Se
houvesse uma Controladoria Geral da República séria, que não se limitasse a
investir contra reitores de universidades públicas, a esta altura estaria
exigindo o contrato firmado entre as empresas e a Block Rock para levantar como
se daria a repartição do butim.
É
simples entender a operação desastrada de quem organizou o grupo de empresas
para adquirir vacinas na AstraZeneca para vacinar seus funcionários, doando
metade para o Sistema Único de Saúde.
Avalie
a lógica da compra.
1.
A AstraZeneca tem toda sua produção comprometida com países, especialmente da
Europa, e Organização Mundial da Saúde. Não há oferta suficiente e a empresa
enfrenta pressões pesadas, especialmente de países da União Europeia, devido
aos atrasos na entrega. Na 6a feira passada, a Astra Zeneca anunciou um corte
de suprimentos para a União Europeia no primeiro trimestre. Alto funcionário da
UE estimou uma redução de 60%, para 31 milhões de doses para o bloco.
2.
Obviamente, para vender para empresas privadas, a AstraZeneca teria que tirar
das encomendas já efetuadas por outros países.
3.
São expressivos os lucros para o setor privado. Nas vendas para países, as
vacinas são menos de US$ 6 a dose. Para as empresas privadas brasileiras, o valor
foi definido em US$ 23,79.
É
uma história extremamente mal contada. Consultada, a Astra Zeneca negou
peremptoriamente qualquer venda ao setor privado. Se negou, de onde saiu o
valor de US$ 23,79, o aval do governo brasileiro e até a quantidade de doses a
serem adquiridas?
É
por aí que se entende o papel de Paulo Guedes.
A
nota oficial o governo brasileiro, avalizando a operação de compra de 33
milhões de doses de vacina pelas das empresas, foi assinada pelos Ministros
Wagner Rosário (Controladoria Geral da União), José Levi (Advocacia Geral da
União) e Élcio Franco (Secretário Executivo do Ministério da Saúde).
Surpreendentemente,
a nota foi copiada para o fundo de investimento Black Rock e para uma firma de
exportação chamada BRZ.
Qual
a justificativa? O Black Rock detém 8% do capital da Astra Zeneca, mas não
dispõe de nenhuma influência sobre a gestão da empresa.
Para
entender o Xadrez, é necessário juntar algumas peças.
PEÇA
1 – GUEDES E O NEGÓCIO DO COVID
No
dia 4 de abril de 2.020, início da pandemia do Covid no Brasil, Paulo Guedes
anunciou bombasticamente – como é de seu feitio – que estava negociando testes
em massa para criar um “passaporte da imunidade”. A negociação estava sendo
feita com um conhecido de Guedes na Inglaterra.
Percebeu-se
a tempo o potencial de escândalo, e a operação foi abortada.
Há
tempos, Guedes já tinha percebido o potencial da saúde. Dirigindo o Bozzano
Investimentos, antes de assumir o Ministério, investiu em 8 empresas na área de
private equity, cinco na área de saúde e educação.
Matéria
do The Intercept desbastava os investimentos de Guedes e trazia uma informação
adicional: sua participação da Estapar, a empresa de estacionamento que
conseguiu o monopólio na venda de Zona Azul em São Paulo – operação denunciada
pelo GGN.
Outro
setor prioritário foi o da energia, confiando na privatização do setor. Ao lado
da Black Rock, o fundo Bozzano – dirigido por Guedes – participava do capital
da Equatorial, a principal candidata à compra da Eletrobras.
Em
princípio, nada de suspeição. Apenas elementos para mostrar que Guedes
compartilhava da mesma lógica de negócios da Black Rock.
PEÇA
2 – A BLACK ROCK
Trata-se
da maior gestora de investimentos do planeta. Assim que foi confirmada a
nomeação de Guedes para a Economia, houve uma entusiasmada reação de Will
Sanders, diretor de mercados emergentes do fundo.
“A
equipe econômica sendo formada pelo novo governo está seguindo o que
esperávamos – atraindo pessoas respeitadas, comprometidas com o plano do futuro
ministro Paulo Guedes, e ao mesmo tempo mantendo aqueles que já vinham
desempenhando esse papel no governo atual”, declarou em entrevista ao Money
Times.
Assim
como o amigo londrino de Paulo Guedes, a Black Rock percebeu rapidamente o
potencial de negócios trazido pela pandemia. No dia 5 de fevereiro de 2020
adquiriu 8% do capital da Astra Zeneca, confiando em uma tacada, a fusão com a
Pfizer. Os controladores da empresa se negaram a fundir.
PEÇA
3 – A OPERAÇÃO DE GUEDES
A
operação montada pelo governo Bolsonaro – com o inacreditável aval da CGU, da
AGU e do Ministério da Saúde – foi claramente direcionado para a Block Rock
Brasil. Não haveria outro motivo para a nota ser encaminhada a ela e à empresa
importadora.
A
venda foi negada pela Astra Zeneca por razões óbvias:
“No
momento todas as doses da vacina estão disponíveis por meio de acordos firmados
com governos e organizações multilaterais ao redor do mundo, incluindo da Covax
Facility não sendo possível disponibilizar vacinas para o mercado privado”, diz
a farmacêutica.
Era
evidente que o excesso de demanda não conseguiria ser atendida pelo
laboratório. Essa informação obviamente estava disponível para a Black Rock, um
de seus principais investidores privados.
Ora,
o aval do governo brasileiro era para uma quantidade definida de 33 milhões de
doses. Qual a lógica? O documento não
visava liberar as empresas brasileiras para adquirir as vacinas, mas permitir à
Black Rock pressionar e ter argumentos para convencer a Astra Zeneca para
separar uma parte dos estoques vendidos para uma operação coordenada
diretamente pelo fundo.
Ora,
a Astra Zeneca iria desviar encomendas dos países europeus ou da Organização
Mundial da Saúde? É evidente que não. Qual o único país propenso a facilitar a
compra de vacinas pelo setor privado? Obviamente o Brasil.
Se
houvesse uma Controladoria Geral da União séria, que não se limitasse a
investir contra reitores de universidades públicas, a esta altura estaria
exigindo o contrato firmado entre as empresas e a Block Rock para levantar como
se daria a repartição do butim.
Quanto
muito, para comprovar que entraram nesse negócio por ignorância, não por
cumplicidade.
GGN.
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