Surpresa
zero em que Jair Bolsonaro tenha defendido a óbvia liberação dos autotestes de
Covid-19.
E
a razão é simples: eles não são uma política de saúde pública, apenas um
complemento dos meios de que pessoas com maior poder aquisitivo podem dispor já
no seu já bem armado arsenal de defesa contra o vírus: home-office; transporte
particular, abastecimento por entregas e outros, distantes da realidade da
maioria mais pobre da população, que não tem como pagar perto de R$ 50 por um
teste para cada pessoa de sua família e de repeti-lo pelo menos uma vez se o
resultado for positivo.
Lembremo-nos
que milhões de famílias brasileiras não tem dinheiro sequer para comprar
comida, que dirá cinco, seis, oito “autotestes”.
Não
quer dizer que o autoteste não seja útil: tudo o que , nesta crise, puder fazer
alguém saber que está infectado e isolar-se é um fator positivo.
Mas
não substitui , nem de longe, a aplicação gratuita de verificação de ocorrência
de covid pelo poder público que dimensione e oriente as políticas estatais de
prevenção e de assistência médica.
E
não se pode deixar de pensar que, num tempo em que temos um governo
negacionista, que tenta o quanto pode esconder a gravidade da doença, o fato de
termos autotestes disponíveis (se é que os teremos, pois são os mesmos,
basicamente, que se aplica nas farmácias e que já faltam) funciona como
“excludente de ilicitude” para que o Estado proveja testes para todos os que
suspeitem de infecção ou que, por tranquilidade em seu dia a dia, querem ou
precisam realiza-los.
“Compra
um teste e faz, pô, qual que é o problema?”, logo, vai ser uma das
frases presidenciais, alguém duvida?
O
Brasil aplicou, per capita, nove vezes menos testes que os EUA, quase 20
vezes menos que o Reino Unido, 11 vezes menos que a França, 10 vezes menos que
a Itália. São países ricos? Está bem: menos de um quarto do Chile e do Uruguai,
metade da Argentina, da Colômbia e do Peru.
Mas
a classe média pode fazer autoteste e comemorar o resultado negativo, até que
chegue a faxineira que não teve como se testar.
Tijolaço.
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