domingo, 10 de maio de 2020

O BRASIL NÃO “VAI VIRAR A VENEZUELA”, POR ROBERTO BITENCOURT

Bolsonaro usa recorrente demonização da Venezuela para criticar as medidas adotadas pelo governo maranhense no combate ao coronavírus.
Considerando a polêmica travada por Jair Bolsonaro, nesse domingo, com o governador do Maranhão, Flávio Dino, vale a pena explorar aspectos do assunto que motiva uma pseudopreocupação manifestada pelo repugnante e desprezível presidente da República.
A sua recorrente demonização da Venezuela agora foi dirigida para criticar as responsáveis medidas adotadas pelo governo maranhense. Importa, pois, salientar: o Brasil não “vai virar uma Venezuela”, como a histeria reacionária e bolsonarista rumina e se opõe. Seguramente, não sob os auspícios do governo entreguista de Bolsonaro.
Com uma população de cerca de 30 milhões de pessoas, o país vizinho registra pouco mais de 400 casos com covid-19 e 10 mortos. Em termos razoavelmente comparativos, o estado de São Paulo possui 46 milhões de habitantes. Os casos registrados de coronavírus ultrapassam os 44 mil infectados, com quase 4 mil mortos.
Números comparativos bastante alvissareiros e positivos para a Venezuela. Eles são motivados por uma testagem massiva, bem como a uma oferta de amplo atendimento médico e às garantias dadas pelo Estado venezuelano para o pagamento dos salários e rendimentos dos trabalhadores. Isso tudo em meio a sérias sanções e boicotes internacionais promovidos pelos EUA, que criam muitas dificuldades e privações no país coirmão.
No Brasil, que “não vai virar a Venezuela”, os trabalhadores perdem direitos, salários, empregos e o governo genocida impõe exigências draconianas para importantes frações da população receberem míseros 600 reais. Filas e mais filas na Caixa Econômica Federal. Uma deliberada política de genocídio.
A fome bate na porta e o governo Bolsonaro empurra a nossa gente para o desespero, a doença e a morte. Quanto ao atendimento médico, o descaso prevalece em nosso país e os recursos não são destinados onde deveriam chegar. Os médicos, enfermeiros e demais trabalhadores da saúde estão mergulhados em péssimas e perigosas condições de trabalho.
Perdura o criminoso congelamento constitucional dos investimentos públicos nas áreas sociais, sem nada no horizonte que indique a derrogação da nefasta lei. Mais de 150 mil casos e de 10 mil mortes no Brasil. Ocorrências decorrentes de uma deliberada decisão política. Sem dúvida, o Brasil “não vai virar uma Venezuela”.
Ademais, não temos militares patriotas, nem camadas trabalhadoras e populares organizadas, menos ainda lideranças políticas de proa, detentoras de notória capacidade de defesa da soberania nacional e dos direitos coletivos.
Não possuímos uma mídia diversificada, para incentivar e dar corpo ao pluralismo da opinião. Para que se permita a irradiação de ideias, assuntos e categorias de percepção da realidade que sejam plurais, em que todas as vozes sejam ouvidas, todos os olhares vistos.  Muito menos temos efetivos instrumentos de participação popular nos processos decisórios do país, como o recall, que impõe controle sobre os atos dos governantes.
O Brasil, por ora, tem, isso sim e em grande medida, militares que são serviçais dos interesses americanos e massas amorfas e desorganizadas, a cada dia mais desapossadas de direitos. Um país sem soberania. Eis o que temos.
Uma pálida imagem de democracia representativa é o que o nosso país possui. Temos o crime organizado no governo e em outras instituições, com o propósito de defender os interesses dos EUA, de assegurar a hiperexploração dos trabalhadores e de transferir riquezas nacionais para fora.
Parabéns, presidente. Nós “não vamos virar a Venezuela”. Na contramão, cada vez mais nos parecemos com a Colômbia. Lugar que mais exporta cocaína no mundo. O pior país em relação à proteção dos direitos humanos.
Na Colômbia, nação também coirmã, proliferam os grupos armados paramilitares e os esquadrões da morte. Todos com força de incidência na vida política, aterrorizando ativistas políticos e movimentos sociais. Um obscuro satélite sul-americano tutelado pelos EUA.
Estamos muito semelhantes desse modelo de sociedade e regime político. Você tem responsabilidade direta nessa desgraça, presidente. Somos um lastimável pária no mundo, em que a morte é exaltada e converte-se em eixo das instituições e da sociabilidade cotidiana.
Roberto Bitencourt da Silva – historiador e cientista político.
Do GGN

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