* Uma referência não muito sútil ao filme O Exército de
Brancaleone.
Talvez o exemplo
histórico mais próximo seja o da Torre de Babel. São
grupos de pessoas de várias procedências preparando-se para tomar o poder. Ou
“O Rato que Ruge”, que conta a tomada de Nova York por um pequeno país, que
tinha apenas a pretensão de ser derrotado para ser auxiliado, mas encontrou
Nova York em blackout.
Só dentre os “olavetes”
(discípulos do filósofo Olavo de Carvalho) há quase dez grupos independentes
entre si, que mal se conhecem. Tem mais tendências que os trotskista dos anos
70.
Há os seguidores do padre
Paulo Ricardo, reacionário de mão cheia, que juntou uma legião de padres
para apoiar a campanha de Bolsonaro. Há
os olavetes que detestam evangélicos e olavetes
que detestam católicos. O segundo grupo segue evangelicamente os ensinamentos
do mestre, que os proíbe criticar o Papa, mas os estimula a desancar a CNBB
(Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).
São os mais ideológicos, acreditam piamente no liberalismo
amplo e irrestrito e no destino manifesto de Bolsonaro, de ser um Donald Trump
tropical.
Aliás, para o grupo, é Deus no céu, Olavo na terra, e Trump
no mundo. Deu um trabalhão para o general Heleno convencer o pessoal que não
bastava pensar como Trump para agir como Trump: era necessário dispor de um
exército como o dos EUA e uma economia como a norte-americana para invadir
outro países. E parem com essa bobagem de pensar em invadir a Venezuela!
Pararam.
Vão ser os primeiros a serem engolidos pela real polítik. No
início tinham a ilusão de que, pelo fato de Olavo ter fornecido os três grandes
motes da campanha – o kit gay, a
Venezuela e a liberação das armas – ele seria o grande ideólogo de
Bolsonaro. Mas o capitão está mais para os ecos de Olavo – tipo Lobão e Danilo
Gentile – que para formulações mais complexas.
Há os youtubers, é claro. E uma profusão de deputados recém-eleitos sem a menor
informação sobre o que significa o trabalho parlamentar. Ninguém conhece
ninguém. Dia desses, em uma das reuniões dos grupos de trabalho, passou um
senhor de terno e gravata e imediatamente vários recém-eleitos pediram que
trouxesse água. Não era garçom, mas um deputado bolsonariano.
A única bandeira que os
une é a do antipetismo e os gritos de guerra de manter Lula preso ou eliminado. Não há consenso nem mesmo no campo
das ideias reacionárias. Por exemplo, como fazer com evangélicos que defendem
aborto? Tem que tirar. Mas como?
O único grupo
articulado é o dos militares da infraestrutura, comandados pelo general da reserva Oswaldo Ferreira, com a cabeça desenvolvimentista
de Ernesto Geisel. Eles têm acesso direto e irrestrito a Bolsonaro e já se
constituem em um facho de racionalidade em meio ao caos.
Se fortalecerão mais ainda depois que caiu a ficha de
Bolsonaro – e da legião estrangeira que o cerca - sobre o enorme erro de
entregar o Ministério da Justiça de porteira fechada para o juiz Sérgio Moro.
Especialmente depois que seu modelo, Donald Trump, demitiu sumariamente o
Procurador Geral de Justiça, por não concordar com suas ações. Bolsonaro criou
um Ministro indemissivel. O que acontecerá quando ele quiser colocar na cadeia
algum aliado estratégico de Bolsonaro? E houve quem saudasse o convite
como um lance de genialidade de Bolsonaro.
O exemplo de Trump,
desde o início atacado pela justiça e pela mídia, consolidou em algumas alas de
olavetes a crítica à Lava Jato e ao partido da justiça.
Muitas das batatadas, Bolsonaro deve aos seus gurus
internéticos. Já as correções nas declarações estapafúrdias, os fachos de
racionalidade – como voltar atrás na questão do Mercosul, do Meio Ambiente ou
da embaixada em Jerusalém – são atribuídas aos conselhos dos militares.
Dia desses, no entanto, houve a maior saia justa. O general
Oswaldo fez uma longa explanação sobre a necessidade de investimentos nos
diversos modais, o ferroviário, o rodoviário, o portuário, o fluvial. Quando
ousou dizer o óbvio – nos locais em que não houver investimento privado, será
necessário aportar investimento público – foi apartado pelo príncipe Luiz
Phillippe de Orleans e Bragança, que teve um xilique, acusando-o de estar sendo
influenciado por ideias comunistas.
Partiu dos militares a sugestão de criar uma Casa Civil da
Infraestrutura, sob o comando do general Oswaldo, diretamente ligada à
Presidência, para coordenar os Ministérios dos Transportes, Minas e Energia e
Telecomunicações.
Um ponto de
convergência geral, aliás, é a constatação de que o astronauta Marcos Cesar
Pontes – nomeado
Ministro da Ciência e Tecnologia – é alienígena que vive no mundo da lua. No
início, impressionou pelo domínio do inglês. Depois, caiu a ficha que o inglês
servia apenas para o astronauta dizer tolices em duas línguas.
Outra decepção foi com o superministro da Economia Paulo
Guedes.
No início, os
olavetes, os militares, os youtubers, todos apostavam na genialidade de Guedes.
Agora, passaram a vê-lo como um
trapalhão. Primeiro, quando foi afrontar o presidente do Senado, Eunício de
Oliveira, demonstrando ignorância em relação ao be-a-bá do orçamento: o orçamento de um ano é aprovado no ano
anterior. Ou seja, o primeiro orçamento de Bolsonaro depende da atual
composição do Congresso. Por isso não é de bom alvitre afrontar o presidente do
Senado.
Depois, quando falou que o Banco do Brasil seria comprado pelo Bank foi America. Guedes não
tinha a menor ideia de que um dos aliados mais influentes de apoio a Bolsonaro,
o pessoal que garantiu o financiamento privado de campanha por todo o país
– o agronegócio – não vive sem o Banco do Brasil.
Depois que Guedes passou a se desdizer tanto quanto o
capitão, as diversas alas bolsonarianas desiludiram-se. Os olavetes deram-se conta da terrível realidade de que o ex-deputado
não é muito letrado nem intuitivo. Não é um um ideológico racional,
formulador. Foram, então, atrás da mediação dos filhos, até cair na real de que os filhos só sabiam mesmo detonar
aliados pelo Twitter. Foi o que ocorreu com o infeliz que se apresentou
como marqueteiro de Bolsonaro, foi desmentido pelo filho, demitido da equipe de
transição e, como bom marqueteiro, anunciou que deixava a equipe para se
dedicar a trabalhos voluntários na equipe que o dispensou.
Balaços pelo Twitter é o de menos. Internamente, há uma guerra de dossiês. Basta alguém
sugerir um nome para o governo para meia hora depois aparecer um dossiê contra
o candidato, em geral apresentando pelo vice-presidente, general Mourão.
Foi um dossiê que derrubou a candidatura a vice do príncipe
de Orleans e Bragança, um sujeito ultraconservador, mas de pensamento
articulado – que fez a cabeça de Bolsonaro com a brilhante constatação de que o
início do fim do país foi a Constituição de 1988. Ah, e o golpe da Proclamação
da República.
A candidatura do príncipe soçobrou devido a questões pessoais
menores que, em nenhum outro ambiente, seriam motivo para vetos. O que menos
pesou foi o fato de, na juventude, ele ter sido skinhead. É mesmo uma cambada
bestial.
GGN
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