sábado, 8 de maio de 2021

XADREZ DE COMO BOLSONARO PODE TER CONVOCADO A POLÍCIA DO RIO PARA ENFRENTAR O STF, POR LUÍS NASSIF

Na coletiva, o comandante da força tarefa que executou 25 pessoas em Jacarezinho atribui a tragédia ao supremo Tribunal Federal (STF). Segundo ele, ao impedir novas operações durante a pandemia, o STF – através de decisão do Ministro Luiz Edson Fachin – teria permitido às facções se armarem.

Na CNN, o principal porta-voz do bolsonarismo no jornalismo, Alexandre Garcia, repete os mesmos argumentos e as mesmas acusações ao Supremo.

Vamos juntar algumas peças:

PEÇA 1 – Bolsonaro e a Segurança do Rio de Janeiro

Desde o início de governo, Bolsonaro se imiscuiu na segurança do Rio de Janeiro. A seu pedido, em maio de 2020 o então Ministro da Justiça Sérgio Moro afastou o delegado Ricardo Saadi, alegando problemas de “produtividade”. Conferiu-se, depois, que, sob Saadi, a Superintendência do Rio ostentou os melhores índices de produtividade de todo o país.

Ao mesmo tempo, investiu contra a fiscalização da Receta Federal no porto de Itaguaí, no Rio, porta de entrada do contrabando de armas no país.

Em Xadrez dos Bolsonaro e da expansão das milícias para Angra, relatamos os movimentos dúbios dos Bolsonaro em relação às milícias.

PEÇA 2 – os Secretário de Castro e as milícias

Ao iniciar sua política de genocídio, o ex-governador Wilson Witzel desmontou a Secretaria de Segurança e transformou a Polícia Civil e a Militar em Secretarias. Ou seja, sem nenhuma intermediação política e definindo, de modo próprio, as ações de repressão.

Com a queda de Witzel, o sucessor Cláudio Castro nomeou os novos Secretários em acordo direto com Jair Bolsonaro. Para a Secretaria de Polícia Civil foi nomeado o Delegado de Polícia Allan Turnowski; para a Secretaria de Polícia Militar, o coronel da PM Rogério Figueredo de Lacerda (Figueredo é sem i mesmo).

Em depoimento ao Ministério Público Federal, o miliciano Orlando Oliveira Araújo, conhecido como Orlando Curicica, denunciou ambos como ligados às milícias, de acordo com reportagem da Revista Piauí de julho de 2020.

Segundo a revista,

·      O secretário da Polícia Militar, coronel Rogério Figueredo de Lacerda, ganhava um mensalão do próprio Orlando Curicica quando comandava o 18º Batalhão da PM em Jacarepaguá. Na época, Figueredo de Lacerda recorria à ajuda de milicianos para combater o tráfico na área.

·      Allan Turnowski, segundo na hierarquia da Polícia Civil, recebeu propina do bicheiro Rogério Andrade.

·      O secretário da Polícia Civil, Marcus Vinicius Braga, que deixou o cargo no final de maio, pediu ajuda da milícia para prender traficantes na Zona Oeste.

Não se tratava de caça pequena. Preso por envolvimento com milícias, Curicica foi o primeiro a delatar o Escritório do Crime, do qual fazia parte.  

Turnowski tem histórico de combate aos que combatem as milícias.

Em 2011 foi nomeado para o Departamento Geral de Polícia da Capital. Na mesma ocasião, o chefe do Draco (Delegacia de Repressão ao Crime Organizado) era  delegado Cláudio Ferraz, com um amplo histórico de combate às milícias: chegou a prender 200 milicianos.

Em 2011 foi decretada pela Polícia Federal a Operação Guilhotina. Nela foi detido o delegado Carlos Oliveira, sub chefe da Polícia Civil e braço direito de Turnowski, acusado de vender armas para traficantes.

A reação de Turnowski foi atacar o delegado Cláudio Ferraz, e acusá-lo de corrupção. A “prova”, segundo ele, teria sido um inquérito que investigava supostos desvios no município de Rio das Ostras, que durou dois dias.  Com base nesse fato, Turnovski chegou a lacrar a Draco (Delegacia de Repressão ao Crime Organizado)

Logo depois, Turnowski foi indiciado pela Polícia Federal, acusado de ter alertado seu subordinado sobre Operação Guilhotina. Na época ele negou a acusação, mas foi exonerado do Departamento Geral de Polícia da Capital. 

PEÇA 3 – reunião com Bolsonaro

No dia 5 de maio, Bolsonaro iniciou o dia com ataques ao Supremo. Deu declarações de enfrentamento nítido ao Supremo, sustentando que editaria uma medida contra os governadores que “não vai ser contestado por nenhum tribunal, porque será cumprido”. 

A bazófia foi repercutida pela mídia e e interpretada como uma auto-defesa em relação à CPI do Covid.

Na sequência, Bolsonaro rumou para o Rio de Janeiro e reuniu-se com o governador Cláudio Castro. Chegou no Palácio Laranjeiras às 16:45 e teve reunião a portas fechadas. Na saída do encontro, a imprensa foi informada de que a conversa foi sobre parceria entre o Estado e a União. Nada mais foi dito.

No dia seguinte, explode a Operação que massacrou 25 pessoas.

Na coletiva, o chefe da operação acusa diretamente o Supremo pela tragédia. Segundo ele, a decisão do Ministro Luiz Edson Fachin, de impedir operações durante a pandemia, permitiu o fortalecimento do tráfico, levando ao confronto.

Esse mesmo discurso seria repetido no dia seguinte pelo principal porta-voz de Bolsonaro, jornalista Alexandre Garcia.

PEÇA 4 – a narrativa provável

A hipótese mais provável é a seguinte:

1. O desastre na frente econômica e sanitária erodiram a popularidade e o poder político de Bolsonaro.

2. Bolsonaro tentou envolver as Forças Armadas e falhou. O ápice foi a demissão do Ministro da Defesa e a reação interna, que obrigou Bolsonaro a cumprir o regulamento da nomeação dos novos chefes do Exército, Marinha e Aeronáutica.

3. Sem respaldo das FFAAs para o golpe, era óbvio que partiria para a radicalização.

4. Com a ordem para que o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco, autorizasse a abertura da CPI do Covid, o Supremo torna-se seu alvo preferencial.

5. Não tendo condições de afrontar o STF pessoalmente, Bolsonaro recorre ao governador Castro para o enfrentamento. Basta pegar uma investigação em andamento e, a partir dela, promover o massacre, tendo no comando da segurança do Rio dois secretários identificados com o bolsonarismo e suspeitos de envolvimento com as milícias.

A operação afronta diretamente decisão do Supremo.

PEÇA 5 – o Brasil contra o crime

Como o STF e as instituições reagirão à rebelião das milícias fluminenses, eis a questão.

Houvesse um Ministro como Alexandre de Moraes à frente, certamente teria sido ordenada a demissão imediata do Secretário da Polícia Civil.

Luz Edson Fachin não dispõe da mesma têmpera. Jogou o caso para plenário. Mas, se não adotar uma atitude drástica contra a rebelião criminosa da Polícia Civil do Rio de Janeiro, a autoridade do Supremo estará comprometida.

GGN

sexta-feira, 7 de maio de 2021

SE BOLSONARO PUDESSE, QUEIROGA SERIA O PRÓXIMO EX-MINISTRO DA PASTA, POR FERNANDO BRITO

Frouxo, falso, escorregadio, contraditório, omisso, pusilânime e outros adjetivos inomináveis.

Nem esta vasta lista descreve bem o comportamento – talvez mais o caráter – o ministro da Saúde Marcelo Queiroga.

Não sabe quantas vacinas tem, acha que a China gosta de ser xingada por Bolsonaro e que “união nacional” evita a transmissão do vírus.

Nem na sua casa alguém acredita que, com um ano e dois meses de pandemia, ele não saiba dizer se deve ou não prescrever cloroquina a quem tenha sido infectado pelo vírus. Ou que possa falar em “isolamento social” sem adotar medidas restritivas à circulação de pessoas.

Aliás deve ser horroroso chegar em casa e ver no rosto dos familiares o ar de piedade, em lugar do de orgulho.

Quando você tem de dar muitas explicações em casa, costumo dizer que a situação está bem ruim.

Mas seria pior sair dali e ter de encontrar-se com Bolsonaro e enfrentar o ar de reprovação do presidente.

Porque também Bolsonaro experimentou uma enorme decepção com um ministro que não teve coragem de defendê-lo, nem na cloroquina nem na oposição a medidas sanitárias de Estados e Municípios.

Aliás, é bom que o tal protocolo do Ministério da Saúde que Queiroga prometeu não saia, porque se sair sem recomendar cloroquina será uma punhalada no chefe.

A favor de Queiroga, só há o fato de não haver na praça muita gente que possa atender melhor ao papel que Bolsonaro espere possa ser desempenhado por um ministro da Saúde um governo da morte.

O último que quis encarnar a função está aí, correndo como um rato que deseja escapar pelos cantos.

Tijolaço.

quinta-feira, 6 de maio de 2021

OPERAÇÃO POLICIAL EM JACAREZINHO AFRONTA STF E É A MAIS LETAL DA HISTÓRIA DO RIO

Tiroteio em Jacarezinho teve início ainda durante a manhã desta quinta (6), quando moradores se deslocavam para o trabalho. Balas atingiram passageiros no metrô. Comunidade denuncia execuções e violações por parte da polícia.

Organizações e as comissões de Direitos Humanos da Alerj e da OAB-RJ conseguiram acesso a seis casas e os sinais são de arrombamento, com civis mortos e sem marcas de troca de tiros. "Foi execução".

A Polícia Civil deu início a uma ação nesta quinta-feira (6) na comunidade do Jacarezinho, zona norte do Rio de Janeiro, que já é considerada a operação mais letal da história da cidade. Oficialmente, ao menos 25 pessoas morreram e outras quatro ficaram feridas, segundo a corporação. A ação ocorreu em violação a decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) que proíbe operações policiais nas favelas e periferias do Rio de Janeiro, a

Entre as vítimas, estão o policial civil André Leonardo de Mello Frias, morto com um tiro na cabeça, e 24 moradores, que a polícia diz serem “suspeitos”, mas não informa como chegou a essa informação ou em que situação elas foram assassinadas. Outros dois policiais também foram feridos com tiros na perna e de raspão no braço. A operação em Jacarezinho começou ainda durante a manhã de hoje, quando moradores deixavam suas casas a caminho do trabalho. Os tiros atingiram dois passageiros que estavam dentro de uma composição do metrô na estação Triagem. 

Movimentos sociais e moradores denunciam que o número de vítimas, no entanto, pode ser ainda maior do que o registrado oficialmente. De acordo com informações do coletivo A Voz das Comunidades, já são mais de seis horas da operação com o pretexto de prender traficantes. Mas relatos de moradores apontam que policiais invadiram casas, agrediram e confiscaram celulares da população local. Imagens da operação também mostram um helicóptero da Polícia Civil com dois atiradores armados sobrevoando a comunidade nas primeiras horas da ação. 

EXECUÇÃO

Desde o ano passado, a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 635, conhecida como a ADPF das Favelas, referendada pelo STF, não só limita operações policiais nas favelas e periferias do Rio para casos excepcionais, como também proíbe o uso de helicóptero por atiradores de elite enquanto perdurar a pandemia de covid-19. Por volta das 14h, as Comissões de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj) e da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-RJ), e a Defensoria Pública e o Instituto de Defesa da População Negra (IDPN) entraram institucionalmente na comunidade para acompanhar a operação ao lado da população que protestava por justiça.

No local, os representantes flagraram uma série de violações. Pelo twitter, o advogado Joel Luiz Costa, co-fundador e coordenador do IDPN divulgou imagens que mostram muitos projéteis e sangue espalhados pelo chão das ruas e casas que foram invadidas por criminosos e policiais. Em um dos vídeos, uma mãe denuncia que o filho foi executado pela polícia, “que já chegou atirando”. “Eles apontaram o fuzil para mim, falando que eu tinha que morrer só porque eu fui perguntar onde o corpo do meu filho estava”, contou. Segundo Costa, o grupo conseguiu acesso a seis casas e os sinais são de arrombamento, com civis mortos e sem marcas de troca de tiros. “Foi execução”. “Dói na alma vê um cenário de guerra dentro da sua própria favela, sabe. É cruel”, escreveu o advogado. Vídeo AQUI.

JACAREZINHO, CHACINA MAIS LETAL 

Em outra imagem, há ainda o corpo de um jovem negro ensanguentado em cima de uma cadeira de plástico com um dos dedos na boca. A deputada federal Talíria Petrone (Psol-RJ) afirma ter recebido uma denúncia de que esse morador foi executado pela polícia, que teria o colocado dessa forma vexatória “para a população ver”. “Isso é barbárie! Não há palavras para descrever essa situação. Respeitem a favela e a decisão do STF!”, contestou. 

Em paralelo, organizações da sociedade civil e de favelas estão promovendo um tuitaço para denunciar a chacina. “Não tem outro nome”, ressaltou o Instituto Marielle Franco. “Essa guerra sem fim, e sem vencedor, só gera mortes e são sempre os mesmos que morrem. Todos pobres, pretos e favelados”, lamentou a entidade. 

A última operação policial mais letal em comunidades no Rio também descumpriu a decisão do STF em 15 de outubro do ano passado. Na ocasião, 12 pessoas, incluindo um ex-policial militar, foram mortas na Vila Ibirapitanga, no Itaguaí. Cinco meses antes, em 15 de maio, uma ação da polícia também matou 13 moradores do Complexo do Alemão, na zona Norte, interrompendo uma ação de solidariedade. Antes delas, 13 pessoas também foram assassinadas pela PM, no episódio que marcou o dia 8 de fevereiro de 2019 como o massacre no Morro da Fallet-Fogueteiros, no centro da cidade. Dados do laboratório Fogo Cruzado indicam ainda a chacina do Jacarezinho entra para a história como a maior desde 2016. Veja o vídeo AQUI

RETRATO DO FRACASSO

Para a deputada Renata Souza (Psol-RJ) esse “é mais um retrato bárbaro do governo do Rio”, que há poucos dias definiu Cláudio Castro (PSC) como o chefe do Executivo, após o impeachment de Wilson Witzel (PSC). “Não garantiu vacina nem comida, mas aterroriza a favela com tiros. Política de morte. Já são mais de 415 mil pessoas mortas pela covid no Brasil, mais de 45 mil pessoas mortas só no Rio. Agora, mais 25 (mortos) com tiros no Jacarezinho”. 

Nas primeiras horas da operação, a Polícia Civil justificava que a ação visava cumprir 26 mandados de prisão expedidos pela Justiça. A corporação alegava ter descoberto que traficantes estavam recrutando adolescentes de 12 anos para a linha de frente do comércio ilegal de drogas na comunidade.  Os movimentos sociais observam, no entanto, que o modo de atuar do Estado, apostando no confronto e na violência, não reduzem a criminalidade. “Entraram no Jacarezinho, mataram 25 pessoas ou mais, e isso vai acabar com o tráfico de drogas?”, questiona o advogado Joel Luiz Costa.

Rede Brasil Atual.

BOLSONARO É O “MALANDRO AGULHA” ACHA QUE TODO MUNDO É “OTÁRIO”, POR FERNANDO BRITO

Há um ano, escrevi aqui que Jair Bolsonaro era um “malandro agulha”(gíria carioca dos anos 70 para os que só “deixam furo”), para designar o cara que se acha muito esperto, que todos os outros são “otários” e que sempre vai “se dar bem”.

Ontem à noite, depois de receber no aeroporto um cidadão brasileiro, ex-fuzileiro naval, preso e condenado na Rússia por transportar um medicamento opióide destinado a um jogador de futebol, Jair Bolsonaro “mandou” a agulhada de malandro, para dizer que não havia, mais cedo, criticado a China, porque não havia dito o nome do país o qual insinuava estar fazendo “guerra química” e enriquecendo à custa da pandemia de Covid-19.

“Vocês é que interpretaram, disse, culpando a imprensa por “muita maldade de tentar um atrito com um país tão importante para nós”.

Só um sujeito muito imbecil acha que isso pode “colar”, ainda mais em cima dos chineses que obviamente não são, como Bolsonaro pensa (desculpem o emprego deste verbo), bobos.

E, como não são idiotas, como nosso presidente, não passam recibo e devem ter alguma expressão em mandarim para definir a “sua batata está assando” para Bolsonaro.

Assista a malandragem aí abaixo, no captada pelo implacável Sam Pancher. Veja o vídeo AQUI.

Tijolaço.

quarta-feira, 5 de maio de 2021

O RISCO PAÍS E OS MOVIMENTOS DE CAPITAIS, POR LUIS NASSIF

O Instituto Novo Pensamento Econômico desenvolveu uma metodologia inovadora para avaliar a percepção de risco. 

Shutterstock: Brazil moneybox

À medida em que aumentam as bolhas pelo mundo, aumenta a preocupação com contágios financeiros. Principalmente após os problemas nas cadeias globais de produção e no ritmo diferenciado de recuperação das economias nacionais. Por esse conjunto de fatores, quantificar risco-país continua sendo um desafio.

O Instituto Novo Pensamento Econômico desenvolveu uma metodologia inovadora para avaliar a percepção de risco. Aplicou um processamento de linguagem natural às transcrições de teleconferências de empresas de capital aberto em todo mundo. A partir daí, construiu um índice de riscos e oportunidades em cada uma das 45 principais economias do mundo.

Segundo o estudo, a metodologia permite separar riscos globais daqueles específicos de países. De um lado, permite vincular o risco-país – confirmado percebido por executivos e investidores globais – aos fluxos de capital, preços de de ativos e decisões em nível de empresa. De outro lado, a metodologia permite testar diretamente a natureza do contágio entre o risco do país estrangeiros e as decisões de investimento e emprego no nível da empresa doméstica. Com tais análises, pode-se medir, decompor e diagnosticar picos repentinos no risco-país.

A partir daí, o estudo chega a algumas conclusões, algumas óbvias:

1.   Países vistos como mais arriscados pelos investidores sofrem queda nos preços dos ativos, especialmente nos preços e na volatilidade das ações..

2.   Risco elevado está associado a spreads de CDS (tipo de swap para amenizar riscos de crédito entre ativos) e rendimentos de títulos elevados, especialmente em mercados emergentes.

3.   Há uma relação direta entre risco e fluxo de capital global. Aumentando o risco-país há retirada de capital de investidores estrangeiros.

Os estudos constatam que os movimentos dos fluxos globais de capital dependem de um fator específico de país – o chamado risco-país. O que influi nesse movimento de capitais e de spreads de créditos soberanos é a percepção das empresas estrangeiras, e não a das domésticas

O risco-país elevado está associado a reduções no investimento e no emprego das empresas sediadas no país. Mas há efeitos não homogêneos na maneira como os eventos externos impactam resultados da companhia. No entanto, o “contágio” (denominação do transbordamento dos efeitos do risco país para os resultados da empresa) não são identificados pelas relações cliente-fornecedor ou pelos investimentos externos observáveis da empresa.

O trabalho analisou três eventos de impacto global: a crise financeira grega (2010-2012), o golpe contra Erdogan (2016), o desastre nuclear de Fukushima (2011). 

A crise grega se transmitiu predominantemente em outros países da União Europeia; o golpe turco afetou empresas russas e italianas; Fukushima afetou produtores australianos de urânio à fabricantes franceses de componentes, além de segurados sediadas nas Bermudas e Hong Kong.

Finalmente, o trabalho utilizou as medidas de risco-país e risco global para identificar conexões entre risco global e taxas de câmbio. E constata que, em períodos de turbulência global, há valorização imediata do dólar americano, euro e iene japonês.

GGN.

O CASTIGO A UM HIPÓCRITA, POR FERNANDO BRITO

Listei, ontem à noite, o rosário de derrotas sofridas por Jair Bolsonaro durante a terça-feira.

Pouco tempo depois de escrever, porém, viria mais uma e, talvez, a de maior repercussão fora dos círculos das pessoas que não acompanham a política.

Provavelmente por sugestão de alguém de sua trupe, o presidente resolveu publicar nas redes uma mensagem de condolências pela morte do ator Paulo Gustavo Monteiro de Barros, gesto de humanidade que não teve em relação a ninguém, nem mesmo a pessoas que lhe foram próximas.

O resultado é uma impressionante avalanche de xingamentos e desaforos diante da hipocrisia presidencial.

Desgraçado, verme, hipócrita, assassino e “vai tomar…” são só alguns dos impropérios repetidos centenas de vezes.

Belo castigo a um oportunista.

Bolsonaro é um tipo reles, daqueles que nem mesmo consegue-se odiar, porque o nojo é ato que não sobra espaço para ódio.

Tjolaço.

terça-feira, 4 de maio de 2021

O MONSTRO DO SOFRIMENTO CARREGA O MEDO DA ESPERANÇA, POR FERNANDO BRITO

Não foi o “dedo do Duda (Mendonça)”, nem a mão de João Santana.

Claro que um bom suporte publicitário ajuda, mas não há publicidade boa, com efeito duradouro, se ela não traduz o benefício que o público tem com esta ou aquela escolha, e não há diferença da política com o “consumo” quando a realidade contraria o discurso.

Venderam-se Sergio Moro e Jair Bolsonaro como sabões em pó, que “lavariam”, e a jato, o Brasil e fariam dele um país “limpinho e cheiroso”. De fato, porém, cinco anos depois, o Brasil é este mar de sofrimentos e dor que se observa, que veio, aí sim a jato, com a explosão de uma pandemia que aguçou o empobrecimento da população e expôs, em cada rua e estudo estatístico, o drama de devolver, à calçada e à miséria milhões de brasileiros.

E a outros milhões, muitos mais, o medo tanto de desempregarem-se e decaírem, como – e sobretudo – perderem a ideia de futuro, de prosperidade e de viverem numa sociedade onde a perda da dignidade, em todos os sentidos, seja um destino fatal, do qual não se poderia fugir.

Jair Bolsonaro choca a todos, é certo, por seus arroubos autoritários, pela estupidez grosseira e primária, pelo golpismo mal-disfarçado. Mas o “Ele, não”, importante e inevitável, é apenas o lado da rejeição e rejeição apenas não basta.

O que o mais fragiliza Bolsonaro é a realidade de dor e sofrimento que ele, para além disso, impõe à população.

Hoje a Folha detecta, entre os políticos do “Centrão” que virou – mais que as falanges sectárias – a base de apoio político do atual presidente, o temor de que “o eleitorado das classes C, D e E se torne mais receptivo a um discurso encampado pelo campo da​ esquerda, sobretudo caso o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), em cujo governo foi criado o Bolsa Família, se lance candidato ao Palácio do Planalto”.

E que, por isso, estariam pressionando Jair Bolsonaro a rever e ampliar os auxílios sociais, seja o emergencial ou o Bolsa-Família.

Não é por acaso que Lula declara ser este o objetivo de sua primeira incursão aos meios políticos em Brasília, aos partidos e aos políticos.

E não foi por outra razão que o ex-presidente nucleou seu discurso, no 1° de maio, na palavra “Esperança” e deu tanta ênfase ao quase único trabalho com que podem aspirar os jovens das cidades brasileiras, o de entregadores de aplicativos, sem direito, sem segurança, sem futuro.

ESPERANÇAS AOS DESESPERADOS.

Esperança que conduz a acreditar e acreditar é o fundamento de qualquer escolha.

Sim, podem existir escolhas pela “novidade”, pelo discurso simplista do “novo”, epíteto que se pode dar a qualquer porcaria. Mas isso é impulso e impulso, várias vezes, é o prelúdio do arrependimento.

Não foi, para Lula, o dedo do Duda nem a mão do Santana que o levaram a representar esta esperança, da qual têm tanto medo.

Como não serão eles que, à medida em que se aproximarem as eleições vão conduzir sua campanha para um novo “retrato do velho, outra vez”, agora em algo que vai ser mais próximo de um “vai na certa, vai de Lula”.

Tijolaço.

segunda-feira, 3 de maio de 2021

GUEDES, UM MINISTRO À DERIVA E A CPI DO FIM DO MUNDO, POR LUIS NASSIF

Seu mérito maior era o de vendedor, o de convencer investidores - e fundos de pensão públicos - a investir em projetos com promessas que dificilmente se realizavam.

A entrevista de Paulo Guedes a O Globo é a comprovação factual da perda de rumo do Ministro da Economia, em plena eclosão da crise.

Guedes perdeu contato com a realidade. A entrevista é um amontoado de fake news, atropelando números conhecidos.

Alguns exemplos de fakenews, já descritos em coluna de ontem:

       1. “Peguei uma inflação alta e entregarei uma inflação mais baixa”.

Em janeiro de 2019, o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Ampliado) anual do IBGE estava em 3,78%. Atualmente, está em 6,10%. O IGP-M (Índice Geral de Preços do Mercado) da Fundação Getúlio Vargas, foi de 7,54% em 2018. Em 2020 foi de 23,14%¨. Este ano, até abril acumula variação de 9,89%;

2. Peguei o país crescendo 1% e o entregarei crescendo 3%”.

O PIB de 2018 foi de 1,12%. O de 2020, -4,1%.2.

3. “Peguei o país com 12 milhões de desempregados e o entregarei com 10”.

O desemprego estava em 12,4% em dezembro de 2018. E em 14,4% em fevereiro de 2021.

4. “É uma oportunidade. Ele é a vítima da nossa legislação trabalhista. Quando você bota lá o salário mínimo, um rapaz filho de uma classe média, que estudou em uma boa universidade, fala duas línguas, ele consegue emprego com salário mínimo.”.

A maior inovação teórica das últimas décadas: o salário mínimo se transformou em salário máximo. E destruição do emprego formal aumenta salários.

5. A segunda medida, estamos chamando de Bônus de Inclusão Produtiva (BIP). Da mesma forma que se dá R$ 200 para uma pessoa que está inabilitada receber o Bolsa Família, por que não poderia dar R$ 200 ou R$ 300 para um jovem nem-nem? Ele nem é estudante nem tem emprego. Ou seja, é um dos invisíveis. Agora, esse jovem vai ter que bater ponto e vai ser treinado para o mercado de trabalho.

Esse programa existe no papel há mais de década.

6. “O maior exemplo de compromisso com a saúde é que eu falei que tem que criar voucher. Acho natural que, com as novas tecnologias, as pessoas queiram viver 100 anos. O grande desafio é como ajudaremos nesse sentido as camadas mais frágeis. Por que um sujeito rico se interna no (hospital) Albert Einstein e o pobre tem que ficar numa fila do SUS durante dez dias? Se o pobre tiver um voucher e não tiver vaga no SUS, ele vai na rede privada. São soluções privadas efetivas para problemas públicos gravíssimos”.

O dia em que um voucher permitir a um pobre se internar no Albert Einstein, nem todo o orçamento do país cobrirá os gastos com saúde. Guedes é mentiroso compulsivo, porque sabe disso. A vantagem do SUS é a universalização a um custo baixo.

A entrevista é relevante pelo lado oposto, ao expor um Ministro que perdeu totalmente pé da realidade. No mercado, Guedes ficou conhecido por algumas características.

Uma delas, a incapacidade de comandar equipes maiores. Perdia-se no comando de grupos pequenos de operadores, trabalhando em cima de um mesmo universo de informações.

O segundo, a dificuldade em analisar comportamento de ativos. Era conhecido por ser um perdedor.

Seu mérito maior era o de vendedor, o de convencer investidores – e fundos de pensão públicos – a investir em projetos com promessas que dificilmente se realizavam.

No governo, as pirações de Jair Bolsonaro colocaram sob o comando de Guedes vários ministérios reunidos em um único super-ministério. Ministério fundamentais, como o do Planejamento, Indústria e Comércio. Sem a menor visão de conjunto da economia, Guedes permitiu que o câmbio explodisse, os produtos comercializáveis inflassem a inflação interna, a falta de limites para as exportações criasse gargalos em inúmeras cadeias produtivas. Sua resistência em melhorar a renda emergencial ajudaram a aprofundar não apenas a crise social, a fome, mas a derrubar ainda mais a economia.

A falta de filtros nas declarações e um individualismo exacerbado comprometeram irremediavelmente as relações com o Congresso, submetendo o orçamento a uma carnificina.

Essa desmoralização final de Paulo Guedes ocorre ao mesmo tempo em que a CPI da Covid-19 promete ir a fundo para identificar responsáveis pela morte de mais de 400 mil brasileiros. Trata-se da CPI mais óbvia já proposta, pois sabe-se, com abundância de provas em áudios e vídeos, da responsabilidade central de Bolsonaro. O trabalho da CPI será apenas a de sistematizar provas já existentes.

Acuado, Bolsonaro recorrerá a alguns movimentos óbvios.

O primeiro deles, já em andamento, consiste em radicalizar a truculência das suas milícias, policiais civis e militares da base. Aparentemente, perdeu a condição de um golpe com as Forças Armadas. Na outra ponta, acenará com promessas não críveis de retomar as tais reformas. Ao mesmo tempo, Lula já começou sua maratona de engajamento de políticos e empresários na grande frente que está sendo montada visando as eleições de 2022.

Há um conjunto de possibilidades pela frente:

1. Com Bolsonaro se habilitando às eleições de 2022, Lula será o líder inconteste da frente ampla contra a barbárie.

2. Se houver um enfraquecimento substancial de Bolsonaro, a mídia retomará os ataques contra Lula, ressuscitando o anti-petismo. É por aí que vem a aposta de Ciro Gomes um sujeito – como se diz em Minas Gerais – sabido, porém não esperto.

3. Não descarte a possibilidade dos militares atraídos por Bolsonaro tentarem viabilizar o vice-presidente Hamilton Mourão, com escassas possibilidades de sucesso.

GGN.

É HORA DE PARTIR PARA A JUGULAR DO CARRASCO MOR! DE PAULO NOGUEIRA BATISTA JR, POR FERNANDO BRITO

Há cerca de um mês, escrevi aqui nesta coluna que o governo Bolsonaro estava nas cordas e poderia até cair. Alguns acharam que era delírio e que eu confundia a realidade com meus desejos. Em outras palavras, acusaram-me de wishful thinking, como se diz em inglês.

No entanto, o que aconteceu desde então parece confirmar o que escrevi: o governo está cambaleando e corre realmente o risco de não chegar até o fim do seu mandato. Bolsonaro vive o seu pior momento.

Os fatores fundamentais do enfraquecimento recente do governo são conhecidos. Destacaria o atraso e os embates na aprovação do orçamento de 2021, que provocaram verdadeira crise política, desgastaram o ministro da Economia e devem ter deixado um rescaldo de desconfiança entre o governo e a sua base parlamentar. Mais importante do que isso: as vitórias sucessivas de Lula no Supremo, que reforçaram dramaticamente o principal adversário político de Bolsonaro.

Mas o que pesa, sem dúvida, acima de tudo, é a criação da CPI da Covid no Senado, com composição desfavorável ao governo e Renan Calheiros na relatoria. Bolsonaro está visivelmente apavorado com o que pode sair dessa CPI. Pode ser a antessala do impeachment.

Não vamos nos enganar, entretanto. O governo não está morto! Tem muitos instrumentos de poder. E pode até se recuperar. Espero que os adversários políticos de Bolsonaro não cometam o erro que cometeram os adversários políticos de Lula em 2005. O leitor lembra do que aconteceu? Lula estava no seu ponto mais baixo com o escândalo do “mensalão”. O seu braço político principal, José Dirceu, teve que deixar o governo. Lula parecia liquidado.

Os seus adversários decidiram, se bem me recordo, não levar o impeachment adiante. Tinham medo do vice de Lula, José Alencar, que era um crítico ferrenho do sistema financeiro e dos juros altos. Alencar, embora empresário, estava à esquerda de Lula em matéria de política econômica. Melhor então deixar o Presidente sangrar até o fim do governo e derrotá-lo nas urnas em 2006.
Felizmente, Lula se recuperou e venceu Alckmin no segundo turno das eleições daquele ano. Partiu daí para um segundo período de governo que, contrariando a regra da “maldição do segundo mandato”, foi muito melhor do que o primeiro. Lula deixaria o governo em 2010 consagrado, com altíssimos índices de aprovação. Elegeu, sem grandes dificuldades, a sua sucessora, Dilma Rousseff, uma tecnocrata desconhecida do grande público. O povo queria votar na “mulher do Lula”. E votou.

Uma recuperação semelhante não poderia acontecer com Bolsonaro? Política é o reino da imprevisibilidade. Mas imaginem o seguinte cenário, que não é implausível. Com o avanço da vacinação no segundo semestre de 2021, a situação da epidemia começa a se normalizar e a economia se recupera um pouco. Bolsonaro pode então começar a cantar vitória de novo. Não vamos esquecer que o povo brasileiro tem expectativas bem rebaixadas, modestas mesmo. Pouco ou nada espera dos seus governantes. E outra: é preciso reconhecer que Bolsonaro, por detestável que seja, sabe falar a linguagem popular. Só há dois políticos de destaque no momento que sabem, de fato, falar com o povo. Lula e, infelizmente, Bolsonaro.

Por isso, é que digo e repito: é hora de partir para a jugular! Liquidar, ou começar a liquidar, este governo nocivo, destrutivo, antinacional e antipopular no seu momento de maior fraqueza, isto é, nos próximos, digamos, 3 ou 4 meses. E não me venham falar em “golpe”. Este governo, cometeu crimes de responsabilidade em série. Motivos para o impeachment, dentro da Constituição e da lei, são abundantes. Nunca um governo deu tantas razões para ter o seu mandato interrompido.

Falta o povo nas ruas? Então, vamos para a rua! A revolta é tanta, que muitos atenderão um chamado para a mobilização. Não podemos ficar em casa, acovardados, com medo da pandemia, assistindo passivamente o País ser destroçado.

Há motivos para temer o vice de Bolsonaro? Dizem alguns que o vice é “tóxico”. Mas não creio que ele ofereça perigo remotamente comparável ao que representa a continuação de Bolsonaro na Presidência. Mourão não foi eleito, não tem carisma, não tem liderança. Será provavelmente um presidente fraco, que se limitará a conduzir o país, em cenário de menos tumulto, até as eleições de fins de 2022. Posso, claro, estar redondamente enganado. Mas não creio.

Teme-se, também, que Mourão na Presidência venha a favorecer uma candidatura da direita tradicional, atualmente denominada de “terceira via”. Esse candidato da direita não-bolsonarista, o falso “centro”, teria provavelmente apoio de um governo federal presidido por Mourão. Mas e daí? Melhor Lula enfrentar um candidato desses, razoavelmente civilizado, do que correr o risco de perder para Bolsonaro.

O leitor lulista dirá: mas Lula é o favorito, Bolsonaro estará muito desgastado, Lula vencerá as eleições no segundo turno de qualquer maneira etc. Pode bem ser. Mas é um risco que não devemos correr! A reeleição de Bolsonaro talvez seja mesmo um evento de baixa ou média probabilidade – e mesmo isso é discutível – mas, em caso de materialização desse risco, o resultado é catastrófico para o País. Mais quatro anos de inépcia, ideias retrógradas, falta de projeto, perversidade e destruição do Estado, da sociedade brasileira e da própria Nação. Esse é o tipo de risco que não podemos correr.

E tem mais o seguinte: quem quer assistir mais um ano e 8 meses de destruição, patrocinada por Bolsonaro e sua equipe de quinta categoria? Os primeiros dois anos e quatro meses já mostraram do que são capazes. Já não é suficiente?

Uma conjectura para terminar. A direita tradicional, que se apresenta como “terceira via”, só parece viável como segunda via. Tudo indica que o falso “centro” só é competitivo nas eleições de 2022 se Bolsonaro ou Lula saírem do páreo. Lula não conseguem mais tirar. Mas é uma ilusão imaginar que a turma da bufunfa já se conformou com nova presidência de Lula. Até aceitarão, se não houver remédio. Mas querem trabalhar outra candidatura, acredito.

Os cálculos eleitorais da direita não-bolsonarista favorecerão o impeachment? Que assim seja.

Uma versão resumida deste artigo foi publicada na revista “Carta Capital” em 30 de abril de 2021. O autor é economista, foi vice-presidente do Novo Banco de Desenvolvimento, estabelecido pelos BRICS em Xangai, e diretor executivo no FMI pelo Brasil e mais dez países. Lançou no final de 2019, pela editora LeYa, o livro O Brasil não cabe no quintal de ninguém: bastidores da vida de um economista brasileiro no FMI e nos BRICS e outros textos sobre nacionalismo e nosso complexo de vira-lata. A segunda edição, atualizada e ampliada, começou a circular em março de 2021. E-mail: paulonbjr@hotmail.com;Twitter: @paulonbjr;Canal YouTube: youtube.nogueirabatista.com.br; Portal: www.nogueirabatista.com.br

Tijolaço.

domingo, 2 de maio de 2021

A FOLHA DE SÃO PAULO DIZ POR QUE GUEDES É TRATADO COMO ‘MENOS IMBECIL’? POR FERNANDO BRITO

A ombudsman da Folha, Flávia Lima levanta, sem ponto de interrogação à questão, e diz que é por quê “a cobertura que a imprensa faz de Paulo Guedes ainda é, no estilo e no tom, diferente daquela feita sobre as falas da ministra Damares Alves, ou do ex-ministro Abraham Weintraub”, foi assim que traduzi na pergunta aí do título.

E a resposta, de uma imensa obviedade, é a de que o extinto Posto Ipiranga sustenta, afinal, o “não-programa econômico” que, desde Fernando Henrique Cardoso, da direita brasileira: o “polidesmonte” do país.

Guedes é um “fundamentalista” do primarismo que ataca, por todos os lados, a única possibilidade que tem o Brasil de construir seu destino: é incluir, assistir, educar, criar, transformar o que poderia ser um dos maiores mercados de consumo do planeta associado a uma capacidade de produzir e, assim, gerar trabalho e renda que sirvam de combustível a tudo o que se listou.

A história é sempre a mesma: “o Estado atrapalha”, “a iniciativa privada faz melhor”, “para que produzir se é mais barato comprar” e outros simplismos do gênero, tratados como “verdades auto-explicadas”.

A rigor, o único objetivo econômico do país não é sequer o “ajustar as contas públicas” que se apregoa tanto, mas o de responder com cortes irracionais (além de desumanos) à perda de capacidade de gerar renda pública crescente do Brasil e, continuar com o processo de alienação de patrimônio palpável (privatização do que há) e potencial (concessões do que está maduro para ser) com a desculpa (sim, sempre verdadeira na penúria) de que não há aqui capitais para o investimento necessário.

É o moto contínuo do atraso e da pobreza, a vocação de gerente de um entreposto colonial que há séculos domina os grupos dominantes do Brasil.

Paulo Guedes não está fazendo nada que não seja cometer o crime de expressar com clareza o pensamento ridículo que habita, em silêncio ou travestido de fórmulas em “economês”: o de que somos o país onde as “regalias aos pobres” atravanca o desenvolvimento econômico: ora são os encargos sociais “no cangote” do empresário, ora é a doméstica que ia à Disney, agora o filho do porteiro na universidade.

A solução, genial, é o “ticket” da Saúde, para ir ao Sírio e Libanês e o “ticket” educação, que poria os filhos dos pobres na PUC.

A capacidade asnática de Guedes só não é maior do que a de uma elite que o sustenta.

Tijolaço.

 

"COMO O BRASIL FOI TOMADO POR IGNORANTES, MENTECAPTOS, OLIGROFRÊNICOS E BURROS DE TODO TIPO?" DIZ MÁRCIA TIBURI

A professora de Filosofia lembra que o país, com "intelectuais geniais e gente inteligente, culta e democática", é governador por "espantalho descerebrado".

(Foto: Mídia NINJA)

A professora de Filosofia Márcia Tiburi disse estranhar a razão pela qual o Brasil “foi tomado por ignorantes, mentecaptos, oligofrênicos e e burros de todo tipo."

A manifestação foi no Twitter (abaixo). "Para animar o domingo:como um país com intelectuais geniais em tantas áreas, um país de gente inteligente, culta e democrática, foi tomado por ignorantes, mentecaptos, oligofrênicos e burros de todo tipo? Como o Brasil se deixa governar por um espantalho descerebrado? Pensemos juntos!”.

A declaração foi tomada no mesmo dia em que o Washington Post diz que o Brasil recebe pouca ajuda para enfrentar a pandemia por causa dos insultos de Jair Bolsonaro a outros países.

A resposta aos pedidos de ajuda do Brasil "tem sido basicamente um encolher de ombros, uma crítica aos erros do Brasil – e uma ação limitada , até agora”.

Uma possível resposta ao tuíte de Márcia Tiburi é a ação organizada da velha imprensa para construir o ódio contra Lula e o Partido dos Trabalhadores.

Na véspera da eleição de 2018, o jornal O Estado de S. Paulo publicou editorial em que afirma que votar em Haddad ou Bolsonaro era “uma escolha muito difícil”.

Haddad era um professor universitária com atuação aprovada como ministro da Educação e uma administração municipal que elevou a cidade de São Paulo a grau de investimento.

Bolsonaro tinha quase 30 anos de atuação na Câmara dos Deputados e apenas dois projetos aprovados.

Tinha se destacado por manifestações agressivas em relação a mulheres e homossexuais.

Hoje o jornal volta a atacar Lula, e o considera símbolo da corrupção, embora se saiba que foi processado e julgado por um juiz incompetente, suspeito e parcial, conforme o Supremo Tribunal Federal - STF julgou recentemente.

Brasil 247.

sábado, 1 de maio de 2021

DIZ UM CERTO OBSERVADOR DO ALATO DE UM AVIÃO. “É POUCO, MAS É MEU”, POR FERNANDO BRITO

Não são tão poucos que permitam à direita convencional aspirar a aparecer com outra solução, nem tantos que possam manter o país na insensatez em que está mergulhado.

A quantidade de manifestantes bolsonaristas pró-golpe que se reuniu hoje em algumas capitais mostra que, petrificada pelo ódio fundamentalista e por um fanatismo religioso medieval, mostra que, o “núcleo duro” do bolsonarismo está longe de desaparecer.

Jair Bolsonaro, do alto do helicóptero das Forças Armadas, criam, está satisfeito como um pecuarista ao observar seu rebanho. Mingua, é fato, mas está marcado, amansado, obediente a seu berrante presidencial, seja qual for a loucura que diga.

Estão convencidos de que o comunismo está à porta, que a pandemia é ideológica, que a China está por invadir-nos e que Messias, o Bolsonaro, é o enviado de Deus.

Seu caminho é o da radicalização e a intolerância é seu estandarte.

Não existe a possibilidade de uma saída pela “não -polarização, pois a polarização está dada pelas forças que hoje dominam o poder político no país.

Tornou-se impossível – e as camisetas “100% Bolsonaro” o demonstram – ser “meio-bolsonarista”.

Como a ensinar que, para haver aqui um capitalismo selvagem, é preciso de selvagens no poder.

É por isso que vai se desfazendo a perversa e mortal armação que se fez para tirar o Brasil do caminho da razão.

Não há razão possível quando se desperta uma turba de insanos.

Não há terceira via possível a isso.

Tijolaço.

QUAL A SITUAÇÃO DA CLASSE TRABALHADORA NESTE 1º DE MAIO? POR MICHELE DE MELLO

Terceirização, uberização e desmonte das leis laborais conquistadas no século XX marcam o cenário atual.

Desemprego e informalidade são as duas realidades mais comuns para os trabalhadores durante a pandemia - Folha Litoral.

Primeiro de maio, Dia Internacional do Trabalhador e da Trabalhadora mais do que um feriado, carrega um histórico de luta por direitos. Ao invés de celebrar, neste 2021, a classe trabalhadora tem ainda mais motivos para reivindicar. De acordo com a Organização Internacional do Trabalho (OIT), durante o último ano de pandemia, houve uma redução de 8,8% nas horas trabalhadas, o que representa a perda de 255 milhões de empregos de tempo integral ao redor de mundo, quatro vezes mais do que em 2019.

Nos primeiros quatro meses do ano, a tendência se manteve, com a diminuição de 3% das horas trabalhadas em todo o planeta, equivalente a 90 milhões de empregos.

No Brasil a situação não é diferente, o país entra em 2021 com uma taxa de desemprego de 14,2%, quase 14 milhões de desocupados, de acordo com Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Para aqueles que ainda possuem alguma renda, a informalidade foi a saída.

Cerca de 34 milhões de trabalhadores, quase 40% da população economicamente ativa do Brasil, está no setor informal. São as pessoas que fazem bico, diaristas, ambulantes, pessoas que trabalham como freelancer, entre outras.

“A gente chega nesse 1º de maio, a nível mundial, com uma situação de bastante debilidade da classe trabalhadora do ponto de vista estrutural.  Algo que vem de um processo mais amplo de erosão do trabalho assalariado”, analisa o sociólogo e professor da Universidade de Brasília (UnB), Ricardo Festi.

RETROCESSOS

Na última terça-feira (27), o presidente Jair Bolsonaro editou uma nova Medida Provisória autorizando a suspensão dos contratos de trabalho por até quatro meses, o adiamento do pagamento do fundo de garantia (FGTS) e a diminuição dos salários em até 70%. Em 2020, com uma MP similar, 1,5 milhão tiveram os salários reduzidos e 9,8 milhões os contratos suspensos.

A socióloga Tábata Berg identifica que a precarização se expressou um tripé: terceirização, uberização e desmonte das leis trabalhistas.

“A gente tem um desmonte progressivo da CLT, com propostas de reformas trabalhistas cada vez mais duras. Essa é a realidade para os trabalhadores em todo o mundo, mas é ainda mais perverso nesse contexto, com um contingente significativo de trabalhadores que nunca experimentaram direitos sociais e direitos trabalhistas”, aponta a também pesquisadora da Universidade Estadual de Campinas (Unicamp).

Trabalho informal é realidade para 39,6 milhões de brasileiros em 2021, segundo IBGE / Governo Santos.

DESIGUALDADE 

Se o panorama geral é negativo, ao fazer um recorte de gênero e raça é possível perceber que o cenário pode ser ainda pior. As mulheres negras são 60% da população desempregada, segundo o IBGE. Também são as que passam mais tempo buscando emprego, 24% de 3 a 6 meses, e 18% passaram até um ano.

Além disso, são as piores remuneradas, uma mulher negra ganha em médio R$10,95 por hora, enquanto as mulheres brancas ganham cerca de R$18,15 por hora trabalhada, já os homens brancos tiveram uma média de R$20,79 de remuneração, segundo levantamento de 2020 do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Econômicos (Dieese).

Entre a juventude, quase um terço dos jovens brasileiros estão desempregados e 78% possui baixos salários ou contrários temporários.

A falta de renda gera uma reação em cadeia, com o aumento da fome da pobreza. Segundo a Comissão Econômica para a América Latina e o Caribe (Cepal), 118 milhões de mulheres latino-americanas passaram a viver em situação de pobreza em 2020 – maior índice dos últimos 20 anos.

O Brasil voltou a fazer parte do mapa de fome da ONU, quase 60% dos lares brasileiros realizam menos de três refeições ao dia, com 125,6 milhões de pessoas em situação de insegurança alimentar.

Categoria de entregadores de aplicativos se mobilizou em diversas capitais e cidades brasileiras durante Breque dos Apps em julho de 2020/Jaqueline Deister.

MOBILIZAÇÃO

A devastação gerada pela pandemia no mundo do trabalho exigiria ainda mais radicalidade dos sindicatos e outras formas de organização da classe nesse 1º de maio. No entanto, o descontrole dos contágios e a alta letalidade do vírus no Brasil, impedem a realização de grandes manifestações de rua.

Para esse ano, as centrais sindicais convocaram debates online com o lema “a vida primeiro”.

Para ambos sociólogos, o panorama dramático se agrava com a crise econômica iniciada em 2018 e com ascensão de governos de extrema direita.

E desde então os setores mais precarizados tem dado o ritmo das agendas de luta. No Brasil, em outros países da América Latina e na Europa, os entregadores por aplicativo realizaram mobilizações massivas e, em alguns lugares, conquistaram melhores condições de trabalho.

Movimento dos Sem Teto realizou uma manifestação em São Paulo, na última sexta-feira (30), para denunciar as 400 mil mortes por covid-19 no Brasil / MTST.

“A gente tem um contexto de avanço da extrema direita, mas também tem muitos focos de luta, como os entregadores em todo o mundo têm se organizado e conseguido vitórias importantes. As lutas dos trabalhadores e trabalhadoras nesse 1º de maio vai ser diferente do século XX e já começa a se desenhar esse perfil”, aponta Tábata Berg.

Para Ricardo Festin, é importante retomar o trabalho de base e o diálogo entre o movimento sindical, social e estudantil para enfrentar o desmonte da concepção de trabalho consolidada nas décadas anteriores.

“É necessário pensar um novo programa que dê conta nesse novo mundo do trabalho, que supere uma nostalgia fordista. Como vamos pensar direitos sociais, políticos, que não retorne as formas de intensificação e exploração da classe trabalhadora. Como vamos atender as maiorias que são minorizadas”, conclui.

Brasil de Fato.