Nessa
terça-feira, 22-12, no tuíte da Folha, a chamada para a matéria sobre a
conquista do direito à universidade pelos negros, diz que “Década colocou os
negros na faculdade”.
A
reportagem mostra que o intervalo de tempo (década) decorrido entre 2010 e 2020
– 10 anos – foi marcado pela “conquista do direito dos negros ao conhecimento
pelo acesso ao ensino superior”.
Bem
legal, os dados mostram isso, mostram a evolução nesse intervalo de tempo
decorrido.
A
década continua a ser descrita na reportagem como muito frutífera, marcada pelo
protagonismo das mulheres negras também.
Tudo
muito legal, a não ser por um detalhe: não há sujeito da ação de fomento a
essas mudanças.
Ou
melhor, o sujeito é a “década” – “Década colocou os negros na faculdade”.
Assim, simplesmente, uma evolução natural.
No
processo de edição e seleção dos fatos e na construção do modo de informar os
fatos, a naturalização de certo estado de coisas, a falta de ligação histórica
e a ocultação de determinados atores são ações deliberadas e intencionais do
fazer jornalístico.
São
escolhas editoriais.
Portanto,
usar “Década” como o sujeito de uma ação tão significativa do ponto de vista
histórico e politico (garantir políticas públicas de acesso da população negra,
sempre marginalizada, ao ensino superior) nada tem de aleatório ou
inconsequente.
Os
anos mostrados e destacados na reportagem são os anos de administrações do PT –
Luís Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff –, e as conquistas ressaltadas não
são fruto de uma tendência histórica, que naturalmente iria ocorrer pela
evolução dos anos e das sociedades.
Não.
Elas são fruto da mobilização de movimentos sociais e da proposição de
políticas públicas afirmativas que ocorreram, volto a afirmar, durante os
governos petistas.
Portanto,
não são resultados aleatórios ou fruto de um processo de “evolução” natural das
sociedades.
E
é no mínimo desonesto o jornal não reconhecer os verdadeiros atores por trás
das ações. A “década” não colocou ninguém em lugar nenhum. Foram as políticas
afirmativas dos governos Lula e Dilma que o fizeram.
Se
a “década” fosse sujeito agente, poderíamos considerar que ela fez:
–
Inclusão do Dia da consciência Negra e da História da África no currículo
escolar
–
Sanção do Estatuto da Igualdade Racial
–
Criação da Secretaria de Políticas da Promoção da Igualdade Racial
–
Criação da Universidade da Integração Internacional da Lusofonia Afro-brasileira
Entre
várias outras ações.
Como
“década” não pode ser o sujeito dessas ações, é preciso que os textos
jornalísticos sejam corretos e apontem os verdadeiros responsáveis.
*Eliara
Santana é jornalista e doutora em Estudos Linguísticos pela PUC/UFMG
Do Viomundo
0 comments:
Postar um comentário