Peça 1 – o iluminista e o negro de
primeira linha
A intenção
era criar um momento de paz, indicar publicamente que as desavenças no Supremo
Tribunal Federal se resumiam ao campo jurídico. Daí a ideia de inaugurar dois
retratos de ex-presidentes - Joaquim Barbosa e Ricardo Lewandowski - e incumbir
dois colegas de saudá-los.
Quando se
optou por Luís Roberto Barroso para saudar Joaquim Barbosa, ficou no ar a
suspeita de que algo poderia dar errado. Barroso é mestre na arte de se auto
louvar, permanentemente atrás dos holofotes e do protagonismo, das declarações
reiteradas de bom-mocismo. Teria o desprendimento de focar o elogio na
celebração de um colega?
Mas, enfim,
foi convidado dois dias antes da cerimônia e, portanto - pensavam os anfitriões
- com bom tempo para preparar o discurso e retirar eventuais inconveniências.
Mal começou
o discurso, um frêmito perpassou os demais Ministros e um frio na espinha
acometeu a organizadora do encontro.
Barroso
lembrava a primeira vez que conheceu Barbosa, na França. Ou na UERJ (Universidade Estadual do Rio de
Janeiro), quando Barbosa prestou concurso e ele, Barroso, já era chefe de
departamento. E o grande Gatsby não parou mais. Joaquim Barbosa tornou-se um
mero álibi para a pregação salvacionista do vingador, bradando seu patriotismo,
sua cruzada em prol da moralidade e da erradicação de toda corrupção.
Vez ou
outra, lembrava rapidamente a relatoria de Barbosa na AP 470 e voltava à catilinária
inicial, sua intenção de limpar a pátria, acabar com a corrupção, jogando os
corruptos no fogo do inferno.
Um Ministro
mais sarcástico virou-se para um colega e murmurou:
- O
"Iluminista" está impossível!
Referia-se
ao apelido que lhe foi pespegado pelo blog, quando seus acessos de humildade
fora de série o faziam se declarar um arauto do Iluminismo e um par dos grandes
juristas que atuaram na vida política nacional, como Joaquim Nabuco, Ruy
Barbosa e San Thiago Dantas.
Até que o
"iluminista" soltou a pérola máxima, saudando Barbosa, "um negro
de primeira linha".
Mal terminou
a auto louvação, os repórteres cercaram Joaquim Barbosa perguntando o que achou
de ser qualificado como "negro de primeira linha", uma versão capciosa
do "negro de alma branca". E Barbosa, impassível:
- Sem
comentários.
No mesmo
instante, portais e blogs, acostumados com as platitudes do ministro
"iluminista", espalharam manchetes de home com a frase que expunha
o dandy deslumbrado e preconceituoso.
Naquele dia,
uma transexual fez um discurso histórico no Supremo Tribunal Federal em defesa
do direito de identidade, um homossexual assumido enfrentou as verrinas
machistas-cafajestes de Gilmar Mendes (https://goo.gl/bwYya6) com a dignidade
das grandes figuras jurídicas que hoje escasseiam, sem se intimidar por um
minuto com as armas do preconceito.
No Supremo,
um negro combativo, polêmico, vencedor, impávido como Mudammad Ali frente a um
lutador bailarino e cheio de firulas, apenas olhou duro e deu um jab de direita
com o seu “sem comentários". E o jurista, socialmente preconceituoso, mas,
de qualquer modo, responsável por alguns dos avanços morais ocorridos nos
últimos anos, escorregou na própria verborragia incontrolável.
No dia
seguinte, o "iluminista" subiu ao púlpito do Supremo se desfazendo em
lágrimas, se desculpando pela demonstração involuntária de preconceito.
Interrompeu várias vezes a penitência com voz embargada.
Peça 2 – os negócios de família
Fiz o
preâmbulo não para condenar Barroso por um caso típico de má expressão, mas
para expor sua vulnerabilidade, de se desmanchar nas lágrimas da auto-compaixão
meramente ante a cobertura da mídia, expondo seu escorregão.
Barroso
nunca foi considerado um progressista, na acepção do termo. Mas também nunca
foi o juiz vingador, selvagem, o pregador prometendo fuzilar os ímpios com os
raios de Poseidon.
Parte do
clima persecutório atual, com reputações sendo assassinadas, prisões
desnecessárias sendo implementadas, em nome de uma genérica luta contra
corrupção, a suspeita espalhando-se por todo o país, os receios com grampos, a
derrubada da auto-estima nacional deve-se a ele, o Ministro do Supremo que mais
assumiu o papel de vingador.
Se Barroso
se desmanchou apenas com as críticas ao seu "negro de primeira linha
", o que ocorreria se a imprensa passasse a explorar os episódios abaixo,
se ele se tornasse vítima da mesma sanha macarthista que estimula?
O caso BHS
Trata-se de
uma construtora de propriedade de Detta Geertruce Van Brussel Telles, sogra de
Barroso, de nome BHS/Beehive.
A
construtora é especializada em reformas de prédios, na construção de mansões e
tem algumas construções de edifícios.
Com esse
histórico, trabalhou para a ICN- Itaguaí Construções Navais braço do Grupo Odebrecht para o programa PROSUB, do
submarino nuclear e para o BTG Pactual.
Detta entrou
para a sociedade da empresa em 2012, junto com Sandra Murat. Atualmente mora em Brasília, na casa onde
morava Valdemar Costa Neto, na época do mensalão. A casa pertence a Antonio
Carlos Osório Filho, dono da Capital 1, grande tomador de financiamentos da
Caixa Econômica Federal.
A offshore em Miami
Tereza
Cristina Van Brussel Barroso, sócia e esposa de Luís Roberto Barroso, em 9 de
junho de 2014 abriu a offshore Telube Florida LLC em seu nome de solteira. Quem
montou a offshore foi um conhecido operador brasileiro em Miami, com problemas
na justiça brasileira, de codinome Barbosa Legal.
O imóvel
fica na Ilha Key Biscayne, avaliado em US$ 3 milhões e é o sonho de todo
brasileiro deslumbrado com Miami.
Com o nome
de casada, Tereza é sócia do marido na LRBT Empreendimentos e na Chile 230
Participações.
Além disso,
Barroso responde ainda por duas empresas, a Casa da Cultura Jurídica do Rio de
Janeiro e o Instituto de Direito do Estado e Ações – Ideias.
Peça 3 – os assassinatos de reputação
Desconsidere
as acusações acima. Provavelmente as operações do Ministro e seus familiares
estão dentro dos limites flexíveis dos negócios privados. A offshore é apenas
uma maneira esperta de defesa contra o fisco, típica do pensamento de Barroso e
seu meio social – embora ele costume apresentar como prova da malandragem
brasileira a empregada doméstica de um amigo, que não quis o registro para
poder acumular os benefícios do Bolsa Família.
Pode causar
dúvida o fato da offshore estar no nome de solteira de sua esposa e sócia. Como
o fato do pai ser advogado de um processo milionário da Eletronorte.
Mas,
provavelmente, se fosse dada a palavra ao Ministro, haveria explicações
plausíveis para cada acusação, inclusive a informação se a esposa registrou
todos os repasses à offshore no Banco Central. "Acusações", como o
nome do proprietário da casa em que reside a sogra de Barroso, não teriam a
menor relevância ou significado.
Essas
acusações foram veiculadas por sites de direita – coincidentemente sediados em
Curitiba – com algumas informações obtidas diretamente do site da Receita
Federal – e repercutidas em blogs da revista Veja, na fase mais expressiva do
jornalismo-esgoto da revista e quando Barroso ensaiava alguns voos de
independência jurídica.
A intenção
política era óbvia. A notícia do site curitibano era encimada por uma foto do
Ministro e pelos versos:
"Meu
boi Barroso,
Meu boi
Pitanga,
O teu lugar
É lá na
canga"
Na canga do
PT
Como uma
pessoa tão frágil, que se desmancha em lágrimas devido às críticas recebidas
por uma expressão descuidada, resistiria a uma campanha pesada, da mesma
maneira de outras campanhas produzidas pela Lava Jato-mídia-blogs de direita,
em que basta juntar registros comerciais, informações da Receita e algumas
coincidências, para destruir uma pessoa?
Logo em
seguida à divulgação dessas "denúncias", Barroso votou pela prisão
após condenação em segunda instância, tornou-se um templário implacável contra
a corrupção e em defesa da flexibilização do estado de direito, o principal
alimentador – por seu cargo de Ministro do Supremo – da sanha persecutória que
tomou conta do país. O Barroso dos primeiros tempos, contra o clamor das ruas e
da mídia, acabou.
Que ele tenha
se atemorizado, desculpa-se: a maior ou menor resistência a pressões depende da
têmpera de cada indivíduo. E, desde seus tempos de UERJ (Universidade Estadual
do Rio de Janeiro), Barroso era reconhecido como o advogado brilhante, mas de
têmpera frágil. Ministros como Marco Aurélio de Mello, Ricardo Lewandowski e o
próprio Gilmar Mendes jamais se atemorizaram com tentativas de assassinato de
reputação – ainda que Gilmar por razões distintas.
O que não se
perdoa foi a maneira como negociou seu salvo-conduto. A fim de ser poupado dos
ataques desqualificadores do macarthismo caboclo, optou por aliar-se aos
vingadores, tornando-se seu principal avalista.
A história
não o perdoará. E não será por conta do "negro de primeira linha".
GGN
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