Túmulos
no cemitério Vila Formosa, em local de concentração de vítimas da Covid-19 -
Lalo de Almeida/Folhapress
Aos
poucos o país vai voltando ao normal —um normal de incúria diante do sofrimento
da população. Alcançamos a marca de 100 mil mortos por Covid-19, e porto da
parte se vê o abandono progressivo do distanciamento social.
Cem
mil mortos em cinco meses. Nessa marcha, o novo coronavírus terminará 2020 como
terceira maior causa de morte no país, atrás somente das doenças cardiovasculares
e do câncer.
Governadores
e prefeitos que se jactavam de sucesso, a exemplo de estados da região Sul,
assistem impotentes à alta descontrolada de casos, já nos 3 milhões, e óbitos.
O
Brasil ocupa a segunda posição em número absoluto de contaminados e mortos, após
os EUA, que chegam a 160 mil falecimentos (em proporção populacional, já os alcançamos).
Não é improvável que os ultrapassemos, pois aqui ainda se testa pouco e mal, e
a epidemia segue fora de controle em várias localidades.
A
cada sete mortos no mundo, um é brasileiro. A média diária de mais de mil
mortos por dia se repete por dois meses inteiros. Não é, não deveria ser
normal.
O
péssimo desempenho do poder público no enfrentamento da pandemia se mostra tanto
mais revoltante por evitável. Afinal, o primeiro caso no país se registrou dois
meses após o vírus começar a grassar na China; na primeira morte, em meados de março,
a Covid-19 já tinha prostrado a Itália.
Os
governos tiveram tempo e tinham o Sistema Único de Saúde a postos para uma reação
coordenada. Não foi tampouco falta de recursos, em que pese a crise orçamentária,
porque agora se despejam dezenas de bilhões em ajuda emergencial sem que se
tenha visto prevenção mais eficiente.
O
maior responsável pela tragédia se chama Jair Bolsonaro. Em vez de liderar uma ação
nacional, negou a gravidade da emergência de saúde pública, promoveu aglomerações
e falsas terapias, como a cloroquina, e colheu oito casos de ministros infectados
(outro provável recorde mundial), além de si próprio e da primeira-dama.
Alguns
comemoram, no presente, o suposto advento de uma imunidade coletiva como chamado
para arrebanhar clientes desgarrados de bares, restaurantes, academias e centros
de compras —não das escolas, paradoxalmente. Epidemiologistas, entretanto, descartam
que se tenha alcançado tal limiar.
Não
há panaceia nem vacina por ora. Infeliz a nação que tem necessidade de heróis, disse
Bertolt Brecht; mais que infelicidade, a desdita do Brasil é nem mesmo poder contar
com um presidente e um ministro da Saúde efetivo neste momento de luto.
D
Folha
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