o dono da rede de telégrafos sem fio, se associou ao The New York Times. Eles fizeram um carnaval e houve uma manipulação, uma fraude que garantiu os votos de alguns Estados para o candidato republicano. Foi a primeira grande fraude que se teve com o uso dos veículos de comunicação. Então, você sempre teve essa ligação entre comunicação e política”

Nassif explica que, com as redes de rádio e televisão, esse poder se torna praticamente imbatível – e esse poder da mídia sobre a opinião pública foi monetizado, garantia recursos para a mídia, seja de forma legítima (via assinatura ou publicidade, por exemplo) até compra e venda de opinião.

“Era uma manipulação sempre de mão única. O grande ativo do jornal era o controle sobre aquela base de leitores, ouvintes, espectadores, e a capacidade de passar a mensagem dos anunciantes, dos parceiros políticos ou das guerras comerciais. Mas o cliente era dele. E esse modelo vigorou até o advento da Internet”

Nos países emergentes, as mídias nacionais se defenderam contra a globalização dos grupos de mídia – “especialmente no pós-guerra, as multinacionais americanas entram em todos os locais, especialmente na América Latina. Os grupos de mídia não”

Esse bloqueio ocorreu uma vez que os grupos de mídia nacionais tinham influência política, conseguem leis para impedir a entrada de grupos estrangeiros – “se quiser entrar, tem que entrar comigo aqui”, pontua Nassif.

E as concessões públicas de rádio e televisão já estavam nas mãos de grupos de mídia associados a políticos. “Atropelando a Constituição, você tem todas essas redes nacionais (…) ligadas a políticos. Isso impedia a entrada de grupos estrangeiros para cá”

Com a Internet, surgem dois tipos de grupos: o que usa o padrão convencional de mídia (como aconteceu com os portais, a partir da ascensão e queda da America Online), e a padronização tecnológica que explode em todas as partes do mundo.

“E como um serviço fechado vai concorrer com um serviço aberto, onde você tem conteúdo de todo mundo? Nesse segundo momento, entra o Google e as redes sociais, que não geram conteúdo. Eles passam a organizar o conteúdo global e a ser transmissores do conteúdo global”

Outras formas de comunicação avançam, como a TV a cabo (que é a porta de entrada para os grupos multinacionais em diversos países), a Internet propriamente dita e os serviços segmentados, como streaming.

“De um lado, os grupos de mídia vão se fundindo e criando supergrupos (…) O segundo grupo são as big techs, que passam a trabalhar o conjunto de usuários e desenvolver outros modelos de negócio, como a publicidade programática (…)”

“Se você for ver o modelo de negócio da mídia desde o início do século, tem a publicidade que depende da abrangência do público que você foca, e tem a venda de ideias (e entram ideias políticas) e disputas de negócios. É a monetização da opinião pública”

“Todo o controle do público é do grupo de mídia de uma forma unilateral, ele manda a informação e o sujeito recebe. Quando vem as big techs, é diferente: ele tem aquele público disseminado e ele vende para terceiros o direito de fazer a manipulação que ele quiser do seu público”

“A partir daí surgem Cambridge Analytica, surgem as Primaveras arrebentando com a democracia de países, porque não se faz mais a manipulação. Eles (big techs) entregam as ferramentas para quem quiser manipular mediante pagamentos”

“Sempre que se tem mudanças de padrão tecnológico, a mídia endoida, porque tem uma mudança de padrão tecnológico da comunicação, alguns grupos vão conseguir pular para o novo modelo e outros não. Então ficam todos desesperados sem saber como se colocar”

E isso acontece no Brasil, onde você tem a internet se expandindo no começo dos 2000 e os grupos nacionais de mídia endividados e em crise. “Eles apelam para o modelo Murdoch, que desmoraliza o jornalismo brasileiro”

“No fundo, eles (grupos de mídia nacionais) queriam o privilégio de defender todos os interesses internacionais, mas serem os intermediários. Então, eles defendiam a abertura da economia para todos os setores, menos para a mídia. Defendiam o fim de todos os subsídios, menos para a mídia. Esse jogo começa a acabar com a TV a cabo e a internet”

Nassif diz que um trunfo que a mídia hegemônica tinha era uma aliança com o pessoal das confederações de futebol e a FIFA, que garantiam a eles a prioridade da transmissão dos campeonatos esportivos. “Os campeonatos de futebol sempre se constituíram na grande âncora de audiência de todos esses campeões nacionais de mídia. “Com a TV a cabo, você tem toda a pulverização de audiência, mas é o futebol que garantia aquele predomínio da audiência. ”

Por isso, quando a Record começou a ganhar mais musculatura, tentou competir com a Globo no campo dos campeonatos, em comprar direitos de campeonatos”

“A realpolitik americana consegue quebrar isso com o FBI indo até a Suíça, prendendo o pessoal da FIFA e fazendo parceria com outros Ministérios Públicos para denunciar essas manobras. Quais são os únicos Ministérios Públicos que não atuaram? Os Ministérios Públicos brasileiros. É vergonhoso. Ao mesmo tempo em que se aprofundavam as relações entre Lava-Jato, Departamento de Justiça, FBI, a Globo dava todo apoio à Lava-Jato e ficava incólume em relação a essas outras denúncias”

Diante de todos os imbroglios judiciais e os problemas de financiamento, os grupos de mídia nacionais jogaram a toalha e começam a trabalhar pela ampliação do percentual de capitais estrangeiros.

“Eles querem 49% de capital estrangeiro para manter o controle. Que grupo estrangeiro vai se associar com um grupo de mídia nacional com gestão familiar, ausência de compliance jornalístico e de negócios, mistura de negócios familiares com negócios da empresa, quem toparia ficar sócio?”

Do GGN

terça-feira, 12 de janeiro de 2021

VELOCIDADE DE TRANSMISSÃO DA COVID CRESCE E BOLSONARISTAS ATACAM CORONAVAC, POR FERNANDO BRITO

O Boletim do Imperial College de Londres, assinalando um crescimento de mais de 35% no nível de transmissão da Covid-19 no Brasil deveria estar de deixando de cabelo em pé as nossas autoridades sanitárias para que o “Dia D e Hora H” da vacinação aconteçam logo.

O índice de transmissão, identificado pela sigla Rt saltou de 1,04 para 1,41, o que quer dizer que, antes, se 100 pessoas infectadas transmitiam para 104 agora, nas mesmas circunstâncias, repassam o vírus para 140.

Em tese, isso significaria um aumento semelhante no número de infecções, internações e mortes em poucos dias.

Na prática, vai significar exatamente isso. O renomado instituto inglês estima 7.640 mortes na semana começada ontem, o mesmo número que a pior semana já registrada até agora, a de 19 a 25 de julho.

Embora seja suficiente para interromper esta avalanche de mortes e de internações hospitalares, a vacina do Butantã, pelo perfil de testes ultra-severos aplicados em sua fase 3 (apenas pessoas de serviço hospitalar, expostas fortemente ao Sars-Cov2) e pelas inúmeras chicanas antes de apresentar-se o número modesto numa “guerra de eficácia” que tem inconfessáveis objetivos comerciais. sofreu hoje um baque de confiança que vai ajudar o Governo Federal a postergar o início da vacinação, se é que não vão voltar atrás na compra dos imunizantes do Butantan.

A campanha dos bolsonaristas antivacina está exultante e criando a crença de que a vacina é inútil. O chefe deve estar se coçando para dizer o mesmo e talvez o faça.

Estamos cada ver mais num mato sem cachorro, ou sem vacina, porque os dois milhões que viriam da Índia, é claro, vão demorar e, mesmo assim, não se funcionam para uma campanha de vacinação massiva e em todo o nosso território.

Do Tijolaço.

segunda-feira, 11 de janeiro de 2021

FORD SAI DO BRASIL. VIVA A DIREITA SUICIDA! POR FERNANDO BRITO

Só não é um atropelamento de caminhão na economia brasileira porque a empresa já havia anunciado o fim da produção de caminhões que mantinha há 62 anos no Brasil em outubro do ano passado.

Mas agora, a Ford fecha de vez, encerrando também a produção brasileira de veículos de passeio, iniciada há mais de meio século, quando lançou o Corcel.

Perto de 7 mil trabalhadores – a fábrica tinha lançado um programa de demissões voluntárias em setembro passado – perderão o emprego no curto e médio prazo, à medida que a fabricação de peças vá sendo transferida, como a de veículos, para o Uruguai e para a Argentina. Quatro ou cinco vezes mais perderão os empregos na cadeia de fornecimento da empresa.

Sim, Argentina, aquela que Bolsonaro disse que “viraria uma Venezuela” e que teria filas de cidadãos fugindo para o Brasil em busca da sobrevivência.

Não é uma decisão surpreendente, porém.

Desde o ano passado, a Ford vinha anunciando a intenção de vender a fábrica de São Paulo e o governador João Doria tentou intermediar a venda para um grupo que detém licença de fabricação de marcas coreanas e chinesas, mas o negócio fracassou.

O governo federal, olimpicamente, lavou as mãos.

Embora trabalhasse com ociosidade, pela queda nas vendas, a Ford representava perto de 15% da capacidade instalada de produção de veículos do país, que já havia perdido, mês passado, as linhas de montagem da Mercedes.

Claro que os obturados ideologicamente (já estão fazendo isso nos comentários dos sites de notícias) vão culpar os custos trabalhistas e “o PT”, mas que diferença para o tempo em que um governo de um ex-operário metalúrgico fazia do Brasil o destino preferido para a instalação de novas fábricas de veículos.

É bem possível que o presidente desta cada vez mais republiqueta reaja com um “e daí?” e diga que é “o mercado” que deve decidir que empresa vive ou morre, fica ou sai.

Os governo que se sucederam ao golpe de 2016 não têm política industrial, não têm foco no crédito produtivo, não querem saber de nada que não seja o lucro especulativo e a exportação de produtos primários.

Abrimos mão de ter uma indústria brasileira de automóveis nos anos 60, assistimos o boom das estrangeiras instaladas aqui por 50 anos e, agora, vamos ver estas progressivamente dizendo adeus a Pindorama.

 Do Tijolaço.

domingo, 10 de janeiro de 2021

IMPOR A DOR PARA LUCRAR COM O ALÍVIO, POR FERNANDO BRITO

Boa parte da sociedade brasileira ainda não se deu conta de que, se temos um governo bandido, seus métodos para lidar com a realidade são os criminosos: fazer aquilo que o faça ter mais ganhos, sem limites éticos, morais ou mesmo humanitários.

Não preciso explicitar o modelo histórico que referenda este raciocínio, hein?

Fernanda Brigatti e Tayguara Ribeiro publicam hoje, na Folha, boa reportagem dos depoimentos de quem está ficando sem o que resta do auxílio-emergencial e sobre o imenso contingente de brasileiros que eles compõem.

Dão nome e rosto a pessoas que são milhões:, 4 em cada 10 brasileiros em idade de trabalhar, ou 67,9 milhões de beneficiários.

E convertem em pequenas grades necessidades – o ‘dicumê’ - os R$ 32,4 bilhões por mês que o auxílio injeta no consumo popular.

(cabe um parêntesis: com a apropriação pelos mais ricos da riqueza nacional, este dinheiro também é rapidamente bombeado para o andar de cima, e não mais o será).

Não é, portanto, necessário ser um grande economista – servem até os da “Escola de Chicago” para percebê-lo – a que grau de crise social nos levará a descontinuidade do auxílio em meio a um inevitável quadro de semi-paralisia a que o recrudescimento da pandemia nos está levando.

Portanto, não é um erro: é um plano.

Não tente entender o que faz Jair Bolsonaro pelo prisma da capacidade administrativa ou pelo do desenvolvimento econômico ou, muito menos, pelo do bem-estar social.

Sua ótica é outra, a mesma que têm as milícias: a legitimação da opressão pelo senso comum da ordem, seja a legal, seja a econômica.

O agravamento da situação econômico-social é peça indispensável na sua equação de poder. Surgir, como salvador, daqui a três ou quatro meses, com uma nova rodada de auxílios é muito mais rentável politicamente que mantê-lo agora e evitar a amplificação do caos.

É assim que a mente bolsonariana funciona e nenhum problema para ela há em dizer hoje o que negava ontem ou vice-versa, porque esta história de coerência é para os tolos ideológicos.

Não está sendo assim no caso das vacinas?

“Minha especialidade é matar”, já disse o ex-capitão, e não há dúvida de que o valor da salvação é tanto maior quanto seja grande a desgraça.

Do Tijolaço.

sábado, 9 de janeiro de 2021

A EUROPA EM 2021, POR BOAVENTURA SANTOS

Bandeira de Portugal. | Foto: Reprodução/Internet do Publico

Portugal tem boas condições para ser o timoneiro da UE neste período. Mas será lamentável se não aproveitar esta posição invejável para se libertar da chantagem dos países frugais e para cumprir plenamente a Leis de Bases da Saúde, dando ao SNS a centralidade que ele merece.

Portugal assume a presidência da União Europeia num momento de definições fundamentais que afetam as rotinas políticas e sociais dos tempos ditos normais. Desde a gestão da vacinação anti-covid-19 e do “Brexit” à preparação de um mundo ocidental pós-Trump e de uma Europa pós-Merkel, os desafios são enormes. Em vez de distinguir, como é uso convencional, entre problemas internos e internacionais, refiro-me aos temas estruturais que afetam tanto o interior como o exterior da UE. Identifico os seguintes temas principais: desigualdade e coesão; identidade histórica e reparações; direitos humanos e democracia; paz e guerra fria.

Desigualdade e coesão. A UE sai da crise pandémica com cerca de 9% de quebra do PIB. O risco da pobreza aumentou, mas é muito desigual entre os países da União e aponta para uma segmentação: entre 25%-32% para um grupo de países e entre 12%-17% para o outro grupo. O desemprego entre os jovens é de 17,3%, mas chega a 40% em Espanha. Tendo em conta que a quarta revolução industrial (inteligência artificial) vai causar adicional turbulência neste domínio, é urgente que a UE avance para uma política de rendimento básico universal que complemente e não substitua as outras políticas sociais. A legitimidade desta medida — hoje objeto de uma iniciativa cidadã na UE — está patente nas palavras de António Guterres no discurso de abertura da 75.ª sessão da Assembleia Geral da ONU em 2020: “a nova geração de proteção social [deve] incluir o seguro universal de saúde e a possibilidade do rendimento básico universal.” Agora, sem o Reino Unido, talvez haja espaço para aprofundar as políticas europeias, mas tal projeto só pode ter êxito na base de mais democracia interna na UE e da redução das assimetrias regionais.

A pandemia veio mostrar a falência do neoliberalismo e da prioridade dada à mercantilização da vida social. O Estado democrático social é, por agora, a única alternativa à barbárie da economia de morte que pretende transformar a letalidade da pandemia numa forma de darwinismo social que resolva os problemas da segurança social. A saúde é um bem público e não um negócio. Os serviços nacionais de saúde precisam de recuperar a sua centralidade, o que não se consegue com o mero reforço emergencial. Apesar de ter financiado em quase mil milhões de euros a investigação para a produção das vacinas, a UE está a comprá-las a um alto preço, talvez o negócio do século para as empresas privadas que as produzem. Não são conhecidos os detalhes dos contratos, sobretudo no que respeita à responsabilidade por eventuais efeitos secundários. E não podemos esquecer que entre os dez países com mais milionários três são da UE (Alemanha, França, Itália) e que na Alemanha 12% do aumento da sua riqueza dos super-ricos deu-se na área da saúde.

Identidade histórica e reparações. A Europa continua a ter dificuldade em saldar as contas com o passado, não apenas do mais remoto mas também do mais recente. O colonialismo não foi um progresso civilizacional, foi antes um instrumento violento para saquear as riquezas de grande parte do mundo extra-europeu. Obviamente que um processo histórico tão longo envolveu muitas outras relações, mas a principal foi o saque, um saque que continua hoje. O bem-estar relativo dos europeus não é pensável sem esse saque. As transferências de recursos do Sul Global para o Norte Global continuam a ser muitas vezes superiores às de sentido contrário. A recusa em descolonizar a história da Europa está na origem do racismo, que continua a inquinar as relações entre cidadãos europeus, da política equivocada de imigração, da transformação do Mediterrâneo em cruel cemitério líquido. É também a recusa em descolonizar a história que abre as portas ao crescimento da xenofobia, da islamofobia, do anti-semitismo e, em geral, ao incremento da extrema-direita. Em tempos de pandemia, a melhor maneira de a Europa se reconciliar com o mundo seria contribuir ativamente para que o mundo menos desenvolvido, grande parte do qual foi alguma vez colónia europeia, tivesse acesso rápido e gratuito à vacinação contra o coronavírus. A identidade histórica deveria estar também presente nas relações com países cuja pertença à Europa se transformou em disputa política, sobretudo nos casos da Rússia e da Turquia. Com 27 milhões de mortos na Segunda Guerra Mundial, foram os russos quem mais contribuiu para a libertação do jugo nazi.

Direitos humanos e democracia. A Europa orgulha-se de ser hoje o continente que mais consistentemente respeita a democracia e os direitos humanos. Sem entrar no mérito desta afirmação, importa-me sobretudo salientar o que implica levar a sério estes valores. Implica, antes de tudo, reconhecer que neste domínio houve retrocessos graves nos últimos 30 anos. A pandemia veio mostrar que a degradação das políticas sociais levadas a cabo por imposição das receitas neoliberais, de que a Comissão Europeia tem sido a grande promotora, tornou mais difícil a defesa da vida. Por um lado, o agravamento das desigualdades sociais, a erosão dos direitos laborais e a consequente precarização dos modos de vida compõem uma das variáveis mais diretamente relacionadas com a taxa de mortalidade da infecção. Por outro lado, a degradação dos serviços públicos incapacitou os Estados para dar a melhor resposta à emergência sanitária. Como vamos entrar num período de pandemia intermitente, levar a sério os direitos humanos significa inverter de imediato as lógicas de investimento público. Uma política robusta de promoção de direitos humanos e de democracia obriga a enfrentar sem calculismos a degradação destes valores na Hungria e na Polónia levada a cabo em nome de uma chamada “democracia iliberal”, uma contradição nos termos. A democracia liberal pode e deve ser criticada por ser pouca, não por ser muita.

Paz e guerra fria. Levar a sério os direitos humanos e a democracia implica seguir convictamente uma política de paz, o que repercute tanto no plano interno como no plano externo. Contra o que seria de esperar num período de emergência sanitária a nível planetário, a nova guerra fria entre os EUA e a China tornou-se mais violenta nos últimos meses. Perante o seu declínio como primeira potência mundial, os EUA têm vindo a acionar mecanismos cada vez mais agressivos para conter o que designam como expansionismo imperial chinês. As revistas que formulam a política externa dos EUA (e.g. Foreign Affairs) falam abertamente da possibilidade de conflito armado nos próximos dez anos, no que são apoiadas pelo poderoso complexo militar-industrial. Os EUA querem envolver neste processo todos os seus aliados e exigem solidariedade incondicional. Como a superioridade mais inequívoca dos EUA em relação à China é militar e como neste domínio a UE é um parceiro insignificante, a menos que a NATO se transforme num instrumento de agressão militar (mais do que tem sido já em tempos recentes, dos Balcãs à Líbia), uma aliança nestes termos não interessa à Europa.

A UE deve libertar-se rapidamente da cruzada persecutória contra o Irão e a Venezuela. Será que o fantoche Juan Guaidó, que já nem sequer é deputado e é contestado pela oposição venezuelana a Nicolás Maduro, vai continuar a ser considerado Presidente legítimo deste país e a presidir ao saque das reservas internacionais venezuelanas?

Os termos que interessam são estes: na longa duração histórica (quando os EUA não existiam) a China foi até ao século XIX a maior potência económica mundial; segundo a McKinsey, em 2040 a China representará 40% do consumo total de bens e serviços;  a China acaba de promover a Associação Económica Regional Integral, que é imensamente mais vasta que o mercado comum europeu; a Índia, atualmente governada pela extrema-direita, não pode ser um aliado especial da UE apenas porque não integra esta associação; a UE não pode ser aliada incondicional, nem da China (não é uma democracia e os direitos humanos são vistos como obstáculos) nem dos EUA (estes só aceitam o unilateralismo; Biden será menos pró-europeu do que se imagina; a luta contra os privilégios das gigantes norte-americanas da comunicação, a GAFA­ — Google, Apple, Facebook e Amazon — deve continuar). Acresce que a UE deve libertar-se rapidamente da cruzada persecutória contra o Irão e a Venezuela. Será que o fantoche Juan Guaidó, que já nem sequer é deputado e é contestado pela oposição venezuelana a Nicolás Maduro, vai continuar a ser considerado Presidente legítimo deste país e a presidir ao saque das reservas internacionais venezuelanas?

Portugal tem boas condições para ser o timoneiro da UE neste período. Tem tido um bom desempenho na defesa da vida na pandemia, inequivocamente patente nos dados; foi relativamente baixa a politização da pandemia; manteve um nível de coesão política e de consenso com a comunidade científica que só a direita mais reacionária não reconhece; pese embora o sistémico comportamento do SEF, tem uma política de imigração mais positiva que outros países europeus; sendo um tradicional aliado do Reino Unido, pode ser artífice de entendimentos num período que vai conhecer atritos. Mas será lamentável se não aproveitar esta posição invejável para se libertar da chantagem dos países frugais e para cumprir plenamente a Leis de Bases da Saúde, dando ao SNS a centralidade que ele merece.

Do GGN

sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

AUGUSTO ARAS DISPARA GOLPE FATAL CONTRA LAVA JATO, VIABILIZA COMPARTILHAMENTO DE DADOS SIGILOSOS

Augusto Aras, procurador-geral da República. Foto: Reprodução

Portaria assinada nesta sexta-feira permite acesso de informações aos integrantes do Ministério Público Federal pelo Brasil.

Uma portaria assinada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras, permite compartilhamento interno das informações obtidas em investigações realizadas pelo Ministério Público Federal, incluindo dados sigilosos da operação Lava Jato.

Apenas o arquivo da força-tarefa da Lava Jato de Curitiba (PR) possui um total de 1000 terabytes, que estão em poder da Sppea (Secretaria de Perícia, Pesquisa e Análise), órgão da PGR (Procuradoria-Geral da República).

No caso do banco de dados da Lava Jato, estão reunidas informações (parte delas sigilosa) de pessoas e empresas, incluindo os acordos de delação premiada e de leniência. O procurador que estiver trabalhando em determinada investigação poderá acessar os arquivos em busca de elementos.

Para isso, será necessário formalizar e justificar o pedido e, quando o pedido for aprovado, a Sppea fará a pesquisa e o encaminhamento de um relatório ao solicitante. A distribuição também pode ocorrer por iniciativa do procurador responsável pelo ofício onde os dados estão vinculados.

Segundo o jornal Folha de São Paulo, a ideia foi anunciada por Aras no final do ano passado, e assinada nesta sexta-feira (08/12) em conjunto com a corregedora-geral do MPF, Elizeta Ramos, regulamenta como será o recebimento, o armazenamento e o compartilhamento das informações.

Do GGN

quinta-feira, 7 de janeiro de 2021

BRASIL TEM RECORDE DE MORTES E PAZUELLO, O SEM-VACINA, ANUNCIA “PLANO MÃO-GRANDE”, POR FERNANDO BRITO

Acaba de sair o boletim de hoje do Conselho Nacional dos Secretários de Saúde, acusando 1.841 mortes nas últimas 24 horas, acrescidos dos “atrasos” da contagem de anteontem no Rio e no Amazonas. Na contagem do Ministério da Saúde, foram 1.524, o segundo mais alto desde o início da pandemia.

No número de casos, tivemos quase 88 mil nas contas oficiais do Ministério, o maior desde que começou a crise da Covid-19.

Ao mesmo tempo em que, com isso, superamos a marca das 200 mil mortes (200.498), assistia-se pela televisão o espetáculo dantesco da “entrevista” do ministro da Saúde: grosseiro, despreparado, autoritário, chegou a dizer que a imprensa “não tem delegação” para interpretar as notícias, apenas para reproduzi-las.

O general vá plantar suas batatas em ditaduras, onde ser jornalista é apenas reproduzir as declarações das autoridades.

Não somos seus subordinados para dizer-lhe “sim, senhor” e deixar de indagar, apontar contradições e apurar a verdade com perguntas – como as que não se fez a ele, que saiu antes de responder qualquer indagação, deixando os auxiliares de dentes à mostra para responderem duas ou três formuladas sem nenhum vigor – e interpretar o que se diz e o que se sabe.

O ministro seguiu sem anunciar objetivamente o que será a vacinação, ficando nas já famosas “três hipóteses”: 20 de janeiro, 10 de fevereiro e início de março. E tudo o que pode ser feito será não por obrado ministério, mas porque São Paulo está aceitando – será que isso tem a ver com a aprovação da Coronavac pela Anvisa? – ser garfado nas doses que acumulou, importadas da China.

Os dois milhões de doses indianas são uma mera cortina de fumaça, um subterfúgio para tentar dissimular que a única chance de Bolsonaro vacinar é com “as vacinas do Dória”. Sejamos justos: Doria ofereceu o Butantan para apoiar o plano nacional de imunização e o governo federal recusou-o a patadas. Agora, talvez esteja diante do dilema de entregá-las e minguar o seu plano de vacinação ou não poder fazê-lo por falta de registro da vacina.

As vacinas a serem produzidas pela Fiocruz dependem de dois fatores. O primeiro, a chegada do componente ativo da vacina, até agora não entregue no Brasil. O segundo, da incerta capacidade de processar este insumo em grandes quantidades, o que não está, ao menos publicamente, bem esclarecido.

As negociações com os laboratórios farmacêuticos, que Pazuello pintou como os chantagistas que de fato são, são as mesmas que tiveram outros países. Esqueceu-se Pazuello, porém, que as dificuldades ficaram maiores e as quantidades das vacinas oferecidas minguaram porque só muito tarde – e sem muita garra – o Brasil foi ao mercado mundial para pretender comprá-las.

Estamos com gente morrendo como moscas e com gente completamente incapaz no comando do país e de seu sistema sanitário.

Aliás, não é gente incapaz: é gente má, que está se lixando para vacinar o povo brasileiro. Quem duvidar disso, tampe o nariz e assista à live de Jair Bolsonaro, daqui a pouco, fazendo pouco da vacina e tirando a credibilidade da vacina.

Do Tijolaço.

quarta-feira, 6 de janeiro de 2021

BANCO DIGITAL É O PRENÚNCIO DA PRIVATIZAÇÃO DA CAIXA, AVALIA PRESIDENTE DA FENAE

 

Os benefícios sociais operados pelo banco serão transferidos para a nova subsidiária, que deve ser criada neste ano.

Uma outra instituição financeira, com outro CNPJ, será responsável pelo pagamento de todos os benefícios sociais operados pela Caixa. É o que pretende o presidente da instituição, Pedro Guimarães, com a criação do banco digital – que vai passar por um processo de abertura de capital (IPO) no Brasil e no exterior.

“O que for banco social vai para o digital”, disse Guimarães em entrevista para o jornal Valor Econômico, no dia 30 de dezembro. A criação do banco digital ainda precisa ser aprovada pelo Banco Central e pelo Conselho de Administração da Caixa (CA/Caixa).

Além do pagamento de todos os benefícios sociais como o Bolsa Família e o Minha Casa Minha Vida (que será substituído pelo Casa Verde e Amarela), o banco digital vai liberar microcrédito para, no mínimo, 10 milhões de clientes. Também vai fornecer crédito imobiliário para famílias de baixa renda.

O presidente da Federação Nacional das Associações da Caixa Econômica Federal (Fenae), Sergio Takemoto, considera a criação do banco digital mais uma etapa para privatizar a Caixa – “O projeto deste governo e da direção da Caixa é dividir o banco em várias partes (subsidiárias) e vender cada uma delas – uma privatização disfarçada para burlar a Lei, que não permite a venda da empresa-mãe sem aval do Congresso. Mas Takemoto considera que a criação de mais uma subsidiária como o banco digital, que já nasce com objetivo de privatização, tem um objetivo mais “ousado e perigoso”.

“O coração da Caixa, a função pública e social do banco será transferida para um outro CNPJ que não é o da Caixa. Qual será o futuro dos programas e benefícios sociais se estiverem nas mãos do mercado privado, que só visa o lucro? As políticas públicas que atendem a população mais carente do País serão garantidas?”, questiona o presidente da Fenae, Sergio Takemoto.

Para Rita Serrano, representante dos empregados no CA/Caixa, a medida é grave e coloca em risco a sustentabilidade e integridade do banco. “O banco digital nada mais é do que um outro banco, com outro CNPJ, para onde serão transferidas as principais operações da Caixa. Num outro momento esta nova instituição será privatizada”, alertou.

Com o pagamento do Auxílio Emergencial, a Caixa foi responsável pela inclusão bancária de milhões de brasileiros que não tinham acesso aos bancos. 105 milhões de poupanças digitais foram abertas para o pagamento do benefício por meio do aplicativo Caixa TEM – o coração do banco digital. Além do acesso a informações sobre o Auxílio emergencial, programas sociais, FGTS e Seguro-Desemprego, pelo aplicativo é possível fazer compras pela internet com o cartão de débito virtual gerado na própria ferramenta.

Todo esse salto de qualidade tecnológica, realizado pelos empregados da Caixa com patrimônio público, deveria ser usado para fortalecer o banco e impulsionar o seu papel como instituição pública, avalia Serrano. “Mas o que a direção do banco vai fazer é o contrário – transferir toda esta herança positiva para outra instituição”, explica.

Serrano lembra que o Banco do Brasil e os maiores bancos privados como Bradesco, Itaú e Santander têm plataformas digitais. A diferença é que foram criadas para agregar público, em especial o público jovem, e entrar na concorrência com as fintechs, que tomam grande parte deste público.

“No caso da Caixa é diferente – ela já possui a plataforma digital, que é o Caixa TEM, já conquistou um público grande com a abertura das poupanças sociais digitais e fez a inclusão bancária de milhões de brasileiros que não tinham acesso aos bancos. Tudo isso já é um patrimônio da Caixa. O que está se falando é criar um outro CNPJ, transferir esse patrimônio já conquistado para outra instituição e, no momento seguinte, fazer a abertura de capital desta instituição, privatizando parte ou todo o banco”, disse. “Quem ganha são os investidores que vão comprar um patrimônio que a Caixa construiu com recursos públicos. Nós temos o dever e o poder de impedir mais esse absurdo contra o patrimônio dos brasileiros”, alerta a conselheira.

Do GGN

terça-feira, 5 de janeiro de 2021

“O BRASIL ESTÁ QUEBRADO”, ADMITE BOLSONARO SUA PRÓPRIA INCOMPETÊNCIA, POR FERNANDO BRITO

O Brasil tem muita sorte de ter um presidente tão desmoralizado que aquilo que diz, por ninguém acreditar, não tem repercussões.

Imagine o leitor distinto e a caríssima leitora que ocorreria se o presidente de qualquer lugar do mundo dissese, de público, que seu país “está quebrado”.

Claro, a Bolsa despencaria, o dólar saltaria, o mercado de juros explodiria.

Mas Jair Bolsonaro disse hoje a seus fanáticos, queimado de sol e gorduchinho com os feriados de fim de ano, que não consegue “fazer nada” pelo fato de que “o Brasil está quebrado”, por causa “desse vírus potencializado pela mídia”.

E foi apenas mais uma cena folclórica do desclassificado. O dólar, que já subia, ficou lá onde estava. A Bolsa, que já caía, também se manteve onde estava.

Somos um país exangue, inerte, cansado ao ponto de não ter forças para resistir à própria destruição.

Além do mais, apesar de haver dinheiro, e muito, circulando, por conta dos mais de R$ 600 bilhões injetados ao longo de 2020 na economia, são poucos os que se dão conta de que isso está acabando, porque não há mais para dar e ainda se o tem de pagar, com os vencimentos cavalares da dívida pública no primeiro quadrimestre do ano.

Sou forçado a dizer que Bolsonaro está certo e os que duvidam do que ele diz, errados.

O Brasil está quebrado, e não é nem essencialmente nas contas públicas.

É na alma, na dignidade, no amor ao país, despedaçado por todos eles – políticos, militares, financistas e mídia – que puseram esta Pátria nas mãos de um psicopata.

Do Tijolaço.

segunda-feira, 4 de janeiro de 2021

O QUE O ESPERNEIO DE TRUMP ENSINA SOBRE BOLSONARO, POR FERNANDO BRITO

A gravação em que Donald Trump pressiona o secretário de Estado da Geórgia, o republicano Brad Raffensperger, a “encontrar 11.780 votos” para reverter o resultado eleitoral daquele Estado e a carta de todos os 11 secretários de Defesa norte-americanos vivos afirmando que o quase ex-presidente tenta envolver as Forças Armadas do país em seus planos continuístas dereiam acender os óbvios alertas no Brasil sobre o que nos aguarda ao fim de 2022.

Tal como ocorreu com seu “modelo” do Norte, não bastará que Jair Bolsonaro seja vencido, será preciso que não se permita que ele ache nas instituições públicas suporte para o que se está vendo – felizmente como caricatura – nos Estados Unidos.

E não é isso o que parece estar acontecendo.

Até agora, políticos, juízes e militares estão, quando não cúmplices, vacilantes e omissos diante das loucuras e crimes cometidos pelo presidente da República.

Nem mesmo emitem sinais de que lhe imporiam limites se fosse além das bravatas e ameaças que faz, aliás trilhando previamente o caminho da desconfiança da lisura do processo eleitoral.

Está escancarado que Bolsonaro é contra a vacinação e que joga um jogo de aparências, forçando situações apenas para que isso não se explicite, mas sabotando, na prática, as ações que deveriam estar acontecendo para que ela ocorra.

Ministério da Saúde, Anvisa e o que mais houver no governo federal são simples passageiros da nau dos insensatos que o tem como capitão.

A parcela da direita que o apoiou ainda acha que pode se livrar dele com candidaturas de R$ 1,99, como as de Luciano Huck, Sergio Moro e assemelhados.

Ainda que o conseguisse – o que é improvável ao oferecer outra aventura ao povo brasileiro – isto não resistiria aos métodos e disposições golpistas do atual presidente.

Nos Estados Unidos, há uma tradição de 224 anos de respeito militar ao comando civil do país e uma Suprema Corte que, se é formada ao sabor das inclinações políticas dos presidentes que indicam seus integrantes, sabe manter sua coluna ereta diante de situações absurdas.

Quem pode dizer algo semelhante do Brasil?

Do Tijolaço.

domingo, 3 de janeiro de 2021

VACINA: QUAL, QUANDO, QUANTAS. ESTÁ NA HORA DE SABER A VERDADE, POR FERNANDO BRITO

Segue completamente obscuro o início do longo processo de vacinação contra a Covid, sem que haja no país uma dose sequer além das chineses da Sinovac, em parceria com o Butantã.

Não obstante, cada um fala numa data – como fez hoje Eduardo Paes, ao mencionar que “ouviu dizer” que a vacinação nacional começaria no dia 20 de janeiro, o que foi formalmente desmentido pelo Ministério da Saúde, que preferiu dizer que a data é, apenas, “a melhor das hipóteses”.

Como o mundo inteiro com a vacinação já em marcha (lenta, aliás, pela baixa disponibilidade dos imunizantes), não é preciso ser muito atilado para saber que – como aconteceu há meses com os respiradores – há uma guerra para capturar os pequenos estoques de vacinas já prontas.

O Globo publica agora à tarde que a “Vacina de Oxford, a maior aposta do governo, pode levar cerca de um mês para ficar disponível“, apontando razões burocráticas para tamanho atraso.

Há, porém, etapas anteriores a elas.

É preciso, primeiro, receber as vacinas e ter a garantia de um fluxo de fornecimento que permita planejar a vacinação, do contrário estaremos causando mais confusão, como fez hoje o novo prefeito do Rio ao falar em vacinar 2,6 milhões de pessoas numa primeira fase. Ora, isso é o equivalente a 38% dos cariocas e significaria que, recebendo vacinas segundo sua proporção na população brasileira, seria necessário que o país tivesse disponíveis 83 milhões de vacinas, o que nem o mais otimista espera que tenhamos até o terceiro trimestre de 2021!

Além disso, o Reino Unido, sede da empresa que produz a vacina de Oxford e a Índia, onde se encontra a maior planta de produção do imunizante – o Serum Institute – começam amanhã a usá-la e é claro que não seremos a prioridade. Aliás, o Serum já assinou um protocolo de intenções com a associação de clínicas vacinais privada brasileira, para o fornecimento de 5 milhões de doses (2,5 milhões de imunizações), certamente a preço melhor do que o cobrado do governo brasileiro.

Tudo está, ainda, na base do “se cumprirem o prometido”, que a gente nem sabe o que foi, como no caso do vai-não vai com a vacina da Pfeizer.

Depois do show aquático com direito a xingamentos a João Doria é legítimo duvidar que Jair Bolsonaro vá deixar o seu arqui-inimigo posar de pioneiro da vacina no Brasil, embora seja ele que tem, na mão, 10,6 milhões de doses dela para aplicar.

Se isso será feito apressando a de Oxford, mesmo em pequena quantidade, para o que tenho chamado de “vacinação cenográfica” ou atrasando a liberação da Anvisa do imunizante chinês, logo iremos saber.

Do Tijolaço.

EMPOSSADO ARNALDO CARDOSO O NOVO PREFEITO DE BURITI PARA UM MANDATO DE QUATRO ANOS

Tomou posse, em primeiro de janeiro de 2021, Arnaldo Cardoso (PL), como novo prefeito de Buriti para o quadriênio 2021 a 2024, numa solenidade muito concorrida, comandada pela cerimonialista Ana Baldez, oportunidade em que compôs a mesa solene num primeiro momento com Joaquim Borges Neto (Neto Borges), representando o povo, e o velho Chico Mourão como o maior líder político do município, segundo suas palavras.

Os demais compunham o primeiro escalão da administrativo, pela ordem, Shirlyane e Lucas Machado – Saúde; Gabriela Chaves e Edilene Tertulino – Educação; Cristina Cardoso e Jean Cássio – Administração e Finanças; Francisco das Chagas (Rosin) e Júnior Frazão – Obras; José Dionísio e Toinho Mouros – Transporte; Ademar Lago e Bernardo – Agricultura; Jeferson Rocha e Ana Susane – Cultura; Romualdo Veras e José Carlos – Esporte; Antonio Luís Nunes Bastos e Clovis Nunes Bastos – Meio Ambiente; Francilvânia Silva Sousa dos Anjos – Procuradoria Geral; Francisco Luís das Chagas Rocha - Lulu – Secretário de governo; Solange Machado – Chefia de Gabinete. 

Fizeram-se presentes a “vereança” conforme nominou o cerimonial, além de Naires Marques Freire recém eleita Presidente da Câmara, portanto credenciada a dar posse ao prefeito, abriu o ato agradecendo a Deus e lembrando seu pai em memória, foram chamados para sentarem nas cadeiras da frente do auditório outros quatro vereadores eleitos na chapa vencedora, exceto Andréa Costa que lera o compromisso de posse. As falas foram seletivas, primeiro Neto Borges, ali na qualidade de representante do povo, acho que por não ter cargo, fez um alerta, “que os políticos que já tiveram sua vez, que deixasse o prefeito trabalhar”, disse.


sábado, 2 de janeiro de 2021

XADREZ DO ANOS 2010, A DÉCADA DA INFÂMIA, POR LUIS NASSIF

Lula foi vítima do próprio sucesso. De um lado, ganhou uma força política imbatível. Sem perspectivas de conquistar a presidência, a oposição passou a conspirar. De outro lado, incensado mundialmente, confiou desmedidamente na sua intuição política e republicanamente desarmou-se.

O Brasil vive o seu maior desafio como nação. Nos últimos anos houve uma hecatombe institucional cujos maiores responsáveis foram os grupos de mídia e o Supremo Tribunal Federal. Em uma disputa selvagem por poder, foram jogadas fora todas as conquistas da Constituição de 1988, desmontou-se o modelo político, destruíram-se as maiores fontes geradoras de emprego, desmontaram-se as políticas sociais, educacionais, científico-tecnológicas e matou-se provisoriamente o futuro, uma destruição iniciada no interinato de Michel Temer e consumada no governo Jair Bolsonaro.

Os historiadores, cientistas políticos, talvez consigam explicar, no futuro, o que levou uma nação ao suicídio.

PARTIDOS POLÍTICOS

Tudo começou quando um partido de esquerda, o PT, movimentou-se para o centro-esquerda, a social-democracia. Tinha como trunfo instrumentos da social-democracia que faltavam ao antigo aspirante, o PSDB, como sindicatos, movimentos sociais e um líder popular de expressão. E foi bem sucedido em suas políticas sociais, apesar da oposição infame da mídia.

Por seu lado, a financeirização empreendida no governo Fernando Henrique Cardoso, a morte de lideranças históricas, como Mario Covas e André Franco Montoro, a ascensão de duas lideranças inescrupulosas, como José Serra e Aécio Neves, e de uma liderança medíocre, como Geraldo Alckmin, afastaram cada vez mais o PSDB de qualquer veleidade programática. Sob FHC, Aécio e Serra, principalmente quando a popularidade de Lula bateu recordes, o PSDB tornou-se cada vez mais um partido com uma única bandeira: o “delenda PT”.

MÍDIA

Simultaneamente, os grupos de mídia entram em violenta crise econômica e, sem estratégia para enfrentar a quebra de barreiras representada pelos novos meios de comunicação, resolveram ganhar protagonismo político: “nós somos a verdadeira oposição”, dizia Roberto Civita, o pai do modelo. Teve início um período de jornalismo de esgoto, uma arma de guerra que estuprou todos os princípios jornalísticos, democráticos, plantou o ódio e contaminou irreversivelmente a democracia brasileira.

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

Com suas armas preferidas – os ataques aos recalcitrantes e lisonja aos que aderiram – a mídia passou a monitorar as ações do Supremo, processo acentuado pela imprudência dos julgamentos televisionados e pela transformação de Ministros em celebridades.

Ministros dignos foram submetidos a escrachos; ministros indignos a aplausos televisivos; Ministros medíocres saudados como grandes poetas ou frasistas. E, com cenoura e chicote, o Supremo foi se moldando aos novos tempos de incúria.

Tinha-se, portanto, um partido que trocou a social-democracia pelo discurso de ódio, uma mídia que pretendia se tornar poder político para se salvar, e um Supremo passando a atuar sem os limites impostos pela Constituição.

Mas não ficou nisso. O vírus inicial espalhou-se por todos os poros da República.

AS CORPORAÇÕES PÚBLICAS

As profissões de elite do setor público voltaram  a ser prestigiadas com salários elevados. A nova elite do funcionalismo abdica da função de servidor público para assumir o espírito dos CEO de mercado. Como CEOs públicos, puderam frequentar cursos superiores, cursar MBAs, ganharam bolsas de suas instituições para estudar fora. Agora, queriam seu naco de poder.

Essa onda de protagonismo foi se espalhando pelo setor civil armado do Estado, as corporações com poder da caneta. O aprimoramento dos sistemas de controle, com o Tribunal de Contas da União, Controladoria Geral da União, Ministério Público Federal, criou entidades de poderes ilimitados, especialmente depois que a campanha em torno da Lava Jato oficializou a máxima de todo poder aos Catões.

Com o vácuo institucional, até as Forças Armadas entraram no jogo, através do seu comandante, general Villas Boas.

O PT

O julgamento do “mensalão” marcou o início desse jogo macabro, de falsificação diária de notícias, de fabricação diuturna de escândalos e de manipulação de provas.

Lula venceu a primeira rodada de golpe com a maneira como enfrentou a crise de 2008, que alçou-o à condição de político mais popular do planeta.

Durante algum tempo o país ressuscitou a auto-estima dos tempos de JK. O modo de ser brasileiro, as políticas sociais, o soft power, a liderança diplomática sobre os países do sul, o avanço diplomático-econômico na África, Oriente Médio, o sucesso do etanol e do agronegócio, a mediação de conflitos no Oriente Médio, tudo apontava para o nascimento de uma nova Nação.

Lula foi vítima do próprio sucesso. De um lado, ganhou força política imbatível. Sem perspectivas de conquistar a presidência, a oposição passou a acelerar a conspiração. De outro lado, incensado mundialmente, confiou desmedidamente na sua intuição política e desarmou-se. Descuidou-se nas indicações para Ministros do Supremo e abriu mão de qualquer tentativa de influenciar  até  poderes sob responsabilidade da Presidência – como a Polícia Federal, a indicação do Procurador Geral da República. Foi terrivelmente imprudente na negociação de cargos na Petrobras.

Mais que  isso, cometeu dois erros fatais: na indicação da sua sucessão  e ao abrir mão  de concorrer nas eleições de 2014.

O caos

Aberto o caminho do vale-tudo, a partir da campanha do “mensalão” todos os pecados foram permitidos. Ministros do Supremo Tribunal Federal concordaram em participar de armações grosseiras sobre grampos, Ministros que assumiram como legalistas se encantaram com a nova onda, jogaram a Constituição no lixo e saíram rodando a baiana. Tudo isso perante um governo petista desarmado, inepto para enfrentar as disputas do poder.

Qualquer bobagem era motivo para explosões de escândalo de baixíssimo nível – quinquilharias, como a tapioca comprada com cartão corporativo, o perfil da jornalista alterado na Wikipédia, até factóides óbvios, como invasão das FARCs, dólares em garrafas de rum e outras obscenidades que marcaram para sempre a mídia brasileira.

O suicídio do reitor da Universidade Federal de Santa Catarina foi a síntese macabra das libações da Justiça, obra conjunta de uma delegada da Polícia Federal, um procurador do Ministério Público Federal, uma juíza da Justiça Federal, da Controladoria Geral da República.

Até hoje, uma imprensa invertebrada, medrosa, foi incapaz de conferir ao episódio a gravidade de que se revestia, para não atrapalhar a estratégia do “delenda quem pensar diferente” ou simplesmente para não ir contra a onda.

Quando sobreveio a queda nas cotações de commodities, perdendo-se o bônus político dado pela economia, o país estava nas mãos honestas, sinceras, mas inexperientes e auto-suficientes de Dilma Rousseff.

Não houve condições de reorganizar a resistência política.

E agora, José? A noite chegou, o monstro surgiu, o custo dessa irresponsabilidade pode ser contabilizado no próprio número de mortes evitáveis do Covid, frutos do negacionismo do Frankenstein político que emergiu do cemitério em que foram enterradas as instituições e as esperanças de construir uma Nação digna.

O que se terá daqui para frente?

Os responsáveis pela destruição institucional e econômica

Moro, Dallagnol, setoristas da Lava Jato, colunistas de ódio, Eduardo Cunha e seu grupo político foram apenas coadjuvantes, os germes oportunistas em um organismo enfraquecido pela atuação dos responsáveis maiores.

O duro recomeço passará por alguns desafios complexos.

PEÇA 1 – O CARÁTER NACIONAL

A crise atual serviu para expor uma das piores heranças culturais do país: o chamado racismo estrutural.  

Mas há um outro componente pouco estudado, talvez primo-irmão, o caráter das elites brasileiras e dos setores que ambicionam um lugar na chamada Casa Grande.

A maneira como mídia, Supremo, políticos, corporações públicas ingressaram no golpismo mais explícito, sem a menor preocupação com a imagem ou, melhor, regozijando-se com sua imagem refletida no esgoto, é um fenômeno típico de sociedades sem caráter.

Tenho a impressão de que a necessidade de se identificar com as classes altas seja um resquício da República Velha, na qual as classes de baixo, para se defenderem dos abusos da Justiça e do poder, tinham que se abrigar sob as asas de algum coronel local.

Essa submissão, por sua vez, gerava um sentimento de onipotência quando, por alguma razão, o cidadão normal, através de estudos passava a cumprir o papel de jagunço letrado, tornando-se defensor das demandas da classe superior junto às instituições de Estado – em uma função de jornalista, juiz ou Ministro do Supremo. Aí havia  o deslumbramento total, dos que supunham ter conseguido a inclusão por cima.

Some-se o fato de uma sociedade historicamente permissiva, que permitia a convivência com traficantes de escravos, bicheiros, doleiros, desde que bem-sucedidos financeiramente. Grandes doleiros, contrabandistas, são aceitos com naturalidade nas sociedades do Rio ou de Brasilia, e confraternizam-se com autoridades no paraíso tropical de Miami.

Esse talvez seja o motivo por que, na guerra jurídico-midiática-política mais suja da história, não tenha ocorrido sequer as chamadas objeções de consciência como impeditivo.  Por tal, entenda-se a atitude do motorista de um trator, que recebeu a ordem de destruir as casas de famílias sem terra. Ele se negou a cometer a crueldade. Recorreu à chamada objeção de consciência.

Nada disso se viu no período em que o ódio foi plantado, cevado e colhido. Não houve objeção de consciência por parte dos principais agentes da conspiração e sequer  um mínimo de pudor, aquela pequena vergonha que acomete até as mentes mais insensíveis, quando flagradas em grandes malfeitos.

Em países com caráter, quem aderisse ao golpismo seria mal visto ao menos por sua categoria. Uma mídia com caráter denunciaria desvios de condutas, exporia os oportunistas, os excessivamente ambiciosos, os crimes cometidos pelos guardiões da lei.

Nada ocorreu. Pelo contrário, os bárbaros foram celebrados, houve pruridos da mídia até em divulgar o suicídio do reitor da UFSC.

Este foi o Brasil da década de 2010.

Por outro lado, começa a surgir uma onda de liberalização relativa, impulsionada pelos ventos externos. Alguns dos principais responsáveis pelo envenenamento político anterior ressurgem como baluartes da democracia – e nada lhes é cobrado, nem um mínimo de autocrítica.

Por tudo isso, nada espere desse aggiornamento liberal dos porta-vozes dos homens de bens, nem mesmo com as novas ondas que se propagam pelo mundo civilizado, como reação à barbárie da era Trump.

O país sem caráter só se submete a contingências de ordem política e é reativo a movimentos de opinião pública.  Jamais assumirá o protagonismo da defesa da civilização.

Portanto, movimentos virtuosos que vierem a surgir, serão externos a esses personagens centrais do golpe.

PEÇA 2 – A MÍDIA

A guerra cultural inicial em 2005 criou uma geração de jornalistas assustados, enquadrados. Não os culpe. Passou a ser pré-condição para seguir carreira.

Agora, começa a haver uma pequena reação de algumas cabeças mais independentes, no pequeno espaço aberto por alguns veículos que perceberam  que jornalistas com caráter próprio são peças centrais na credibilidade do veículo como um todo. Mas esse tipo de jornalista com luz própria ainda é minoria e pisa em ovos.

Além disso, o liberalismo midiático vai até o limite Lula. Persistem todas as idiossincrasias do período anterior, substituindo os assassinatos de reputação pela invisibilização. E tudo isso em um momento em que o mercado de opinião foi pulverizado por bolhas de todas as cores, tirando definitivamente da mídia o papel de mediadora central das discussões nacionais.

A grande contribuição da mídia será refrear o jornalismo de esgoto do período anterior e deixar de aspirar a ser partido político.

Aliás, os editoriais de hoje da Folha e do Estadão escancaram a estreiteza de visão, em relação à maior crise política da história. 

PEÇA 3 – O SISTEMA DE JUSTIÇA

Hoje em dia, o sistema de Justiça lembra os exércitos confederados depois da guerra da Secessão, grupos andando pelas estradas e fuzilando quem passe pela frente, adversários, transeuntes, pouco importando. Bastava não vestir uniformes cor de cinza.

Primeiro foi a Lava Jato impulsionando o protagonismo político do Judiciário. Depois, o liberou geral de alguns tribunais, estimulando o lawfare judicial contra supostos adversários políticos.

Há em curso, também, uma guerra mundial interna no Judiciário.

A Procuradoria Geral da República monta uma ofensiva contra o juiz Marcelo Bretas e a Lava Jato Rio. Para se defender, ambos acertam uma operação que mira filhos de ministros do Superior Tribunal de Justiça (STJ).  Antes disso, a Lava Jato de Curitiba se valeu de suas ligações internacionais ilegais para tentar provas contra Ministros do Supremo.

Nessa frente, o fim da Lava Jato é um refresco, mesmo deixando indevassáveis vários porões dos tribunais superiores.

No Supremo, a entrada de um Ministro garantista, ainda que indicado por Bolsonaro, traz esperanças de uma pacificação da corte e da Justiça em geral. Mesmo porque, os batedores de 1a instância, que vão na linha de frente fuzilando adversários, jogando bombas nos inimigos, representam ameaças efetivas ao próprio conceito de hierarquia jurídica.

Além disso, o fim da onda punitivista faz com que Ministros-que-seguem-ondas, como Luís Roberto Barroso, passem a cavalgar outras ondas, desinteressando-se da guerra nada santa contra os garantistas do Supremo.

Não espere nenhuma contribuição do Supremo – e da Justiça – a um pacto civilizatório de envergadura. Mas, também, não será mais um protagonista político, limitando-se a convalidar as políticas econômicas de desmonte das redes de proteção social votadas pelo Congresso. O que não é pouco.

PEÇA 4 – AS FORÇAS ARMADAS

Hoje em dia as Forças Armadas estão irreversivelmente ligadas à imagem do governo Bolsonaro. Os erros dos generais de Bolsonaro na questão de energia, especialmente na Saúde, na articulação política, a apatia ante a liberação de armas, a aceitação pacífica da oferta abundante de empregos na área civil, fez com que as Forças Armadas brasileiras tivessem seu momento Malvinas.

Não se verá mais atitudes como a do general Villas Boas que, com um mero twitter, ajudou a consolidar o golpe jurídico-parlamentar. Mas será um enorme desafio desalojar os militares do enorme mercado de trabalho criado na área civil e nas escolas militares.

De qualquer modo, apesar da excelência dos institutos militares de tecnologia, não espere das Forças Armadas nenhuma contribuição à ideia de pacto ou projeto nacional. Seu papel no desenvolvimento industrial, desde as políticas industriais dos anos 30 ao desenvolvimento da indústria aeronáutica e do enriquecimento de urânio, são apenas retratos na parede. Hoje, o que viceja é o padrão Pazuello.

PEÇA 5 – OS PARTIDOS POLÍTICOS

O sistema partidário foi triturado. Hoje em dia, o jogo político se dá em torno de dois movimentos:

Liberalismo selvagem – movimento que junta o MMS – Mídia, Mercado e Supremo. Seu objetivo maior é sancionar o desmonte final do Estado. Todos seus movimentos ocorrem na validação dos negócios da privatização, do desmonte das políticas sociais, mas com um olho em 2022. É o que mantém Bolsonaro imune, apesar de todos os descalabros que comete. Sua aposta é em Luciano Huck, apesar dos esforços de João Dória Jr em se habilitar.

Progressistas – há uma corrente progressista presente nos movimentos sociais e em várias categorias profissionais. Hoje em dia, há os economistas pela democracia, os juízes, os procuradores e os policiais antifascistas. Mas não há um ponto de organização para essas demandas.

Espinha dorsal do petismo, o sindicalismo foi fuzilado a partir do interinato de Temer. Mesmo antes, jamais conseguiu sair das bolhas corporativas. E o PT não conseguiu se arejar para repetir o papel dos anos 80, do grande ônibus abrigando movimentos sociais de toda espécie.

Lula mantém-se como a grande liderança, mas sem as condições de articulação de antes. Caso semelhante ocorreu com Getúlio Vargas quando retornou do exílio interno e se tornou novamente presidente. As circunstâncias eram outras, os atores eram outros e ele não conseguiu se mover com a mesma desenvoltura política de antes.

Por outro lado, movimentos auspiciosos que estavam se formando – como a frente dos governadores do Nordeste – recuou devido às fragilidades fiscais provocadas pela pandemia. E o ativismo político da Justiça liquidou com o grande articulador da frente, Ricardo Coutinho, ex-governador da Paraíba.

Dono dos melhores diagnósticos sobre a crise, Ciro Gomes padece dono mesmo voluntarismo que o marcou a vida toda.

Em todo caso, à medida em que as esquerdas não conseguem apresentar uma proposta competitiva, e a direita se perde em devaneios com Huck, há um espaço para o novo conhecido, o bonapartismo de Ciro.

PEÇA 6 – SEM CONCLUSÕES

Vive-se um momento totalmente inconclusivo. A década de 2010 legou um país destroçado, com as instituições desmoralizadas, sem lideranças expressivas. Não existe vácuo na política mas também não existe, à vista, nenhuma instituição em condições de empalmar o poder – o que é bom, pois poderia significar a consolidação da ditadura em mãos de um poder.

Mas, como não existe vácuo na política, resta aguardar movimentos mais concretos para um xadrez mais assertivo. O agravamento da crise, misturando segunda onda do Covid-19, fim do auxílio emergencial, pressão de custos, certamente colocará fatos novos na mesa.

Espera-se que para o bem do país.

Do GGN