domingo, 6 de março de 2022

NO ‘ESTADÃO’, O CLIMA DE VELÓRIO DA CAMPANHA DE MORO. POR FERNANDO BRITO

Gustavo Queiroz e Luiz Vassallo, d’O Estado de S.Paulo, desenham neste domingo o clima fúnebre da campanha do ex-juiz Sergio Moro à Presidência, segundo eles, “marcada nos últimos meses por eventos pouco concorridos e sem a presença de líderes partidários”.

“O ex-juiz tem participado de eventos com público reduzido, nos quais fala, basicamente, para antigos apoiadores e fãs da Lava Jato. E ainda não conseguiu arregimentar apoios relevantes. Moro enfrenta desgastes internos no Podemos. Diante dessa situação, ele se cercou de um grupo de confiança, apartado da cúpula do partido. A exemplo do ex-juiz, alguns dos integrantes desse núcleo são novatos em eleições”.

A preocupação central de Moro, é que o Podemos estaria “rifando” a sua candidatura, para não ter de gastar nela a sua cota do Fundo Eleitoral.

O remédio, então, é fazer uma “caixa privada” de campanha, com uma meta de “arrecadar R$ 25 mil por mês de um universo de aproximadamente 40 empresários. A ideia é ter R$ 1 milhão mensal para a campanha.”.

Como não há (em tese) financiamento privado de campanha, estas doações teriam de ser ao seu partido, o Podemos, para que fossem repassadas à campanha, mas o partido diz que não existe qualquer combinação para isso.

Os repórteres descrevem sua relação com o partido como ‘separação de corpos’, ou seja, apenas a de manter a fachada.

Pior que não ter dinheiro é não ter palanques estaduais, que ajudam a empurrar uma candidatura: segundo levantamento de O Globo, Moro só tem candidato definido no Distrito Federal, José Antônio Reguffe e duas alianças encaminhadas, no Paraná e no Mato Grosso do Sul. Ou seja, 10% dos estados brasileiros.

No mais importante deles, São Paulo, tinha um, ainda que ridículo, mas o “Mamãe Falei” acaba de mergulhar numa lata de lixo.

Moro pode jurar de pés juntos que não troca de candidatura, para senador ou deputado, mas a realidade da política o está empurrando a isso.

Um pena, porque seria mais didático que ele permanecesse candidato, com um ou dois por cento, para ser reduzido ao tamanho que tem.

Tijolaço.

sábado, 5 de março de 2022

NENHUMA TRÉGUA FUNCIONARÁ SEM FIADOR. ISTO É, A CHINA. POR FERNANDO BRITO

O fracasso do cessar-fogo, ainda que localizado e por algumas horas, para evacuação de civis de cidades no sudeste da Ucrânia tem versões diferentes – e inacreditáveis – dos dois lados, ambas estranhas.

Não faz sentido que os russos tenham proposto uma suspensão das hostilidades para continuarem, eles próprios, bombardeando, como não tem lógica que ucranianos possam estar sabotando a retirada de civis de uma área que, todos sabem, está militarmente condenada, como o porto de Mariupol.

Será assim, provavelmente, com qualquer outra mitigação dos danos humanos que possa propor.

Ninguém é fiador destes acordos, por uma simples razão, além do óbvio isolamento a que foi relegada a Rússia: o monolitismo do bloco ocidental e a sua adesão ao “discurso heroico” de Volodimir Zelensky (que não hesita, sequer, em exigir-lhes o engajamento de suas forças aéreas no combate, a pretexto da criação de uma “zona de exclusão aérea” na Ucrânia.

Só há uma força política e econômica com peso para isso, e é a China. De que não se fará da Ucrânia uma ponta de lança da Otan às portas da Rússia, o que não parece difícil, que a Russia concorde em, diante deste compromisso, reduzir a questão com a Ucrânia ao cumprimento dos acordos de Minsk, firmados após a anexação da Criméia.

Se a China é “comunista” demais, que se agregue ao grupo de fiadores a Índia e Israel, dois países “de direita” que não aderiram à histeria anti-Rússia.

Os governos europeus, perdidos no torvelinho belicista em que entraram, talvez não percebam que esta crise vai realimentar o crescimento da extrema-direita em seus países, que parecia ter sido contido, a considerar os resultados das últimas eleições no continente.

Zelensky tornou-se, em 15 dias, o principal líder da Europa, mesmo fora – por enquanto – da União Europeia e da Otan. Não só é um outsider, mas uma pessoa que conseguiu conviver harmonicamente com todas as organizações de extrema-direita do país.

Tijolaço.

sexta-feira, 4 de março de 2022

NASSIF E O “PARTIDO ÚNICO” NO JORNALISMO. POR FERNANDO BRITO

Ontem, escrevi aqui sobre o comportamento histérico da mídia sendo parte de um processo de “saddanização” de Vladimir Putin, contra o qual tudo vale e nem sequer é possível debater as razões geopolíticas de suas atitudes e tudo se reduz ao “bom ucraniano” contra o “russo mau” que ocupa o Kremlin, já não comunista, mas ainda tão detestável quanto se fosse.

E estamos vendo, na principal emissora de jornalismo do país, a Globonews, metida em episódios ridículos em que esta visão de “partido único” se exprime de modo brutal e grosseiro, atropelando e desqualificando quem, ainda que pouco, divirja da “saddanização” reinante.

Ontem, coube ao veterano Carlos Alberto Sardenberg ser o representante do “brucutu” ocidentalista, partindo para cima do comentarista Guga Chacra, que ousou dizer que a Otan não poderia fazer o que fez hoje a Otan: recusar-se ao risco de combates aéreos com os russos nos céus da Ucrânia.

Vale a pena a leitura que faz Luís Nassif, no GGN, sobre o episódio, mas convém lembrar que não é só no jornalismo que isso se dá. Agora há pouco, o novo herói da mídia, o presidente da Ucrânia, Volodimir Zelensky, dirigiu-se da maneira mais arrogante contra a Otan: “Todas as pessoas que morrerem deste dia em diante também morrerão por sua causa, por sua fraqueza, por sua falta de unidade”, disse agora à noite, segundo o The Guardian.

Falta só se comparar a Luke Skywalker, porque o Darth Wader o Ocidente já arranjou para ele. 

SARDENBERG, AS UNANIMIDADES E A SÍNDROME DO DEDO-DURO, POR LUIS NASSIF

A guerra Rússia x Ucrânia está sendo didática para expor como se dá o processo de formação de consensos na mídia nacional e global, impedindo o livre fluxo de opiniões.

Nem se fale de um irresponsável sem noção, como o presidente da Ucrânia, exibindo-se em entrevista coletiva, falando do seu heroísmo: “se não fosse o presidente da República, estaria na linha de frente com meus soldados”. Nada impediria que Volodymyr Zelenskyy fosse cumprir seu destino heróico na linha de frente. Caxias era comandante e foi para a linha de frente.

Mas ele joga o mundo em uma guerra sem futuro, destrói seu país, aumenta a pobreza mundial, pelos efeitos indiretos do conflito, para se apresentar como “herói” nos salões mundanos da mídia.

E expõe a mídia brasileira ao ridículo.

O vídeo abaixo mostra um episódio grosseiro, de Carlos Alberto Sardenberg “patrulhando” Guga Chacra, ambos comentaristas da Globonews.

Sardenberg é um defensor da autodeterminação dos povos, sem um pingo de sofisticação. Cada país é dono do seu nariz, independentemente das consequências de sua decisão sobre os vizinhos. Convenhamos: é um conceito tosco, que foi exaustivamente explorado na pandemia: uma pessoa tem o direito de não se vacinar, se pode afetar a saúde de outra? Ou seja, é um desafio intelectual acessível até ao senso comum.

Guga Chacra indagou o óbvio: quais as consequências quando a decisão individual de um país afeta os interesses (ou a segurança) de outro país e, no caso, o outro é um país militarmente mais forte? É o caso concreto da reação da Rússia à tentativa da Ucrânia de se filiar à OTAN (Organização do Tratado do Atlântico Norte). Daria uma bela discussão, inclusive sobre a necessidade de fortalecimento do multilateralismo. Mas foi imediatamente interrompido por Sardenberg, “acusado” de estar defendendo a Rússia.

O episódio, em questão, é ridículo. Mas repete didaticamente o clima que acometeu o país na ditadura militar e repetiu-se na ditadura civil imposta pela mídia nos últimos anos. É quando qualquer opinião contrária implica em risco para quem ousa ficar contra a unanimidade e se cria a síndrome do dedo-duro, o sujeito que se considera empoderado para delatar fraquezas políticas dos colegas.

No período da Lava Jato, imagine qualquer jornalista dos grandes veículos meramente colocando em dúvida a legalidade da operação. Seria “dedurado” implacavelmente, como foi Guga Chacra, e condenado ao desemprego.

Mas o caso transcende esse episódio ridículo.

Tome-se outro bom tema de discussão: o Itamaraty fez bem ou não em condenar a invasão, mas ser contra a aplicação de sanções econômicas mais severas contra a Rússia?

Tem-se, de um lado, a maioria absoluta dos países condenando a invasão e impondo guerra sem quartel à Rússia. Na outra ponta, dois países – a China e o Brasil do Itamaraty – condenando a invasão, mas deixando a porta aberta para futuras negociações. Como será possível resolver essa guerra sem uma mediação diplomática, sendo que o país agressor não pode ser simplesmente derrotado por ser a maior potência atômica do planeta?

É evidente que terá que haver uma mediação no final. E, havendo, quem serão os países mediadores? É tema para uma discussão rica, mais ainda se forem incluídas peças que faltam nas análises pedestres da mídia – o papel da China e de sua moeda, a rota da seda, a nova divisão geopolítica mundial etc. Por aí se percebe a complexidade do tema e a posição do Itamaraty, coerente com a tradição diplomática brasileira.

No entanto, há uma uniformização da discussão mesmo em outros canais, como a CNN, não submetidos ao patrulhamento primário de Sardenberg (o “patrulhador” da CNN é Boris Casoy, que se apresenta só de manhã). O jornalista que ousar fugir do pensamento binário estará perdido.

No início da discussão, há argumentos explicando a posição do Itamaraty. No final do dia, as opiniões estão uniformizadas.

Cria-se um clima generalizado de emburrecimento em todas as frentes. Não se pode criticar Zelensky para não parecer defesa de Putin. Na ponta esquerda, não se pode criticar Putin, para não fazer o jogo do “imperialismo”.

A maior vítima da guerra, então, é o jornalismo.

Tijolaço.

quinta-feira, 3 de março de 2022

HISTERIA COM A RÚSSIA VAI AO RIDÍCULO E IMPÕE ‘SANÇÃO A GATOS’. POR FERNANDO BRITO

A onda de histeria, que garante lugar de “herói da mídia” a qualquer um que adira a irracional campanha de punição aos russos , importe ou não a evitar o avanço da guerra na Ucrânia ganhou um marco do ridículo na notícia publicada à tarde pela rede de televisão NBC, norte-americana: a proibição da inscrição de qualquer gato russo nos livros da Fédération Internationale Féline, na França.

Os gatos azuis da Rússia são um dos tipos preferidos de criadores mas, ao que se saiba, não são um item relevante na pauta de exportações russas, nem têm orientações ideológicas pró ou anti-Putin.

Como é ridículo o boicote às vodcas que se iniciou nos Estados Unidos. Segundo a Folha, “para as autoridades e empresas americanas e canadenses, retirar as marcas russas das prateleiras e dos cardápios é um símbolo valioso de apoio à Ucrânia e uma forma visível de rejeição internacional a Moscou pela invasão”, atendendo a “apelos” de políticos demagogos.

Outras notícias, claramente propaganda de guerra, são transmitidas com foros de verdade, como esta de que a Ucrânia está convidando mães russas a irem ao país buscarem filhos prisioneiros. Imaginem só as senhorinhas viajando milhares de quilômetros, atravessando fronteiras altamente vigiadas, chegando a Kiev, pegando o rebento e fazendo a viagem de volta, de novo passando em dúzias de barreiras e ponto de controle militares dos dois países…

Bem, mas sempre dá para pedir à produção para arranjar uma velhinha simpática, com direito a cenas de choro e “ai, ai, ai”, se aproveitando do drama humano que é cair prisioneiro de um inimigo de guerra.

Logo poderemos parar de falar em fake news, porque fake e news serão pleonasmo…

Tijolaço.

quarta-feira, 2 de março de 2022

PICARETAGEM ATÉ COM GUERRA? POR FERNANDO BRITO

O candidato de Sergio Moro ao governo de São Paulo, o tal “Mamãe Falei” e o coordenador do MBL um certo Renan Santos, estão protagonizando cenas inacreditáveis.

Depois de terem anunciado uma ida à Ucrânia, postam, na maior cara de pau, fotos de 2016, apelando para a simpatia com crianças, como se fossem destes dias infelizes de agora e abriram um “Pix” para recolher supostas doações para imaginários suprimentos para refugiados e, pasmem, para depositar na conta do “exército ucraniano”.

E dizem ter arrecadado, em poucas horas, R$ 180 mil.

É claro que ninguém tem acesso à existência dos recursos, a sua origem e a seu destino. Quem sabe o Ministério Público se anime a apurar os indícios de um estelionato.

Ah, mas eles são Moroboys e aí vale o mesmo critério da bufunfa paga ao ex-juiz: é só dizer que é “tudo direitinho”.

E aí, Dr. Moro, funciona para o senhor aquele famoso “diga-me com quem andas”?

Francamente, até desta gente abjeta, usar o sofrimento dos refugiados de guerra para arrecadar dinheiro obscuro é mais do que qualquer um poderia esperar.

Tijolaço.

terça-feira, 1 de março de 2022

QUARTA-FEIRA DE BRASAS PARA A ECONOMIA. FERNANDO BRITO

Mercados fechados ou fechando no exterior, já é possível ver a impacto que teremos, amanhã, no mercado financeiro brasileiro e nos preços das commodities que, se dão mais dinheiro aos exportadores, refletem-se impiedosamente nos nossos preços internos.

O petróleo subiu cerca de 10% no exterior. Quando a Petrobras fez seu último reajuste, o barril do tipo Brent custava 85 dólares. Está, agora, a 107, quase 26% de aumento.

Ainda que o dólar permanecesse a R$ 5,15 – e não vai permanecer -, um pelo outro, significa um desnível de 17,8%.

Trigo, soja e milho, entre outras mercadorias, tiveram aumentos expressivos, que vão influir nos preços ao consumidor brasileiro.

Este, porém, é o melhor cenário, por agora.

Pode piorar, se houver de fato a grande ofensiva russa esperada para as próximas horas. Pode sofrer um alívio se a entrada da China na mediação entre Rússia e Ucrânia, embora isso não pareça próximo, ainda que seja a melhor chance que tem, agora, a pacificação.

Mas é preciso reconhecer que estas chances não são grandes, porque é muito difícil que se possam fazer os recuos necessários – retirar as sanções à Russia e dar garantias de que a Ucrânia não se incorporará ao cerco atômico da Otan ao país – sejam mais difíceis do que as tropas deem passos atrás.

Tijolaço.

segunda-feira, 28 de fevereiro de 2022

MST NO MARANHÃO LANÇA PRÉ-CANDIDATURA DE GILVÂNIA FERREIRA PARA DEPUTADA FEDERAL

Nascida na Paraíba, "Gilvânia do MST" é filiada ao PT e atua há 30 anos na luta pela reforma agrária no Maranhão.

Escolhida pelo MST Maranhão como pré-candidata a deputada federal, Gilvânia Ferreira já soma 30 anos de movimento sem terra - Hannah Letícia,

A imagem da infância é a cerca do latifúndio que esmaga o quintal da casa. Nesse cenário, complementa-lhe o olhar diário a cana-de-açúcar, a usina, os trabalhadores e as trabalhadoras esbagaçados no engenho, além de famílias sem terra buscando pequenos pedaços que lhes caibam na franja das gigantes fazendas de um único dono, para plantar e sobreviver à fome.

Na comunidade de Canafístula, no interior da Paraíba, nos idos dos anos de 1970, uma menina de uma família de camponeses sem terra pobres percebe que as condições de vida dessa gente não andam muito bem. Embora lhe faltasse discernimento à época, não lhe faltava a astúcia do querer saber.

A menina foi crescendo inquieta, enérgica, estudiosa. Devorava livros de literatura emprestados pelas professoras da escola. Começa a imaginar o mundo, que não queria igual ao de sua convivência, por vezes tão brutal. 

Aos nove anos, lê cordel para homens e mulheres analfabetos, que só tinham o fardo do trabalho na roça e na cana, sem arte, sem direito, sem pão, sem chão. Aos 13, escreve cartas carregadas de saudades e novidades a pedido dos camponeses e das camponesas para enviar aos seus parentes distantes, migrantes que foram obrigados a vender sua força de trabalho em São Paulo e no Rio de Janeiro.

Na juventude, embalada pelos discursos proferidos por Margarida Alves, sindicalista rural na Paraíba, a vida começa a traçar seu destino. Participa da igreja organizando grupo de jovens, até que um dia lhe chega um livro sobre as mulheres combatentes da Nicarágua. A cabeça fervilha. Agora, ela tem a certeza de que as mulheres têm importante papel nesse mundo e passa a conceber que a luta pode ser organizada pelo povo.

Aos 17 anos, em 1987, conhece o Movimento de Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) ainda em seu estado natal, Paraíba, num momento de intensos conflitos por terra, caracterizados por violência e assassinatos contra famílias camponesas. Mesmo assim, sem temer, lhe dá vontade de engrossar as fileiras junto a tantos e tantas lutadoras contra a concentração de terra e as desigualdades sociais nesse país. Então decide: “A partir de agora, vou rodar este país, este Nordeste, ocupando terra e fazendo luta pela reforma agrária”. 

Nascia, então, a histórica e sagaz militante, conhecida como Gilvânia do MST. Depois de colaborar com a fundação do movimento em vários estados da região, foi enviada ao Maranhão. Hoje, 30 anos depois de sua chegada ao estado, Gilvânia tem a memória e a participação nos principais embates da luta pela reforma agrária na terra do arroz, da juçara, do babaçu e do reggae. 

Lançada recentemente pelo MST como pré-candidata a deputada federal pelo PT do Maranhão, Gilvânia explica, em entrevista ao Brasil de Fato, porque agora aceitou entrar para outra frente de batalha, onde mulheres negras, mães, educadoras e camponesas como ela não têm espaço.

 

Confira abaixo a entrevista concedida ao Brasil de Fato: 

BdF - São 30 anos de MST-Maranhão. Você ajudou na constituição de muitos assentamentos que beneficiam milhares de famílias hoje. É isso que te chama para uma nova luta concorrendo como pré-canditada à Câmera Federal?

Gilvânia do MST - O que me chama a concorrer como pré-candidata a deputada federal é minha história, minha classe e a decisão do meu movimento, a vontade de mudar este país em benefício dos mais prejudicados, trabalhadores e trabalhadoras do campo e da cidade, os indígenas, os quilombolas, os ribeirinhos, as populações extrativistas, as várias juventudes que existem neste país, as mulheres. 

O que me chama é a luta por um conjunto de direitos que nos foram negados e tirados, para reverter isso e promover políticas públicas que ajudem a fomentar saúde, educação, cultura, lazer, trabalho, renda, acesso à terra, habitação, tudo que leve a população maranhense a uma vida digna. [Para] participar de um lugar de luta importante na política brasileira, que sempre negou ou não deixou pessoas com minha trajetória de vida chegar lá – filha de camponeses pobres, sem terra, mãe, negra, camponesa e educadora.

Como você conheceu o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra?

Quando eu tinha 17 anos, foi nesse período que eu escutei falar do MST. A sindicalista Maria da Penha, que estava ajudando nas articulações para a chegada do MST na Paraíba, me convidou para participar de uma oficina sobre o Jornal Sem Terra, editado e produzido pelo Movimento. 

Dessa oficina, já saí como zeladora, que cuida da chegada e distribuição do jornal nas regiões e nos territórios. E fui correspondente também do periódico, ficando responsável por mandar informações sobre as confusões agrárias na Paraíba: a área em conflito, a história do lugar, nome do fazendeiro, quantas famílias estavam mobilizadas, quais as organizações que estavam ajudando no processo de resistência.

Lembro que foi a primeira vez que me chamaram de "comunista", quando eu distribuía o jornal na escola, nas comunidades rurais. "Ah, você é comunista, esse jornal é de comunista". Falar de reforma agrária era ser comunista, isso estava muito vinculado, na Paraíba, às ligas camponesas, que foram muito fortes. 

Depois eu fui pra são Paulo, também numa atividade do Jornal Sem Terra. Sendo minha primeira viagem para fora da Paraíba. E depois fui para o 5º Congresso Nacional do MST em São Paulo, também em 1989. 

E assim virou militante da organização? 

É importante contar um fato que aconteceu um ano antes, em 1988. Além da tarefa do Jornal Sem Terra, eu também estava com a tarefa de articulação da organização do Movimento no estado da Paraíba. E foi nesse ano a realização de um encontro estadual com várias organizações e pessoas para decidirem se a gente ia fundar o MST na Paraíba ou não. 

A pergunta na assembleia, na verdade, era: vamos ou não ocupar terra? Se sim, fundamos o MST no estado. Era um momento de muita violência do latifúndio contra os posseiros, camponeses que queriam terra para trabalhar na Paraíba. Então, as pessoas tinham muito medo desse enfrentamento.

A votação estava empatada. O Jaime Amorim estava nessa assembleia e disse que meu voto foi decisivo. Lembro que Neuri Rosseto estava presente também, dois militantes históricos do MST. Pois bem, votei pelo "sim" das ocupações e ali fundamos o MST na Paraíba. 

Esse "sim" foi para muitas coisas: para a fundação do MST, mas também foi o momento em que tomei uma decisão definitiva na minha vida: "A partir de agora, vou rodar este país, este Nordeste, ocupando terra e fazendo luta pela reforma agrária". 

Eu tinha terminado o ensino médio e já poderia entrar nas fileiras da luta. Esse era o compromisso: não podia largar os estudos, senão a Maria da Penha me "puxava as orelhas".

E você foi rodar o Nordeste nas lutas do MST?

Sim, mas, quando voltamos do quinto congresso, já tínhamos a tarefa de em um mês começar a ocupar terra na Paraíba, ou seja, voltamos pro trabalho de base. É o período em que entro na Frente de Massa, mas sempre me articulando com todos os temas e setores do MST.

Quando, no ato da ocupação, você precisa organizar a terra-mulheres, terra-escola, terra-saúde, terra-juventude, terra-cultura, porque a terra tem todos esses componentes, e o militante da Frente de Massa tem que ter a totalidade do Movimento. 

Tem que saber trabalhar a questão de gênero – às vezes, íamos para as negociações, e um monte de companheiro presente, e as mulheres fazendo a refeição no acampamento. Não, isso não pode acontecer. E eu sempre dizia: "Vamos colocar outras mulheres nessa comissão de negociação, as companheiras da escola, as rezadeiras, as que fazem os remédios medicinais nos acampamentos e por aí vai...".

Por isso que hoje temos uma paridade de gênero no MST. Ou seja, a Frente de Massa foi uma universidade pra mim, porque ali é necessário ser pedagogo, psicólogo, compreender a subjetividade do povo que está no acampamento, entender afetividade e os sonhos das crianças.

A ocupação é a hora da partilha, de vencer o medo e de discutir problemas estruturais da nossa sociedade. Por exemplo, a nossa base social do MST no Maranhão, é majoritariamente negra, então temos que trabalhar a questão racial, sobretudo, da sua participação na construção da riqueza deste país, onde os negros e negras foram violentados, nos seus corpos, na sua subjetividade, na sua sexualidade, foi um processo de violência brutal para produzir riqueza pra colônia. Neste sentido, não podemos nunca esquecer que nossa base é indígena, quilombola, ribeirinha, extrativista. 

Assim, eu fui com todos esses elementos despertos para trabalhar com o povo, andar por este país. Participamos das primeiras ocupações de terra do MST no Ceará, em Pernambuco e no Rio Grande do Norte. Já existia MST na Bahia, Alagoas, Sergipe e Piauí. E no Maranhão já existia uma articulação do Movimento, com várias organizações; entre elas, o Centro de Educação e Cultura do Trabalhador Rural (Centru), coordenado pelo histórico Manoel da Conceição, que nos deixou o ano passado, infelizmente. 

E como foi sua chegada ao Maranhão? 

Minha chegada ao Maranhão se deu através de um convite da Frente de Massa do Movimento para que eu contribuísse com o processo de luta pela terra no estado. Desembarquei em 2 de junho de 1992 na rodoviária de Imperatriz, vim pra passar um ano e já estou há 30 anos [risos].

Ao longo desses anos no Maranhão, muita coisa me marcou. Logo nos primeiros dias, fui para um despejo na cidade de Zé Doca, numa terra grilada pelos fazendeiros da região. Fomos despejados e retomamos a terra depois. Ou seja, "cheguei chegando". 

Depois fui para Vitória do Mearim, na baixada maranhense, ajudar a organizar a escola do acampamento Vila Diamante, que não tinha nada, nem cadeira, nem carteira, nem lousa. Bom, nossa ideia era ocupar a prefeitura e exigir do prefeito da cidade que fizesse as melhorias na escola e cedesse os materiais. 

Mas não tinha dinheiro para pagar os ônibus pra ir até a prefeitura com os acampados. Aí a gente teve a ideia de parar os ônibus na rodovia, enchia de gente e, assim, chegamos e ocupamos a prefeitura. Em muito pouco tempo, chegou muita polícia, com muita repressão, deu tiro de bala de borracha, espancou e prendeu 19 companheiros. 

Diante disso, eu corri até a rádio da cidade para denunciar o que estava acontecendo, e a polícia atrás de mim na rádio para me prender. Consegui escapar pelos fundos e me esconder na casa de familiares de um promotor de Justiça na época. 

No mesmo dia, começou a aparecer deputado, vereador, organizações de direitos humanos vindos de São Luís para libertar os companheiros. 

Como eu estava dizendo na rádio que precisávamos de ajuda e qual era nossa causa, começou também a chegar no meio do tumulto, muitas camionetes com as traseiras cheias de trabalhadores rurais das comunidades. Os moradores da própria cidade saíram às ruas, nos alojaram nas casas deles, foi um momento muito bonito. 

Qual outro momento que você rememora na sua chegada ao Maranhão?

As marchas convocadas pelo MST, que são inesquecíveis. Em 1993, fizemos uma grande caminhada chamada de Marcha da Esperança, que foi de Vitória do Mearim até a capital, São Luís, cerca de 240 km.

Essa marcha foi em conjunto com a Federação dos Trabalhadores e Trabalhadoras da Agricultura do Maranhão (Fetaema), com a Comissão Pastoral da Terra (CPT), o movimento das viúvas dos posseiros assassinados na disputa pela terra, as quebradeiras de coco, comunidades tradicionais – que ainda não chamavam de quilombolas, se denominavam comunidade dos pretos, comunidade dos santos, terra de preto, era assim os nomes. Na caminhada, as pessoas iam se juntando à marcha e diziam: "Sou da comunidade das Lagoas"; "[Sou] da comunidade dos Baianos", que tinham perdido suas terras griladas pelo agronegócio, e iam entrando na marcha porque também estavam em conflito.

Fazíamos debate sobre reforma agrária nos municípios e nas comunidades onde parávamos, e tinha um sentido de formação muito importante. Essa estrada que liga as cidades até São Luís é toda de conflito por terras. Foram mais de 10 dias de marcha.

E um dos momentos mais bonitos foi quando chegamos à ponte do Estreito dos Mosquitos, na entrada de São Luís. Ali fizemos o Encontro das Luzes, que era o encontro entre campo e cidade. Os trabalhadores da cidade nos recepcionaram com tochas. Eu tinha 23 anos, e aquele foi um momento muito marcante na minha vida. 

Você chegou por Imperatriz, mas depois foi para outras regiões. Quando é que retornou e territorializou o MST nessa região?

Eu rodava por todo o Maranhão, mas para a região Tocatina vim definitivamente em 1995. Aqui era tudo acampamento, não tinha assentamento. Tive minha filha em 1995, a Tainá. Com menos de um ano da bebê, em 26 de março de 1996, ocupamos a fazenda Califórnia. Era o filé mignon de Açailândia, na beira da estrada.

Os latifundiários já tinham ficado furiosos com a consolidação do assentamento Itacira, conhecido como Vila Conceição, muito próximo à fazenda Califórnia. Fomos despejados em 24 horas. Tinha a polícia vinda de toda a região pra tirar a gente, pois era uma área cobiçada pelo projeto de celulose, inicialmente da Celmar, que passou para a siderúrgica Ferro Gusa Carajás e depois pra Suzano. Eles tinham comprado muitas terras em Açailândia para a produção de eucalipto. 

A fazenda Califórnia, inclusive, estava na lista das fazendas que eles queriam comprar para plantar eucalipto. Depois que ocupamos a fazenda, eles aceleraram o processo de compra e plantação de eucalipto, tanto que hoje o assentamento está cercado de eucalipto. 

Nós conseguimos reverter o processo de despejo fazendo muita mobilização no Incra [Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária], na cidade, porque eram quase 600 famílias nessa ocupação. E assim conseguimos a desapropriação. 

E depois do assentamento Califórnia? 

Como tinham muitas famílias nessa luta, nós tínhamos possibilidade e gente para ocupar mais terras na região. E foi aí que descobrimos que tinha uma área pública do Exército que tinha sido cedida pela Superintendência de Desenvolvimento da Amazônia (Sudam) para treinamento dos soldados na região. 

Ocupamos! E o Incra não queria de jeito nenhum conversar com a gente. Então fomos ocupar o Incra. Foram dias intensos de muita mobilização, mas conseguimos as terras cedidas para o Exército, uma área de quase 22 mil hectares que hoje abriga um complexo de assentamentos e vilas: Nova Vitória, Nova Conquista, Macaúba, Conquista da Lagoa, 50 Bis... É uma das maiores conquistas do MST nessa região e demarca nossa territorialização na região tocantina.

Brasil de Fato.

domingo, 27 de fevereiro de 2022

“DISNEYLÂNDIA DO NEONAZISMO”. MAS NÃO É BRINCADEIRA. FERNANDO BRITO

Aos que acham que esta história de neonazismo é “folclore” em torno de alguns alucinados sem importância, recomenda-se a leitura da reportagem de Janaína Figueiredo, na edição de hoje de O Globo. onde registra-se que o Brasil é, no mundo, o país “onde mais cresce o número de grupos de extrema direita”. São 530, segundo um grupo de professores dedicado à pesquisa do tema:

— Desde 2018, o Brasil se transformou no país com maior crescimento de grupos de extrema direita. Este fenômeno tem a ver com a eleição de Jair Bolsonaro que, num nível subterrâneo, está vinculado a estas ideologias. Hoje, estima-se que 15% dos brasileiros são de extrema direita — afirma Michel Gherman, membro do Observatório da Extrema Direita, professor de Sociologia da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e coordenador do Instituto Brasil-Israel.

Seu colega Karl Schuster, professor das Universidades de Pernambuco e Vigo, na Espanha:

— Estas mais de 530 células ganharam autorização para aparecer. A pergunta fundamental não é se estes grupos são ou não fascistas, e sim por que eles trazem para si aspectos do fascismo histórico. O que eles ganham se aproximando desses discursos?

Eles manifestam a preocupação com a facilitação do acesso a armas desde que Bolsonaro assumiu a Presidência porque “todos estes grupos são contrários a qualquer tipo de nova regulamentação para voltar a restringir o acesso a armas e munições”.

Creio que a origem deste fenômeno assustador veio de antes, do momento em que a direita brasileira, a pretexto da derrubada de um governo eleito, aceitou conviver com estas ideias.

Parece que ninguém se lembre que, há apenas 6 meses, após o “7 de Setembro” golpista de Bolsonaro, alguns destes grupos acampavam com faixas nos gramados de Brasília prometendo “ucranizar o Brasil”.

Tijolaço.

sábado, 26 de fevereiro de 2022

KIEV DIZ QUE SERÁ ‘INIMIGO’ QUE EM FOR À RUA APÓS 17 H. POR FERNANDO BRITO

O prefeito de Kiev, Vitali Klitschko, determinou que qualquer pessoa que esteja nas ruas de Kiev após 17 horas (hora local, meio-dia no Brasil) será considerado “inimigo” e, em consequência, preso ou alvejado.

O presidente da Ucrânia, Volodymyr Zelensky, respondeu que “não precisa de carona” a uma suposta sugestão dos EUA para que evacuasse a capital do país.

O Ministério da Defesa do Reino Unido, certamente mais bem informado que quase todos nós, soltou um comunicado em que diz que a maior parte das tropas russas está acantonada a 30 km de Kiev.

Não existe ainda, e por algumas horas, uma batalha por Kiev. Todos os pequenos avanços russos são localizados, visando destruir os centros militares da capital, com artilharia e ações de comandos e de sapadores. Os russos querem evitar tanto quanto puderem o combate urbano, o que mais causa baixas, mas, ao mesmo tempo, tentam evitar colocar a cidade sob fogo intenso de mísseis e de artilharia, Basta lembrar das ofensivas dos EUA sobre Bagdá, no Iraque, para saber que, se quisesse, Putin teria tantas ou mais condições de aniquilar Kiev com um bombardeio de algumas horas.

Chega a ser mal-disfarçado o interesse da Otan que isso aconteça e lhe dê uma vantagem imensa na opinião pública mundial.

O destino da Ucrânia importa-lhes pouco, porque a submissão do país a Putin será fartamente compensada com o “prêmio” de colocar bases da Otan na Escandinávia e avançá-las na Europa do Leste.

Esqueça qualquer amor à autodeterminação dos povos, não é isso que está em questão, mas o avanço do império norte-americano para Leste, ou Oriente, se preferirem dar ao boi o nome que ele tem.

Tijolaço.

sexta-feira, 25 de fevereiro de 2022

QUEIXA DE BOLSONARO PODE SER SINAL DE AUMENTO DA GASOLINA. POR FERNANDO BRITO

Jair Bolsonaro, sempre adepto da tática de dizer que os problemas “não são com ele”, fez hoje pesadas críticas aos salários (astronômicos, por sinal) dos dirigentes da Petrobras. Pode ser uma manobra “preventiva” para se dissociar do aumento de preços que todos sabem que está sendo adiado, mas terá de acontecer nos próximos dias, em razão da alta mundial do petróleo.

“O diretor ganha 110 mil por mês. O presidente, mais de 200 mil por mês e no final do ano ainda tem alguns salários de bonificação. Os caras têm que trabalhar! Têm que apresentar a solução e mostrar o que aconteceu na Petrobras nesse tempo e como essa dívida de 900 bilhões de reais está sendo paga”.

Bolsonaro costuma usar o método de atacar as “mordomias” dos diretores da Petrobrás quando estão para sair aumentos de preço, e a ocasião mais aguda foi quando demitiu o então presidente Roberto Castello Branco e nomeou para seu lugar o atual presidente, general Joaquim Silva e Luna que manteve a mesma política de paridade com os preços internacionais do petróleo que, embora mais espaçados, chegaram perto de 50% em 2021.

A queda do dólar, que chegou perto de 10% desde janeiro estava sendo suficiente para segurar o ajuste. Mas o fim das quedas da moeda norte-americana e a disparada do preço do barril no exterior (perto de 30% desde o início do ano) tornou isso inevitável e, com a política de preço que seguem, urgente.

Tijolaço.

quinta-feira, 24 de fevereiro de 2022

BOLSONARO, O QUE FAZ ERRADO ATÉ QUANDO FAZ O CERTO. POR FERNANDO BRITO

Jair Bolsonaro é tão grosseiro, desqualificado e estúpido que, até ao fazer as coisas certas, faz errado.

Poderia ter ido à Russia sem problemas. Viagem marcada há tempos, parceiro comercial do Brasil, mesmo a crise – ainda sem guerra – da Ucrânia não lhe tiraria a razão de cumprir a agenda, com discrição e formalidade.

Mas fez vários movimentos errados, o maior deles de praticamente reduzir a militares a sua comitiva, e uma escolha desastrosamente errada da palavra a usar em relação ao governo Vladimir Putin: solidariedade. De glacê no bolo, a imbecil insinuação de que, “coincidência ou não”, ele tinha “levado a paz” ao conflito da Europa do Leste.

É, realmente, um “cabeça de meme”.

Mas hoje ele repetiu a dose e, para “corrigir” a estupidez do seu vice, o General Mourão, que havia atropelado e defendido um “solução de força” contra a ofensiva russa sobre a Ucrânia, soltou os cascos em sua mentecapta live das quintas-feiras:

“Deixar bem claro: o artigo 84 da Constituição diz que quem fala sobre esse assunto é o presidente. E o presidente chama-se Jair Messias Bolsonaro e ponto final”, comentou. A declaração foi feita nesta quinta-feira (24).
“Então, com todo respeito a essa pessoa que falou isso, eu vi as imagens, falou mesmo, está falando algo que não deve, não é de competência dela [Hamilton Mourão]. É de competência nossa”

Tudo isso ao lado do Ministro das Relações Exteriores, Carlos França (que havia soltado uma correta nota defendendo o fim das hostilidades e o início do diálogo) que não abriu a boca.

É claro que quem fala pelo país, em matéria de política externa são o presidente e o chanceler e que Mourão é um espectro que está na vice-presidência só porque era um general boquirroto.

Mas desautorizá-lo expressa e grosseiramente assim, Bolsonaro “vende” outra vez um apoio decidido à ação russa, o que é um erro tão grande quanto se alinha ao coro das sanções.

Um imbecil é sempre um imbecil, acima de tudo.

 Tijolaço.

quarta-feira, 23 de fevereiro de 2022

COM LUCRO RECORDE DA PETROBRAS, É ESCÁRNIO DERRUBAR IMPOSTO. POR FERNANDO BRITO

Dê-se o “desconto” de que o primeiro ano da pandemia foi um tempo de petróleo barato (embora nem tanto a gasolina, o gás e o diesel) e é um exagero pensar que o lucro da Petrobras em 2021 -R$ 106,6 bilhões, contra R$ 7,1 bilhões em 2020 – tenha sido muito maior.

Mas 1.400% de aumento no lucro líquido é uma situação que não só torna a empresa uma extorsionista dos consumidores brasileiros como, descaradamente, uma vilã do processo inflacionário que acontece neste país.

Afinal, subir o preço nas bombas em 50%, em um ano, que nome merece?

Ainda mais quando se articula uma chantagem para tirar dos estados (e dos municípios, que têm grande participação no ICMS – parte de sua receita em tributos sobre o preço dos combustíveis.

A empresa produziu menos petróleo (-2,2%) mas ganhou muito mais na exportação do óleo bruto e dos derivados. Reduziu sua capacidade de refino e anunciou que pretende seguir na sua política de “desinvestimento”, isto é, na venda de “nacos” da empresa, como fez na sua privatização da sua rede lucrativíssima de postos (a BR Distribuidora) que construiu ao longo de cinco décadas de sucesso.

Só de venda de ativos, no último trimestre do ano, foram R$ 28 bilhões.

Dos lucro, R$ 101 bilhões serão distribuídos aos acionistas em dividendos A União fica com R$ 37 bilhões e os R$ 64 bilhões restantes são embolsados pelos acionistas privados, sem um centavo de impostos.

Como era mesmo a declaração “intervencionista” de Lula?

“Nós não vamos manter o preço da gasolina dolarizado. É importante que o acionista receba seus dividendos quando a Petrobras der lucro, mas eu não posso enriquecer o acionista e empobrecer a dona de casa que vai comprar um quilo de feijão e paga mais caro por causa da gasolina”

Que é isso, Lula? 1.400% a mais de lucro é “a mão invisível do mercado” tirando a parte dela…

Tijolaço.

terça-feira, 22 de fevereiro de 2022

PUTIN AVANÇA, PARA E ESPERA. POR FERNANDO BRITO

Logo após a fala de Vladimir Putin, ontem, escreveu-se aqui que ele poderia “escalonar sua ofensiva, porque o simples reconhecimento das duas repúblicas não o obriga a nada” embora indique “para uma improvável ofensiva sobre aqueles territórios” : “Ele [Putin] estica a corda e deixa claro que não fará novo recuo até que o Ocidente acene com alguma proposta de limitar a presença da Otan na Ucrânia, como parece ser o seu desejo.

Putin joga xadrez, seus adversários parecem jogar damas.

Era tão evidente isso que foi o que, ao menos nas primeiras 24 horas, aconteceu. Putin jamais daria ao Ocidente o que EUA e Otan queriam: imagens de colunas de tanques, às centenas, com a chama dos disparos na ponta de seus canhões”.

Não quer dizer que esteja descartada alguma ação militar incisiva, mas dificilmente ela seria espetacular.

Lembrem-se que esta guerra, como todas as modernas, tem a propaganda como artilharia mais eficaz.

Não há nada nas sanções anunciadas por Biden e por países europeus que sejam um grande problema para o Governo russo: proibir transações financeiras de bancos russos nos Estados Unidos é como usar uma peneira para conter água, sustar um gasoduto – sanção também há muito prevista – é um tiro no pé da economia alemã e europeia, totalmente dependente do suprimento de gás russo.

Da mesma forma, mandar armas para a Ucrânia, com o nível de sofisticação que armamentos têm hoje é inócuo, porque exceto equipamentos básicos, não há pessoal habilitado a manejá-las com eficiência e é, neste momento, impensável que tropas da Otan e, especialmente, dos EUA vão se engajar em combates no solo.

No mais, pensar em ataques aéreos ao solo, com mísseis e helicópteros, é desalentador: além de conduzir o conflito para um combate sem limites, e não há a supremacia absoluta no ar que houve nas últimas guerras travadas pelos EUA, contra o Iraque, no Afeganistão e na Síria. Disparar um míssil contra território russo e abrir-se a um disparo equivalente contra quem o disparou.

O Ocidente podia ter deixado “por menos”, sem nada ou muito pouco de prejuízo estratégico. A Ucrânia pode querer fazer parte da Otan, mas se a Otan tivesse dito “não”, numa atitude prudente de deixar uma cortina “neutra” nas fronteiras russas, nada na lei internacional tornaria um direito esta associação. Mais adiante, com a crise já instalada, evitar uma atitude hostil, como a do “é mentira e eles vão invadir a qualquer momento” teria deixado Putin na obrigação de dar consequência à sua declaração de que as tropas se recolheriam.

Capitaneados por Joe Biden, com visíveis intenções de reforçar-se internamente depois do fiasco da retirada do Afeganistão, deixaram Putin conduzir como queria a situação.

E, claro, nada tem a ver com a Ucrânia e a segurança e autonomia de seus povos.

Tijolaço.

segunda-feira, 21 de fevereiro de 2022

PUTIN RECONHECE SEPARATISTAS E CRISE DA UCRÂNIA SOBE OUTRO DEGRAU. POR FERNANDO BRITO

Em uma longa fala – quase uma hora – em que passou em revisão as relações seculares entre a Russia e a Ucrânia, Vladimir Putin anunciou que reconhecerá “nos próximos dias” as repúblicas separatistas de Donetsk e Lugansk, na região de Donbass, onde há grande parcela de população russa, há um século e meio, desde que o carvão passou ser extraído da região do Donbass e provocou a chegada de grande quantidades russos.

Putin disse que a entrada da Ucrânia em restrições na Otan significa colocar sob perigo de ataque militar toda parte europeia da Rússia, até os Montes Urais: “misseis Tomawank a 35 minutos e mísseis hipersônicos a cinco minutos de Moscou”.

O presidente russo não adotou um discurso belicista e não fez conclamações na base do “tudo ou nada”, como tem feito o Ocidente. Mas falou de olho em seu público interno, destacando o fato de que os russos sempre deram apoio à Ucrânia, inclusive pagando suas dívidas após o fim da União Soviética. Trabalhou o tempo todo para colocar os ucranianos como dissipadores do legado russo., desde o Império e disse que foi Lênin quem produziu um estado ucraniano como república.

Não foi um discurso de guerra aberta, mas não foi um discurso de paz a qualquer preço e deixou claro que não vai oferecer mais do que já ofereceu, semana passada, quando chegou a falar em retirar as tropas à medida em que terminassem os exercícios militares.

Sobrou aos EUA e a Otan retaliar, mas até agora o fizeram de maneira fraca, com a edição de um decreto proibindo novos investimentos, comércio e financiamento nas regiões separatistas. Isso e nada dá no mesmo, claro.

Putin pode escalonar sua ofensiva, porque o simples reconhecimento das duas repúblicas não o obriga a nada, mas lhe dá razões para uma improvável ofensiva sobre aqueles territórios. Ele estica a corda e deixa claro que não fará novo recuo até que o Ocidente acene com alguma proposta de limitar a presença da Otan na Ucrânia, como parece ser o seu desejo.

O fato é que a crise escalou outro degrau e uma solução diplomática está cada vez mais longe, até porque o mundo vive um período de líderes apagados, incapazes de propor soluções e que, por isso, apelam para bravatas que tecem uma armadilha da qual eles mesmos se tornam prisioneiros.

Aqui, para nós, sobra mais alta no preço do petróleo, que bateu hoje 96 dólares (o tipo Brent) e vai deixando, apesar da queda do dólar, cada vez mais provável um aumento dos combustíveis.

Tijolaço.

domingo, 20 de fevereiro de 2022

O PT FOI AO LIMITE COM O PSB. POR FERNANDO BRITO

Ninguém duvida que a disputa presidencial, ainda que com variações dentro da margem de erro, segue polarizada entre Lula e Jair Bolsonaro, muito embora o percentual dos que optam por uma enorme variedade de outros candidatos ainda oscile na casa dos 20%.

Em votos válidos – excluídos brancos nulos, nenhum e indecisos – os dois somam isso, 80 %.

Portanto, ao que tudo está indicando, é esta a disputa que, em princípio, definirá votos para os governos estaduais e para o Congresso.

Aos partidos do Centrão, há boa certeza que não escreverão os nome de seu candidato oficial a presidente, porque sabem que, neste campo a hegemonia será dos “bolsonaristas-raiz”, impulsionados pelas falanges armamentistas, religiosas e belicosas.

No campo da direita não haverá outros espaços, exceto o enclave  “morismo”, que já demarcou claramente seu pequeno alcance.

E no campo popular?

Ao que parece, não há como o “cirismo” possa crescer e que o PSB, apresentando-se afastado de Lula, possa vicejar.

Lula já deixou evidente a sua intenção de agregar e fez o PT aceitar ceder acima e além do necessário para viabilizar alianças.

Até o posto de vice em sua chapa entregou a Geraldo Alckmin ofereceu, sem condições, que o exime de qualquer acusação de que vá procurar uma radicalização.

Mas tem todo o direito de reagir a uma postura de “reciprocidade zero” com que é correspondido. E de procurar uma aliança com Guilherme Boulos em São Paulo, já no primeiro turno.

O PSB tem de se cuidar, porque depende muito mais de Lula do que o ex-presidente depende dele.

Ambições fazem parte do jogo político, mas têm limites.

Lula e o PT cederam várias “janelinhas”, mas parece que se está fazendo opção pelo fim da fila.

Tijolaço.