Se permitirmos – e se o permitir o cinismo dos que invocam
“mimimis” de autocríticas públicas, sabendo que isso é não apenas injusto como
uma capitulação no combate – estaremos vivendo uma agravada e farsesca reedição
de 1964, correndo o risco, quase certeza, de que a brutalidade e a longevidade
do autoritarismo as supere.
Há diferenças, claro, a começar pela figura hitleriana que
tem o comando público do assalto ao poder – pelo voto, mas um assalto, porque
não fruto de uma trajetória política, mas de uma onda fanática – diferente da
estrutura organizada do Exército que assumiu o poder.
O objetivo alegado é “livrar o país da roubalheira e do
comunismo”, antes e agora, este com o nome de “petismo” e “salvar a democracia
da desordem”, da devassidão (a Marcha com Deus, etc…) da dissolução dos
costumes e, claro, de Cuba ou da Venezuela, escolha a época.
Quando assumiram os militares muitos acreditaram que seria
transitório, até porque tratava-se de defender a realização das eleições
presidenciais de 1965 e muitos que se omitiram – já se desenhava a campanha
JK-65 – ou apoiaram, como Carlos Lacerda, foram devorados pela máquina
autoritária que havia se posto em movimento.
A repressão, de início, foi voltada para trabalhistas e
comunistas, o que pouca solidariedade provocou. A seguir, foram os políticos
(em nome da corrupção) e, afinal, voltou-se contra a própria classe média que
pariu o regime. Quem quiser imaginar semelhanças, imagine para lutar com mais
empenho.
É possível que, se permitirmos que esta aventura se consume,
um espetáculo de trágica comédia, como os do “pelos meus filhos, pelos meus
netos, pelo meu cachorro e meu papagaio” da votação do impeachment que chocou a
todos. Mas serão breves dias, porque o mundo real será o das milícias, o dos
homens encapuzados promovendo fuzilamentos, o de baderneiros nos fazendo
redescobrir uma palavra que parecia ter ficado no passado, o pogrom contra
minorias.
Nossos liberais, há muito decaídos, dizem que não podem ser
“moralmente coagidos” a se opor de forma eficaz aos que invocaram contra eles
métodos como o fuzilamento, como fez hoje Fernando Henrique Cardoso, no Estadão. Imagine-se, portanto, o que sentem – ou o que
não sentem – como dever moral diante das vidas de outros.
Não temos e jamais tivemos – numa e noutra quadra da história
– ameaça comunista sobre o Brasil. Não se tomaram bens, não se fecharam
igrejas, não se fez “partido único, muito menos “imprensa oficial”.
Mas tivemos e temos diante de nós, bem clara, a rampa de
entrada de uma ditadura, degrau inferior do convívio humano e a mais eficaz
ferramenta de destruição da liberdade e da dignidade.
Tijolaço
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