Indígenas
pedem que Funai siga protocolos legais, para se protegerem de empreendimentos
no Pará e afirmam que se não houver diálogo eles farão, novamente, o bloqueio
total da BR-163.
(Foto:
Mydjere Kayapo Mekrangnotire)
Brasil de Fato - Uma reunião realizada na tarde desta
quarta-feira (19), com lideranças Kayapó Mekrangnotire e representantes do
Ministério Público Federal (MPF) buscou soluções para resolver os problemas que
levaram os indígenas a realizar o bloqueio na BR-163, no sudeste do Pará, na
última segunda-feira (17). Depois de uma reunião dos caciques, parte da via foi
liberada, mas os indígenas afirmam que se não houver diálogo eles farão,
novamente, o bloqueio total da rodovia. A região, como um todo, é ameaçada por
um conglomerado de empreendimentos econômicos.
A
liderança Mydjere Kayapo Mekrangnotire explica que, até o momento, nenhum órgão
foi dialogar com os indígenas, apenas, o MPF, que apoia as suas
reivindicações.
"Tivemos
a BR-163 bloqueada até que uma autoridade, o pessoal da Funai, ou da Saúde, Cesai,
Ibama, DNIT, possa vir conversar com a gente. Hoje (quarta) tivemos uma reunião
com o pessoal do MPF e eles vão nos ajudar a cobrar o pessoal da FUNAI. Os
caciques decidiram abrir um pouco a BR, mas sem resposta da FUNAI vamos voltar
a fechar, de novo", diz o indígena Mydjere Kayapo Mekrangnotire.
Procurada
pelo Brasil de Fato, a Funai disse, em nota, que "está no local e
acompanha, junto à Polícia Rodoviária Federal, as negociações para desobstrução
da BR-163".
O
órgão disse ainda que "cabe ressaltar que já foi expedido pela Justiça
Federal um mandado para liberação da rodovia".
Na
quarta (19), o MPF entrou com recurso no Tribunal Regional Federal da 1ª
Região, em Brasília, contra a ordem de reintegração de posse concedida pela
Justiça Federal de Itaituba, no Pará na última segunda-feira (17). A decisão
prevê a retirada, com força policial, dos indígenas que protestam na rodovia.
Segundo
o MPF, a ordem judicial foi pedida pela Polícia Rodoviária Federal (PRF) e
emitida pela Justiça sem aviso ao órgão, que tem o dever constitucional de
proteger os direitos indígenas e deveria ter sido intimada sobre o pedido para
poder se manifestar.
A
ordem de liberar a estrada fixou multa diária de R$ 10 mil aos indígenas. O MPF
classifica a decisão como "afronta aos princípios e valores do ordenamento
jurídico-constitucional".
O
problema
As
reivindicações são por melhorias da saúde indígena e também contra as invasões
de madeireiros, mineradores, garimpeiros. Até o momento, Os Kayapó Mekragnotire
totalizam 403 casos da covid-19 e apenas um médico atende toda a etnia.
Nas
duas terras indígenas onde vivem os manifestantes, Baú e Mekragnoti, a
Secretaria de Saúde Indígena não tem motoristas, nem carros para remover
pacientes que necessitem de hospitalização, segundo o MPF.
Além
da desassistência na saúde, em dezembro de 2017 a Agência Nacional de
Transportes Terrestres (ANTT) assinou uma ata de compromissos na qual garantia
que o projeto da empresa interessada na área, Ferrogrão, não seria encaminhado
para o Tribunal de Contas da União (TCU) sem a realização do processo de
Consulta, Livre, Prévia e Informada com os Kayapó.
Progresso?
O
projeto prevê a construção de uma ferrovia de 932km destinada ao escoamento de
grãos como soja e milho que liga Sinop, no Mato Grosso, até Mirituba, no Pará.
Mas
Johny Fernandes Giffoni, pesquisador, mestrando em direitos humanos e defensor
público do estado do Pará explica que a Fundação Nacional do Índio (Funai)
deveria auxiliar os indígenas no processo de consulta prévia, livre e informada
e isso não foi feito.
"Um
dos papeis que a Funai descumpriu foi a realização do processo administrativo
de consulta e consentimento livre, prévio e informado tomando como base o
protocolo de consulta Kayapó e Munduruku. E qual vai ser o impacto dessa
rodovia? Essa rodovia precisa ser olhada em um contexto de mais de 30
empreendimentos e mais de 30 políticas públicas que estão sendo executadas no
território paraense em toda a Amazônia Legal", diz ele.
Em
junho deste ano, o governo federal protocolou o Plano de Outorga da ferrovia no
TCU sem a realização da consulta. Em julho, o Observatório De Olho no Xingu da
Rede Xingu+ encaminhou uma Nota Técnica sobre o descumprimento do direito de
Consulta aos povos indígenas no momento em que a ANTT e o Ministério da
Infraestrutura encaminharam o Plano de Outorga para concessão.
Questionada
por que não fez a consulta, a Funai não respondeu à reportagem.
O
mestrando em direitos humanos diz ainda que esses projetos afetam diversas
comunidades em nome de um discurso do desenvolvimento.
"A
Ferrogrão não é um empreendimento isolado. Ela está dentro de um conjunto de
empreendimentos que está atacando todas as terras indígenas do estado do Pará e
também outras comunidades. Quando eu falo de Ferrogrão, falo do complexo
logístico naquela região com os portos, por exemplo, a hidrelétrica, o aumento
da área para cultivo. É o que a gente chama de corredor logístico
neodesenvolvimentista", resume.
Se
não houve diálogo com as comunidades, alerta ele, as perdas são inúmeras, seja
para as comunidades tradicionais assim como para o meio ambiente e a
sobrevivência do ecossistema da Amazônia.
"Várias
espécies de animais que estão em risco de extinção que ser colocadas em risco
pelo desmatamento. Vai ser um impacto que a longo prazo coloca em risco além da
sobrevivência desses povos, mas também todo o ecossistema ambiental no qual
estamos inseridos."
Do
247/BdeF
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