Para
Fabio Malini, Bolsonaro perde batalha nas redes sociais com união de forças e
catarse coletiva depois de ameaçar repórter com “porrada”.
"Minha
vontade é encher tua boca na porrada", disse presidente a repórter, com
seu linguajar conhecido
A
gigantesca repercussão, nas redes sociais, desencadeada pela ameaça de Bolsonaro a um jornalista reverbera
insatisfação de amplo espectro social e representa significativa derrota dos
“combatentes” bolsonaristas, embora em uma batalha apenas, na guerra da
comunicação. “O presidente subiu o tom como forma de tentar manter o discurso
de força e enfrentamento que ele sabe que dá retorno. Mas esse retorno, no
caso, se deu nos seus canais de redes sociais, administrados por ele, e a
questão é que ele não está conseguindo administrar na ‘casa’ dele. Ele não está
jogando na casa do adversário, está jogando em casa e está perdendo muito”, diz
Fabio Malini, professor e pesquisador da Universidade Federal do Espírito Santo
(UFES). A pergunta e sua repercussão chegou a atingir mil reproduções no
Twitter a cada 40 segundos.
“Presidente,
por que sua esposa, Michelle, recebeu R$ 89 mil do Queiroz?”, perguntou um
jornalista de O Globo, neste domingo (23) durante uma visita de Bolsonaro
à Catedral de Brasília. “Eu vou encher a boca desse cara na porrada”, respondeu
Bolsonaro. Em seguida, o presidente acrescentou: “Minha vontade é encher tua
boca na porrada”. A resposta nas redes sociais de internautas chegou a
1.035.521 de mensagens nas redes sociais, terreno onde o grupo que governa o
país domina a técnica e a capacidade de disseminação de informações, falsas ou
não.
“O
governo tem uma característica de comunicação que dá ideia de combate. Eles não
têm militantes, têm combatentes. Há uma guerra da informação que precisam
ganhar. E a batalha de ontem foi perdida. Mas haverá novas”, diz Malini.
“Porém, esse conceito de comunicação de combate tem um limite, dada a própria
lógica do governo, que precisa entregar resultado, porque a taxa de desemprego
está subindo, a crise fiscal instalada, problemas muito grandes.”
MEMES SE ALASTRAM
Para
Malini, essa repercussão inesperada para Bolsonaro decorre de uma agregação de
forças que transcende o terreno da oposição. “O que é interessante desse
movimento de ontem é que, se não há frente única institucionalmente (contra
Bolsonaro), na internet ela já está se consolidando. No mesmo campo, juntou-se
a turma do PT com a turma do partido Novo”, avalia.
Na
opinião do analista, as diferentes forças sociais e políticas que se agregaram
nesse movimento midiático se valeram de um gatilho, “para expressar dores,
esperanças, desilusão, desamparo, e também abandono, que é próprio da pandemia:
foi a oportunidade para expressar a catarse coletiva de uma parte da
população”.
Outro
ponto destacado por Malini é que, para ele, a “memetização” (o fato
transformado em “memes” na internet), que ocorreu a partir de ontem, é tão
forte que fez com que os alvos, sobretudo a primeira dama, “se tornassem
objetos de formas e mensagens que saíram do limite do politicamente correto,
normalmente muito mais no campo da esquerda”.
Ao
começar a ler os comentários que se alastraram pelas redes, observa Malini,
Bolsonaro e seu grupo estavam perdendo a capacidade de controlar o espaço de
suas próprias redes, em função da quantidade enorme de falas com a mesma
pergunta. “Notei um número muito grande de pessoas desesperadas, solicitando,
por exemplo, mais tempo para o auxilio emergencial. Passa a ser um segundo
movimento acontecendo ao mesmo tempo. E esses elementos têm a ver com
pessoas que entraram na internet apenas para reivindicar isso (no caso, o
auxílio emergencial)”.
DISCURSO DE FORÇA E
ENFRENTAMENTO
Na
esteira desse movimento crescente, surgiu também, entre outros, o assunto da
deputada Flordelis (PSD-RJ), acusada de ser mandante do assassinato do marido,
segundo o delegado Allan Duarte, titular da Delegacia de Homicídios de Niterói.
“Umas
coisas vão contaminando outras. Criaram-se memes com o indiciamento da
deputada. Ou seja, as coisas não acabam, existe uma dimensão homeopática. O
presidente subiu o tom como forma de tentar manter o discurso de força e
enfrentamento que ele sabe que dá retorno. Mas, quando esse retorno se dá nos seus
canais de redes sociais, normalmente são administrados por ele”, diz Malini.
Mas neste fim de semana o problema de Bolsonaro foi que o movimento após
a pergunta sobre os R$ 89 mil ultrapassou a capacidade de o clã administrar.
O
analista também destaca que um dos elementos que balizam o discurso de
Bolsonaro, a questão do combate à corrupção, sofreu um grande desgaste. “Quando
ele começa a se calar ou radicalizar para não responder um fato que tem relação
direta com esse valor da defesa do combate à corrupção, que já ficou
fragilizado com a saída de Moro, vai se fragilizando ainda mais. Então, esse
eleitorado sensível a esses temas fica ainda mais irritado com esse
posicionamento do presidente”, na opinião do professor da UFES.
Do
RBA