"Moro
não tem suporte internacional, não é o autor de nenhum grande trabalho, não é
nenhum jurista distinto em ascensão foi recompensado com um cargo no gabinete,
que teve que renunciar quando Bolsonaro se comportou deploravelmente".
“Tendencioso”,
“ultrajante” e “sem qualquer importância no mundo jurídico”. É assim que o
ex-juiz Sergio Moro é visto internacionalmente entre juristas, segundo o
advogado Geoffrey Robertson, que representa Lula no Comitê de Direitos Humanos
da ONU. Em entrevista exclusiva ao GGN, como participação do
documentário “Sergio Moro: A construção de um juiz acima da lei”, ele
avaliou que o comportamento de Moro no julgamento de Lula repercutiu
negativamente na imagem da Justiça brasileira.
“Acho
que o juiz Moro vai entrar para a História como um dos investigadores mais
descuidados com os direitos dos réus. Ele seguiu uma agenda política. E não tem
suporte internacional, porque ele não é o autor de nenhum grande trabalho, ele
não é nenhum jurista distinto em ascensão, ele é um juiz que, na visão de
muitos advogados, julgou injustamente, em particular o ex-presidente, e foi
recompensado com um cargo no gabinete, que teve que renunciar quando Bolsonaro
se comportou deploravelmente. Isso deu a ele uma marca”, expressou.
“Mas eu não acho que ele desfruta de qualquer importância hoje na visão de advogados de outros países, porque ele não é autor de nenhum grande trabalho, ele não é um pensador, ele é uma pessoa que obviamente se envolveu em uma crise política no Brasil, algo que ele deve conviver com isso no Brasil, e deveria ser considerado em termos de História do Brasil, seu futuro e pelo cumprimento do Direito Internacional”, acrescentou. Entrevista a seguir:
AGENDA
POLÍTICA DE MORO
O
advogado ressaltou a contradição de um mesmo juiz guiar investigações –
chegando a orientar os procuradores da força-tarefa da Lava Jato e atuar como
um deles -, posteriormente condenar o réu e, em seguida, assumir um mandato
ministerial no governo do oponente político desse réu, o presidente Jair
Bolsonaro.
Os
movimentos de Sergio Moro foram “notados” pelo mundo, assegurou Geoffrey
Robertson, e foi “um sinal imediato de que Moro era um apoiador político de
Bolsonaro”. “Mostra o nível de tendência contra Lula, que o homem que o
condenou, perseguiu uma agenda política e recebeu a recompensa de condená-lo,
sendo indicado para o gabinete. Isso é certamente um indício do ataque
desavergonhado contra Lula, uma recompensa foi dada a um juiz.”
“ANOMALIA
BRASILEIRA”
Mas
para além das visão simplista que o então juiz, ex-ministro e mais recentemente
advogado Sergio Moro carrega pelos olhos do mundo, Robertson também expôs que
os abusos cometidos por ele no julgamento da Operação Lava Jato são, na
verdade, um reflexo da própria Justiça brasileira que permitiu esse tipo de
atuação.
Nesse
sentido, as críticas são de que parte da atuação de Moro “deve-se à
característica primitiva do sistema brasileiro”, que remonta “à inquisição
espanhola, onde você tem essa grande figura inquisidora que decide quem deve
ser suspeito e depois quem será condenado”.
“É
uma anomalia na lei brasileira. E foi o juiz Sergio Moro que conseguiu tirar o
máximo dessa anomalia”, arrebatou.
DESRESPEITO
DO BRASIL AO TRIBUNAL INTERNACIONAL
A
ação levada à Comitê de Direitos Humanos da ONU, sob a defesa de Geoffrey
Robertson, obteve como uma das vitórias a recomendação do Tribunal de que o
ex-presidente Lula deveria ter garantido o seu direito de se candidatar às
eleições presidenciais de 2018, o que não foi cumprido no Brasil, levando à
vitória de Bolsonaro.
“A
Lula foi negado seu direito de participar democraticamente da eleição. Foi um
exercício muito triste de injustiça”, lamentou.
Pela
determinação do Comitê da ONU, que é o órgão de controle do Pacto Internacional
sobre os Direitos Civis e Políticos, do qual o Brasil é signatário, Lula não
deveria ter sido impedido, sequer, em 2018, de conceder entrevistas enquanto
estava preso.
A
consequência dessa negativa é diretamente na imagem da Justiça brasileira ao
mundo, explicou, uma vez que o sucesso do Direito Internacional depende da
cooperação dos Estados. “Em 2009, o Brasil ratificou o Acordo Internacional dos
Direitos Civis e Políticos. Mas quando o Tribunal, por duas vezes, determinou
que Lula deveria ser candidato na eleição presidencial, em agosto de 2018, o
Brasil se recusou a acatar. Então, eu temo que a Lei Internacional depende da
boa fé dos Estados, e o Brasil mostrou má fé em não cumprir com as
determinações do Comitê de Direitos Humanos.”
EXEMPLO
DE OUTROS PAÍSES
O
que se verificou no Brasil com a atuação de Sergio Moro na Operação Lava Jato
e, mais especificamente, contra o ex-presidente Lula, também foi tema tratado e
já superado em outros países do mundo.
Robertson
relatou as recomendações feita pela Corte europeia de Direitos Humanos à
Portugal, em um caso similar, decidindo que juízes envolvidos em investigações
não podem julgar estes casos, estabelecendo, assim, duas figuras julgadoras: o
de instrução, responsável por atender a demandas da investigação em si, e
aquele que decidirá a sentença contra o réu.
“Até
mesmo Portugal mudou sua lei para garantir que não haja um juiz que faça a
investigação e o mesmo faça o julgamento. (…) É uma regra clara e isso não se
aplica no Brasil. O Brasil realmente precisa revisar essa regra, que, como eu
disse, vem da Idade das Trevas, da inquisição, e modernizá-la para que possa
ter julgamentos justos”, criticou.
Biden
e a reabilitação da Justiça Internacional
Na
entrevista, o especialista também comentou o fortalecimento que os Tribunais
Internacionais devem receber com a eleição do democrata Joe Biden, enterrando o
polêmico modelo de Donald Trump, em gestão que foi “danosa” à Justiça
Internacional. “A América [EUA] recusou nomear juízes para a Organização
Mundial do Comércio, o que prejudicou, e foram muitos os problemas causados ao
sistema internacional pelo presidente Trump”, elencou.
“Então
isso tem que ser dito: a eleição de Joe Biden é algo bom para a Justiça
Internacional, porque a América vai mostrar mais concordância [com a Justiça
Internacional]”, disse, completando com um recado ao Brasil: “Há chances agora
de que haverá uma reabilitação e teremos mais força e mais possibilidades de
questionamentos sobre países que se recusarem a cumprir com as determinações da
linha de direitos humanos.”
A
entrevista do reconhecido especialista em Justiça Internacional e Direitos
Humanos foi concedida em novembro de 2020, como parte do documentário “Sergio
Moro: A construção de um juiz acima da lei”, relembre: