Mas
a purgação do Ministro Luiz Edson Fachin é a mais dramática. Ao que tudo
indica, Fachin é (era) um jurista de princípios consolidados.
À
medida que as mazelas da Lava Jato e de Sérgio Moro vão desnudando a farsa da
operação, e que o governo de Jair Bolsonaro vai demonstrando o preço pago pelo
desmonte das instituições, começa um esforço de alguns Ministros do Supremo
para recauchutar suas biografias.
A
divulgação das conversas da Vaza Jato teve efeito corrosivo sobre a imagem da
operação. Assim como o anti-lulismo foi o instrumento que agregou uma frente
política ampla, que abalou a democracia – com a participação de Ministros do
Supremo, mídia, mercado, militares -, a frente anti-Lava Jato vai juntando
setores dos mais improváveis, criando uma nova onda de opinião pública que
junta advogados garantistas, Procurador Geral da República, parte da mídia,
juristas que endossaram o golpe do impeachment.
A
primeira trinca na operação ocorreu com a prisão e denúncia de Michel Temer.
Denunciar e prender Eduardo Cunha estava na conta. Mas Temer, não, pois poderia
comprometer a política de desmonte do Estado e de negócios da privatização.
A
fenda ampliou-se com a Vaza Jato, na qual Glenn Greenwald se valeu da mesma
receita da LJ para conquistar a mídia: ofereceu a carne fresca de notícias de
impacto à mídia.
A
desfaçatez dos diálogos rompeu de vez com a blindagem.
Nesse
aggiornamento da opinião pública, é interessante acompanhar os esforços dos
Ministros do STF para recauchutar sua biografia.
Um
dos principais agentes de desestabilização dos governos Lula e Dilma, Gilmar
Mendes se converteu no mais ativo crítico da Lava Jato chegando a defender
julgamento justo para o próprio Lula. Tornou-se um campeão da democracia,
valendo-se de sua principal característica: a coragem. No julgamento da
liberação dos arquivos da Vaza Jato para a defesa de Lula, Carmen Lúcia também
mostrou-se sensível à nova onda.
Mas
a purgação de Ministro Luiz Edson Fachin é a mais dramática. Ao que tudo
indica, Fachin é (era) um jurista de princípios consolidados. Antes do STF,
notabilizou-se pela defesa dos direitos sociais e tem suficiente sensibilidade
pública para temer o julgamento da história. Ao mesmo tempo, está preso ao
apoio incondicional que deu à LJ. Sua cara, para a historia, será do Ministro
que convalidou a destruição institucional do país, permitido os maiores abusos
nos julgamentos da Lava Jato.
Mas,
como mostrei em outro artigo, há um Anjo e um Demônio habitando Fachin. O Anjo
aparece ocasionalmente em entrevistas, artigos, relembrando o Fachin pré-Lava
Jato, coalhado de bons propósitos, de visão humanista e de respeito ao papel
constitucional do Judiciário. O Demônio se apresenta no que interessa: seus
votos no Supremo.
Ontem,
em entrevista ao advogado curitibano Tarso Violin, o Ministro Luiz Edson
Fachin, do Supremo Tribunal Federal, acionou seu lado Anjo, para tentar
explicar que o Demônio não é tão feio assim. É!
Indicado
Ministro do STF, o Demônio apossou-se dele e atingiu paroxismos com a Lava
Jato.
Sobre
a operação, Fachin defendeu-se dizendo que não demoniza nem diviniza a Lava
Jato e como magistrado não analisa o conjunto da obra e não faz narrativas políticas:
analisa ação penal e conjunto de fatos. Defendeu a ideia de um Supremo
contra-majoritário, não cedendo ao clamor das vozes publicadas, e sim ao
respeito à Constituição. O Judiciário não pode ser transformado em caixa de
ressonância da sociedade disse ele. É caixa de ressonância da ordem jurídica e
democrática, votada e escolhida pelo poder constituinte originário, diz ele.
Não
bate com sua atuação. Endossou todos os abusos da Lava Jato. Repito: todos! Nos
momentos críticos – como em um embargo da defesa do Lula, em pleno ano
eleitoral – Fachin jogou com os prazos, transferiu a decisão para o pleno nas
vésperas do recesso da corte, sabendo que, na sua volta haveria pouquíssimo
tempo para ser julgada a possibilidade de Lula concorrer às eleições – quando
era favorito nas pesquisas.
Enfim,
Fachin sabe que a história sabe o que ele fez nos últimos verões. E o
julgamento será implacável.
Como
tem um preço alto a pagar, está oferecendo um pagamento elevado, assumindo
bandeiras relevantes – e corajosas – alertando para os riscos de um golpe
político-militar em 2022. Fala da transição imperfeita da ditadura para a
democracia. Provavelmente se refere à não punição dos abusos do regime militar
e da Lei da Anistia negociada por Nelson Jobim e Sepulveda Pertence, que abriu
espaço para a volta da militarização da esfera pública – a maior ameaça à
democracia, na visão de Fachin. Recorde-se que há anos o presidente da casa,
Luiz Fux, mantém em sua gaveta o processo de reavaliação da Lei da Anistia.
Alerta
que o maior risco à democracia é a volta da militarização do poder civil,
admite que a profissionalização das organizações de controle ocorreu dentro do
regime democrático – que ele ajudou a destruir, com o apoio do STF na
demonização da política.
São
discursos corajosos e eivados de fé na democracia. Mas não basta.
Enquanto não provar seu respeito aos direitos e à Constituição através de
seus votos, suas manifestações extra-autos apenas ajudarão a consolidar a ideia
de que se trata de um carrasco que chora depois de cada execução. E se prepara
para a execução seguinte.
Quanto
a seu parceiro Luís Roberto Barroso, nada se espere, nem gestos de coragem
tardia, nem preocupação com o julgamento da história. Para ele, basta viver
intensamente o presente.
GGN.
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