Há
um evidente traço em comum nas três estrelas do campo da esquerda formalmente
vencidas na eleição de hoje: a juventude.
Guilherme
Boulos, Manuela D’Ávila e Marília Arraes (embora esta tenha tido um adversário
novo na idade, mas velho na política oligárquica) trouxeram um sopro de
renovação que há tempos não se sentia nas forças progressistas.
Não
creiam que, já sessentão, esteja eu dizendo que os mais velhos não tenham mais
o que fazer ou de dizer à política, e Lula está aí para prová-lo, inclusive por
seu apoio aos três, inequívoco mesmo quando não expresso por querelas
partidárias.
Os
três personagens, porém, trazem mais do que a presença de uma nova geração –
diferente da minha e da anterior a ela, formadas na luta contra a ditadura e no
aprendizado da reconstrução de uma democracia podada, durante um quarto de
século, da vida brasileira.
Trazem,
com certeza, a força de um novo fenômeno político que é a irrupção das redes
sociais como forma de interação entre as pessoas, até aqui muito mais
proveitosa para a direita, que fez delas a propaganda do mais estúpido
moralismo e a irracionalidade de louvar o que a faz mais medíocre e pobre.
Importam
menos os quatro ou cinco por cento que lhes faltaram para vencer numericamente
(porque a Boulos também faltaria isso, se a Covid não o tivesse tirado do último
debate, na Globo) do que o fato de terem surgido no cenário político.
Dito
isto, é preciso ver o que lhe faltou para vencerem.
Parece
claro que foi o voto do povão, das periferias, a perda das estruturas de
representação histórica das camadas populares, onde o discurso cosmopolita que
trazem – e é bom que tragam – não é o que empolga, o que agrega e o que
mobiliza as pessoas.
A
grande crítica que se faz ao PT, a de ter se articulado com as camadas
políticas convencionais, foi posta à prova nos últimos tempos. A campanha lavajatista deixou
o partido sozinho, sem alianças e aliados, em estado “puro”. E, assim, minguou
e vulnerou-se, quando não teve como evitar a destruição mental do que construiu
de fato: a época de maior progresso da história recente do Brasil.
Claro
que não é possível colocar no partido mais forte do campo da esquerda a culpa
essencial de seus problemas e esquecermo-nos de que eles resultam de uma ação,
criminosa e monstruosa, dos aparelhos judiciais que eles próprios promoveram,
prestigiaram e fortaleceram, pouco atentos ao fato de que eles são um aparato
do establishment, da atual ordem econômico-social e de seus
interesses políticos.
Mas
o PT errou, sim, e muito, ao imaginar que a força política e o carisma
excepcional de Lula seriam o bastante para garantir-lhe a hegemonia do processo
político e o resultado de hoje, que o deixa, pela primeira vez em 35 anos, fora
do comando de qualquer capital brasileira é o atestado de que, salvo em
raríssimo momento, não conseguiu se renovar em quadros políticos e passou a
ficar refém das políticas acessórias – embora importantes e indispensáveis –
que o acabaram por afastá-lo dos segmentos populares urbanos.
O
fato é que, sem Lula, o PT perde a referência popular que o ergueu. E, sem
Lula, também a camada jovem, oriunda da classe média, que emerge agora, não tem
a conexão popular sem a qual não tem força eleitoral suficiente para a vitória.
Este
será, ao que penso, o desafio que se põe ao campo progressista no Brasil.
Separados, divididos, isolados – “puros”, afinal – não iremos a lugar nenhum
senão à derrota, que se não se evitou mesmo com a direita dividida como esteve.
Boulos,
Marília e Manuela merecem todos os aplausos. E precisam, mais ainda, da própria
humildade e de apoio de todos nós, que sustentamos a inglória luta contra o
tempo.
Dorrit
Harazin, em seu artigo de hoje em O Globo, traz uma frase magnífica de Bertrand
Russell sobre este tempo final: “amplie gradualmente seus interesses, torne-os
mais impessoais, até que as paredes do seu ego recuem, e sua vida possa se
fundir na vida universal.”
Do
Tijolaço.
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